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UM BRINCALHÃO - Durante alguns anos tive esperança de que poderia surgir em Portugal uma nova geração de políticos mais abertos ao mundo, menos manobristas e oportunistas, mais apostados em novas formas colaborativas para além das barreiras ideológicas e, sobretudo, mais interessados em melhorar o funcionamento do país, aumentar a riqueza da economia portuguesa e melhorar as condições de vida das pessoas. Imaginei que políticos assim poderiam estar menos presos às máquinas partidárias, interessados em fazer reformas no país, na área da justiça, no sistema eleitoral, melhorando a educação e a saúde. Durante anos disseram-me que sem uma maioria absoluta era difícil mudar o estado das coisas. Temos agora uma maioria absoluta, António Costa é Primeiro Ministro há quase oito anos e desde as mais recentes eleições legislativas governa em maioria absoluta. A maior demonstração da forma como encara o País, o Estado e os Portugueses foi dada pela sua atitude no mais recente Conselho de Estado. Confrontado com críticas e reparos ao desempenho do seu Governo, remeteu-se ao silêncio. Não quis falar, não quis responder, não quis debater, não quis criar pontes, encontrar soluções. Mas criou um problema: a prova de que a sua maioria absoluta usa o silêncio para justificar a inação e esconder a falta de ideias sobre como melhorar o país. A Costa sobra-lhe em táticas manhosas o que lhe falta em estratégia e vontade de mudança. O silêncio de António Costa, maquilhado pelo sorriso sempre igual em todas as ocasiões, é o retrato de uma geração onde deixou de haver estadistas para só haver brincalhões que acham que as suas agendas pessoais valem mais que os interesses nacionais. Imaginei políticos que quisessem um Portugal melhor mas já desisti de os procurar - não compareceram à chamada. E aos poucos este rectângulo à beira-mar plantado vai-se transformando num pantanal.
SEMANADA - As exportações portuguesas registaram em Julho uma quebra de 10,6% face ao mesmo mês do ano passado e as vendas para Espanha e Reino Unido foram as que mais caíram; a tarifa social da internet só chegou a 510 das 800 mil famílias que a ela podiam aceder; 632 euros é o valor que as famílias portuguesas esperam gastar, em média, com o regresso às aulas, mais 107 euros que no ano passado; 44% dos portugueses compram produtos de marca branca nos supermercados; o retrato da execução dos fundos comunitários tem um problema estrutural de atrasos sucessivos: o programa Portugal 2020 começou em 2014, está a 4 meses do seu fim e ainda tem 2.6 mil milhões de euros por executar e sua taxa de execução é de 90,2%; quanto ao PRR já passou 36% do seu tempo de vigência mas ainda só está executado a 15,6% tendo apenas sido atribuídos 2,6 mil milhões de euros da dotação inicial de de 16,6 mil milhões; já o Portugal 2030 praticamente ainda não atribuíu verbas e só 4% da sua dotação já está em concurso; nos últimos 11 anos as escolas públicas e privadas perderam mais de 300 mil alunos dos ensinos básico e secundário; na semana passada estavam cerca de mil horários escolares por preencher, o que implicava que mais de 90 mil alunos teriam professores em falta se as aulas começassem naquela altura; uma professora que lecciona há 50 anos só agora, aos 68 anos, entrou para os quadros; entre 2015 e 2022 os salários reais dos professores caíram 1% em Portugal mas subiram 6% nos outros países da OCDE; segundo o Eurostat 1,7 milhões de portugueses não conseguem aquecer convenientemente a sua casa no Inverno e a situação portuguesa só encontra paralelo na Lituânia, Bulgária, Chipre e Grécia; há 600 médicos em falta em 16 hospitais e 23 centros de saúde; na quarta feira passada ocorreram, em simultâneo, greves de professores, médicos e funcionários judiciais.
O ARCO DA VELHA - A freguesia de Santo Amaro, na ilha do Pico, Açores, tem mais camas turísticas que residentes - 264 camas em unidades hoteleiras ou alojamentos locais e 255 habitantes.
RETRATO DE UMA LUTADORA - “Memórias de Uma Menina Bem-Comportada”, de Simone de Beauvoir, regressa às livrarias, de onde estava ausente há muitos anos, pela mão de uma nova edição da Quetzal, com tradução de Maria João Remy Freire. O diário francês Le Monde, na altura da sua publicação original, em 1959, escreveu que este livro «podia ter como subtítulo História de Uma Libertação - A revolta da menina bem-comportada tem como objetivo essencial a conquista do espaço em redor para pensar à sua maneira.» Neste primeiro dos volumes de memórias que Simone de Beauvoir escreveu, publicado originalmente dez anos após o controverso “O Segundo Sexo”, Simone de Beauvoir narra a infância, a adolescência e a juventude – as suas primeiras duas décadas, no seio de uma família burguesa, sem dinheiro ou posição. Aqui se reencontra Zaza, a sua melhor amiga durante a adolescência e a primeira idade adulta, figura central do romance autobiográfico “As Inseparáveis”, figura determinante para o seu desenvolvimento. “Memórias de Uma Menina Bem-Comportada” é um bom retrato de Simone de Beauvoir, onde vemos surgir os traços de personalidade e os interesses da pessoa em que a escritora se veio a transformar: a mulher anticonformista, ambiciosa, lutadora e socialmente empenhada. Simone de Beauvoir nasceu em Paris, em 1908, estudou Filosofia na Sorbonne, onde conheceu Sartre, companheiro de toda a vida e com quem viveu uma relação célebre pelos seus padrões de abertura e honestidade. Foi ativista no movimento francês de emancipação das mulheres, nos anos de 1970, e serviu de modelo e de influência aos movimentos feministas posteriores. Morreu em Paris, em 1986.
IMAGENS FOTOGRÁFICAS - A primeira das exposições do Imago Photo Festival já abriu e merece ser vista na Sociedade Nacional de Belas Artes. Enquanto o resto das exposições do Imago abre no fim do mês, na SNBA já se pode ver “Rethinking Identities”, que apresentam trabalhos de Maria Gruzdeva, Lois Cid Ma e Lara Jacinto. Maria Gruzdeva mostra “O Território”, um trabalho sobre como se estabelece a ligação entre os cientistas que estudam diversas disciplinas em reservas naturais de áreas remotas, no caso situadas na Rússia, focando a forma de coexistência entre o ser humano e o mundo natural. Já Lois Cid Ma, observa em “Estruturas de Fusion”, espaços em construção, fotografando-os “como se fossem um jazigo arqueológico para analisar os resíduos que ficam depois do levantamento de um edifício, relacionando-os com os entulhos gerados pelo derrubamento de antigos prédios”. Lara Jacinto apresenta “O Paraíso”, uma observação atenta que mostra os bastidores de locais que são atracções turísticas, no caso, no concelho de Lagoa, no Algarve (na imagem). A fotógrafa mostra como pessoas que vivem e trabalham nessas zonas balneares, vindas de outras partes do mundo, mantêm a sua identidade, enquanto buscam um outro futuro. Outra sugestão é “Outro Jardim Interior”, uma exposição de Luísa Ferreira e António Faria que fica até final de Setembro na Galeria de Santa Maria Maior, prosseguindo o bom trabalho que este espaço tem vindo a desenvolver na área da fotografia. Por último, Nuno Cunha, apresenta na Galeria Sá da Costa uma série de desenhos a grafite e tinta da china sob o título genérico “So Far” .
BEPOP & SWING - George Shearing foi um talentoso pianista e compositor de jazz londrino que depois de ganhar notoriedade no Reino Unido desenvolveu uma extensa carreira nos Estados Unidos, sendo o autor de temas como “Lullaby Of Birdland” e “Conception”, por exemplo. Agora , em sua honra, foi editado o disco “Shear Brass: celebrating Sir George Shearing”. A Shear Brass é um agrupamento que junta alguns dos melhores instrumentistas de jazz britânicos, dirigido por um sobrinho neto de Shearing, o baterista Carl Gorham. Para este disco James McDermid escreveu onze arranjos novos de composições de Shearing , interpretados por ele próprio e por Chris Storr (trompete), Pete Long (clarinete, e saxofone), Alistair White (trombone), James Pearson e Simon Wallace (piano), Anthony Kerr (vibrafone), Alec Dankworth e Arnie Somogyi (baixo), Carl Gorham (bateria), Satin Singh (percussão) e Sarah Moule, Louise Marshall e Romy Sipek (vozes). Os novos arranjos de McDermid mostram a forma como Shearing apreciava o bebop e a forma como tocava piano, cheio de swing. Ouçam as versões de “Let There Be Love” (o único dos temas que não foi composto por Shearing) ou “Lullaby Of Birdland” na voz de Romy Sipek. As sonoridades do bebop estão bem presentes em “Conception” e é curioso o contraste com um tema escrito um ano antes, “The Fourth Deuce”. Outros destaques vão para “Children’s Waltz”e a balada “Midnight Mood”, cantada por Sarah Moule. Disponível nas plataformas de streaming.
A ARTE DA TOSTA CASEIRA - Por acaso já apanharam grandes irritações numa tostadeira, com o pão a colar-se às placas e o queijo espalhado por todo o lado? Pois graças ao admirável mundo digital descobri a solução para o problema e é a coisa mais simples do mundo. Basta ter à mão um pedaço de papel vegetal, daquele que se usa para ir ao forno. Corta-se à medida das duas placas abertas da tostadeira e dobra-se ao meio. Quando quiser fazer uma tosta basta colocar o pão por cima do vegetal e cobri-lo com a outra metade, fechando a tostadeira. Assim nada cola nem nada fica a deixar restos pelas placas. Agora que já aprendeu o truque, mãos à obra: corte duas fatias de pão de forma de Rio Maior, com cerca de um centímetro de espessura cada uma. Barre cada uma delas com chutney de manga, corte várias lascas finas de queijo da ilha para fazer duas camadas, uma por cima de cada fatia de pão, e, numa delas, rodelas finas de pepino fresco por cima do queijo. Fecha-se a sanduíche, coloca-se na tostadeira já quente, com uma folha de papel vegetal por baixo e outra por cima, fecha-se e deixa-se ficar dois a três minutos, conforme o gosto de cada um. Vai ver que no fim tudo é mais fácil quando levar a tosta para um prato e a cortar ao meio na oblíqua, de canto a canto, sem se queimar nem ver a tostadeira toda suja. Bom apetite.
DIXIT - “Quando vejo esta gente querer julgar a História pelos dias de hoje, vendo apenas o mal e não também o fantástico, dá-me vontade de lhes perguntar porque não experimentam embarcar numa coisa parecida com aquilo a que então chamavam naus e tentarem chegar vivos às Berlengas” - Miguel Sousa Tavares
BACK TO BASICS - “Quem não sabe nada de ciência não devia intervir na política” - Richard Roberts, Prémio Nobel da Medicina
O GRANDE ENGANO - Há dias, por acaso antes da reunião do Conselho de Estado onde se iria debater a situação económica, o Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, abandonou o princípio de independência que devia nortear as suas funções e veio vestir a camisola de ex -governante a mando do PS, clamando que o país registou fortes progressos nos últimos anos. Acontece que não é isso que o país sente. As palavras de Mário Centeno não chegam para esconder que os dados europeus mostram que Portugal está na cauda da Europa e o silêncio de Costa no Conselho de Estado, face às críticas sobre a política do Governo, são o exemplo da auto-suficiência e arrogância que tem caracterizado o comportamento da maioria absoluta. Temos o sexto mais baixo PIB per capita da Zona Euro, a par da Roménia e da Hungria. Em Portugal faltam professores, juízes, enfermeiros, médicos e militares. Em sectores que vão da contrução à agricultura, passando pela restauração e hotelaria, faltam pessoas. E no país faltam casas para as pessoas que cá vivem. A verdade de que Centeno não fala é que, depois de décadas a recebermos fundos de Bruxelas, os números totais da emigração são superiores aos da década de 60. Conseguimos educar uma geração mas não conseguimos dar-lhe condições para poder trabalhar e realizar-se pessoal e profissionalmente em Portugal. António Costa é Primeiro-Ministro há quase oito anos, período durante o qual se assistiu à progressiva deterioração da classe média e ao aumento da carga fiscal, sem reformas em nenhuma área fundamental. O mais curioso de tudo isto é que os propagandistas do PS, face à revelação das evidências e dos dados reais, vêm dizer que quem afirma que o país está pior é arauto de André Ventura. O Papão Ventura é um balão insuflado pelo PS e pelos seus estrategas, que querem reduzir toda a oposição a aliados do Chega, da mesma forma que Salazar quis fazer crer que todos os que lutavam contra a ditadura eram do PCP. É uma infeliz, mas real coincidência.
SEMANADA - 70% da população portuguesa afirma ter o poder de compra fortemente afectado pela inflação; a taxa de juro média dos novos depósitos concedidos em julho fixou-se em 1,66%, uma tímida subida face aos 1,58% registados no mês anterior; de acordo com os mais recentes dados do Banco Central Europeu (BCE), a fraca taxa de juro dos depósitos em Portugal só é ultrapassada pelas baixas taxas pagas pela Eslovénia, Chipre, Croácia e Grécia; em sentido inverso, França oferece 3,51% em juros aos clientes bancários para aplicarem depósitos a um ano, a Estónia paga 3,39% e Itália 3,29% e em Espanha, país de onde são oriundos os acionistas de grandes bancos portugueses (Santander e BPI), a média é de 2,36%; aumentou o número de famílias em sobrecarga financeira com o crédito da casa e cerca de 70 mil agregados familiares estão em vias de gastar mais de metade do rendimento no empréstimo; em 2022 a Justiça arrecadou mais de 382 milhões de euros em custas judiciais e taxas de registos, um aumento de 22,21% face ao ano anterior; as empresas portuguesas estão a pagar quase 6% para conseguirem obter novos empréstimos junto da banca portuguesa, um valor mais alto que a média europeia; 92,2% das famílias têm acesso a internet de banda larga fixa; mais de metade das medidas anti-fraude ficaram na gaveta e não são aplicadas; Marques Mendes já ganha a Marcelo nas audiências de TV - o espaço de comentário de Luís Marques Mendes na noite de domingo na SIC teve mais 242 mil espectadores do que a entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa na TVI, que passou ao mesmo tempo.
O ARCO DA VELHA - Cerca de metade da receita do Estado vem dos impostos pagos pelos quase cinco mil grandes contribuintes.
VER FOTOJORNALISMO - Esta é uma semana cheia de fotografia e começo pela exposição do fotojornalista Fernando Ricardo na Casa da Imprensa, “Momentos”, que pode ser vista até 6 de Outubro. A exposição apresenta cerca de meia centena de imagens feitas desde os anos 70 até agora. Fernando Ricardo tem uma longa carreira, sendo um dos fotojornalistas portugueses com maior actividade a nível internacional. Trabalhou em agências como a Associated Press e a Gamma, fez reportagens em cenário de guerra em África (na imagem) e no médio oriente. Além do “Expresso” e da “Visão”, publicou em jornais e revistas como o International Herald Tribune, New York Times,Washington Post, Boston Globe, Time, Newsweek, Stern, Der Spiegel, Paris Match, L’Express, Figaro, Times of London, Sunday Times e El País, entre outros e realizou várias exposições em Portugal e no estrangeiro. António Sánchez Barriga, o fotógrafo espanhol que escreveu o texto que acompanha esta mostra, afirma que as imagens apresentadas são “o ensino da vida numa só exposição.” Casa da Imprensa, Lisboa (Rua da Horta Seca 20, ao Largo de Camões). Outra exposição que destaca o papel do fotojornalismo é CASA, uma mostra coletiva de 27 fotógrafos, integrada na MFA – Mostra de Fotografia de Arroios, patente no Quartel do Largo do Cabeço de Bola, Arroios, em Lisboa, até 15 de setembro. São nove exposições colectivas e individuais, de fotojornalistas e fotógrafos documentais portugueses e estrangeiros, que abordam questões sociais e ambientais. A organização é das associações C11 e Largo Residências nas instalações de um antigo quartel da GNR no Largo Cabeço da Bola. Há ainda visitas comentadas às exposições, a projeção de 'slideshows' de autores emergentes e consagrados, a exibição de documentários, a apresentação de livros e revistas, e conferências e debates, "que abordam temas da fotografia e do jornalismo". Além disso, aos fins de semana decorre o Mercado do Autor, com uma larga seleção de livros e fotografias para venda e oficinas "em várias áreas da fotografia e processos fotográficos". Pode consultar a programação completa nas contas da associação CC11 nas redes sociais Instagram e Facebook.
UMA AVENTURA GELADA - Gosto de ler relatos das aventuras dos grandes exploradores e tenho um fascínio especial por aqueles que se lançaram à descoberta do Pólo Sul. Um desses homens foi Henry Worsley, admirador de Ernest Shackleton, o explorador do século XIX que tentou ser o primeiro a chegar sozinho ao Polo Sul, e que nunca conseguiu completar a sua viagem. Worsley, que viveu entre 1960 e 2016, sentiu um grande fascínio por essas expedições à Antártida e em 2018 fez a sua primeira viagem, na companhia de mais dois aventureiros, um deles um descendente de Shackleton. Depois disso, quis voltar à Antártida sem qualquer companhia e é a história dessa aventura que David Grann, um jornalista da revista The New Yorker, escreveu. O resultado é “A Escuridão Branca”, um livro que parece um thriller no qual o suspense se desenvolve no cenário da Antártida. A aventura começou a 13 de Novembro de 2015, tinha Henry Worsley 55 anos. Sozinho, com foco e dedicação, o então já aposentado oficial do exército britânico deixou o mundo em suspenso enquanto tentava vencer onde os seus antecessores tinham falhado. Andou mais de mil quinhentos e cinquenta quilómetros, durante sessenta e dois dias, em condições adversas, mas foi obrigado a desistir a duzentos quilómetros do destino final. Esta é uma história de superação que não é obscurecida pela derrota. O livro está editado na bela colecção “Terra Incógnita”, da Quetzal e tem tradução de Vasco Teles de Menezes.
ALÉM DO JAZZ - Sugiro que vão direitos a uma das plataformas de streaming e procurem o disco “Flowers In The Dark”, assinado por Kofi Flexxx, personagem enigmático que tem estabelecido relações criativas com algumas das mais importantes figuras da música britânica contemporânea. O novo disco baseia-se num ensemble que agrupa alguns desses músicos, orientado pela batuta de Shabaka Hutchings, outro nome sonante da cena musical londrina, que percorre à vontade os territórios do jazz e do hip-hop e que é a figura principal do grupo The Sons Of Kemet. O disco foi editado pela Native Rebel, que acolhe as produções e explorações das várias personalidades musicais de Shabaka Hutchings. O seu trabalho anda sempre na fronteira entre sonoridades do jazz improvisado, cruzando-o com outros géneros musicais. No disco colaboram nomes como o poeta Anthony Joseph, o pianista Alex Hawkins, o flautista Ross Harris, o rapper Billy Woods, o baterista Jas Kayser, o baixista Daisy George e mais algumas contribuições - o resultado é um disco que é mais que a soma das partes ao longo dos seus nove temas. Disponível nas plataformas de streaming.
UMA BOA SURPRESA PERTO DE PALMELA - Na estrada entre Azeitão e Palmela, à saída da Quinta do Anjo, no Espaço Fortuna- Artes e Ofícios, fica o Flavors. É um restaurante inesperado naquele local, que foge da tentação do óbvio regionalista, evitando grelhados de peixe ou choco frito e procurando uma lista alternativa em relação à oferta local. Logo nas entradas somos surpreendidos pela proposta de gyosas, o primeiro indício de elementos da cozinha asiática na lista. Nos pratos principais as propostas têm uma alheira de caça de Mirandela e bochechas de porco estufadas, a coexistirem com caril verde tailandês ou caril goês, ambos de frango e com arroz basmati. Mais abaixo observa-se uma inesperada alheira de bacalhau, a abrir caminho para um caril goês de lulas e camarão e um caril vermelho tailandês de vieiras e camarão ou ainda umas lulas recheadas. Dos acompanhamentos consta. além do arroz basmati batatas doces fritas aos palitos de se lhes tirar o chapéu. A mesa provou um ceviche peruano de vieiras e o caril goês de camarão e lulas e ambos passaram com distinção. A cerveja de pressão é a alemã Franziskaner e a de garrafa é a belga Stella Artois. Nos vinhos há boas ofertas da região como os vinhos da Quinta do Piloto e de Venâncio da Costa Lima. A cozinha é dirigida por Pedro Castelo Branco, o serviço de sala é irrepreensível, o espaço é confortável e foi um belo jantar- é o que vos tenho a dizer. Para reservas, recomendadas sobretudo ao fim de semana, o telefone é o 917 263 116.
DIXIT - “Com uma dívida pública colossal e preconceitos que o PS alimentou, mas que outros países venceram há décadas, a diferença entre o nível de vida em Portugal e na Europa tornou-se impossível de ignorar” - André Abrantes do Amaral.
BACK TO BASICS - “Uma lufada de vento é capaz de mover uma árvore, mas não uma pedra” - Robert Walser
O IMOBILISMO - As próximas eleições presidenciais são apenas em 2026, mas nos últimos dias elas entraram em força no noticiário político depois de Marques Mendes ter manifestado disponibilidade para se candidatar e um mês depois de Santana Lopes ter afirmado estar a ponderar o tema. É portanto à direita que o assunto está mais efervescente, com alguns observadores a darem conta que Paulo Portas pode também ser um potencial candidato. Do lado da esquerda, por enquanto há silêncio, em boa parte porque nesse lado do espectro político se aguarda qual o próximo movimento de António Costa - e há quem diga que é mais provável ele candidatar-se à Presidência do que a um cargo internacional. Depois de ter institucionalizado uma crise entre o Presidente da República e o Primeiro Ministro, esta pode ser uma tentação para Costa. Na falta de reformas PS e PSD entendem-se às mil maravilhas para não fazerem uma revisão constitucional que, quase meio século depois da entrada em vigor da Constituição, a consiga actualizar. Recordo as palavras de António Barreto, no “Público” do passado fim de semana: “Estamos a assistir a uma mudança do regime. O semipresidencialismo é uma espécie de ocapi: bicho esquisito, tem de burro e de cavalo, de girafa e de zebra. Restringe os poderes do presidente, mas não faz dele um adorno democrático. Modera e limita a representatividade do parlamento, reduzindo por vezes esta instituição a um plano secundário. Reforça e reduz, ao mesmo tempo, os poderes e as responsabilidades do governo. Vivemos tempos de revisão. Já se percebeu que não haverá nada de jeito, a não ser, eventualmente, uma reforma secundária, com pouco significado e alguma demagogia. Se houver revisão, será um exercício fútil de acrescentos e remendos, não de tentativa de reformar e rever. Pense-se, por exemplo, no mais urgente, no mais grave: a reforma da Justiça, a necessitar adequação constitucional. Nada acontecerá. Reflicta-se ainda nos dois mais graves entraves à democracia parlamentar que são o sistema eleitoral e o semipresidencialismo. Podemos ter a certeza de que não teremos novidades nestas áreas “.
SEMANADA - Os quartos para estudantes subiram 10% desde o anterior ano lectivo e podem custar mais de 400 euros em Lisboa e no Porto; as receitas dos operadores de telecomunicações com os pacotes de serviços tiveram o maior crescimento anual desde 2016 e asseguram 51,8% do total das receitas obtidas por essas empresas; o número de partos em Lisboa no primeiro semestre aumentou 20% nos hospitais privados e 3% nos públicos; a dívida dos particulares, das empresas privadas e das administrações públicas aumentou 12.900 milhões de euros no primeiro semestre; em 2022 foram destruídos 17 mil ninhos de vespa asiática e os distritos onde existem mais são Porto, Aveiro e Braga; o PCP não esteve de acordo com a autorização dada pelo Parlamento à deslocação do Presidente da República à Ucrânia; na última década construíram-se apenas 17% dos edifícios para habitação construídos em décadas anteriores; dos 3622 quilómetros de ferrovia existentes em Portugal apenas 2527 têm exploração comercial; 67% das refeições dos portugueses não são cozinhadas em casa; nesta primeira fase de colocação de estudantes há 38 cursos superiores que não tiveram nenhum candidato interessado em os frequentar; o nível de preços na hotelaria acelerou 70% nos últimos dois anos e os restaurantes e hotéis tiveram em Julho a primeira quebra mensal de faturação desde Janeiro; os preços do imobiliário em Lisboa são três vezes mais altos que a média do país.
O ARCO DA VELHA - Uma palmeira do espaço público de Cascais, que tinha um localizador de GPS foi roubada do sítio onde estava plantada e foi depois descoberta numa casa que pertencia a um militar da GNR.
EXPOSIÇÕES LISBOETAS - Devo começar por fazer uma declaração de interesses: exerço o cargo de administrador não executivo da EGEAC, a empresa municipal que gere a maioria dos equipamentos culturais de Lisboa. Digo isto porque hoje vou destacar três exposições desses equipamentos. Começo pelo Museu da Marioneta, no Convento das Bernardas, que organizou uma nova exposição a partir das reservas do museu. Ao todo mais de uma centena de marionetas, originárias da Europa, África e Ásia, realizadas entre finais dos séculos XIX e XX. foram incluídas na nova exposição da colecção para, na sua maioria, serem mostradas ao público pela primeira vez. A exposição”A Outra Vida das Marionetas” inclui ainda três teatros portáteis e um teatro de sombras. A exposição pode ser visitada até dia 29 de outubro no espaço do Convento das Bernardas. Na imagem, uma fotografia de Nuno Silva, está uma marionete de vara do Mali, de meados do século XX, adquirida pelo Museu em 2005. O segundo destaque vai para uma exposição que assinala o centenário do nascimento de Celeste Rodrigues e que pode ser visitada no Museu do Fado até este domingo, 3 de Setembro. A exposição revisita o vastíssimo legado de Celeste Rodrigues, mostra o seu papel na renovação do Fado e apresenta a sua discografia, os seus repertórios, troféus, galardões, adereços de actuação, periódicos, pinturas e filmes. Finalmente o terceiro destaque vai para “Haven”, de James Newitt, que está na Galeria da Boavista. Newitt elaborou a exposição a partir da investigação que fez sobre um facto real e quase desconhecido: a história de uma pequena plataforma abandonada ao largo da costa britânica, construída pelo governo com funções militares de defesa anti-aérea no tempo da II Grande Guerra e, ocupada por um casal na década de sessenta que reivindica a sua independência do Reino Unido denominando-a de Principado de Sealand. Entre a realidade e a fantasia Newitt mistura arquivo e criações originais. A exposição tem uma folha de sala feita propositadamente para visitas de crianças que vale a pena conhecer.
UM GRANDE MISTÉRIO - Yrsa Sigurdardóttir escreve policiais arrebatadores e ao mesmo tempo é diretora de uma das mais importantes firmas de engenharia da Islândia. Saber como consegue conciliar as duas coisas é logo um mistério. Yrsa Sigurdardóttir é editada internacionalmente e é a escritora islandesa mais conhecida além-fronteiras, autora de mais de uma dezena de grandes histórias policiais e thrillers, várias em adaptação para o cinema e televisão. “A Boneca” é o seu novo livro, o quinto volume da série DNA. Ao longo de 475 páginas Yrsa Sigurdardóttir desenvolve uma sucessão de mistérios, ligados a outros tantos crimes, que passam pelo tráfico de droga e vários assassinatos. Na origem de tudo está uma boneca, apanhada numa rede de pesca e cuja fotografia, publicada nas redes sociais, provoca a morte de quem divulgou a imagem. Em “A Boneca”, Yrsa Sigurdardóttir recorre a uma já conhecida dupla - o detetive Huldar e a psicóloga infantil Freyja. Os dois completam-se e conseguem perceber a ligação entre a morte de uma jovem adolescente, que teve uma vida problemática, e os crimes anteriores, que incluem a morte da sua própria mãe - a mulher que tinha publicado a foto da boneca anos antes. Pelo meio percebe-se a tensão que existe na sociedade islandesa, os conflitos dentro da polícia, as dúvidas sobre o sistema de assistência a menores e, também, a forma como os adolescentes se relacionam, se protegem e como contactam uns com os outros nas redes sociais. Como em anteriores livros de Yrsa Sigurdardóttir a intriga é viciante e o ritmo da narrativa é intenso. Edição Quetzal.
O OUTRO LADO DE HARVEY - “I Inside The Old Year Duing” é o décimo álbum de estúdio de P.J. Harvey, o seu primeiro trabalho desde o álbum “The Hope Six Demoition Project” de 2016. No novo trabalho Harvey volta a trabalhar com os seus habituais colaboradores de longa data, John Parish e Flood. O disco nasce de um livro de poemas que Harvey escreveu nos últimos anos, “Orlam”, baseados na tradição - e no dialecto - de Dorset, onde ela vive. Musicalmente é uma combinação de influências folk com experiências eletrônicas. As 12 canções, com letras adaptadas de 12 poemas do livro, estão cheias de imagens bíblicas e de referências a Shakespeare. Rezam as crónicas da gravação deste disco que ela terá dado indicações claras a Parish e a Flood, sublinhando que não queria que a sua voz e forma de cantar se assemelhasse ao que fez a sua imagem de marca, criando um território vocal entre o antigo e o novo e mostrando um outro lado de Harvey. Aparentemente conseguiu-o e canções como “Lwonesome Tonight”, “Seem an I”, “The Nether-edge”, “A Child's question, August”, “I Inside the Old Dying” e “A Child's Question, July” destacam-se pelo que mostram sobre a forma como P.J. Harvey encara a sua música a partir de agora. Disponível nas plataformas de streaming.
UMA BOA PROVA - Em pleno centro de Azeitão, junto ao largo central, no nº1 da Rua José Augusto Coelho, paredes meias com os edifícios que albergam a empresa vinícola José Maria da Fonseca, está o By The Wine. Depois de uns anos iniciais oscilantes, agora o restaurante, que pertence também à José Maria da Fonseca, está em estada mais segura. O responsável pelo feito é o Chef José Barradas. A lista é essencialmente petisqueira e a ideia é pedir e repartir na mesa. Numa incursão recente provaram muito bem as amêijoas do Sado à Bulhão Pato, um quinoto de legumes do outro lado da mesa e um choco frito com maionese e lima, tenro e saboroso, acompanhado por batata frita aos palitos feita com competência. Antes disso havia umas boas azeitonas, bem temperadas e pão da região. Na lista há tábuas de queijo da região e a possibilidade de experimentar algumas das conservas artesanais Belmar, de Setúbal, muito apreciadas. Para acompanhar os petiscos recomenda-se um dos vinhos da José Maria da Fonseca ou então a sua própria cerveja artesanal, Mosquita. Nos vinhos não perca a possibilidade de experimentar o fabuloso Quinta de Camarate Branco Seco a um preço de combate - 4,30 euros o copo. Aliás o By The Wine é um bom sítio para provar os vários vinhos da casa. O serviço, que nessa noite esteve a cargo do Ricardo, é expedito e simpático e a esplanada é deliciosa nas noites de verão. Se quiser mesmo a esplanada é aconselhável reserva pelo telefone 212 191 366.
DIXIT - “Eu ainda sou do tempo em que a política, aqui e lá fora, não era apenas um espectáculo” - Alberto Gonçalves
BACK TO BASICS - “Quanto mais estudo as religiões mais me convenço que o Homem não venera nada a não ser ele próprio” - Sir Richard Francis Burton
REENTRADA - Daqui a pouco tempo o espírito de férias na política desvaneceu-se: acabam as fotografias dos políticos à beira mar, a comer bolas de berlim ou simplesmente a passear no areal. Imagino que para alguns jornalistas seja um alívio deixar de perseguir notícias e reacções, de microfone em punho, eles razoavelmente vestidos, os entrevistados bastante despidos, em dias quentes, com o oceano como cenário de fundo. Este ano o ridículo da caça à notícia no meio da praia excedeu tudo o que é razoável. Até parece que alguns políticos, nos mais elevados cargos, não tiraram férias, apenas mudaram o cenário das conferências de imprensa. A coisa não correu bem - a política pode ser informal mas quando se vulgariza perde dignidade. Quando tudo se banaliza deixa de haver notícia, passa apenas a fazer-se o relato de ocorrências e tudo se consome de forma apressada como as páginas das antigas gazetas sobre casos de polícia, casamentos e necrologia. Passar as divergências e o confronto cada vez maior entre Governo e Presidente da República para o areal equivale a transformar Parlamento e Palácio de Belém em castelos de areia. A ver vamos como corre a reentrada política entre as eleições regionais da Madeira no final de Setembro, a preparação do Orçamento de Estado - com o cenário de reduções de impostos no horizonte - e a actuação de um Governo de maioria absoluta que bem precisa de um impulso reformista e de uma remodelação. Estes dois pontos, no entanto, dependem de uma única pessoa: António Costa. Que legado quererá ele deixar? Manter Portugal na cauda da Europa? Destruir a classe média? E como é que os próximos meses vão impactar nas guerras internas do PS pela sucessão do líder actual? Vão ser uns meses curiosos de seguir.
SEMANADA - Nesta sessão legislativa o PS chumbou 74 pedidos de audição parlamentar a ministros, 11 deles a Medina; Portugal é o oitavo país da União Europeia onde o IVA mais pesa; desde que António Costa é primeiro-ministro a receita fiscal aumentou 25 mil milhões de euros; Portugal já recebeu quase um terço dos 16,6 mil milhões previstos no PRR, ou seja um pouco mais de 5,5 mil milhões, mas até agora só pagou menos de metade a projectos apresentados, 2,4 mil milhões; Portugal perdeu num ano 200 explorações agrícolas e os agricultores com menos de 40 anos são menos de 4% do total; no ano passado as Forças Armadas perderam 7,2% dos efectivos e faltam 7732 militares, havendo actualmente 1,7 oficiais e sargentos por cada praça; mais de metade dos portugueses até aos 34 anos vive com os pais; a prestação média do crédito à habitação subiu 40% entre julho do ano passado e o mesmo mês deste ano; o primeiro semestre de 2023 teve mais nascimentos e menos mortes que no período homólogo de 2022; a corrupção no Ministério da Defesa terá lesado o Estado em pelo menos um milhão de euros e o Ministério Público acusou 73 pessoas e empresas; o número de desempregados aumentou cerca de 2,5% no final de julho, face ao período homólogo, e a maior subida deu-se na região Centro, com um agravamento de 8,7%; o aumento dos juros dos empréstimos de habitação está a levar os portugueses a diminuir despesas correntes e, segundo uma sondagem recente, as maiores reduções foram em restaurantes, férias e roupa; os contratos a termo representavam 13,2% dos postos de trabalho na Administração Central no final de 2015, altura do início da governação do PS de António Costa e em junho deste ano, esse número atingia os 15,2%, o que signfica um aumento do trabalho precário no Estado sob a governação da geringonça e PS.
O ARCO DA VELHA - No serviço nacional de saúde ainda há aparelhos de radiologia antigos, que trabalham com película, cada vez mais escassa no mercado desde a conversão ao digital, impossibilitando a realização de muitos exames.
O HOMEM DA VITÓRIA - Churchill é uma das personalidades políticas mais conhecidas e estimadas graças ao papel que teve no combate aos nazis e na defesa da democracia no Reino Unido e na Europa. Mas como foi a vida de Churchill fora do período da segunda grande guerra? Onde estava ele antes e o que já tinha feito? E no fim da guerra, que aconteceu? Em menos de centena e meia de páginas Sophie Doudet, uma autora de romances históricos e de biografias, escreveu de forma divertida sobre a vida de Churchill. O livro chama-se “Churchill na praia - o velho leão na toalha e na areia”. A autora consegue oferecer ao grande público, com base em elementos biográficos, e de forma rigorosa e acessível, o relato da extraordinária carreira deste homem, considerado um visionário e um dos grandes nomes da História do século XX. Pode ler excertos dos seus grandes discursos, a forma como tomou decisões geniais e também um relato do que foram as suas maiores fraquezas. O livro descreve como Churchill foi um conquistador e um herói, cujo espírito combativo e o desejo de fazer História mudaram o mundo, popularizando o seu gesto de dois dedos a fazerem o V da vitória dos aliados sobre os nazis. Célebre primeiro-ministro de Inglaterra no momento mais crítico da História, os dias sombrios da II Guerra Mundial, deixou ainda a sua marca como jornalista, militar, historiador, Prémio Nobel da Literatura e, por fim, pintor até. Edição Guerra & Paz.
CESARINY - Em Alfama, na Rua das Escolas Gerais, existe uma galeria de arte que se tem dedicado aos surrealistas portugueses, construindo uma importante colecção de artistas portugueses ligados a esse movimento. A Perve Galeria teve há cerca de uma década a iniciativa de, mesmo junto às suas instalações, criar um espaço a que deu o nome de “Casa da Liberdade”, dedicado à obra de Mário Cesariny, cuja fase inicial foi ainda acompanhada na vida do artista. Agora, assinalando o centenário de nascimento de Mário Cesariny de Vasconcelos (1923-2006), a Casa da Liberdade e a Perve Galeria apresentam “Primeira Pessoa” e “... e os seus contemporâneos”, duas exposições que celebram a extraordinária vida e o profundo legado daquele que é uma das personalidades maiores das artes e da poesia em Portugal. Na Casa da Liberdade está o núcleo “Primeira Pessoa”, mostrando o seu universo criativo sem barreiras e livre. A exposição, entre uma parte significativa de material inédito, apresenta centenas de documentos, fotografias, textos e obras de arte (na imagem), de Cesariny e de vários autores seus contemporâneos e mostra, pela primeira vez, um núcleo de obras e documentação das décadas de 1940 e 1950, proveniente do recém-doado espólio de João Artur da Silva. No espaço da Perve Galeria são destacadas as relações estabelecidas entre Mário Cesariny “... e os seus contemporâneos” de várias décadas, apresentando perto de duzentas obras de artistas nacionais e internacionais, muitos deles tendo coincidindo com o autor nas múltiplas exposições em que participou entre 2000 e 2006. A exposição, através, da apresentação de correspondência, fotografias e obras visuais podem ser vistas as colaborações de Cesariny com surrealistas portugueses e internacionais, e a sua relação crítica com alguma da tradição nacional. As duas exposições, que ficarão abertas até 26 de Novembro, têm curadoria de Carlos Cabral Nunes, director da Perve Galeria, que começou a trabalhar com Cesariny em 2020, até à sua morte seis anos mais tarde. Rua das Escolas Gerais 13, 17 e 19.
UM DISCO INESPERADO - Incorporar a tradição da música negra dos Estados Unidos com a folk e a country norte-americanos é um desafio conseguido por Rhiannon Giddens, uma contadora de histórias com uma interpretação vocal e instrumental muito próprias. Virtuosa e eclética, Giddens tem percorrido vários estilos até chegar a este seu primeiro álbum de originais que ela própria compôs, “You’re The One” . São muitas as influências musicais que se encontram ao longo dos 12 temas do álbum desde sonoridades zydeco da música Cajun de “You Louisiana Man”, os blues com influência country em “Way Over Yonder” (escrita em parceria com Keb’Mo), a percussão forte a acompanhar palavras certeiras em “Hen In The Foxhouse”, o tom soul envolvente de “Who Are You Dreaming Of”, o jazzy de “You Put The Sugar In My Bowl” e a energia contagiante de “Wrong Kind Of Right” ou de “Yet To Be” num dueto imparável com Jason Isbell, dos 400 Unit, o relato de uma história de amor entre uma mulher negra e um homem irlandês. Dois destaques mais - para “You’re The One”, que dá o título ao álbum e à faixa final, a divertida e contagiante “Good Ol’ Cider”. Um disco absolutamente irresistível. Só para terem uma ideia da versatilidade de Giddens, em 2019 ela gravou, com o músico de jazz Francesco Turizzi o álbum “There Is No Other”, por onde passam evocações de ópera, bluegrass, gospel e músicas tradicionais americanas. Mas este novo “You’re The One” mostra bem, além da versatilidade e virtuosismo, o seu talento de compositora. Disponível nas plataformas de streaming.
PETISCARIA ENTRE MURALHAS - E se ao fim da tarde rumasse a um castelo, se sentasse numa esplanada que de um lado permite vislumbrar Lisboa e do outro a foz do Sado e o mar? O sítio existe e é o Castelo de Palmela. Lá em cima, entre muralhas e ameias, fica O Bobo da Corte, bar e restaurante de petiscos, aberto ao almoço de quarta a domingo e nas noites de sexta e sábado. A casa é uma petiscaria, e não pretende ser mais que isso, mas usa boa matéria prima: queijo de azeitão, pão da região, chouriço assado cortado em rodelas finas, pasta de atum regular e pasta de farinheira superior. Pode pedir uma tábua de presunto e queijos, uma espetada de enchidos ou uma alheira de caça e convém sempre ver qual o prato do dia. Boas opções são o pica-pau, bem temperado e com boa carne e o frango à passarinho, acompanhado de batata doce frita às rodelas. Numa visita recente foi também provado um bom aveludado de melão com hortelã. O vinho da casa, em jarro, tinto ou branco, é honesto e da região e há sangria - que pode ser de moscatel, a pedido. O largo frente à esplanada convida a passear de copo na mão no intervalo dos petiscos. O local é muito procurado por grupos em festa, por isso se quiser ir na noite de sexta ou sábado convém fazer a reserva com antecedência. O Bobo da Corte, Castelo de Palmela, telefone 935 205 936.
DIXIT - “Toda a gente sabe que pelo menos meia dúzia de ministros e mais ainda secretários de Estado não estão à altura”- António Barreto
BACK TO BASICS - “Um bom livro diz-nos a verdade sobre os personagens, um mau livro mostra-nos a verdade sobre o seu autor” - G.K Chesterton
PALAVRAS DE ORDEM - Em 1974, logo a seguir ao 25 de Abril, as palavras de ordem mais enunciadas eram “pão”, “saúde”, “educação” e “habitação” - e , também, “paz”, relativamente à guerra colonial. Hoje, em vez de paz, devia reivindicar-se melhor justiça, um dos cancros da nossa sociedade. O pão, a saúde, a educação e a habitação resumem aquilo que é a aspiração natural a uma vida melhor e mais digna. De uma forma ou outra, ao longo destes 49 anos, todos os partidos têm incluído nos seus programas eleitorais estas aspirações - mas muito está ainda por fazer. António Costa percebeu que a chave para conseguir vencer estava em garantir melhores salários, mas como o dinheiro não dá para tudo, ao mesmo tempo lançou mais taxas e impostos. Na realidade Costa aproveitou as medidas de austeridade provocadas pelo descalabro da governação de Sócrates e exigidas pela troika, para nalguns casos ir ainda mais além, com o seu eterno sorriso bonacheirão. E assim conseguiu receitas fiscais nunca antes vistas, o que lhe permitiu folga orçamental. Injectou dinheiro no sistema de Saúde, mas não melhorou a sua gestão e é claro que a ruptura começa a ficar à vista. O mesmo se passa na educação - com os professores a reclamarem a recuperação do poder de compra que tinham há alguns anos. De uma forma geral Costa seguiu o princípio de aumentar o salário mínimo e as pensões e de não mexer no resto. O resultado foi mais uma cacetada na classe média, que já vinha bem combalida dos anos anteriores e que tem empobrecido nas últimas duas décadas. Se a saúde e a educação são casos de má gestão, a questão da habitação é mais delicada. Centrando a recuperação da economia no turismo, o Governo abriu as portas à especulação imobiliária e à gentrificação das cidades. A questão volta sempre ao mesmo ponto: como fazer crescer a economia e garantir melhor qualidade de vida às pessoas? Não é com impostos altos sobre o trabalho e sobre a actividade das empresas que isso se consegue. As pessoas gostariam que a oposição explicasse como alcançar aquilo que Costa prometeu e não alcançou: maior qualidade de vida para os portugueses. Resta saber se a oposição que temos consegue fazê-lo. Depois dos primeiros ecos da rentrée política, tenho as maiores dúvidas.
SEMANADA - Os aumentos salariais verificados nos últimos dois anos ainda não compensam a subida de preços verificada no mesmo espaço de tempo; as exportações de alta tecnologia portuguesa atingiram em 2022 o valor mais alto desde 2013; o valor total das exportações portuguesas caíu em Junho pelo terceiro mês consecutivo; no total, entre janeiro e junho, os visitantes estrangeiros gastaram em Portugal cerca de três mil milhões de euros, mais 31,3% face ao ano anterior; em Junho o sector do alojamento turístico registou 2,9 milhões de hóspedes e 7,4 milhões de dormidas correspondendo a 622,1 milhões de euros de receita, mais 14% que no mesmo mês do ano anterior; segundo o INE os não nacionais representam 70% das receitas do Turismo e gastaram mais de dois mil milhões de euros no primeiro semestre; até final de Junho os aeroportos portugueses registaram 31 milhões de passageiros, um aumento de 28,4% face ao ano anterior; a economia paralela atingiu em 2022 um novo recorde histórico alcançando 34% do PIB e especialistas fiscais indicam que a carga fiscal alta é a principal razão; a violência doméstica já fez 12 mortes este ano; nos últimos cinco anos 154 menores mudaram de nome e de género; quase 17% dos bebés nascidos em Portugal em 2022 são filhos de mães estrangeiras; quase 20% das freguesias do país estão a ficar despovoadas, com popuação envelhecida e sem oportunidades de trabalho para os mais novos; num ano Portugal perdeu 128 mil trabalhadores com ensino superior e o aumento de emprego no segundo trimestre deste ano foi feito com trabalhadores menos qualificados.
O ARCO DA VELHA - Portugal foi o único país da União Europeia que aumentou o custo do registo de patentes de invenções e inovações industriais.
PINTURA, DESENHO E FOTOGRAFIA - Se estiver em Chaves não perca a exposição de Pedro Calapez, no Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso. Intitulada “Deste Espaço Luminoso e Obscuro”, tem curadoria de Joana Valsassina e apresenta até 28 de Janeiro, um conjunto de obras de Pedro Calapez da colecção de Serralves e da colecção do artista, mostrando a relação entre a pintura e o desenho, desde final da década de 70 (na imagem). Neste sábado 19 decorre uma visita orientada pelo próprio artista e pelo historiador de arte e curador Oscar Faria. Outros destaques: dia 19 de Agosto assinala-se o Dia Mundial da Fotografia e o Centro Português de Fotografia, no Porto, inaugura “Mãe d´Água", a partir de imagens da sua colecção. E no Carvalhal, no âmbito das primeiras iniciativas da Terra Foundation, lançada por Guta Moura Guedes, pode ver o projecto fotográfico “O Dia Abre Os Meus Olhos”, resultante de uma residência do fotógrafo Rafael de Oliveira e da sua visão do ecossistema da região da Comporta, com curadoria de José Cabaço. Ao todo são apresentadas 345 fotografias em formato postal e 24 nos tamanhos A1 e A2. A exposição, com uma bem pensada montagem, decorre no espaço de um antigo café, na Avenida 18 de Dezembro nº5, no Carvalhal, até 27 de Agosto.
PERGUNTAS DIFÍCEIS - Sou fascinado por pessoas que conseguem transmitir conhecimentos complexos de forma fácil. Por cá temos entre outros, Carlos Fiolhais e Jorge Calado. Saber comunicar bem temas científicos é importante e Sabine Hossenfelder, uma cientista, na área da Física, investigadora no Instituto de Estudos Avançados de Frankfurt, sabe fazê-lo. O seu novo livro, “A Física E As Grandes Questões da Vida” é disso um bom exemplo. Ela coloca perguntas como: “Existem cópias de nós mesmos? O Universo pensa? A consciência é computável? Afinal, qual é o propósito do que quer que seja?”. “A Física e as Grandes Questões da Vida” baseia-se nas mais recentes pesquisas em mecânica quântica, buracos negros, teoria das cordas e física de partículas e Sabine Hossenfelder explica o que a física moderna nos pode dizer acerca das grandes questões da humanidade: De onde viemos? Para onde vamos? O que está ao nosso alcance conhecermos? O livro inclui entrevistas com outros cientistas de renome e Sabine Hossenfelder mostra o caminho que falta percorrer para que os físicos consigam responder àquelas questões, indica os limites atuais do conhecimento e aponta as perguntas que podem ficar sem resposta para sempre. «Sim, somos uns sacos de átomos rastejando sobre um ponto azul-pálido no braço espiral externo de uma galáxia notavelmente pouco digna de nota. E ainda assim, somos muito mais do que isso.» Fascinante, sobretudo por um apaixonado por física, como eu.
GUITARRA MÁGICA - Pat Metheny agarrou em algumas gravações suas a solo, dispersas e inéditas, efetuadas nos intervalos de uma série de digressões, em quartos de hotel, ou durante ensaios. A partir daí fez um novo álbum, intitulado “Dream Box”. Aos 68 anos Pat Metheny continua uma referência para todos que gostam de ouvir uma guitarra tocada a solo e aqui ao longo de quase uma hora estão nove temas que mostram a capacidade criativa do músico, que apresenta versões de clássicos como “Never Was Love”, expurgando-os das palavras que integravam as canções e deixando só a voz da guitarra eléctrica. O disco combina versões de canções, de standards de jazz, mas também novas composições que lhe surgiam no momento em torno de melodias que ía construindo. Metheny é sempre surpreendente pelos caminhos que escolhe e este disco permite perceber o seu processo criativo. Aqui está um álbum que nasceu por acaso, a partir de retalhos, improvisações, devaneios melódicos tardios. Cruzam-se géneros, como a evocação das sonoridades dos blues em “From The Mountains” ou da bossa nova em “Morning Of The Carnival”, um clássico de 1959, composto por Luis Bonfá e António Maria e que se tornou popular por exemplo nas versões de Astrud Gilberto e de Nara Leão e de músicos de jazz como Gerry Mulligan. Mas esta interpretação de Metheny é ao mesmo tempo saudosista e inovadora. O disco está disponível nas plataformas de streaming.
EXPERIÊNCIA SADINA - Uma das coisas que qualquer restaurante deseja é ser reconhecido. Se o reconhecimento vier do BIB Gourmand, o patamar de entrada na constelação das estrelas do Guia Michelin, melhor ainda. Há uns anos atrás Rute Marques decidiu que o seu objectivo era criar um restaurante diferente em Setúbal e inventou o Xtoria. Chamou para o seu lado um jovem Chef, Rafael Portasio, que já tinha experiência em alguns bons restaurantes. Localizado em Setúbal, junto ao Porto de Pesca, o Xtoria é referenciado na lista do BIB Gourmand de Portugal pelo segundo ano consecutivo. Nota-se o empenho do proprietário, do Chef, e da equipa de sala em seguir à risca os preceitos que são capazes de seduzir o célebre guia, desde a atenção aos produtos locais, a novas técnicas gastronómicas. A decoração é confortável, o serviço é exemplar, os preços são honestos e há até um menu de almoço simpático. No menu normal, nas entradas deixei para uma próxima visita as moelas glaciadas com sésamo e aneto e as enguias fritas de Alcácer. Mas a minha escolha foi para as ostras da região - que podem vir ao natural ou criativas, estas temperadas ao sabor da inspiração do Chef no momento. Arrependi-me de não ter escolhido as ostras ao natural. Na lista há peixe da lota de Setúbal e um bacalhau em tempura mas eu fiquei pelas lulas recheadas com arroz, cogumelos, toucinho e coentros. Não me arrependi. Nas carnes havia pato em brioche e vaca Mertolenga. Do outro lado da mesa a opção foi por duas entradas: a primeira foi choco, ponzu, batata negra, maionese de Sriracha, e caviar de lumpo, que foi apreciada. A seguir veio ovo panado com creme de ervilhas e hortelã pimenta, espargos marinados, e chouriço frito. A sobremesa, dividida, e que agradou, foi cremoso de cardamomo com cookie de gengibre. A acompanhar o repasto uma vinho surpreendente, pela relação qualidade-preço, o branco da Quinta da Invejosa, de Palmela, feito a partir das castas Fernão Pires e Verdelho. O Xtoria fica na Rua Guilherme Gomes Fernandes 17, Setúbal, telefone 961284144.
DIXIT - “Portugal não pode ser só o país das casas para estrangeiros e dos hotéis para turistas” - Sónia Sapage.
BACK TO BASICS - “Tenham sempre presente que querer obter sucesso é mais importante que qualquer outra coisa para efectivamente terem êxito” - Abraham Lincoln.
PARA MEMÓRIA FUTURA - Como a memória é curta convém recordar como as coisas se passaram. As eleições autárquicas foram há menos de dois anos e quando Carlos Moedas iniciou funções o novo executivo da Câmara Municipal de Lisboa percebeu que a preparação das Jornadas Mundiais da Juventude estava muito atrasada. Em Julho de 2021 António Costa tinha nomeado José Sá Fernandes para coordenar o grupo de projeto que iria assegurar o acompanhamento dos trabalhos de preparação das Jornadas Mundiais da Juventude. Sá Fernandes teve desde a derrota do PS na autarquia lisboeta uma relação difícil com o novo executivo e era patente que o trabalho que tinha entre mãos andava mal e devagar, a passo de caracol. No final de Janeiro deste ano, face aos atrasos e divergências e com o risco de o evento ter sérios problemas, Carlos Moedas decidiu que a CML passaria a articular directamente com a Igreja a organização, excluindo Sá Fernandes do processo. Nessa altura, Filipe Anacoreta Correia, vice-presidente da autarquia lisboeta com a responsabilidade executiva do evento, afirmou que a Câmara não aceitava mais “pretensos coordenadores que não fazem nada e que não ajudam a resolver nada” e que iria tomar o processo em mãos, a seis meses do evento. Na altura , face aos atrasos verificados, parecia impossível. Mas a verdade é que a equipa montada pela autarquia lisboeta, em conjugação com outras autarquias e a Igreja, conseguiu ter tudo pronto, para além até dos planos iniciais, em termos de localização das várias acções. O papel de Sá Fernandes acabou por ser quase nulo. Foi por isso com espanto que se assistiu, a seguir à JMJ, a uma entrevista a Sá Fernandes, na SIC, em que ele se apresentava como o grande obreiro de tudo e mais alguma coisa. Se dúvidas houvesse, depois do onanismo verbal praticado na televisão sobre a JMJ, ficou provado que José Sá Fernandes é das mais desprezíveis figuras da política portuguesa, um lunático encartado com um umbigo descomunal e vendas nos olhos que só lhe permitem ver numa direção. A realidade, para memória futura, é que sem o trabalho de autarcas como Carlos Moedas a festa tinha corrido mal, de atrasada e desorganizada que estava. Verdade seja dita que as culpas do que estava mal não eram só de Sá Fernandes - quem o escolheu, António Costa tem também culpas no cartório - foi mais uma má escolha na sucessão de más escolhas que tem caracterizado a sua acção como Primeiro Ministro.
SEMANADA - Os pedidos de asilo em Portugal aumentaram 30% no ano passado; desde 2011 foram destruídos 89 mil ninhos de vespa asiática em Portugal; há 30 mil crianças estrangeiras inscritas para entrar no primeiro ciclo e no ensino pré escolar; só este ano cerca de sete mil cabo-verdianos já pediram vistos de longa duração para Portugal; o número de pessoas singulares e colectivas que pediram insolvência na primeira metade de 2023 subiu 19,2% face ao período homólogo de 2022, num total de 2482; a linha nacional de Emergência Social recebeu 2372 pedidos de ajuda por perda de habitação nos primeiros seis meses deste ano; taxas e multas cobradas no primeiro semestre somam recorde de dois mil milhões de euros, um aumento de 11% em relação ao mesmo período do ano passado; os preços dos quartos para estudantes em Lisboa aumentam 19%; a taxa de desemprego jovem em Portugal é de 17,2%, acima da média de desemprego móvel na UE, que é de 14%; o salário dos jovens em Portugal é o segundo mais baixo da UE, logo atrás da Grécia; seis mil alunos de cursos superiores perderam este ano as suas bolsas de estudo por falta de aproveitamento; dos 230 deputados, 37 exercem cinco ou mais cargos além do mandato parlamentar na Assembelia da República e desses, 34 são do PS e PSD; as salas de cinema portuguesas tiveram em Julho o melhor mês desde 2004, com um total de 1,7 milhões de espectadores e 10,5 milhões de euros de receita, um aumento de 64,5% em relação ao mesmo mês do ano passado; os canais generalistas e os de informação no cabo fizeram 278 horas de emissão sobre a JMJ;
O ARCO DA VELHA - O programa Ferrovia 2020 , lançado por Pedro Nuno Santos, devia ter ficado concluído em 2021 mas a execução está atrasada e não há ainda previsão da conclusão dos trabalhos previstos nem do custo final das obras.
UM CLÁSSICO EM LISBOA - Hoje sugiro uma visita ao Museu Nacional de Arte Antiga para visitar a obra convidada, neste caso pinturas de Albrecht Durer. O primeiro é um clássico do artista alemão, o retrato de Jakob Muffel, que foi presidente da cidade de Nuremberga, datado de 1526. A obra (na imagem) mostra como Durer foi um dos grandes retratistas do Renascimento e foi cedida ao MNAA até 24 de Setembro pela Gemaldegalerie de Berlim. O segundo retrato é do rosto de um português, desenhado por Durer em 1521, que se supõe ser de João Brandão, que era feitor português em Antuérpia. Outra sugestão é a exposição “Vita Prima, Santo António em Portugal”, que está no Museu da Cidade, Palácio Pimenta, até 31 de Dezembro. A exposição é uma viagem pela vida de Santo António enquanto jovem, durante o tempo em que viveu em Portugal antes de ingressar na Ordem dos Frades Menores e ter ido viver para França e Itália. Fora de Lisboa, a norte, “Poeta Chama Poeta” é uma exposição realizada a partir de obras de Ana Hatherly da Coleção de Serralves, que fica até 1 de Outubro na Galeria Solar da Porta dos Figos - Casa do Artista, em Lamego. Por fim, se estiver nos Açores, pode visitar, na Galeria Fonseca Macedo, em Ponta Delgada (Rua Dr. Guilherme Poças Falcão) a exposição “1,2,3 O Prado Infinito” de João Miguel Ramos.
UMA VIAGEM IMPRESSIONANTE - No final do século XIX, em 1887, Bernardo Pinheiro Correia de Melo, também conhecido por Conde de Arnoso, esteve durante nove meses em viagem, de Marselha até Pequim, no coração da China, onde se deslocara para a assinatura do tratado sobre a tutela portuguesa de Macau. Pelo meio visitou lugares do colonialismo europeu, do Mediterrâneo e de Suez, a Hong Kong ou a Singapura. O livro que escreveu com o relato dessa viagem levou o nome de “Jornadas Pelo Mundo”, publicado pela primeira vez em 1895. Bernardo Pinheiro Correia de Melo, mais conhecido por Conde de Arnoso, nasceu em Guimarães, em maio de 1855. Estudou matemáticas e engenharia, foi oficial do exército e secretário pessoal do rei D. Carlos, que lhe atribuiu o título em 1895. Membro dos Vencidos da Vida, como autor usou também o pseudónimo literário Bernardo Pindela (era filho do visconde de Pindela), publicou vários livros e deixou vasta colaboração na imprensa da época. Cito excertos da introdução de Francisco José Viegas à nova edição de “jornadas Pelo Mundo”: «O Conde de Arnoso devia ser também assim: um dos elegantes do reino, cultíssimo, afável, naïve, cheio de monde, de curiosidade, de uma toillete adequada, dos pecados da época e de vontade de literatura.» Podia ser uma personagem de Eça de Queirós, escreve também Francisco José Viegas: «Os seus olhos são os de um ocidental vagamente emprestado ao exotismo.» O relato desta grande viagem mostra como os portugueses de então viam o mundo, numa altura em que o conhecimento que as elites europeias tinham da China era quase nulo. Interessam-no as personagens notáveis, os negociadores, o cerimonial, os vasos de porcelana, os templos, a presença cristã portuguesa. Confrontado com o prodigioso passado da China (as termas do imperador Qianlong, os túmulos Ming ou a Grande Muralha) e com as vicissitudes que o Império do Meio atravessava na época, Arnoso nunca abandona o seu olhar cosmopolita, minucioso, chocado diante da penúria, atento aos pormenores, assombrado perante as ruínas ou a promessa do futuro. Edição da Quetzal, na colecção “Terra Incógnita”, com prefácio e notas de Francisco José Viegas.
A DANÇA DA BARBIE - A Rolling Stone diz que a banda sonora de “Barbie” é como uma noite numa discoteca em que a música não deixa ninguém parar e quem lá está não quer que a noite acabe. Nicki Minaj, Dua Lipa, Karol G, Lizzo, Billie Eilish, e vários outros estão nas 16 faixas que integram o CD com a banda sonora do filme que está a bater recordes de bilheteira e que em Portugal já teve mais de 500 mil espectadores nas salas de cinema. Com produção do veterano Mark Ronson, “Barbie - The Album” captura em música a história que o filme conta. Vejam bem: Ryan Gosling, uma das estrelas do filme, canta “I’m Just Ken”, com arranjos e produção que parecem evocar Meat Loaf - um achado. Logo na primeira faixa, “Pink”, Lizzo começa por contar que gosta de acordar no seu mundo cor de rosa, mas reconhece que a vida é mais dura que os sonhos. E a seguir Dua Lipa canta “Dance The Night”, mais à frente Billie Eilish canta “What Was I Made For”. O álbum mistura temas inéditos com canções que evocam memórias e inclui estrelas pop já citadas como Dua Lipa e Lizzo, fenómenos globais como o cantor de reggaeton Karaol Gand ou o grupo feminino Fifty-Fifty e até Tame Impala, um grupo australiano meio psicadélico ou a cantora britânica Charli XCX. E, claro, não falta Sam Smith com o seu hino de dança “Man I Am”, uma pequena provocação no meio do álbum. Disponível nas plataformas de streaming.
PETISCO NO PÃO - Uma das minhas descobertas deste verão é a sanduíche de tomate. Vi a receita numa newsletter norte-americana e lancei mão da adaptação possível em Portugal. Comecei por procurar num comércio local tomate coração de boi bem maduro. Depois fui à procura de pão de crnteio de boa consistência. Tenho grande confiança no que é feito pelo Museu do Pão e que se vende já fatiado. A seguir peguei na minha maionese preferida e coloquei numa tigela duas colheres de sopa, que temperei com pimentão doce fumado, mexendo tudo muito bem. Barrei duas fatias de pão de centeio com esta maionese temperada e, depois, dispus as rodelas de tomate, não demasiado grossas, nem demasiado finas, por cima de uma das fatias. Temperei o tomate com uma pitada de sal, e algumas folhas de manjericão, tapei com a outra fatia de pão, cortei ao meio em dois pedaços. Entretanto para entrada tinha preparado uns figos pingo de mel, partidos ao meio e acompanhados por umas farripas de presunto. Juntei num tabuleiro os figos à sanduíche e sentei-me ao ar livre com um copo de cerveja bem fresca. Um petisco.
DIXIT - “Portugal não é bem um país, é uma sala de espera” - Ricardo Araújo Pereira.
BACK TO BASICS - “Não vale a pena ir por caminhos já percorridos, é preferível abrir um trilho novo e deixar uma marca” - Ralph Waldo Emerson
SEM RÓTULOS - A situação criada pelas eleições espanholas é um bom pretexto para pensarmos na necessidade de rever o modo como os maiores partidos fazem as suas alianças. Tradicionalmente o que acontece é que replicam blocos à esquerda e à direita, em vez de procurarem entendimentos que garantam estabilidade e possam permitir reformas profundas. Privilegiam a rivalidade à avaliação da competência. Ainda por cima, em nome de uma superioridade moral que há muito deixou de existir, a esquerda impõe regras de alianças à direita que ela própria rejeita. Ao maior partido da esquerda é permitido aliar-se com extremistas do seu lado político, alguns deles com uma história de desprezo pela democracia, mas qualquer aliança à direita é logo apelidada de pecado. Durante as eleições espanholas Alberto Feijóo, líder do Partido Popular, o mais votado no acto eleitoral, propôs a Pedro Sánchez que ambos procurassem uma plataforma comum de entendimento para o Governo, com uma larga base de apoio. Tal como Costa fez há uns anos por cá, Sánchez escolheu aliar-se a extremistas, incluindo partidos saídos de organizações terroristas e separatistas. O mais absurdo é que este comportamento da esquerda mostra que existe um esforço de apagamento de um facto: na Europa, nos últimos 50 anos, foram mortas mais pessoas por organizações que se reclamam de esquerda do que de qualquer outro espectro político. A instabilidade dos sistemas de rivalidade entre dois blocos não é só um problema da Europa. Nestes dias li notícia de criação, nos Estados Unidos, de um movimento que reflecte sobre a necessidade de criar plataformas de entendimento alargadas. O nome é bem achado, No Labels, Sem Rótulos numa tradução livre, mostrando logo que rejeitam catalogações. Inclui destacados membros do Partido Democrático e do Partido Repúblicano. O movimento já divulgou um manifesto e organizou e está a realizar debates em vários Estados. Está em cima da mesa a possibilidade de o No Labels se apresentar a actos eleitorais e uma sondagem feita por uma Universidade indica que um quinto dos eleitores registados votariam por um partido de ”fusão”, como o New York Times classifica o No Labels. No fundo, a proposta é colocar a competência das pessoas à frente das rivalidades partidárias e garantir uma alargada base de apoio. A mim parece-me uma boa ideia, até agora a melhor para que a Democracia recupere dinamismo e o sistema político e partidário se regenere. E isto seria um bom ponto de partida para a criação de um Think Tank, sem rótulos.
SEMANADA - Os juros variáveis do crédito à habitação subiram 80% para dois milhões de famílias; na última década uma em cada cinco casas construídas é para férias e outras utilizações que não habitação permanente; um estudo da Pordata sobre os jovens portugueses entre os 15 e os 24 anos conclui que 95% deles vive com os pais (em 2004, eram 86%) e 60% tem um vínculo de trabalho precário; segundo o mesmo estudo, Portugal é o sétimo país da UE com maior desemprego jovem; as estimativas demográficas do INE para 2022 indicam que, em Portugal há 1 083 445 pessoas com idade entre os 15 e os 24 anos, 10.4% da população total; nos últimos 31 anos, Portugal perdeu 527 mil jovens nesta faixa etária, passando de um total de 1,6 milhões em 1991 para os atuais um milhão; apenas um terço dos 56% dos jovens entre os 14 e os 30 anos dizem-se religiosos,e apenas um terço é praticante; o número de candidatos ao ensino superior cresceu face ao ano passado; o número de reclamações dirigidas ao Ministério da Educação aumentou 285% entre janeiro e julho deste ano, em relação ao mesmo período de 2022; em termos médios 75% da prestação da casa são juros pagos aos bancos; os cinco maiores bancos lucraram onze milhões de euros por dia no primeiro semestre deste ano; o preço médio de venda da gasolina 95 simples em Portugal foi no segundo trimestre superior em 4,7 cêntimos por litro aos valores médios na UE; segundo a Netsonda, 98% dos portugueses estão sempre, ou quase sempre, atentos a descontos e promoções na compra de produtos alimentares em supermercados; a economia portuguesa estagnou no segundo trimestre face aos primeiros três meses do ano.
O ARCO DA VELHA - Por dia há quase 900 multas por excesso de velocidade em Lisboa.
A MAGIA DA PINTURA - Ruy Leitão , um artista precocemente desaparecido, ainda antes dos 30 anos, no final da década de 70 do século passado, deixou uma obra significativa. O Centro de Artes Manuel de Brito, que fica no nº 113 do Campo Grande, onde nasceu a Galeria 111, tem até final do ano uma exposição (na imagem) com dezenas das suas obras, que lhe é dedicada - “Ruy Leitão, Com Alegria”. Por ocasião de uma exposição realizada em 1994, Maria Filomena Molder escreveu estas palavras: “Encontramos nas suas obras, e justamente devido à exatidão, à mestria com que se domina o afeiçoamento de cada um dos materiais e técnicas utilizados e os movimentos da mão, um poder mágico, uma eficácia sensível imediata, que determina a transformação do objeto de arte em caminho redentor”. Outros destaques: em Coimbra, no Centro de Artes Visuais (CAV), pode ver até 10 de setembro uma exposição baseada na colecção desenvolvida pelos Encontros de Fotografia de Coimbra e que inclui nove dezenas de fotografias de nomes como Horst P. Horst, Debbie Fleming Caffery, Walker Evans, Weegee, Raymond Pettibon, Lyalya Kuznetsova ou Marianne Mueller, entre outros, numa mostra que se centra na auto-representação e no retrato, com curadoria de Miguel von Hafe Pérez, responsável pela programação do Centro de Artes Visuais durante os próximos quatro anos. Em “auto & retrato”, é possível acompanhar o caminho que a fotografia foi fazendo ao longo do tempo, numa exposição que põe em diálogo artistas nacionais e internacionais e fotógrafos de diferentes períodos; e no Museu do Neorealismo, Vila Franca de Xira, apresenta “Uma Poética Neo Realista”, exposição dedicada à obra de Querubim Lapa. Finalmente no Porto e até 9 de Setembro, a Galeria Fernando Santos apresenta uma colectiva com nomes que vão de Álvaro Lapa e Costa Pinheiro a Pedro Cabrita Reis, Pedro Calapez, Ana Vidigal, Bertholo, Rui Sanches, Sandra Baía ou José Loureiro, entre outros.
AS ÚLTIMAS COISAS - Geoff Dyer escreveu, usando as suas próprias palavras, um livro “sobre as últimas coisas”, ou seja um livro sobre aquilo que podíamos não ter lido ou experimentado antes de morrer. O livro chama-se “Os Últimos Dias de Roger Federer E Outros Finais”, tem uma tradução de Bruno Vieira do Amaral e, recorrendo mais uma vez às palavras de Dyer: «Haverá alguma vez um exemplo mais angustiante do que Roger a servir na final de 2019 em Wimbledon contra Djokovic com 8-7 no quinto set? […] Foi uma derrota particularmente difícil e pesada.» Geoff Dyer explora os últimos dias, as últimas obras ou as obras tardias de escritores, pintores, músicos, cineastas e estrelas do desporto que marcaram a nossa memória. Com charme, ironia e inteligência, revê o colapso de Friedrich Nietzsche em Turim, as reinvenções de antigas canções de Bob Dylan, a pintura de Turner com a sua abstração harmoniosa, a ressurreição tardia de Jean Rhys, as derradeiras melodias de John Coltrane, mas também os últimos quartetos de Beethoven, os poemas finais de Larkin ou as últimas canções dos The Doors, o último sopro criativo de Walter Scott, Joyce, Updike ou David Foster Wallace. O livro percorre um vasto catálogo dos tópicos preferidos de Dyer, que vão do rock à história militar.
GUITARRADA - O disco que hoje recomendo é para os amantes da guitarra. Neste disco há dois instrumentos: a guitarra e as mãos de quem a toca, Ralph Tower. O álbum chama-se “At First Light” e é um disco maravilhosamente simples, um solo de guitarra acústica tocada por um dos grandes nomes do jazz. Towner começou a gravar em 1970 para a ECM, a editora fundada por Manfred Eicher, que desde o início tem um compromisso com a qualidade técnica das suas gravações. Os padrões de qualidade, desde a gravação, à edição, passando pelas capas, têm-se mantido ao longo dos anos e Towner, hoje com 83 anos, continua a seguir a cartilha que o trouxe a esta editora. “At First Light” inclui 11 temas, todos originais de Towner, à excepção de três - o tradicional “Danny Boy”, o clássico standard de Jule Styne “Make Someone Happy” e “Little Old Lady”, de Hoagy Carmichael. Nas notas da capa do disco Towner explica que estes temas o influenciaram quando começou a tocar guitarra. De entre os temas originais destaque para “Fat Foot”, “At First Light” e “Flow”. Editado pela ECM, disponível nas plataformas de streaming.
BARES - Há uma tradição portuguesa de fazer longos almoços sob o pretexto de uma conversa. Eu gosto muitas vezes de almoçar sozinho, ganhando um tempo de equilíbrio a meio do dia; e agrada-me a ideia de desafiar um amigo para uma conversa de fim de tarde num bar de hotel - pouco barulho, competência no acolhimento e na execução dos pedidos. Estou a falar de hotéis com bares onde existam barmen que sabem o que fazem. Há pouco tempo estive na cavaqueira amigável no balcão do bar do recente Hotel das Amoreiras, no jardim homónimo, e fiquei agradado com o cuidado posto pelo barman na preparação de um dry martini - com todos os preceitos e segundo as melhores práticas. Um bar de hotel é um sítio pensado para se estar sossegado - pode usufruir-se do conforto de um grande hotel sem ter que lá dormir. Uns tempos antes tinha estado num fim de tarde no bar do Sheraton, onde pedir uma flûte de Murganheira bruto é um pedido recolhido com atenção e competência e onde também se pode petiscar alguma coisa a acompanhar. E há uns anos era frequente marcar reuniões no bar do Ritz - onde aliás numerosas figuras da política e negócios passavam a tarde, como se de um escritório se tratasse, a receber pessoas para conversas sabe-se lá de quê, umas atrás das outras. Se os bares dos hotéis falassem…
DIXIT - “Entre greves, inoperância e burocracia, os tribunais mostram-se cada vez mais incapazes de assegurar níveis aceitáveis de justiça” - António Barreto.
BACK TO BASICS - “Dizer o que pensamos é como cavar a própria sepultura” - Sinead O’Connor
FIM DE TEMPORADA - Esta semana nasceu um novo folhetim: um Conselho de Estado em episódios. No primeiro episódio um dos protagonistas, António Costa, chegou tarde e já tinha avisado que teria de sair cedo, já que teria de apanhar o avião para ir ver um jogo de futebol à Nova Zelândia, no caso a estreia da Selecção portuguesa de futebol feminino no Campeonato do Mundo. Simpatizo com a ideia de o Governo acompanhar as selecções nacionais - mas não bastaria o Secretário de Estado da Juventude e Desportos para representar o país? Fica a parecer que o Primeiro-Ministro aproveitou o pretexto para não ter que dar a atenção devida ao Conselho de Estado, onde várias vozes iriam criticar a acção do seu Governo. O resultado é que face à pressa de António Costa, Marcelo Rebello de Sousa adiou a sua própria intervenção, para a qual, rezam as notícias entretanto surgidas, desejava uma resposta desenvolvida de António Costa e agendou novo episódio do Conselho de Estado para Setembro, colocando em banho maria um debate sobre o estado da nação mais sério, e menos demagógico, do que aquele que Costa protagonizou no Parlamento, perante a fraqueza das oposições. Costa, já se sabe, é bom orador, bom tribuno, e não hesita em torcer a verdade e os factos por forma a que tudo pareça estar pelo melhor. Mas arranjou forma de se escapulir quando tinha pela frente uma mesa onde estavam analistas e políticos com experiência. O Conselho de Estado tinha sido marcado pelo Presidente da República numa data posterior ao debate sobre o Estado da Nação, não certamente por acaso. O súbito interesse de António Costa pelo futebol feminino veio baralhar as coisas e esvaziar o que Marcelo pretendia. Um artista.
SEMANADA - Rui Rio disse que não abriu a porta à PJ porque dorme com tampões nos ouvidos e não ouviu nada; a filha diz que ouviu, mas não abriu a porta porque não permite a entrada a estranhos; as subvenções aos grupos parlamentares aumentaram 16% nas últimas cinco legislaturas; um sondagem do DN indica que 54% dos jovens portugueses admite sair do país num futuro próximo por falta de perspectivas de trabalho, a maioria não participa em actividades de partidos ou sindicatos e não faz voluntariado; a Presidência da República ainda não criou um inventário único de bens como recomendado pelo tribunal de contas desde 2019; 255 pessoas fizeram cirurgias para mudança de sexo nos últimos cinco anos e em Coimbra a lista de espera para essa intervenção ultrapassa 18 meses; 36% do solo em Portugal continental, cerca de três milhões de hectares, é ocupado por floresta; o PIB per capita de Portugal é o oitavo mais baixo da Europa e já está atrás da Lituânia, Estónia e Roménia; O filme “Barbie”, de Greta Gerwig, foi o mais visto em Portugal no fim de semana de estreia, com 189.709 espectadores e mais de 1,1 milhões de euros de bilheteira, revelou o Instituto do Cinema e Audiovisual; o endividamento de Portugal atingiu o valor mais alto de sempre, 804,4 mil milhões de euros o que significa que cada português deve em média mais de 77 mil euros; em junho a procura por Certificados de Aforro caíu 70% depois da diminuição das taxas de juros; em 2022, no hospital de S. José, foram tratados 995 feridos em acidentes com trotinetas.
O ARCO DA VELHA - As contas dos partidos e dos grupos parlamentares não são fiscalizadas desde 2018.
VISÕES DE FOTOGRAFIA - Até Janeiro, no Museu de Arte Contemporânea de Elvas, MACE, está patente a segunda parte de “Contravisões”, a mostra das obras de fotografia na colecção de António Cachola: A exposição tem curadoria de Sérgio Mah, que, num texto sobre a exposição, assinala a importância do núcleo de fotografia da colecção, “que cobre diversos géneros e tipologias, e onde coexistem predisposições que apontam para um campo mais estritamente fotográfico com inúmeros exemplos de articulação e de hibridação da fotografia com outras artes visuais”. Ao todo, nas duas partes de “Contravisões” estão representados cerca de 50 artistas. Nesta segunda parte existem obras de, entre outros, André Gomes, André Romão, António Júlio Duarte, Augusto Alves da Silva, Cristina Ataíde, Edgar Martins, Gabriel Abrantes, Henrique Pavão, Igor Jesus, João Tabarra, Jorge Molder, Julião Sarmento, Luís Palma, Manuel Botelho, Paulo Catrica, Rita GT, Rui Toscano e Mónica De Miranda, que aliás é a autora da imagem aqui reproduzida, “Twins”, da série Cinema Karl Marx, 2017. Entretanto a primeira parte de “Contravisões”, pode ser vista até 29 de Setembro no átrio principal do edifício sede da Caixa Geral de Depósitos em Lisboa e inclui obras de André Cepeda, Nuno Cera, João Paulo Serafim, Daniel Blaufuks, Patrícia Garrido, José Maçãs de Carvalho ou Salomé Lamas entre outros. Ainda em Elvas, na Cisterna, e no âmbito das actividades do MACE, podem ser vistas até 30 de Setembro duas obras de Rui Sanches, uma de 2016 e outra de 2018. Permanecendo no Alentejo, em Évora, na Fundação Eugénio de Almeida pode ver até final de Dezembro, fotografias e videos de Paulo Catrica, Rita Barros e Virgílio Ferreira na exposição “No Tempo dos Dias Lentos”.
RIVALIDADES PERIGOSAS - Bem sei que não está muito calor ainda, mas venho recomendar uma leitura gelada. Melhor dizendo, o relato de uma disputa passada numa região rural da Suécia, entre duas aldeias separadas por uma floresta e por uma rivalidade feroz entre as respectivas equipas de hóquei no gelo, Björnstad e Hed. “Nós Contra os Outros” é uma história que envolve as dificuldades das regiões do interior, a ameaça de encerramento de uma fábrica com as consequentes repercussões na economia local, as ligações que se tecem entre a política, o desporto e as empresas. Mas também a forma como as populações reagem a quem foge à norma, como reagem a que uma equipa de hóquei no gelo masculina seja treinada por uma mulher, o que acontece quando descobrem que o capitão da equipa e um dos seus melhores jogadores é homossexual. Pelo meio há ameaças, agressões, mortes, sempre com o hóquei no gelo como pano de fundo. Há frases ao longo do livro que são lições de vida: “o poder é a capacidade de levar os outros a fazer aquilo que queremos”; ou, “ser líder é tomar decisões difíceis, desagradáveis e impopulares”; e também: “o problema, tanto com as pessoas boas como as más, é que a maior parte de nós é as duas coisas ao mesmo tempo”. E esta, na última página do livro e que resume o que é o hóquei no gelo: “ é um jogo simples se tirarmos todas as porcarias que o rodeiam e guardarmos apenas aquilo que nos faz amá-lo ao princípio. Toda a gente tem um stick. Duas balizas. Duas equipas. Nós contra os outros”. Fredrik Beckman, o autor, escreveu já sete romances, duas novelas e um livro de não ficção. É o autor de “Um Homem Chamado Ove”, que já elogiei nestas páginas e ao todo as suas obras já venderam mais de 19 milhões de exemplares, traduzidos em 46 línguas. “Nós Contra os Outros” foi publicado pela Porto Editora.
NINA AO VIVO - Sabem quem é Eunice Kathleen Waymon? Este nome não vos dirá nada, mas se souberem que se tornou conhecida sob o nome artístico de Nina Simone o caso mudará de figura. Nascida em 1933, tornou-se uma das grandes cantoras da América e o seu repertório passeou-se entre os blues e o jazz, com incursões na soul e no gospel. Pianista, compositora, cantora, o nome Simone veio da sua admiração pela actriz francesa Simone Signoret. O seu primeiro álbum data de 1958, “Little Girl Blue” e o derradeiro “A Single Blue”, de 1993. Morreu em 2003 e, de então para cá, têm sido reeditados vários dos seus êxitos. Ao todo gravou quatro dezenas de álbuns e deu material para dezenas de colectâneas. Interpretou temas seus e de outros compositores. Pelo meio foram também descobertas várias das suas gravações ao vivo, a mais recente das quais, editada pela primeira vez, é um registo inédito de uma actuação no Festival de Newport em Julho de 1966, um momento alto da sua carreira. “You’ve Got To Learn - Live” é o nome desse disco, que inclui seis temas gravados ao vivo nessa ocasião: “You’ve Got To Learn”, “I Love You Porgy”, “Blues For Mama”, “Be My Husband”, “Mississippi Goddam” e “Music For Lovers”. O organizador do festival de Newport, George Wein, doou as fitas da gravação do concerto de Nina Simone à Library Of Congress dos Estados Unidos, onde estiveram esquecidas até há pouco tempo, tendo sido descobertas por uma das pessoas que se têm estudado a carreira de Nina Simone, Nadine Cohodas. Nestas gravações, com boa qualidade, Nina Simone é acompanhada pelo guitarrista Rudy Stevenson, o baixista Lisle Atkinson e o baterista Bobby Hamilton. O disco está disponível nas plataformas de streaming e constitui uma homenagem editada este ano, quando Nina Simone completaria 90 anos.
PROVAR - Em Alfarim, quase a chegar a Aldeia do Meco, na Avenida José Carlos Ezequiel, junto ao largo da Igreja, encontra-se uma bela esplanada, colorida e festiva que dá pelo nome de “Muito Espalhafato”. Trata-se de uma petiscaria onde também se pode agora pedir algo mais substancial que as tábuas de queijo e enchidos que têm feito a fama da casa. No comando das operações está um casal que é uma garantia de hospitalidade: a Lai e o Francisco Completo. Antes de entrar nas comidas deixem-me dizer que para além da esplanada o interior oferece um mundo de artigos de decoração, móveis e até roupa. Nas refeições têm feito sucesso as bochechas de porco preto, tenríssimas, e o pica pau de lombo. Por vezes há ostras, por vezes há peixinhos da horta, quase sempre a entrada pode ser um cogumelo portobello de bom porte recheado de alheira e doce de abóbora ou um carpaccio temperado com maracujá. Enquanto a comida chega há pão da região com um azeite delicado de Proença-A-Nova, de onde vem também, na época apropriada, um bucho de alta qualidade. Numa recente visita a mesa experimentou, além das entradas, um tártaro de atum fresco envolvido em abacate e um vol au vent de pato confitado, acompanhado de endívia aos pedaços. Para o fim veio um arroz doce de tangerina e uma boa sobremesa de chocolate. Quanto ao vinho, deixem a escolha na mão do Francisco que as suas recomendações são boas e honestas no preço - no caso foi um branco Sem Segredos, do Douro. Reservas e Informações, ligue 962 902 234
DIXIT - “Saíram 13, por mim tinham saído mais” - Carlos César, Presidente do PS, sobre o número de membros do Governo que já se demitiram.
BACK TO BASICS - “O mistério de qualquer Governo não é saber como funciona e sim como se pode parar” - P. J. O’Rourke
A NUDEZ DO REI - Este rectângulo à beira mar plantado é um emaranhado de casos insólitos, onde a realidade ultrapassa a ficção e a responsabilidade e a coerência são inexistências. Confrontado com indícios de corrupção no Ministério da Defesa, António Costa disse que essa não era a preocupação principal das pessoas. Seguiu-se uma pequena tempestade, obviamente urdida na “bolha político-mediática”, que hoje em dia é a mãe de todos os males: curiosa situação esta em que os factos não são assumidos como a causa dos problemas, mas as reacções a esses factos são consideradas malfeitorias. A propósito ocorreu-me isto: a política só é lugar de crime quando quem a pratica comete crimes, mas não vejo ninguém na direcção dos partidos reconhecer esta evidência. O ladino Ministro da Cultura, Adão e Silva, agora investido em amplificador das palavras de Costa, empinou-se a criticar a bolha e rezou a lengalenga dos casos e casinhos, jurando sempre as boas intenções do Governo. E António Costa, tal vestal a caminhar para o sacrifício de algum cargo internacional, declarou-se incompreendido no que queria ter dito. Sucessivamente incompreendido, digo eu, já que, tantas vezes, o que diz não corresponde ao que se passa - ou que ele imagina que pensou. Mas o insólito não é acolhido só no PS. Do lado do PSD constata-se, por escutas gravadas numa investigação policial, que um deputado, no exercício de anteriores funções de autarca, estabelecia o módico valor de 25 mil euros por cada acto de favorecimento que cometesse. E o facilitador lá tem estado ainda sentado no Parlamento, dois meses depois de tudo isto se saber, com o líder do PSD a confessar-se impotente para resolver a situação. Cereja no topo do bolo: a corte política de múltiplos sectores do regime uniu-se em torno da justeza de utilização de verbas parlamentares para desígnios partidários e insurgiu-se contra quem acha estranha a coisa, que, sendo prática corrente, não será legal. Como escreveu Susana Peralta, a propósito de Rui Rio, "para uma pessoa que nos prometeu um banho de ética, é curioso que não perceba que uma prática ser comum não a torna aceitável; pelo contrário: só piora a gravidade dos factos.” Não é o rei que vai nu, é o regime.
SEMANADA - O Conselho de Finanças Públicas alertou para o facto de a execução do PRR estar muito abaixo do previsto e em 2022 o Orçamento de Estado gastou apenas um quarto das verbas da bazuca que estavam inscritas; o secretário geral da CAP alertou para o facto de o PRR não contemplar investimentos na área da eficiência hídrica, nomeadamente em relação à agricultura; as obras na linha circular do Metro de Lisboa têm um atraso de 30 meses em relação ao previsto, confirmou o presidente da empresa; as exportações portuguesas tiveram um recuo de 6,9% em Maio, em comparação com o mesmo mês do ano anterior; o crescimento de vendas da Porsche em Portugal no 1º semestre foi de 34,1%, número que compara com os 15% de aumento que a marca registou a nível global; em 2022 foram feitas 168.000 transações imobiliárias, um novo recorde; os pedidos de despejo aumentaram mais de 20% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado; há dez anos que a média a matemática do exame do 9º ano não era tão baixa e este ano quase 60% dos alunos não chegaram à nota positiva; mais de 40% dos atropelamentos registados em Portugal ocorrem em passadeiras e Portugal é o país da Europa com mais mortes de peões; os bancos e financeiras emprestaram quase 3,2 mil milhões de euros com a finalidade de consumo nos cinco primeiros meses do ano, o que representa o valor mais elevado desde 2013; 3400 professores aposentaram-se no ano lectivo passado; no primeiro semestre de 2023 em Portugal, verificou-se um aumento de 6% no número de nascimentos, em comparação com o período homólogo.
O ARCO DA VELHA - Notícias da justiça: um processo judicial considerado simples arrastou-se durante 11 anos, arruinou uma firma familiar do Cartaxo e provocou três dezenas de despedimentos.
PINTURA E FOTOGRAFIA - Na Galeria Cristina Guerra Contemporary Art pode ser vista até 2 de Setembro uma das mais interessantes exposições patentes em Lisboa. Trata-se de “Neo-Pós-Neo”, de Mariana Gomes, um conjunto de nove obras de pintura, inesperadas, marcantes, com cores vivas, formas soltas, como se cada uma tivesse vida própria. E, no entanto, elas estão no espaço de uma tela, inequivocamente fruto de um trabalho diligente e criativo de pintura, que não é frequente encontrar hoje em dia. Passando da pintura para a fotografia, há várias sugestões. Começo por aquela que mais me marcou - “Volterra, Portraits of Local People”, de Eurico Lino do Vale, uma série realizada em 1997 na Toscânia e que agora é exposta, até 16 de Setembro, pela primeira vez na Galeria Belard, um espaço recente localizado na Rua Rodrigo da Fonseca 103. Como escreveu João Pinharanda, “as fotografias de Eurico Lino do Vale ocupam-se de personagens, e não de cenários” e o resultado é marcante. A seguir sugiro “Interior”, de Ricardo Lopes, um ensaio fotográfico sobre o despovoamento da Região Centro, uma visão da ruralidade portuguesa. O trabalho recebeu a Bolsa Estação Imagem em 2020, além de ter sido distinguido internacionalmente no LensCulture Portrait Awards. Está na Casa da Imprensa até 28 de Julho (Rua da Horta Seca 20). “Fading”, de Luís Campos, é uma exposição sobre a memória e o desaparecimento. Trata-se de um conjunto de fotografias de animais selvagens no seu habitat natural, tiradas ao longo de 12 anos em 14 países. São fotografias a preto e branco, com uma elipse preta esbatida à volta de uma imagem central, que alude a um processo cinematográfico de desaparecimento da imagem. Até 16 de setembro na Galeria Carlos Carvalho (R. Joly Braga Santos, Lote F).
LER PORTUGUÊS - Quem gosta de livros gostará desta síntese das principais obras e autores desde o início da escrita em língua portuguesa até aos anos 70 do século XX. Originalmente escrito em 1971, “Literatura Portuguesa - Das Cantigas de Amigo às Vanguardas do Século XX” é um ensaio escrito por Jorge de Sena em 1971 para a 15ª edição da Enciclopédia Britânica. O texto original é agora publicado em edição autónoma pela Guerra & Paz e o editor considera-a “a mais justa, a mais inteligente, a mais exaltante história já escrita da nossa literatura”. São cerca de cem páginas que deveriam ser matéria de conhecimento geral para todos. São de Jorge de Sena estas palavras: “O século XVI, durante o qual Portugal atingiu o seu máximo em poder imperial, foi uma Idade de Ouro na Literatura Portuguesa, e muitos autores e obras foram na altura importantes no desenvolvimento das literaturas ocidentais. Mas desde cerca de 1200 até 1350 já Portugal tinha criado um dos mais importantes corpus de poesia lírica e satírica da Idade Média numa língua que se tornou quase universalmente aceite na Península Ibérica como o veículo literário das composições líricas de quase três décadas”. Na parte final do ensaio surgem nomes como Natália Correia, David Mourão-Ferreira, Herberto Hélder e Luis de Sttau Monteiro. O livro aborda ainda, num capítulo separado, outra literatura escrita em português - a brasileira, lembrando a importância de nomes como Mário de Andrade, Gilberto Freyre, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Sérgio Buarque de Holanda, Erico Veríssimo, Vinicius de Moraes e Jorge Amado.
MÚSICA MELOSA - Jaime Fernandes, um dos grandes radialistas portugueses, tinha em tempos um programa dedicado à country music e foi aí que aprendi a gostar deste género musical. Lembrei-me disto ao ouvir “One Thing At A Time”, o terceiro álbum de Morgan Wallen, um músico country que está a ser um caso de sucesso. “Last Night”, um dos temas deste disco, ocupou o primeiro lugar do Hot 100 chart do Billboard durante 13 semanas, algo que é uma raridade - desde que a tabela existe, apenas 15 canções conseguiram essa proeza. O álbum, pelo seu lado, esteve durante 15 semanas à frente da tabela de vendas de discos da revista Billboard, desde que foi editado em Março passado. Wallen mostra que existe um ressurgimento na música country, depois de um progressivo apagamento ao longo dos últimos anos. O consumo de música country nas plataformas de streaming cresceu 20 por cento desde o início deste ano. O álbum de Wallen tem 36 canções - o seu disco anterior tinha 30. Os temas das canções são recorrentes: engates, copos, noitadas, paixonetas variadas. O novo disco tem duas horas disto, canções sentimentalonas, alegres, de festa, choramingas, de abandono, doridas, de ressaca. Disponível nas plataformas de streaming.
PETISCO - Gostam de comer moluscos cefalópodes cozidos com ervas aromáticas? Não torçam o nariz - são apenas caracóis, biologicamente ainda aparentados com as lesmas. As suas conchas, que atacamos de palito em punho, são o seu esqueleto externo. Se olharem para a cabeça dos caracóis quando os estão a comer verão os olhos na ponta dos corninhos e saibam que ao lado da boca fica o aparelho genital - atenção que são hermafroditas e para fecundar formam casais e copulam em média 4 vezes por ano num acto que pode durar até dez horas. Não comecem agora com más ideias e limitem-se à iguaria que, nesta altura do ano, é um pratinho de caracóis cozidos e temperados como deve ser. A maioria destes petiscos que comemos ao longo do verão são oriundos de Marrocos. A boa maneira de os cozinhar, depois de muito bem lavados durante uns 20 minutos, é colocá-los numa panela e tapá-los com água. Devem cozer em lume brando por uns dez minutos. Ao fim deste tempo pode adicionar sal, azeite, dentes de alho esmagados, cebola picada, folha de louro, orégãos e, em querendo, piripiri. Suba o lume e quando levantar fervura deixe estar cinco minutos e depois desligue e deixe arrefecer uns 15 minutos para que ganhem bem o gosto do tempero. Em Lisboa, para além do Menino Júlio dos Caracóis, uma casa de referência, sportinguista, é o Lutador, perto de Alcântara, Rua da Junqueira nº1, com uma bela esplanada. Ou então o Pomar de Alvalade, na rua Marquesa de Alorna. Acompanhamento? Uma imperial bem tirada. Às vezes remata-se com um prego no pão. Aqui está a happy hour lisboeta de verão por excelência.
DIXIT - “Há problemas que a democracia não pode e não sabe resolver. Um deles é a corrupção partidária. Outro é a crise da justiça” - António Barreto.
BACK TO BASICS - “Numa altura em que a desilusão prolifera, dizer a verdade é um acto revolucionário” - George Orwell
EQUÍVOCOS DEMOCRÁTICOS - A autora do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP, a deputada do PS Ana Paula Bernardo, é uma séria candidata ao prémio de ficção do ano, uma especialista em não contar o que se passou, em não descrever aquilo a que assistiu, em ocultar factos e manipulá-los. O mais chocante é que a senhora não teve hesitações em alterar a realidade e criar a fantasia que mais lhe interessava para agradar aos seus superiores. A sua atitude é, além do mais, um insulto a todos quantos seguiram as audiências daquela Comissão Parlamentar e sabem o que de facto se passou. E é um insulto aos deputados que na Comissão trabalharam para esclarecer as pouco edificantes cenas recentes que cresceram à volta da Tap, de Pedro Nuno Santos, de Alexandra Reis, de Fernando Medina e de João Galamba. Até do próprio PS vieram protestos pela forma como o relatório está escrito. Este é mais um daqueles casos em que se percebe o perigo manifesto da maioria absoluta quando mal utilizada. Mas eis que, face aos protestos vindos de membros de todos os partidos, sem excepção, apareceu o ex comentador desportivo e propagandista político do PS, actualmente a desempenhar o papel de Ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, a acusar os deputados daquela Comissão de serem eles os protagonistas de um filme de fraca categoria. Perante a reacção de figuras do PS, como o Presidente da Comissão, António Lacerda Sales, o dito comentador desencadeou nova série de ataques tornando-se assim ele próprio o protagonista de um reality show que acusou outros de fazerem. Como disse um deputado do PS, Adão e Silva desempenha agora o papel que Santos Silva teve durante uns anos e que agora já não pode fazer. Ambos são um equívoco da democracia. Encaixam bem num primeiro-ministro que, perante mais uma demissão do governo, insinuou que para os portugueses a corrupção na política é um tema sem interesse.
SEMANADA - Quase metade dos reclusos em Portugal estão em cadeias sobrelotadas; os turistas vindos dos EUA representam 42% do aumento de turistas entre Janeiro e Maio; este ano o sector do Turismo poderá contribuir com 16,8% do PIB, representando 40,4 mil milhões de euros; em metade dos dias do primeiro semestre deste ano houve greve da CP; de janeiro a maio foram comunicados 754 pré-avisos de greve no país, o equivalente a 70% do total de greves do ano passado; a taxa de juro média de novos empréstimos à habitação alcançou 4%, o maior valor desde 2012; em 2022 foram criadas em Portugal 3080 startups, mais do dobro face a 2013; dos 3.940 incêndios rurais registados entre Janeiro e Junho, apenas 1% se deveram a causas naturais; em 2022 foram enviados a partir de Portugal 7400 milhões de euros para paraísos fiscais, o valor mais alto em quatro anos; há 7802 pedidos de vistos Gold à espera de aprovação; o ministro Galamba desclassificou 101 dos 105 documentos que há semanas atrás apontou como segredos de Estado, dizendo que o seu conteúdo não justifica que assim sejam considerados; o investimento publicitário em Portugal teve um aumento de 8% entre Janeiro e Maio, digital e publicidade exterior foram as áreas com maior subida e televisão generalista e rádio as que mais desceram; nas últimas duas décadas e meia, Portugal foi dos países da União Europeia que mais aumentaram as taxas máximas do imposto sobre o rendimento; a Iniciativa Liberal vai apresentar no Parlamento uma proposta de alteração à Lei Eleitoral, que cria um círculo de compensação, destinado a minorar os efeitos dos quase 700 mil votos desperdiçados nas mais recentes eleições; segundo o INE um quarto da população portuguesa tem mais de 65 anos.
O ARCO DA VELHA -A Entidade para a Transparência tomou posse há cinco meses e as instalações que lhe foram atribuídas pelo Governo, em Coimbra, ainda não têm água, luz, internet nem cadeiras.
A HISTÓRIA DE UM GÉNIO MUSICAL - Hoje, em vez de falar de um disco, venho falar de um livro sobre música. Trata-se de “A Vida de Beethoven”, de Romain Rolland. Publicado em 1903, este livro constitui uma belíssima descrição da vida e obra de Beethoven escrita com uma visão crítica dos factos, que enfatiza a empatia e a resistência do biografado. Para Rolland, Beethoven previu o futuro e assombrou o mundo com o seu talento, mas foi também um «homem forte e puro» envolto em sofrimento. Romain Rolland reconstitui os passos de Beethoven a partir de fontes primárias e testemunhos dos amigos do grande compositor, desde a infância na cidade de Bonn, onde nasceu em 1770, infância marcada pela educação severa imposta pelo pai, até à sua morte, em 1827, durante um temporal. Pelo meio estão episódios riquíssimos, descritos por Rolland como se de um romance se tratasse. O ouvido absoluto, que nem mesmo a surdez lhe roubou em definitivo, a morte da mãe, o alcoolismo do pai, a oportunidade que Joseph Haydn lhe deu de estudar em Viena, o processo de ensurdecimento, a composição das míticas nove sinfonias, o desgosto amoroso que Therese Brunswick lhe provocou, a degradação da sua saúde, mas também «do seu aspecto e dos seus modos», e, claro, o momento em que, a 7 de Maio de 1824, em Viena, surpreendendo tudo e todos, conseguiu dirigir a primeira audição da Missa em Ré e da Nona Sinfonia completamente surdo. A obra é complementada por uma selecção da correspondência de Beethoven e por algumas das suas citações mais famosas. Esta nova edição, da Guerra & Paz, tem tradução de Isabel Ferreira da Silva.
IMAGENS DE VIAJANTE - Cristina Ataíde continua a manifestar a sua preocupação com a acção dos homens sobre o planeta e esse é o tema central da exposição/instalação que apresenta, até 17 de Setembro, no Museu de Arte Contemporânea do Chiado, sob o título “A Terra Ainda É Redonda?”. No texto que escreveu para a exposição, o seu curador, David Barro, sublinha que “Cristina Ataíde ausculta as diferentes dimensões da alteração da matéria”, através de “obras de uma marcada presença escultórica”. E prossegue: “ São obras que se baseiam na transformação, capazes de poetisar o tempo e suas circunstâncias, mas também de questionar criticamente o nosso lugar no mundo”. Para o espectador é difícil isolar uma só peça desta exposição, tal a relação que elas naturalmente estabelecem entre si, relação que é potenciada pela montagem, que cria uma narrativa visual ao longo do espaço onde as obras foram colocadas. Existe como que um percurso incontornável, que vai em crescendo, explorando formas diversas mas complementares e que obriga a percorrer tecto, chão e paredes, a visitar recantos e a descobrir perspectivas. São 20 obras, todas datadas de 2023, cada uma com uma origem geográfica diferente que identifica a artista como uma viajante a explorar o seu universo.
O SALTO - Alexandre Melo, que se tornou conhecido como crítico, ensaísta, curador e professor de sociologia da arte e cultura, deu o salto para o outro lado e expôs-se na Galeria Balcony (Rua Coronel Bento Roma 12), onde mostra, até 16 de Setembro, “Alexandria”, um conjunto de quase duas dezenas de obras recentes, todas baseadas na recuperação de memórias vividas, temperadas com uma boa dose de imaginação na sua apresentação. Na realidade, trata-se da reprodução de colagens que fez a partir de recortes de notícias e imagens de jornais e revistas, de programas de espectáculos, de fotogramas de filmes, anúncios e cartazes, folhetos, rótulos, fotografias de alimentos, embalagens e por aí fora. Em muitas há a evocação de locais - os Estados Unidos, Itália, França, Inglaterra e ocasionalmente também Portugal. É a mistura de todas estas imagens - procurando em cada uma das colagens traçar encontros e sublinhar pontos comuns - que torna estas obras uma descoberta. Percorrer estes trabalhos é como folhear um livro de banda desenhada e deixar que a cada nova revisitação da página se descubram novos pormenores - é o que acontece quando se volta a percorrer a exposição. As obras apresentadas são fotografias únicas das colagens originais, impressões produzidas em 2023 de 18 trabalhos, seleccionados de um conjunto de 63, realizados em 2003 e em 2021/2022, “recorrendo a uma colecção de papéis impressos e materiais afins reunidos ao longo das últimas seis décadas”, para usar as palavras do autor. Na realidade não é a primeira vez que Alexandre Melo expõe, teve uma outra apresentação, menor, e no meio de uma mostra de que foi curador, no início deste século, na Galeria Cómicos, de Luís Serpa.
UMA DÉCADA - No Atelier Museu Júlio Pomar abriu na semana passada uma exposição que assinala os 10 anos de existência do espaço e que aproveita a oportunidade para apresentar obras e séries de trabalhos de Pomar que fazem parte do acervo do Museu, e também peças expostas pela primeira vez e que fazem parte do espólio da Fundação Júlio Pomar e dos herdeiros do artista. Destaque ainda para um conjunto de estudos e documentos alusivos às pinturas murais que Júlio Pomar fez no Cinema Batalha, no Porto, e que foram recuperadas no ano passado. Outro núcleo inclui retratos e autorretratos e também um conjunto de retratos do próprio Pomar feitos por amigos como Menez, Luísa Correia Pereira, Eduardo Luís ou Álvaro Siza Vieira. A exposição mostra ainda um bestiário de animais mais ou menos estranhos, um conjunto de quadros que partem de obras literárias que sempre foram uma fonte de trabalho para o artista, e de que dois bons exemplos, agora expostos, são “Cartilha do Marialva” e “Navio Negreiro”. Um outro núcleo mostra a abordagem de Pomar ao erotismo e os curadores, Sara Matos e Pedro Faro, sublinham que”nas obras agora expostas percebe-se como Pomar funde corpos e objetos estranhos, numa experiência absolutamente inovadora no seu percurso, que deixa de lado géneros, posições de força ou a natureza das relações”. Finalmente, em duas vitrines são mostradas fotografias de Pomar em momentos importantes da sua carreira e outros testemunhos, desde os cadernos com desenhos feitos na sua infância até documentos relativos à censura que foi exercida antes de 1974 sobre a sua obra. A exposição, que fica no Atelier Museu até 14 de Janeiro, tem um excelente cartaz, aqui reproduzido, da autoria de Joana Machado.
DIXIT - “ Confirma-se que a função do deputado é a de votar o que o seu grupo entende. E este, aprovar o que pretende o partido. E este último o que deseja o Governo” - António Barreto
BACK TO BASICS - “Eis ao que leva o intervencionismo do Estado. o povo converte-se em carne e massa que alimenta o simples artefacto que é o Estado” - Ortega Y Gasset
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