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por falcao, em 28.09.07
O CRITÉRIO EDITORIAL
A questão básica colocada pela atitude de Santana Lopes na SIC Notícias, na noite de quarta-feira, tem a ver exactamente com os termos em que se define a linha editorial de uma meio de comunicação que se apresenta como fazendo informação de referência.
Que Santana Lopes esteve bem é uma evidência - mas era bom que o assunto não ficasse esquecido e se debatesse o essencial da questão, que é o valor dos directos, a forma como são utilizados e o efeito que têm na informação.
Nos últimos anos a utilização de directos vulgarizou-se e isso não é bom. Pode dar muita imagem em movimento, mas é perigoso - um directo é uma possibilidade de manipular a informação e a opinião pública e não de fazer informação credível.
Vamos por partes - o jornalismo é basicamente intermediação. A evidência interessa pouco - é mais importante um relato que separe o trigo do joio, uma análise cuidada das forças em presença, a possibilidade de ouvir várias pesoas, qualificadas, sobre o mesmo tema. Os actuais directos não têm intgermediação - ou se têm é apenas electrónica, entre a câmara que capta e o receptor que recebe a imagem. E isto , por muito que custe a quem se mete nestas aventuras, não é jornalismo.
A mania dos directos é aliás responsável por essa anormalidade da vida mediática portuguesa que são as conferências de imprensa às oito da noite, para passarem em directo no Telejornal, ainda por cima estranhas conferências de imprensa - muitas delas anunciadas como sem direito a perguntas. Ou seja, trata-se de utilização de tempo de antena - sem querer exagerar é o mesmo comportamento de Hugo Chávez - quer falar sem ser interrompido, quando lhe dá mais jeito.
A opção de Santana Lopes, ao suspender a entrevista que estava a dar sobre a crise no PSD e o sistema partidário vem chamar a atenção para isto - o abuso dos directos irrelevantes, a prevalência do imediatismo sobre a reportagem, a apetência de muita comunicação pelo espectáculo, mesmo que seja vazio.
Um directo, infelizmente, não é uma reportagem na maior parte das vezes. De facto, é-o raramente. E o bom senso manda que a menos que haja uma catástrofe relevante, não se interrompa uma conversa sobre um tema sério. Não é só uma falta de respeito para com o entrevistado. É sobretudo uma enorme falta de respeito perante todos quantos estavam a seguir a emissão e queriam ouvir a entrevista. Nenhuma linha editorial deve violar a expectativa dos destinatários da mensagem, nem forçar uns temas por cima dos outros.
Mas isto é uma herança da prática «vamos até ao fim da rua, vamos até ao fim do mundo», que anda bem distante do jornalismo.

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publicado às 10:34

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por falcao, em 27.09.07
DESFADOS
(publicado na edição de 26 de Setembro do diário «Meia Hora»

Anda por aí um grande alarido em torno de uma coisa chamada «Fados», uma operação propagandística impulsionada e protagonizada por Carlos do Carmo, que logrou um inusitado investimento público, à revelia de todas as regras vigentes em matéria de financiamento ao audiovisual, para conseguir um filme onde ele próprio brilhasse no papel de inspirador da obra. Para dar um ar cosmopolita à coisa arregimentou o sempre disponível Carlos Saura, que nos últimos anos se especializou em fazer bilhetes postais em torno de géneros musicais – primeiro o flamenco, depois o tango e, agora o fado. Claro que estes filmes não foram nem grátis nem rentáveis e claro que houve sempre vários poderes a pagar a factura, o que faz sentido por que na realidade eles foram usados essencialmente como peças propangandísticas. Pena é que o resultado final tenha sido sempre mais favorável a Saura e aos produtores que foram buscar os dinheiros públicos, do que aos países que financiaram a operação, e sobretudo, na realidade pouco fizeram a médio-longo prazo pelos géneros musicais cuja imagem no mundo se dizia irem exponenciar.

O mentor e os produtores do filme gabam-se de que ele estará colocado em duas dezenas de mercados e sublinham o enorme valor que isto tem para a divulgação da cultura portuguesa. Vamos por partes: primeiro é preciso ver que mercados são estes, em que circunstâncias vai o filme aparecer (para que audiências, em que circuitos, se estamos a falar de redes de salas de estreia, se salas e circuitos de filmes de autor, ou se de canais de televisão abertos; depois, é fundamental ver bem o que o filme é – e a esse nível as primeiras notícias são alarmantes na descaracterização, na falta de rigor, no facilitismo e até no pirosismo a que se recorreu.

No fundo a questão aqui é perceber se os tais imensos mercados onde dizem que o filme vai passar são relevantes em termos de audiência e, depois, se o produto e o seu conteúdo contribuem para afirmar a marca de Portugal e a sua cultura ou se apenas aumentam a confusão e a descaracterização. Do que li e ouvi, aposto que este é mais um caso de dinheiros públicos deitado à rua para satisfação de umas quantas vaidades e interesses pessoais.

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publicado às 12:02

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por falcao, em 24.09.07
BOM – O «New York Times» destacou esta semana um vinho português, o tinto «Padre Pedro» de 2002, da Casa Cadaval, considerando-o uma das cinco boas oportunidades do ano.


MAU – O fim da presença de António Sérgio na rádio e a extinção do seu programa «A Hora do Lobo», que passava na Comercial. É o terminar de um dos derradeiros programas de autor da rádio portuguesa, é o fim do tempo em que se podia ouvir um descobridor de sons e de músicas – o papel que o António Sérgio melhor cumpre. O serviço público de rádio encontraria um bocadinho de justificação para a sua existência (e para a cobrança de taxas na factura de electricidade), se desse aos ouvintes de António Sérgio a possibilidade de o poderem continuar a ouvir na rádio.


PÉSSIMO – Em vésperas de início efectivo do processo da Televisão Digital Terrestre o accionista Estado ainda não esclareceu que papel entende que a RTP deva desempenhar em tudo isto. E isso levanta as maiores suspeitas sobre a vontade de diminuir o peso do Estado na televisão do futuro e sobre a possibilidade de novos operadores entrarem em cena. O Ministro Santos Silva faria bem em esclarecer se acha que a RTP deve ter mais canais, os mesmos canais ou menos canais. E se o Governo tenciona permitir uma maior concorrência no sector.


O MUNDO AO CONTRÁRIO – Agentes da polícia a servirem de arrumadores de carros no anárquico largo do Tribunal da Boa Hora e a ficarem com as respectivas chaves, como se de um serviço de valet parking se tratasse.


PESADELO – Voar na TAP está a transformar-se num pesadelo. Esta semana calhou-me, num avião cheio, uma cadeira com um autêntico buraco no assento, que me fazia ficar inclinado e desconfortável. A sanduíche que foi servida era de fiambrino, um plastificado sucedâneo de fiambre, em pão elaborado numa fábrica de borracha. Mais valia não servirem nada e diminuírem o preço dos bilhetes para valores decentes.


PETISCAR – A La Gôndola é uma das mais antigas fábricas de conservas portuguesa, que data dos anos 40 do século passado. Situada em Perafita, Matosinhos, usa o método tradicional denominado “pré-cozido”, exclusivamente com peixe fresco, capturado nas épocas em que melhor realça o sabor e qualidade. Não é fácil encontrar, grande parte da produção vai para exportação (encontrei no google sites de Barcelona e dos Estados Unidos com elogiosas referências à marca). Nas boas lojas gourmet conseguem encontrar-se. As embalagens são só por si uma tentação – mas quando abrirem uma lata de petingas em azeite poderão perceber o que na verdade é um petisco.


LER – Não é muito frequente surgirem livros de poesia, de autores portugueses, que em cada página tragam uma revelação, que nos forcem a avançar de página para página, embrenhados no ritmo e nas palavras. «Senhor Fantasma», de Pedro Mexia, é um livro assim. É um livro de poesia que apetece devorar e, depois, ler e reler. Fica. Deixa marca. (edição Oceanos, 2007).


OUVIR – Maria Malibran foi uma das mais célebres cantoras de ópera da primeira metade do século XIX, aparentemente a mezzo-soprana preferida de Rossini para as suas óperas. De oridem espanholam, viveu uma vida agitada, encantou audiências de teatros em Londres, Filadélfia, Paris e por toda a Itália, fez escândalo e foi uma estrela da época. A sua carreira foi breve, uns dez anos – morreu cedo, no auge do talento. Muitos compositores escreveram para ela, aproveitando o potencial da sua voz, que alcançava uma extensão de praticamente três oitavas. Curiosamente uma das óperas que contribuíu para a sua fama foi expressamente escrita por ela por Giuseppe Persiani e conta a história de Inez de Castro. Cecília Bartoli é uma admiradora entusiasta de Maria Malibran e, a partir de partituras originais, reconstituíu algumas das árias que lhe deram maior fama e gravou-as com a Orchestra La Scintilla, dirigida por Adam Fischer. O registo está disponível em edições especiais – um livro sobre a história de Maria Malibran que inclui o CD e uma edição especial de grande formato, com reprroduções de documentos da época e que para além do CD integral inclui um DVD com um documentário sobre Bartoli e Malibran. (Edição Decca, 2007)



PERGUNTANDO… Que terá passado na cabeça de José Sócrates quando ouviu Bush elogiar e agradecer o apoio de Portugal aos Estados Unidos na invasão do Iraque?


BACK TO BASICS – «Em Portugal a justiça é uma máquina anquilosada, lenta e inconclusiva, incapaz de produzir provas e julgar em tempo útil, mais apropriada para triturar a paciência de um credor e a reputação de um inocente do que para fazer cumprir as obrigações e identificar responsáveis» - Carlos Pinto de Abreu, advogado, candidato à Presidência do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados.

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publicado às 19:43

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por falcao, em 20.09.07
RECORDISTAS
(publicado do diário gratuto «Meia Hora» em 19 de Setembro)


Este ano Portugal corre o sério risco de se tornar o país da Comunidade Europeia com maior número de partos ocorridos em ambulâncias – é rara a semana em que não se tem notícia de mais um nascimento a meio de uma qualquer estrada entre uma terra onde antes existia uma maternidade, entretanto encerrada pelos diligentes serviços do Ministério da Saúde, e o hospital de destino.

Os mesmos diligentes serviços começaram agora a seguir a prática de contrariar as prescrições de médicos, quando lhes parece que os medicamentos receitados são de custo elevado. Na semana passada soube-se que os serviços administrativos de um Hospital haviam rejeitado uma recomendação médica sobre a utilização de um novo medicamento num paciente com cancro. Aqui há uns meses descobriu-se, da pior forma, que as juntas médicas eram dominadas por burocratas que nada sabiam de medicina e que ultrapassavam as recomendações médicas – o escândalo foi tal que o Governo teve de intervir. A predominância dos burocratas sobre os médicos no sistema de saúde do Estado arrisca-se a constituir outro triste recorde lusitano.

Mas estes diligentes serviços do Estado encontram muita ajuda dentro do sistema quando se trata de maltratar a vida e a saúde dos contribuintes. Há poucos dias atrás os familiares de um doente em estado grave chamaram a atenção para outro caso: a ambulância em que um doente seguia, aparentemente com uma ataque cardíaco, foi parada pela Brigada de Trânsito da GNR, que a terá imobilizado cerca de um quarto de hora fazendo uma fiscalização formal, apesar de avisada de que estava a ser transportado um doente em estado grave e situação de urgência. O doente veio a falecer à chegada ao hospital, o coração não resistiu e os seus familiares colocam a questão de saber se, caso a GNR não tivesse agido como agiu, se poderia ter salvo uma vida. Parece que a GNR queria confirmar se estava a ser feita uma utilização abusiva das luzes de emergência – e em vez de ter escoltado a ambulância ao hospital de destino e aí ter tirado as dúvidas, resolveu averiguar se o doente estava mesmo doente, ali no meio da estrada.

Eu, por mim, gostava que os inquéritos que devem ser levantados a casos destes tivessem conclusões rápidas publicamente divulgadas e culpados apontados a dedo e castigados. Mas Portugal também é o país recordista de inquéritos inconclusivos…

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publicado às 12:26

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por falcao, em 17.09.07
BOM – A abertura de uma boa livraria no centro de Lisboa é sempre motivo de festa. Aqui se assinala a inauguração da «Pó dos Livros», no nº98 da Avenida Marquês de Tomar, um espaço amplo, bem arrumado, agradável e bem iluminado, com novidades editoriais portuguesas e também novidades importadas. Boa secção de fotografia e de banda desenhada.


MAU – Alguma coisa não funciona quando o próprio Ministro da Administração Interna é enganado pelas polícias, como aconteceu no caso do assalto à ourivesaria de Viana do Castelo.


PÉSSIMO – A habitual pantominice de Scolari deixou-se vencer pelos seus instintos mais básicos – agora pode fazer conferências sobre como dirigir homens ao estalo.


LISBOA – A Câmara Municipal devia garantir que os cidadãos que vivem e têm domicílio fiscal em Lisboa e que aí pagam imposto de circulação automóvel tivessem estacionamento gratuito à superfície em qualquer ponto da cidade que financiam; em contrapartida os não residentes deviam pagar, até mais do que agora se paga. Aqui estaria uma medida que defenderia os munícipes e que penalizaria a deslocação de veículos para a cidade, sem necessidade de evitar portagens. Dr. Costa, tem coragem para tanto?


PERGUNTANDO – Porque é que José Sócrates teve tanto empenho em receber o rocker reformado Bob Geldof e o seu Governo se esforçou por evitar o Dalai Lama?


O MUNDO AO CONTRÁRIO - O disco «A Música e a Guitarra», de Mário Pacheco, foi considerado pela revista britânica «Songlines» entre as dez melhores edições de world music de 2006. Esta semana tentei, sem sucesso, comprá-lo no «El Corte Inglês» e na FNAC do Chiado, as duas maiores discotecas de Lisboa. Não existia em nenhuma nem me sabiam dizer quando seria reposto. Fui à Amazon inglesa e lá estava o disco. Conclusão: para se comprar um disco português premiado o melhor é encomendá-lo do estrangeiro.


PETISCAR – Um bom prato de iscas à portuguesa (com elas) é das melhores coisas que me podem dar. Esta semana recordei como são excelentes no «Coelho da Rocha», em Campo de Ourique. São especiais: corte muito fino (como deve ser), mas depois disso cortadas em pedaços pequenos, quase farripas, bem temperadas e avinagradas no ponto certo. As «elas» são neste caso umas batatas fritas às rodelas de espessura média, mal passadas sem estarem cruas nem farinhentas. Uma delícia. Rua Coelho da Rocha nº104, Tel. 213900831.


LER – Shantideva foi um monge budista indiano do século VII, um príncipe que renunciou à coroa e entrou para a universidade budista de Nalanda onde por diversas razões se tornou motivo de chacota pelos seus pares. Para encurtar a história, os seus pares, que o julgavam incapaz, fizeram-lhe um desafio, convictos que Shantideva se iria ridicularizar. Em vez disso declamou-lhes um poema repleto de reflexão e ensinamentos e que havia de se afirmar um dos textos de referência do budismo, conhecido em português como «A Via do Bodhisattva». Por ocasião da visita do Dalai Lama a Portugal, acaba de ser editado pela Ésquilo, numa tradução de Paulo Borges e Rui Lopo, a partir da versão oficial inglesa do original em tibetano. Uma das citações mais conhecidas da obra é a estrofe 34, do capítulo IX, «Sabedoria»: «Quando algo e a sua não existência estão ambos ausentes da mente, nenhuma outra opção tem esta: chega a um perfeito repouso, livre de conceitos» - ou seja, há que deixar a mente tal como ela é, livre e sem entraves, solta do dogma da verdade única.


OUVIR – Volta e meia apetece-me voltar a ouvir alguns discos. Nestas últimas semanas tenho repetidamente posto a tocar «The Intimate Ella», um registo de gravações de Ella Fitzgerald em que a cantora é apenas acompanhada pelo piano de Paul Smith. Originalmente gravadas em 1960 e editadas como banda sonora do filme «Let No Man Write My Epitaph» (um filme menor, que não fez história, sobre o mundo da droga e a corrupção), estas 13 canções são interpretações invulgarmente intimistas, muitas vezes melancólicas até. Estes temas foram editados em CD sob a designação «The Intimate Ella» em 1990 e entre eles estão grandes clássicos como «Angel Eyes», «I Cant’t Give You Anything But Love, Baby», «My Melancholy baby», «Misty», «September Song» e «Reach For Tomorrow», entre outras. Por curiosidade o ano original de edição do disco, que na altura passou despercebido, é o mesmo do célebre «Ela In Berlin», uma gravação ao vivo que recebeu dois Grammies e em que Paul Smith também acompanha Ella. CD Verve, distribuição Universal Music.


BACK TO BASICS – Toda a alegria que o mundo contém / Veio por desejar felicidade para os outros. / Toda a aflição que o mundo contém / Veio por querer o prazer para si mesmo. (Shantideva)

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publicado às 16:28

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por falcao, em 10.09.07
BOM – A desassombrada posição do Presidente do Automóvel Clube de Portugal, Carlos Barbosa, que responsabiliza directamente António Costa, enquanto Ministro da Administração Interna, pelo aumento este ano verificado na sinistralidade rodoviária devido à desarticulação a que procedeu das campanhas da Prevenção Rodoviária Portuguesa.


MAU – Ficou esta semana a saber-se que está a aumentar o abandono escolar em Portugal. A notícia teve menos destaque nos telejornais do que o folclore montado à volta da entrega de computadores por membros do Governo durante o fim de semana por esse país fora.


PÉSSIMO – Diz um porta voz da PSP que a força policial não se revê na prática de espancamentos a civis por agentes policiais, na base de, literalmente, tomar em mãos a execução de punições. Convirá que alguém que mande nas polícias perceba porque é que os casos se repetem, porque é que os polícias portugueses são por via de regra violentos e prepotentes. Na realidade a regra é o abuso de poder e não o contrário.


O MUNDO AO CONTRÁRIO – Quem publicar transcrições de escutas telefónicas realizadas por forças policiais ou instâncias judiciais tem direito garantido a prisão. E o que acontece aos polícias, magistrados e outros agentes de justiça que as entregam a jornalistas para assim irem moldando a opinião pública e induzindo julgamentos sumários na praça pública?


INDEFESOS – O veto do Presidente da República à Lei da responsabilidade civil extracontratual do Estado foi um péssimo momento do Presidente da República. A única explicação possível para o facto de o mais alto magistrado da nação querer penalizar os cidadãos na sua relação com o Estado, é porque ele bem sabe quão mal o Estado funciona, quão injusto é e como a Lei, se aprovada, mostraria abusos, atropelos e injustiças quotidiana cometidos. E este veto, precisamente, encaixa-se nos abusos e atropelos aos direitos dos cidadãos.


PESADELO – Vivo no pesadelo de um dia pedir favas guisadas e me aparecer um prato com umas favas insípidas acompanhadas por chouriço, entrecosto e farinheira, tudo embrulhado individualmente em celofane com um selo da ASAE em cada um. Agora, quando estou num restaurante e vejo um tipo de bigode a olhar com cara de mau para o que está a comer, começo logo a temer que entre por ali dentro uma brigada da ASAE mascarada de tropa de choque com metralhadoras na mão.


PETISCAR – O pesadelo veio-me à ideia à hora de almoço num pacato restaurante de bairro, bem perto da sede da ASAE, enquanto comia precisamente umas favas deliciosas. Dei comigo a pensar que qualquer dia já não se consegue saborear um prato assim, que tanta uniformização e estandardização vão acabar com estes sítios. O restaurante em causa é um exemplo de bom serviço, simpatia, bom preço e honesta comidinha portuguesa. Chama-se «Manaus» e fica no nº23 da Avenida Conde de Valbom.


LER – Durante uns anos a revista «The Economist» publicava anualmente uma edição especial a que chamava «Intelligent Life», dedicada a algumas das melhores coisas da vida. A partir de agora a «Intelligent Life» passa a ter quatro edições por ano, uma por cada estação. A dedicada ao Outono de 2007 acaba de ser distribuída e está à venda na maior parte dos postos de venda onde se pode encontrar «The Economist». Há mudanças no grafismo, novas secções, novos temas e áreas por explorar. Muita informação sobre novidades na área da cultura e entretenimento, um portfolio fotográfico sobre caça, bons artigos sobre finanças pessoais e o preço da arte, incursões no mundo dos grandes cozinheiros e dos críticos de vinhos e ainda a previsão de que num futuro próximo utilizaremos leds para iluminar, melhor e mais barato, as nossas casas. Não deixa de ser engraçado que numa época em que tantos profetizam o fim da imprensa escrita, continuem a aparecer belos e ambiciosos projectos editoriais, lançados por empresas jornalísticas que não são propriamente nem inexperientes nem aventureiras.


OUVIR – A colecção de gravações organizada para celebrar os 150 anos da Steinway, a fabricante de pianos de excelência usados por alguns dos melhores pianistas de todo o mundo. São 10 CDs que recolhem gravações de diversas épocas, muito bem apresentadas e organizadas. A colecção recolhe registos inéditos, gravações nunca editadas em CD e outras actualmente fora de edição. A tocar estão nomes como Vladimir Horowitz, Claudio Arrau, Maurizio Pollini, Vladimir Ashkenazy, Mitsuko Uchida, Arturo Benedetti Michelangeli, Wilhelm Kempff, Emil Gilels, Martha Argerich e Alfred Brendel. Colecção Steinway Legends, distribuição Universal Music.



PERGUNTANDO… Alguém sabe o que aconteceu ao filme «Fados», do espanhol Carlos Saura, com estreia anunciada e falhada para vários festivais, e onde a Câmara Municipal de Lisboa investiu centenas de milhares de euros?


BACK TO BASICS – O mais importante de tudo é nunca deixar de colocar questões, Albert Einstein

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publicado às 12:18

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por falcao, em 06.09.07
O ADMIRÁVEL MUNDO NOVO



Hugo Chávez dificilmente seria uma estrela do You Tube: os seus longos discursos não encaixam nos formatos reduzidos que agradam aos espectadores do canal de vídeo para computadores. Mas a verdade é que Chávez também não precisa – quando quer vai à TV do Estado na Venezuela e fica dezenas de minutos a falar sem ser interrompido; por cá, Sócrates e seus ministros têm cada vez mais lugar garantido nos telejornais, preparam cuidadosamente os momentos em que aparecem e aquilo que vão dizer, cada vez mais sem oportunidade a perguntas ou lugar a contraditório. Na realidade o espaço mediático da oposição – nomeadamente o seu espaço no mais poderoso dos media, que é a televisão – está cada vez mais reduzido às polémicas internas de cada partido e não a questões de fundo.

A televisão, na sua forma actual, favorece objectivamente a propaganda em detrimento da informação: relatar às pessoas o que aconteceu ou o que um político pensa arrisca-se a ser monótono e desinteressante, ganha sempre uma qualquer acção bem encenada mesmo que vazia de conteúdo ou até, paradoxalmente, de novidade.

A decisão de Paulo Portas, de assinalar a rentrée política no You Tube, tem duas leituras: por um lado é claramente a tentativa de ganhar uma imagem de modernidade e de contemporaneidade tecnológica; mas, por outro, é também a constatação de que, de outra forma, não conseguiria expor o que pensa, de forma articulada, sobre cada um dos temas que abordou: os vetos presidenciais, a destruição de propriedade privada por neo-ecologistas em Silves e, finalmente, a questão do aumento das taxas de juro.

A nossa sociedade alimenta-se de paradoxos e um deles, delicioso por sinal, é que Paulo Portas se tenha estreado no You Tube na mesma semana em que o Governo andou por esse país a distribuir computadores e placas de acesso à internet por banda larga para ter mais um pretexto para aparecer na televisão. Resta a esperança de que alguns dos destinatários dos computadores o tenham usado para ver Portas no You Tube, à mesma hora em o cerimonial das ofertas era religiosamente passado no Telejornal.

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publicado às 16:04

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por falcao, em 02.09.07
OFERTAS – Aqui há uns anos, numas eleições autárquicas, havia candidatos que se promoviam à custa de electrodomésticos; agora é o Governo que se promove à custa de entregas de computadores. O conteúdo é diferente, mas o princípio é o mesmo.


CURIOSO – A TVE decidiu deixar de fazer transmissões directas de touradas. Mantém magazines sobre tauromaquia, mas o serviço público de televisão no país mais aficionado por toiros do mundo resolveu que deixaria as touradas para as praças de touros. Vindo de um serviço público é um exemplo curioso, não é?


ASAE – Coisas que a ASAE deve estar quase a classificar como espécies em vias de extinção: a venda de bolacha americana na praia; as simpatias de alguns restaurantes algarvios que oferecem no fim da refeição uma medronheira caseira aos clientes; peixe não congelado nem embalado, assado na brasa ao ar livre, num grelhador feito a partir de um bidon; restaurantes com bancos corridos não ergonómicos nem certificados por um qualquer burocrata europeu; tarte de alfarroba não pasteurizada nem embalada.


ROTUNDAS – Há uns anos que não andava em vai-vem pelo país e julgava que o movimento de construção de rotundas tinha abrandado. Puro engano, a rotundomania continua em grande forma, a maior parte tem ajardinados horrendos, fontes em esguincho e, alguns, peças escultóricas medonhas - os autarcas são na realidade a vanguarda responsável por pôr o país inteiro a andar aos círculos sem sair do mesmo sítio.


A MESMA LUTA – António Costa e Rui Rio mostram ter grandes semelhanças em matéria de entretenimento. Rio resolveu monopolizar os céus do Porto para uma mais que discutível corrida de aviões - na prática por cima da cidade - e ninguém acha a coisa absurda; e António Costa promove um festival de magia e ilusionismo pelas ruas da Baixa, ao mesmo tempo que se deixou cair na tentação de transformar o Terreiro do Paço numa feira de fim-de-semana. Ambos gostam mais de fogachos do que em pensar uma política de entretenimento, diversão e cultura estruturantes, mas pelo meio lá vão gastando os magros orçamentos que têm. La Feria, que se tinha albergado nos braços de Rui Rio, deve estar prestes a regressar a Lisboa, ao regaço de António Costa. Ou então divide-se por ambos: dois apoios sempre são melhores que um só – é a globalização norte-sul…


INVESTIGAR – Um dos meus géneros favoritos é o livro policial. Há uns tempos vi umas referências elogiosas a uma escritora norte-americana que não conhecia, Sara Paretsky, Foi ela a criadora da detective privada V. I. Warshawski, em cujas aventuras baseia a sua escrita, que já vai em mais de uma dúzia de títulos publicados. Pesquisando na net vi elogiosas referências a um dos títulos recentes, de 2003, «Blacklist» e resolvi encomendá-lo pela Amazon. Saiu-me uma edição de bolso da Penguin, de letra minúscula, mas que apesar desse desconforto, se lê sem parar. A escrita de Paretsky é envolvente, intimista, relatada sempre na primeira pessoa, em nome da detective Warshawski, mulher de vida complicada, algo confusa e obcecada por uma boa investigação. O que é certo é que fiquei fã de Paretsky e resta-me agora continuar a ler o resto da sua obra. O próximo é capaz de ser «Ghost Country», um não policial, descrito como « uma viagem mágica e emocionante por algumas das mais cruéis ruas de Chicago», precisamente a cidade onde a escritora vive.


DESCOBRIR – As gravações das actuações de John Coltrane no Festival de Newport em 1963 e 1965, agora pela primeira vez reunidas num CD, «My Favourite Things: Coltrane at Newport». A gravação de 1963 apresenta os três temas com que Coltrane encerrou o Festival desse ano,«I Want To Talk About You», um clássico de Billy Eckstine, o standard «My Favourite Things» da dupla Richard Rodgers e Oscar Hammerstein e finalmente um tema do próprio Coltrane, «Impressions». Nessa noite Coltrane era acompanhado por McCoy Tyner no piano, por Jimmy Garrison no contrabaixo e por Roy Haynes na bateria. Dois anos mais tarde a banda era quase a mesma (Elvin Jones estava de regresso à bateria no quarteto de Coltrane), mas a música estava mais solta e arrojada, era o tempo em que se experimentava a «New Thing». Curioso comparar a versão deste segundo ano de «My Favorite Things» com a de dois anos antes, e muito interessante ver como Coltrane , em termos de composição e improviso, avançava no seu tema «One Down, One Up». Coltrane havia ainda de regressar a Newport um ano depois, no que foi a sua última apresentação no Festival – o músico morreu em 1967, aos 40 anos. As gravações destes dois primeiros anos de Coltrane no Newport Jazz Festival são considerados momentos altos de uma carreira meteórica. CD Impulse, Distribuição Universal Music.


BACK TO BASICS – É muito perigoso querer ter razão quando um Governo persiste nos erros, Voltaire.

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publicado às 13:08


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