GRANDE DOMINGO
Acordei cedo, cheio de boas intenções, a pensar em caminhar um bocado. Ainda estava na preguiça, veio a chuvada. Comecei a telefonar, ninguém se animava nas circunstâncias pluviais para uma incursão pelo campo. Percebi que era hoje que se esgotavam as desculpas para poder evitar arrumar o escritório. Eu explico: arrumar o meu escritório de casa é a pior coisa que me podem dizer para fazer. Sigo o princípio de meter numa pilha as cartas que chegam com os extractos dos bancos, as contas domésticas, os avisos do condomínio, as facturas da farmácia e por aí fora. Uma vez por ano, mais ou menos, arrumo tudo. Hoje deitei fora dois sacos do supermercado heios de papéis e cerca de um metro de altura de revistas diversas que vou guardando nunca percebi bem porquê, porque é raro voltar a folheá-las depois de as ter lido.
O resultado da aventura é que estive durante três horas a arrumar papelada. No fim o escritório estava irreconhecível: havia espaço no sofá para eu me sentar, em cima da secretária só ficou o computador, até encontrei receitas de petiscos alentejanos que às vezes peço à minha mãe para me escrever - e lá vou guardando os papéis pelo meio das correspondências. Recuperei uma receita de boleima e umas notas sobre a massada de peixe à moda da Nazaré, surgidas no fim de um jantar num tasco no Algarve há mais de um ano.
O dia não terminou sem desbastar duas semanas de jornais da sala - e nunca como nesse momento tive a sensação que foi gasto tanto papel para tão pouco.
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PERDIGUEIROS DO RIO
Consegui finalmente voltar ao teu bar Zé, depois de teres ido dar aquela volta. Já não é bem a mesma coisa - faltam miminhos na lista, até os pimentos padrones estavam falhos nesta tarde de sexta-feira.
Mas continua a ser um sítio bonito. É claro que nunca perceberei porque é que a Martini coloca publicidade onde pouca gente deve beber Martini, mas ele há segredos no mundo da publicidade. Não resisto a contar uma velha história de barmen que, salvo erro, o Miguel Esteves Cardoso me mostrou escrita num livro precioso sobre cocktails. Rezava mais ou menos assim: Durante anos, no centro de New York, um tipo com ar de executivo chegava por volta das seis da tarde sempre ao mesmo bar e pedia um dry Martini. Deliciava-se com a coisa, pagava, cumprimentava o barman, e saía. Acontece que o cidadão foi deslocalizado para outra cidade qualquer e esteve uns anos sem dar à costa em New York. Lá voltou um dia, dirigiu-se à mesma rua, entrou no mesmo bar, onde estava o mesmo barman. Pediu-lhe um Dry Martini, beberricou-o extasiado, revirou os olhos de prazer e no fim perguntou: «-Ouça lá, estive anos noutra cidade, experimentei milhares de Dry Martinis e nenhum tem o paladar do seu. Qual é o seu segredo?». Detrás de um imenso sorriso, o barman respondeu-lhe, cotovelo apoiado no bar: « - Repare, coloco o gin, deixo cair a pequena raspa de casca de limão, ponho a azeitona a nadar um pedaço, e depois pego na garrafa de Martini seco, destapo-a e passo com ela,meio inclinada, com o gargalo por cima do copo, com todo o cuidado de não deixar cair nem uma gota no Gin...».
Para me recompôr com a existência bastou-me ver aquele casal que chegou e se sentou ao pé das espreguiçadeiras e se pôs logo, cada um para seu canto, a ler uma revista diferente. A dele tinha fotografias de carros, a dela de casas. Mas pareciam felizes.
Claro que a existência ficou pior quando um rapaz do «Portugal Diário», que é um simulacro de informação que circula na net, me telefonou. Queria uma reacção: expliquei-lhe que achava que notoriamente escreviam mentiras e disse-lhe que optava por não falar com ele. Vai daí escreveu que eu não quis comentar um determinado texto. Como se vê, o rapaz percebe mal o português: não era uma questão de não querer comentar, era uma questão de preferir não o fazer para aquele media.
Adiante - a tarde recuperou quando o Carlos Oliveira Santos apareceu, vindo do estrangeiro, e me falou de ti - percebi que estávamos ali ao mesmo. Adeus menino, que se faz tarde, porta-te mal, cá voltarei um dia destes.
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MARCAS
Porque é que todos os tipos com ar de jogadores de futebolistas falhados e com a barriguinha a despontar vestem camisolas da marca «Umbro» de côr berrante?
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BOM ARTIGO
Muito bom o artigo de Paulo Teixeira Pinto em «O Independente», sob o título «Do Oráculo da Polis». Excertos: «Política é a distância que vai da mera gestão da conveniência pessoal ou tribal à real opção pelo bem comum...Na política, só um conselho é útil:não abrandar nunca o exercício do que é suposto dever fazer, nem por mau tempo ou por má sorte....Consta da própria definição das regras do jogo político que não há nunca empates. Só há dois resultados possíveis:perder ou ganhar. E o que se ganha é sempre algo que a prazo, por natureza, estará também inelutavelmente perdido - o poder...É louvável viver com e para a política. É censurável sobreviver só da política». E o resto vai por aí fora. às Vezes sabe bem voltar aos princípios porque «é nos princípios que residem os fins últimos da política».
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ESQUINA NO PAPEL
Hoje, como todas as sextas-feiras, é dia de «Esquina» no papel do
Jornal de Negócios. Excerto:
O Partido Socialista considera desde o fim de semana passado que o grande argumento contra o Governo é acusá-lo de ser movido por um radicalismo de direita. A propósito arregimentou imagens retóricas da ditadura. O resultado não se fez esperar: PC e Bloco de Esquerda juntaram-se-lhe em côro gritando contra as ameaças de fascismo. Está recriada a Frente Popular, o velho sonho dos anos 30 e 40 que, de mãos dadas com os nazis em determinadas circunstâncias, e por mera reacção noutras, levou a Europa à guerra. Nunca nada me pareceu tão patético em política como exagerar na análise para provocar reacções também elas exageradas. O exagero, a hipérbole retórica, é geralmente sinal de falta de honestidade intelectual. Praticamente 30 anos depois do 25 de Abril a esquerda ainda quer deliberadamente confundir direita com fascismo, nacionalismo com ditadura, e verifica-se, sem surpresa, confesso, que é bem mais intolerante para quem não pensa como ela do que normalmente quem é de direita, em relação a quem é de esquerda.
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ART BUCHWALD
Confesso que sou admirador confesso deste cronista norte-americano que implacavelmente observa o mundo ao seu redor nas páginas do «Washington Post». Houve um tempo em que um jornal português publicava crónicas suas e foi aí que me habituei a deliciar-me com a sua escrita. Nesse tempo, já lá vão muitos anos mesmo, havia jornais em Portugal que falavam do mundo e não apenas das curiosidades e superficialidades que ocupam a maioria dos dias do pequeno rectângulo. Depois do 25 de Abril tornámo-nos tão obcecados conosco próprios, que começámos a ser incapazes de olhar em redor, sobretudo quando os ecos das últimas notas de «A Internacional» se desvaneceram por completo. Parte do exercício que me dá gozo e me leva a escrever estes posts é ter conseguido voltar a estabelecer uma rotina de pesquiase notícias, opiniões e comentários por esse mundo fora. Deliciem-se com este
Buchwald.
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HÁBITOS EUROPEUS
Um estudo europeu sobre os hábitos de consumo de media nos diversos países da Comunidade merece atenção. A versão integral pode ser consultada
aqui e lá poderão ver que Portugal tem em matéria de consumo de televisão um consumo semelhante à Irlanda, com as séries e novelas a aparecerem em segundo lugar das preferências e os documentários a não constarem da lista dos mais vistos, ao contrário do que acontece na maioria dos países da Europa. Em matéria televisiva os telejornais e o desporto são os outros programas mais procurados - na verdade 75,7% das pessoas depende dos televisores em termos informativos.
Mais grave é o facto de 74,7% dos portugueses não utilizarem o computador e apenas 10,1% afirma utilizá-lo diariamente. O pior sector é o da imprensa, como já se temia: apenas 25,1% dos portugueses tem hábitos regulares de leitura de jornais diários - nesta desgraça somos acompanhados pela Grácia (20,3%) e a Espanha (24,8%).
Foi o
Abrupto, de José Pacheco Pereira, que chamou a atenção para este documento e é dele a síntese da situação que, com a devida vénia, aqui se reproduz:
"TV
Almost all Europeans (97.6%) watch television. 99% have at least one TV set at home.
The four types of programmes that Europeans mostly watch are: news and current affairs (88.9%), films (84.3%), documentaries (61.6%), sports (50.3%).
Radio
Almost 60% of the citizens within the European Union listen to radio every day.
Radio programmes that Europeans prefer are: music (86.3%), news and current affairs (52.9%), sports (17.4%).
Newspapers
46% of Europeans read newspapers 5 to 7 times a week. The highest rates are found in Finland, Sweden, Germany and Luxembourg where 77.8%, 77.7%, 65.5% and 62.7% people read newspapers 5 to 7 times a week. On the other hand in Greece, Spain and Portugal only 20.3%, 24.8% and 25.1%, respectively, do so. It is also in these three countries that the proportion of people saying that they never read newspapers is higher than in other countries (30.5%, 23.4% and 25.5% respectively).
Computer
A majority of Europeans (53.3%) does not use a computer. This is especially the case for Greece (75.3%) and Portugal (74.7%). On the other hand, more than one fifth (22.5%) uses it every day. This proportion reaches 36.7% in Sweden, 36.6% in Denmark and 32.2% in the Netherlands. A smaller proportion (14%) uses it several times a week.
Internet
34.5% of the interviewed surf the Internet: 13.5% several times a week and another 8.8% every day. Swedes (66.5%), Danes (59.4%), Dutch (53.8%) and Finns (51.4%) use the Internet more than other Europeans. On the other hand, the proportion of Internet usage is the lowest in Portugal and Greece (14.8% and 15.1%, respectively)."
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EM DIRECÇÃO À SERRA
Parece que o meu elogio às enguias da Costa Nova deixou alguns outros amigos meus em polvorosa - do lado da serra queixam-se que eu só ligo ao litoral - esta é uma velha questão que atravessa a sociedade portuguesa. Já se sabe que o litoral é a zona mais povoada, com mais emprego, com melhores acessos, com mais oferta em geral. Em contrapartida o interior vive ainda das memórias do tempo em que se demorava quase um dia inteiro a chegar de Lisboa a qualquer ponto para lá de Coimbra, perdidos por estradas onde a ideia de recta era inexistente e em que a existência de viadutos ou terraplanagens parecia ter sido integralmente ignorada.
Era no entanto este o estado do país há não mais de 15 anos. Não havia auto-estrada Lisboa-Porto, nem Lisboa-Algarve, nem Via do Infante, nem ligação Torres Novas -Covilhã. Para que se saiba, há 15 anos havia uma amostra de auto-estrada à saída de Lisboa em direcção a norte, outra até Setúbal, outra até ao Estoril e depois um arremedo de auto-estrada a umas dezenas de quilómetros do Porto. O total dos troços então existentes não devia sequer chegar aos 200 quilómetros.
Serve tudo isto para dizer que agora o interior tem melhores ligações e aproveito para daqui deixar o recado aos meus amigos da serra que espero ser convidado para a matança do bicho e repastos de festim.
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CANAL 2
Mais de dois milhões de mensagens publicadas por dia, repetidas notícias em exclusivo e um fanatismo militante são as características do mais popular site japonês, o «Channel 2». Descubram tudo sobre o assunto
aqui.
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CARICATURAS
Um dos bons serviços da
Slate é a compilação de desenhos humorísticos de cariz políticos publicados um pouco por todo o lado à volta do mundo. Espreitem a secção sobre o candidato Arnold no Estado da California e divirtam-se um pouco.
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