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DR. COSTA, E DEPOIS DO VAZIO?

por falcao, em 26.08.16

VAZIO - Este verão tem sido politicamente muito educativo. Ficámos a saber que a economia persiste em não crescer, que Catarina Martins está desgostosa com as tropelias que o PS faz na geringonça, que Costa continua optimista. Tudo indica que a rentrée política vai ser muito interessante: uma preparação do Orçamento de Estado que promete agudizar as divergências na coligação, um agudizar das tensões com Bruxelas e uma degradação geral do panorama do país. Há membros do Governo desgastados, em boa parte por culpa própria, e começa agora a ver-se que a equipa maravilha que Costa reuniu à sua volta está a meter água em vários lados. Se a geringonça fosse um barco, o melhor seria instalarem rapidamente uma bomba de água potente para evitar que se afundasse. O episódio da CGD, que, sabe-se agora, levará  a um orçamento rectificativo, ainda vai provocar mais fissuras na coligação - PCP e Bloco já disseram o que queriam, e o que querem não é o que o PS acordou em Bruxelas. O cenário está preto: olhamos à volta e não vemos criação de empregos duradouros, não se vislumbram políticas de desenvolvimento regional e nacional coerentes - em vez disso as cidades estão entregues a obras de jardinagem e embelezamento, fruto do esbanjamento em função das eleições autárquicas do próximo ano; a balança comercial está frágil, a reputação das finanças de Portugal nos mercados tem piorado e os juros que pagamos ressentem-se. como se viu na última semana. Costa encontrou um país em recuperação quando chegou a S. Bento. Vamos ver o que deixa, quando sair - no entretanto tudo indica que se prepara para provocar umas eleições antecipadas e tentar ficar a governar sozinho.

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SEMANADA - O Presidente da República veio de férias e forçou explicações do Governo sobre a Caixa; Bruxelas disse como queria a Administração da CGD, reduzindo os seus membros de 19 para 15; Bruxelas mandou que alguns dos nomes propostos pelo Governo para a CGD fossem estudar; Bruxelas aprovou uma recapitalização da CGD até 4,6 mil milhões de euros e fez incluir financiamento privado no pacote; Bruxelas quer redução do número de balcões e de funcionários da Caixa; a intenção governamental de mudar a lei bancária para encaixar as propostas do Governo, vetadas pelo BCE, foi travada por uma convergência de opiniões do Presidente da República, do PCP e do Bloco de Esquerda; Catarina Martins afirmou arrepender-se todos os dias do acordo que permitiu ao seu partido apoiar o Governo do PS, devido às limitações que cria; os filhos de um embaixador de um país árabe envolveram-se numa zaragata, um português de 15 anos foi espancado por eles, e os agressores disseram estar “humilhados e zangados” ; neste assunto o ocupante do Ministério dos Negócios Estrangeiros mostrou mais uma vez ser um mero verbo de encher; na PSP há entre 7 a 10 mil agentes desperdiçados em tarefas burocráticas; o Governo disse que não podia fazer mais no combate aos fogos; a Ministra da Administração Interna deu uma entrevista à revista Flash a explicar como as suas férias foram interrompidas pelos incêndios.

 

ARCO DA VELHA - Os encargos do Estado com as parcerias público-privadas no primeiro trimestre aumentaram 5% face a igual período de 2015 e as receitas das portagens para os cofres públicos caíram 2%.

 

 

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OUVIR - Este ano tenho feito umas férias um pouco diferentes do que é habitual e lancei-me à estrada, em Portugal e Espanha. De vez em quando ouvia as minhas listas no Spotify, mas na maior parte do tempo, em Portugal, sintonizei a Antena 1, 2 ou 3. Devo dizer que por razões profissionais sou um saltitão na escuta das rádios, mas pelo menos uma vez por semana sigo a emissão da manhã da Antena 1. Eu gosto muito de rádio, acho que é um dos media mais fascinantes e daqueles que melhor se tem conseguido adaptar às mudanças - de tal forma que tem ganho ouvintes em vez de os perder. Um estudo recente indicava que a rádio superava a imprensa em termos de confiança quanto à informação transmitida. Ao contrário do que acontece com a televisão, o horário nobre da rádio está no início da manhã, entre as sete e as dez, quando a maior parte das pessoas se deslocam para o trabalho, nomeadamente nos seus veículos particulares. Até há uns dois anos o carro era o sítio por excelência para ouvir rádio, mas, de repente, olhado-se para os números de consumo de internet, constata-se que começou a existir uma dispersão de horários - a audiência de rádios online, em streaming, já é significativa durante o período laboral. Regressando ao início do parágrafo, venho aqui dizer que gosto da Antena 1, gosto às vezes da Antena 2 e acho que a Antena 3 cumpre bem a sua função, embora não lhe ficasse mal um choque de vitaminas. O bom estado do serviço público de rádio deve-se a Rui Pêgo, que há anos o dirige. É impressionante o contraste entre a qualidade e utilidade do serviço público de rádio e a vacuidade da maioria do  serviço público de televisão - quer em termos de programas, quer em termos de informação. Bem sei que os meios necessários são diferentes, mas aqui, o que conta, é a atitude. Rui Pêgo faz serviço público. Outros, na RTP televisão, não. É isto. Deixo também um elogio ao facto de a rádio pública ter desenvolvido programas de autor sobre os mais variados temas. Estes programas de autor são, hoje em dia,  a matéria prima para a mais valiosa propriedade da rádio no mundo digital - os podcasts. E nesta matéria a rádio pública dá cartas.

 

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VER - A Condé Nast Traveller considerou este ano o Guggenheim de Bilbao, desenhado por Frank Gehry, como o mais bonito museu do Mundo. Bilbao saía de um período difícil quando se decidiu avançar para a construção do museu, que decorreu entre 1993 e 1997. O projecto ajudou claramente a mudar a imagem da cidade e voltou a colocar Bilbao no mapa. Lisboa podia ter um polo de atracção assim se o projecto de Gehry para o Parque Mayer tivesse ido em frente - infelizmente esse azar da democracia chamado Jorge Sampaio impediu-o, vetando, quando era Presidente da República, um diploma que permitiria fazer a obra. Ao fim destes anos todos o Parque Mayer continua sem solução, abandonado e sem plano coerente. Mas regressemos ao Guggenheim de Bilbao - além de ter um museu fantástico, tem um site na internet fabuloso e um conjunto de presenças nas redes sociais que permite visitar o projecto de arquitectura, a história da sua construção, o trabalho de Gehry e uma visita ao exterior e ao interior do edifício. É também possível percorrer a colecção própria do museu, fazendo uma visita virtual. Enquanto não se encontra tempo para lá ir, a visita virtual, cada vez mais acessível em numerosos museus de referência, é uma boa forma de nos informarmos, conhecermos e escolhermos aquilo que queremos ver. Era engraçado que o projecto de Gehry para o Parque Mayer estivesse também assim acessível. Pode ser que a história recente de Lisboa não se resumisse no futuro aos desvarios a que vamos assistindo.

 

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FOLHEAR - A edição de Setembro da “Monocle”, já distribuída em Portugal, é dedicada ao empreendedorismo, e sugere muitas ideias e casos para seguir. Berlim, Tel Aviv, Oslo e Auckland são cidades recomendáveis para novos negócios, segundo a revista. Kasrin Wanngard, a Mayor de Estocolmo, olha para os  resultados conseguidos pela sua cidade nos anos mais recentes e destaca a importância da educação, dos transportes públicos, de apoios familiares e de alojamento acessível como aquilo que permitiu atrair e reter talentos. Foi um esforço continuado de inovação, de promoção da diversidade, de educação em todos os níveis escolares e na criação de uma rede de infantários municipais disponíveis para todas as famílias, sejam estudantes ou já trabalhadores. Uma das prioridades da cidade é dar condições para combinar a família com a carreira e Karin sublinha que quando as cidades funcionam em termos de atracção de talentos, funcionam em termos de atracção de negócios, e está garantido que terão sólidas instituições culturais e desportivas. Outros artigos interessantes nesta edição têm a ver com as novas tendências de produção de televisão e diversos ensaios sobre as razões de sucesso de bons negócios. Portugal tem três referências - uma página de publicidade da trienal de arquitectura, um elogio às novas capacidades na industria aeronáutica que a Embraer aqui criou, e finalmente, no Guia do Empreendedorismo, o primeiro destaque vai logo para Nuno Carvalho, que explica como construíu a sua Padaria Portuguesa.

 

PROVAR - Já se sabe que o norte de Portugal é uma região onde se come bem. Mas mesmo assim, às vezes fica-se bem surpreendido. Foi o que me aconteceu na “Muralha de Caminha”. Trata-se de uma casa que é simultaneamente restaurante e alojamento local, situada em sítio privilegiado, frente à foz do rio Minho. Tem uma zona interior e uma belíssima esplanada que nestes dias merece ser vivida. À partida há três coisas a destacar - a frescura dos produtos (mariscos, peixe ou carne), a simpatia do pessoal e o saber da cozinha. No meio das voltas que dei não vi robalo de pesca local tão fresco como o que chegou à mesa da Muralha. Espreitei para  a mesa do lado, onde um cliente notoriamente habitual se deliciava com um lavagante “da nossa costa”, grelhado e flamejado em aguardente velha. Eu fiquei-me com meia dose de posta de novilho, feita com um tempero habilidoso de alho, louro e pimenta e que estava verdadeiramente delicioso. A acompanhar vinham batatinhas novas salteadas e feijão verde, mas o pedido de umas batatas fritas - feito por inveja do que via passar  - foi prontamente satisfeito. Antes de o repasto começar tinham vindo dois pastéis de bacalhau daqueles que já é raro encontrar, com mais bacalhau que batata, e dois rissóis de carne, impecáveis. A lista de vinhos é boa e tem em conta a produção local. A broa de milho era exemplar. Muralha de Caminha, Rua Barão de São Roque 69, telefone 258 728 199.


DIXIT - O facto de querer sempre concorrer com os privados, o facto de não ter uma elite com coragem para fazer diferente, tornam a RTP pouco relevante e muitas vezes irrelevante no que toca ao serviço público” - Eduardo Cintra Torres.

 

GOSTO - Da apresentação da integral das nove sinfonias de Beethoven, pela Orquestra Metropolitana de Lisboa, em várias cidades, como vai acontecer em quatro dias seguidos, no Terreiro do Paço, no fim do mês de Setembro.

 

NÃO GOSTO - Da decisão sobre a permanência dos Mirós em Portugal. Como Jorge Calado escrevia na Revista do Expresso: “Em vez de ficar com dois ou três razoáveis e vender o resto para comprar obras para as colecções existentes, vai-se criar o pior museu Miró do mundo para mostrar o rebotalho de uns restos de colecção. “

 

BACK TO BASICS - “Depois de saber tudo, estará sempre tudo por saber” - Alexandre O’Neill

 

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publicado às 14:09

IMPOSTICES - A história dos cidadãos portugueses nos últimos anos resume-se em poucas palavras: pagar sempre mais ao Estado, seja em impostos directos, seja em taxas diversas. A máquina fiscal dispõe de poderes especiais, é muito pouco escrutinada, o sistema de (in)justiça fiscal e tributária favorece os abusos do Estado sobre cidadãos e empresas. Ainda esta semana se soube que a Autoridade Tributária quer reduzir diversos prazos de reclamação dos contribuintes. Soube-se também, felizmente, que a Comissão Nacional de Protecção de Dados não concorda com a quebra de sigilo bancário proposto pelo Governo. Este Ministério das Finanças, e este Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais em especial, têm dado provas de grande desrespeito pelos contribuintes, de que as numerosas notícias de atraso de reembolso e os expedientes utilizados para o fazer são apenas a ponta do icebergue. Nesta matéria dos mecanismos delatórios do reembolso este Governo foi aliás bastante criativo. Não vou alongar-me sobre a postura ética de Rocha Andrade no caso do convite para ir à bola no estrangeiro, com tudo pago, que aceitou de uma empresa em contencioso fiscal com o Estado, nem da forma trapalhona como quis abafar a questão, como se um reembolso restabelecesse a honra - o que não acontece. Basta olhar para o que tem sido a sua acção, desde o que pensa sobre o imposto sucessório que ameaçou reintroduzir, até aos critérios de agravamentos do IMI. Todos os Governo recentes preferem aumentar impostos a reduzir as gorduras do Estado e este não é excepção. E todas as oposições, quando se tornam governo, aproveitam os aumentos antes decretados e, se possível, ainda os carregam. Os combustíveis são um bom exemplo, talvez por se tratar de uma geringonça cujo motor há-de consumir algum carburante. António Costa, por via do seu cobrador Rocha Andrade, é apenas mais um dos intérpretes do tirano Xerife de Sherwood, que carregava nos impostos à medida dos seus custos. Mas Passos Coelho, que foi o anterior actor no papel desse vilão, escusa de se armar em Robin Hood, como fez no lamentável discurso da festa do Pontal. Ninguém o leva a sério. Nesse discurso Passos Coelho fez o papel de velho do Restelo, um arauto da desgraca, sem visão nem caminho. Feitos passados não garantem rendimentos futuros - é apenas o que me ocorre dizer nestas circunstâncias.

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SEMANADA - Até ao final da semana passada já tinham ardido 2500 hectares no parque nacional do Gerês; Portugal, sozinho, é responsável por praticamente metade da área ardida em todos os países da União Europeia em 2016; desde o início do ano já arderam em Portugal quase 120 mil hectares de floresta; o número de candidatos ao ensino superior voltou a aumentar pelo segundo ano seguido e está perto dos 50 mil; em Portugal há 96 mil jovens entre os 20 e 24 anos que não estudam nem trabalham; o Governo deve quase 50 milhões de euros às instituições de ensino superior; os plantéis das equipas de futebol da Liga estão avaliados em 900 milhões de euros; o BPN já custou 3,2 mil milhões de euros aos contribuintes; a economia portuguesa voltou a crescer apenas 0,2% no segundo trimestre face ao primeiro trimestre e o Governo já admite que o crescimento anual possa ficar abaixo de 1%, cerca de metade da previsão inicial; o Ministério das Finanças anunciou que, ao contrário de afirmações anteriores, não vai descer o imposto sobre os combustíveis;  o fisco continua a atrasar os reembolsos do IRS; o Tribunal De Contas identificou mais de 100 milhões de euros em dívida de Câmaras e empresas públicas à Empresa Eléctrica da Madeira e alguma das dívidas têm 30 anos; €268.000.000 é o impacto gerado na economia lisboeta pelo AirBNB em 2015 segundo a própria empresa;  um inquérito divulgado na semana passada afirma que quase 30% dos emigrantes querem voltar ao país.


ARCO DA VELHA - A vítima de um acidente de moto andou a passear de ambulância entre Faro e Portimão e, não tendo conseguido o tratamento urgente de que necessitava, acabou por vir em carro particular para Lisboa, onde finalmente foi operado num hospital público.

 

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FOLHEAR - Sigo há uns meses o trabalho de uma pequena editora exclusivamente dedicada à fotografia, chamada Unknown Books (www.theunknownbooks.net). É uma operação verdadeiramente de paixão, que só faz pequenas tiragens, na maior parte dos casos entre a meia centena e a centena de exemplares e que só vende através da internet. O seu criador, Fábio Roque, é um fotógrafo, ele próprio autor de algumas das obras que edita. A Unknown Books existe desde 2014 e publicou duas dezenas de livros, sempre com edições numeradas, feitos em impressão digital - que nas edições mais recentes tem melhorado muito. É o caso de uma das mais recentes edições, o livro “Saudade”, do norte-americano Nick Tauro Jr, e que é o resultado de uma residência artística que fez em Portugal. É muito curioso observar o resultado de mais um olhar estrangeiro sobre o nosso quotidiano, a nossa luz e os nosso hábitos. Aqui não há a procura do típico nem do fácil, existe um olhar atento para além das aparências. O autor descreve Saudade como - e perdoem-me não traduzir - “a vague and constant desire for something that does not and probably cannot exist, for something other than the present, a turning towards the past or towards the future; not an active discontent or poignant sadness but an indolent dreaming wistfulness.”

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VER - Se está em Lisboa este é um bom momento para ir ver a “Adoração dos Magos", de Domingos Sequeira (na imagem), que ocupa finalmente o lugar devido na Galeria de Pintura e Escultura Portuguesa, piso 3 do Museu Nacional de Arte Antiga, recentemente inaugurada. Graças aos donativos que possibilitaram a compra da obra e ao exemplar restauro dos conservadores do MNAA, “ganhou nova vida e a cena emerge triunfante sob uma luz divina nascida do genial traço de Domingos Sequeira” - como salienta o próprio Museu. Se gosta de visitar o passado e de um bom trabalho baseado em arquivos, no Picoas Plaza fica o Centro de Informação Urbana de Lisboa e lá pode ver uma exposição fotográfica que documenta os 50 anos da Ponte 25 de Abril. Se está no Porto, em Serralves, até ao fim de Agosto, todas quintas, sextas e sábados há visitas nocturnas ao parque, pela mão de Marco Ramos - “Há Luz no Parque” é o nome da iniciativa. Finalmente se passar por Vila Nova da Barquinha não deixe de visitar o Barquinha Parque, Prémio Nacional de Arquitectura Paisagista 2007 na categoria "Espaços Exteriores de Uso Público", da autoria da dupla de Arquitectos Paisagistas – Hipólito Bettencourt e Joana Sena Rego. Ali pode encontrar esculturas de Alberto Carneiro,  ngela Ferreira, Carlos Nogueira, Cristina Ataíde, Fernanda Fragateiro, Joana Vasconcelos, José Pedro Croft, Pedro Cabrita Reis, Rui Chafes, Xana e Zulmiro de Carvalho.

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OUVIR - Parece existir um regresso aos discos essencialmente instrumentais de guitarra portuguesa nos últimos tempos e um conjunto de edições recentes dão nota disso mesmo. Para mim o mais aliciante é o trabalho de Marta Pereira da Costa - por ser o mais aventureiro, a sair do estrito território do fado, que no entanto lhe é muito familiar, para se aventurar a experimentar a guitarra portuguesa na música popular em temas que ela própria compôs,  dos quais destaco Ícaro (com Pedro Jóia), Terra, Encontro (com Richard Bona), Fado Laranjeira (com Camané) e “Moon” (com a iraniana Tara Tiba). O disco regista ainda participações de Rui Veloso e Dulce Pontes, ambas comedidas e a deixarem a primazia à guitarra de Marta Pereira da Costa. Este é um daqueles trabalhos surpreendentes e que fica na memória. Outro trabalho a reter é “Guitarra Portuguesa”, de António, Paulo e Ricardo Parreira, herdeiros de uma grande tradição musical familiar. “Tons de Lisboa”, de José Manuel Neto, conta com colaborações de peso: Carlos Manuel Proença na viola, Daniel Pinto no baixo acústico, mestre Joel Pina e Frederico Gato. Estes dois trabalhos, dos irmãos Parreira e de José Manuel Neto são de uma enorme fidelidade à guitarra portuguesa e ambos são do ponto de vista técnico irrepreensíveis. O que lhes sobra em virtuosismo falta-lhes no entanto na chama criativa e na ousadia que o de Marta Pereira da Costa ostenta. Da actual fornada o menos interessante parece-me ser Maturus, de Custódio Castelo, em guitarra portuguesa de dois braços, também chamada de guitarra siamesa. Como estão todos disponíveis no Spotify, se gosta de guitarra portuguesa, nada como ouvi-los e comparar.


PROVAR -  Um espumante alentejano bom? Estão a gozar comigo ou quê? Pois fiquem sabendo que a coisa acontece e é realidade. João Portugal Ramos criou, a partir de uvas das castas Pinot Noir, Touriga Nacional e Aragonez, o Marquês de Borba DOC Espumante  Rosé.Trata-se de um espumante bruto natural, com 11,5 graus, de cor rosada, com bolha fina, com notas de citrinos que lhe dão frescura e um final seco. É um vinho verdadeiramente surpreendente, que nesta época do ano tanto se revela um aperitivo excelente, como um excelente companheiro de saladas, de peixe ou mariscos. Mas é ao fim da tarde, num destes dias de verão, que verdadeiramente ele fica na memória. Não deixa de ser interessante que João Portugal Ramos lhe tenha dado a sua marca Marquês de Borba, que assim fica renovada e com uma gama alargada para onde menos se esperava.


DIXIT - “As humanidades ou as Artes são bonitas ou feias, e as coisas em ciência estão certas ou erradas. Portanto, o certo é bonito e o errado é feio.” - Professor Jorge Calado

GOSTO - Que o Tribunal de Contas continue a denunciar a má gestão do Estado e dos dinheiros públicos.

NÃO GOSTO - Que o Estado não cumpra ele próprio as regras que obriga os cidadãos a cumprir, como sublinhou o Tribunal de Contas.

BACK TO BASICS - No jornalismo houve sempre uma disputa entre noticiar primeiro e noticiar com rigor - Ellen Goodman

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publicado às 12:38

FOGO! - A pior coisa que pode acontecer é transformar a desgraça dos incêndios numa guerrilha politiqueira - mas isto não deve levar ao aliviar das responsabilidades. O que se passou nos últimos dias é um grave problema de prioridades políticas desajustadas e não de divergências partidárias - na realidade todos os partidos que estiveram no poder nos últimos 30 anos tiveram responsabilidades nos erros de políticas de ordenamento de território e florestais que agora se revelaram com uma intensidade terrível. Diria que existem três áreas críticas: a da prevenção, que foi a mais desprezada; a do combate aos incêndios que vai funcionando em alternativa à prevenção e que recebe maior atenção (e financiamento) porque serve de veículo de propaganda; e a da justiça, com um enquadramento penal anedótico face à gravidade dos crimes cometidos - que este ano como se sabe provocaram mortes mais uma vez. Temos 3,5 vezes mais incêndios do que a média dos países mediterrânicos e 2,5 vezes mais área ardida. Só entre 1 e 8 de Agosto registaram-se em Portugal 1775 incêndios. No Público, Fernando Santos Pessoa, da Universidade do Algarve, pôs o dedo na ferida: "devemos ser o único país do mundo com florestas que não tem um corpo específico de Guardas Florestais" - escreveu, sublinhando não ter dúvidas "que essa era a mais eficaz e mais barata forma de prevenção dos fogos florestais". E recorda que os extintos Serviços Florestais, "eram um organismo que vinha desde o séc. XIX, e não há país nenhum no mundo, com uma grande área florestal, que não possua o seu Serviço Florestal". No Observador, Paulo Fernandes, da Universidade de Trás os Montes e Alto Douro, recordou que "em 2013, a Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC) dava conta que o dispositivo de combate a incêndios tinha um custo previsto de 74 milhões de euros, enquanto a prevenção mereceria apenas um investimento de cerca de 20 milhões. Daí para cá, o desequilíbrio agravou-se. O sistema de combate a incêndios está divorciado do sistema de prevenção“. Também no Observador José Cardoso Pereira, do Instituto Superior de Agronomia, aponta: “Vemos todos os dias os noticiários das oito a serem abertos com helicópteros Kamov no terreno. Mas não vemos noticiários a serem abertos com a limpeza das matas”. A propaganda é inimiga da realidade e isto aplica se a todos os partidos que estiveram no Governo. Henrique Pereira dos Santos, um arquitecto paisagista, tem sido uma presença constante a denunciar o que se passa: O custo do dispositivo de combate aos fogos passou de 30 milhões anuais para 100 milhões anuais, enquanto o Plano Nacional de Defesa das Florestas contra Incêndios e o Fundo Florestal Permanente, concebido por técnicos do sector há uma dezena de anos atrás, numca foi aplicado e antes foi esvaziado em verbas e acções - e Pereira dos Santos defende que se as recomendações tivessem sido seguidas a situação seria bem diferente. E chegamos à questão da Justiça - a pena máxima para os incendiários é de oito anos. Quase nenhum dos condenados cumpre a pena por inteiro, a maioria sai em liberdade a seguir à detenção, muitos com pena suspensa reincidem. O que há décadas se passa com os brandos costumes sobre estes crimes merece reflexão. E a atitude dos Governos em relação à prevenção também tem ela própria uma faceta criminosa.

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SEMANADA - Em dez anos foram passadas 57 multas a quem levou cães para a praia; o FMI considerou o Deutsche Bank, um ícone da Alemanha no pós guerra, o maior risco a nível mundial para a estabilidade financeira; dos 230 deputados em funções no fim da sessão legislativa, só o duo de "Os Verdes" e outros 38 parlamentares têm um registo 'limpo' de faltas nos plenários da Assembleia; segundo os serviços do parlamento o total de faltas neste ano parlamentar ascende a 934 em todas as bancadas, uma média de 11 deputados ausentes por sessão; o Porto é a cidade onde se registam mais atropelamentos e Aveiro é a cidade onde se verifica maior número de mortes por atropelamento; Rui Rio, velho amigo e aliado autárquico de António Costa, afirmou não excluir “a possibilidade de legislativas ainda antes das autárquicas”; os medicamentos genéricos já são metade do total dos medicamentos vendidos; em Portugal há mais casais a terem o terceiro filho e continua a tendência para o aumento da natalidade; as exportações portuguesas tiveram o seu pior semestre desde 2009; as queixas de deficientes por discriminação subiram 42% num ano.

 

ARCO DA VELHA - Mais de metade dos suspeitos de fogo posto que a PJ detém são logo libertados pelo juiz de instrução, muitos recebem penas suspensas e, destes, vários são reincidentes no mesmo crime e continuam depois em liberdade.

 

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FOLHEAR - Não me canso de ficar surpreendido com o dinamismo dos editores de revistas independentes, que continuam a  apostar no papel e apresentam edições fantásticas. Uma das mais deliciosas publicações que vi nestes últimos meses foi a “peeps”, que vai agora no segundo número. De origem canadiana, e feita graças a contribuições de apoiantes num esquema semelhante ao crowdfunding,  o seu objectivo é seguir as mudanças sociológicas que acontecem pelo mundo fora. Um dos artigos mais interessantes desta edição chama-se " Welcome to the cyber village" e aborda casos de adaptação de sociedades rurais ou de vilas longe dos grandes centros urbanos às novas tecnologias. Outro tem o curioso título "Fresh ideas on the death and rebirth of marketing" - é uma entrevista com John McGarr, fundador de uma empresa de consultoria, Fresh Squeezed Ideas, que juntou uma equipa de antropólogos que estudam as alterações de hábitos de consumo e de comportamento e que tem por lema " o que antes resultou pode não funcionar agora, dá mais resultado ser diferente que ser o melhor". A revista tem também short stories reais que contam episódios da vida de profissionais de diversas áreas. A edição fotográfica é muito cuidada ao longo de todos os artigos e o grafismo é simples e eficaz. Ao folhear "peeps" não resisti a pensar como em Portugal existem tantos casos que podiam caber numa linha editorial semelhante e como podia fazer sentido fazer aqui uma publicação destas, que sai duas vezes por ano. Podem saber mais no twitter em peepsforum, no instagram em peepsmagazine ou no facebook em peepsforum - e peepsforum.com é o nome do seu site.

 

 

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VER - Ora aqui vão sugestões avulsas. Até 15 de Outubro, na Galeria Municipal de Matosinhos, Julião Sarmento apresenta “No Fio da Respiração”, 26 obras de pintura, desenho e escultura, produzidos entre 1966 e 2011, com duas peças inéditas - exposição comissariada por Miguel von Hafe Pérez. Em Lisboa sugiro, no Museu de Etnologia, um belíssimo e pouco conhecido edifício na Rua da madeira, no restelo, uma exposição particularmente adequada a estes dias em que a destruição do fogo varreu o país: “Inquéritos ao Território: Paisagem e Povoamento. No Museu Nacional de História natural e da Ciência a exposiçãp “Dinossauros Que Viveram Na Nossa Terra”, que reconstitui como seria a paisagem da região Oeste no período jurássico. Em Loulé, no Convento de Santo António dos Capuchos,  Teresa Segurado Pavão apresenta trabalhos de escultura sob o título “Terras Brancas”. Finalmente em Sines, no Centro Cultural Emmerico Nunes, está a belíssima exposição “4 fotógrafos de Moçambique”, que apresenta trabalhos de Moira Forjaz, José Cabral, Luis Basto e Filipe Branquinho (na imagem).

 

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OUVIR - William Tyler foi guitarrista dos Lambchop e, antes deles, dos Silver Jews. A sua carreira a solo vai em quatro álbuns, todos eles instrumentais, onde faz jus à sua técnica e a uma forma muito própria de tocar guitarra. O novo disco chama-se Modern Country e é uma espécie de manifesto musical de uma América das pequenas cidades, das estradas percorridas por camiões e dos bares onde os seus condutores se encontram. Cada um dos temas podia fazer parte da banda sonora de um filme sobre o sul dos Estados Unidos, desde Albion Moonlight a The Great Unwind, passando por Highway Anxiety. Destaque para a participação do baterista dos Wilco, Glenn Kotche,  entende -se às mil maravilhas com o baixista Darian Gray.Quando apresentou o álbum William Tyler disse que o disco era uma carta de amor ao que se estava a perder na América. E ao ouvir o disco não é saudosismo o que se sente, é esperança. William Tyler Modern Country Merge Records, disponível no Spotify

 

PROVAR - Um hamburguer decente com serviço simpático para portugueses ao pé do largo de Camões? Podem deixar de pensar que é realidade virtual ou o fruto de uma pancada na cabeça. A coisa existe , é o Italian Burguer e Lobster House  e tudo correu acima das minhas expectativas. Num destes dias, a caminho do cinema Ideal, e querendo jantar antes do filme, entrei com alguma desconfiança no referido local, na Rua do Loreto. Pois reconheço que estava com um preconceito estúpido. O atendimento foi excelente, o serviço rápido, a confecção e qualidade da comida foram irrepreensíveis e a imperial era bem tirada e fresca apesar do calor lisboeta destes dias. Para a mesa veio um hamburguer Tuscanny, à base de frango com manga e tomate laminado, manjericão e coentros frescos, e um hamburguer Parma, com cogumelos, cebola caramelizada, parmesão e salsa. cada hamburguer pode vir com dois acompanhamentos, entre salada, risotto de cogumelos, batata frita ou arroz thai. Os hamburguers estavam no ponto e os acompanhamentos escolhidos também. Há opções de hamburguer de atum e vegetariano. E depois, claro, há o lavangante -. que pode vir cozido ou grelhado, em tártaro,, em risotto ou com linguine. Há-de ser experimentado numa próxima ocasião. Nas entradas destaque  para a manteiga de corais e a pasta de tomate assado, com grissinis. Além do chiado o Italian Burguer e Lobster House existe no Centro Colombo, Centro Vasco da gama e na Avenida de Roma junto á Praça de Londres. No caso do Chiado, fica na Rua do Loreto 12, telefone 961 092 652.

 

DIXIT - “Espero não ser como os políticos e saber parar de escrever no tempo certo “ - Ian McEwan

 

GOSTO - Da série de textos «A América através dos livros», de Isabel Lucas, um grande exemplo de bom jornalismo.

 

NÃO GOSTO - De comentários bacocos como os que ouvi na transmissão da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos.

 

BACK TO BASICS -"Não fazes ideia o trabalho que me deu chegar pobre até ao fim da vida." (Paiva Couceiro)

 

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publicado às 15:09

O SOL, QUANDO NASCE, É PARA O IMPOSTO

por falcao, em 05.08.16

E RESPIRAR, PODEMOS? É oficial: o sol, quando nasce, não é para todos. As casas com mais sol serão penalizadas pelo fisco, por acaso tutelado pelo homem que aceitou viagens à borla a França para ver jogos do Euro, pagas pela Galp, empresa que tem um contencioso fiscal com o Estado superior a cem milhões de euros. Rocha Andrade, o governante em causa, disse à revista Sábado que não via no assunto qualquer incompatibilidade ou conflito ético e encarava “com naturalidade, e dentro da adequação social, a aceitação deste tipo de convite”. O homem foi um dos redactores do código de ética para candidatos a deputados do PS, lançado por António Costa em 2015 e só depois de noticiada a oferenda resolveu dizer que queria reembolsar à Galp a despesa feita. Se o ridículo pagasse imposto este homem sozinho resolvia o problema do país. Vale a pena recordar que esta é a mesma criatura que quer andar atrás dos vendedores de bolas de berlim e de gelados na praia, que quer aumentar a tributação das casas que têm vista e por onde o sol entra sem receios. Este homem, que acha natural, sendo Governo, aceitar presentes de quem está em litígio com o Estado que ele representa, é copista de uma medida medieval inglesa, a window tax, de 1686, como bem explicou neste jornal Fernando Sobral, recordando uma frase de Charles Dickens: “nem o ar nem a luz são grátis”. O tema fiscal mereceu esta semana, no Facebook, várias citações interessantes, que reproduzo. O Professor José Maltez, sobre a matéria, teceu o seguinte comentário: “Ainda ninguém se lembrou do imposto de isqueiro, ou do regresso ao papel selado? Não há alma geringonça capaz de emitir uma simples regra: as avaliações serão feitas conforme os preços do mercado?" Sobre a sanha fiscal, Luis Paixão Martins contou uma história estival: "Como é que tu, paizinho, contribuis para o progresso de Portugal? - Orgulho-me de andar nas praias a ver se os ricalhaços das bolas de berlim passam fatura". Talvez por tudo isto o publicitário Manuel Oliveira saíu-se com esta: “A minha casa tem vista para S. Bento. Posso considerar que tenho vista para uma ETAR e pedir isenção do IMI?”

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SEMANADA - As exportações para o Brasil caíram 21% desde o início do ano; 80% dos alunos do 5º ano falham a matemática: em ano e meio foram apanhados 13 mil condutores sem carta de condução; há 286 condutores sem carta a cumprirem penas de prisão;  há chumbos em quase metade dos exames de código de estrada; entre os políticos portugueses Marcelo Rebelo de Sousa é o que regista mais menções no twitter desde o início do ano; os polícias estão proibidos de aceder a redes sociais enquanto estão em serviço; em Custóias foi assaltada a máquina automática de venda de tabaco que abastecia a prisão; a natalidade em Portugal está a subir pelo segundo ano consecutivo; em Armação de Pêra há quem vá marcar lugar na praia às sete da manhã com chapéu de sol e toalha; são recebidos 70 pedidos de ajuda por dia no centro de informação antivenenos ; os sites de jornais, revistas e de notícias portugueses receberam perto de cinco milhões de visitantes durante o primeiro semestre do ano, segundo os dados do Netpanel meter da Marktest; mais um recorde nacional: a dívida pública atingiu em junho os 240 mil milhões de euros - resta saber quem leva a medalha; Rocha Andrade foi o segundo membro deste Governo a propôr restituir verbas, apenas depois de ter sido confrontado com factos polémicos.

 

ARCO DA VELHA - Um estudo recente indica que, dos sete mil milhões de habitantes do planeta, cerca de seis mil milhões têm acesso a telefones móveis mas apenas 4,5 mil milhões têm acesso a instalações sanitárias domésticas em condições.

 

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FOLHEAR - A “Egoísta” é um prazer colectivo - para quem a idealiza e faz e, sobretudo,  para quem tem a oportunidade de a folhear, guardar e ir relendo ao passar do tempo. A edição do Verão, publicada no início de Julho, é dedicada a Lisboa - uma Lisboa destruída pelo triunvirato Medina-Salgado-Sá Fernandes. Qualquer semelhança entre a beleza e encanto da cidade e o caos e destruição que se sente na capital são pura coincidência. Pedro Bidarra, na sua coluna semanal no “Diário de Notícias”, sublinhou que face a um candidato decente de outra orientação política “o Medina, o principezinho herdeiro, não teria a mínima hipótese. É que Lisboa não vai com qualquer um.” No entretanto o Medina, que não é da cidade, vai dando cabo dela. Mas adiante, que a “Egoísta” é o que agora interessa. O facto de esta edição ser dedicada à cidade tem a ver com o facto de o Casino Lisboa estar a celebrar o seu décimo aniversário. E este á uma bela edição. Desde logo pela capa e as páginas de abertura que mostram Leonor Poeiras como um corvo, idealizada e fotografada por Carlos Ramos e vestida por Filipe Faísca. Mas há mais na revista: boa prosa de Rui Cardoso Martins, Nuno Miguel Guedes, Patrícia Reis, José Navarro de Andrade ou Teolinda Gersão,   ilustrações de Ricardo Cabral (que desenhou o Torel),  Rodrigo Saias e  André Carrilho, fotografias de Augusto Brázio (Monsanto) , Pedro Teixeira Neves (Lisboa) e Pedro Ferreira, para além de uma recolha de trabalhos de Vihls nas paredes da cidade. Uma edição alfacinha.

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VER - Rever “Barry Lyndon” em cópia digital é uma surpresa. Com boa projecção e bom som, o restauro digital que o cinema Ideal (ao Chiado) exibe até 17 de Agosto permite ter uma ideia clara do que era a luz que Stanley Kubrick quis mostrar. A luz molda as cores - nas paisagens, mas também nos interiores iluminados apenas por velas e filmados com as lentes especiais da Zeiss que Kubrick utilizou. Após todos este tempo (o filme é de 1975, foi produzido há 41 anos), é impressionante voltar a ver os enquadramentos rigorosos, a reconstituição das cenas de batalhas, o crescendo de emoção desde os primeiros planos do filme, com Redmond Barry, ainda adolescente, a ser seduzido pela prima. Ryan O’Neal tinha 34 anos e Marisa Berenson tinha 28 quando o filme foi estreado. Na altura houve quem pensasse que era uma obra menor de Kubrick, depois de 2001: A Space Odissey e de Clockwork Orange, antes dos seus derradeiros três filmes - The Shining, Full Metal Jacket e Eyes Wide Shut. Mas hoje fica mais fácil perceber que Kubrick  percorreu em Barry Lyndon a sua visão da natureza humana, utilizando um tempo fora do seu próprio tempo para reflectir sobre a evolução dos costumes. Outras recomendações para ver neste mês de Agosto: uma mostra da história dos jogos Majora ao longo dos seus 77 anos, no Espaço Amoreiras, Rua D. João V 24; “Auto Retrato em Solidó, de Ana Jotta, na Galeria Miguel Nabinho, Rua Tenente Ferreira Durão 18; “Sombras , Máscaras e Títeres da Colecção do Museu da Marioneta”, obras de  António Viana, Francisco Tropa, Jorge Queiroz e Susanne Themlitz, na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional; no Espaço Chiado (Rua da Misericórdia 12), a série “Anatomia do Boxe”, de Jorge Molder, criada em  1997, que está na colecção António Cachola e que é exposta em conjunto em Lisboa pela primeira vez.

 

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OUVIR - Lou Rhodes é uma cantora oriunda de Manchester e tornou-se conhecida por ser, digamos, metade dos Lamb. Com utilização apenas ocasional de  sonoridades contemporâneas e essencialmente baseada em soluções acústicas, a carreira a solo de Lou Rhodes,  vai já no seu quarto disco, este “Theyesandeye”, que conjuga canções de amor com baladas que manifestam recorrentes preocupações ambientais, tudo cantando com uma voz etérea, carregada de sedução e sentimento. A sua voz é envolvente e tem um timbre provocante e sedutor. O Guardian  diz que ela evoca Nick Drake, outras vezes  Carole King e até Alanis Morrissette. Os arranjos das 11 canções são exemplares e a sonoridade de instrumentos acústicos como a harpa ajudam a criar um ambiente musical especial,  que está reduzido ao essencial, deixando amplo espaço para a voz e as palavras. Numa época em que as sonoridades se repetem, este disco de Lou Rhodes aparece como uma pedrada no charco. O facto de ela, a solo, ter evoluído num caminho completamente diferente das sonoridades dos Lamb mostra também como Rhodes se preocupa em fazer algo de novo e original na sua carreira, mesmo que para isso recorra a princípios básicos, musicais  e temáticos , do folk. “Theyesandeye”, CD Nude Records, no Spotify.

 

PROVAR -  Se nestes dias quentes quiserem uma esplanada não vão à Champanheria do Saldanha. Na realidade a utilização do termo champanheria no nome deste restaurante é um equívoco - porque a bebida - e sobretudo o seu equivalente português - o espumante - não têm ali qualquer favorecimento. É por exemplo incompreensível que não haja uma selecção de champagnes e espumantes servidos à flute e é ainda menos compreensível que, quando se pede uma garrafa de espumante (da reduzida selecção existente)  se coloquem na mesa copos de vinho em vez de flûtes. A coisa piora quando, feita a observação, a empregada fica a olhar para nós com ar de caso e responde que vai ver o quer é possível. Passado um bom bocado lá acabou por arranjar umas flûtes publicitárias de uma marca francesa. A chegada ao local fica pois assim descrita. O restaurante tem uma esplanada no pátio interior do prédio, com a maioria das cadeiras desconfortáveis e mesas pequenas,  em contraste aliás com o cuidado da decoração do interior. O sítio podia ser ameno se não existisse um som despropositadamente alto a sair de colunas instaladas demasiado perto das mesas. Em, resumo - a esplanada tinha tudo para ser simpática, o serviço é completamente antipático e a comida é mediana. As lascas de bacalhau em tempura estavam demasiado oleosas, o tártaro de atum sabia mais aos condimentos que ao atum e tinha como acompanhamento apenas tostas industriais, sem qualquer vestígio de salada. Os goujons de dourada salteada com legumes acabaram por ser a escolha mais acertada de uma noite que podia ter sido simpática e ficou aquém das expectativas. E o preço? a relação qualidade/serviço/preço merece nota negativa.Muito negativa. São preços desajustados para a oferta produzida.

 

DIXIT - “Lisboa atingiu o máximo cosmopolitismo Tem um presidente (não eleito) que sabe ser simultaneamente o terramoto e o marquês de Pombal” -  António Homem Cardoso

 

GOSTO - Desta afirmação de João Villalobos: “O sol, quando nasce, é para o imposto”.

 

NÃO GOSTO - Do cancelamento da 12ª edição da exposição World Press Cartoon, que estava agendado para este ano em Cascais.

 

BACK TO BASICS - “Quem tem cera na cabeça não deve andar ao sol” - Benjamin Franklin

 




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