POLÍTICA – Uma das questões que marca estes últimos anos é a utilização de investigações policiais como arma de arremesso político e uma das coisas que marca as intervenções, nomeadamente da Judiciária e da Procuradoria Geral da República, é o aparato e o deliberado mediatismo de muitas das suas acções. Para complicar as coisas, numa enorme quantidade de processos investigados por estas entidades com grande alarde público, os resultados ficam aquém do estardalhaço provocado e constatam-se repetidas fragilidades formais na construção dos processos. Vivemos num país sem culpados nem inocentes, como bem fazia notar, em editorial, a subdirectora deste jornal, Luísa Bessa, há poucos dias. A forma como tudo se passa deixa as maiores dúvidas sobre a bondade da intervenção aparatosa da Polícia Judiciária na Câmara de Lisboa, assim como a conjugação de factos e acontecimentos permite criar interpretações políticas à actuação policial – desta suspeição já não se livram.
COINCIDÊNCIA – O alarde investigativo sobre a Câmara Municipal de Lisboa desencadeou-se na mesma semana em que a autarquia começou a protestar contra os cortes impostos pelo Governo nas transferências que eram devidas pela Lei das Finanças Locais – na verdade, unilateralmente, o Governo decidiu que Lisboa devia receber menos do que aquilo que a Lei prevê. Sou pouco dado a acreditar em coincidências: quando o estrangulamento financeiro surge ao mesmo tempo que uma investigação ruidosa, é porque está instalada uma guerra política com objectivos precisos - fazer cair o executivo camarário, provocar eleições e arrastar pela lama os opositores do Governo. E o actual poder, como se tem visto, não tem contemplações nem escrúpulos: o caso Cravinho é bem a prova da tentação absolutista. O PS está a especializar-se em usar a polícia para fazer política.
SISTEMA – Não é preciso ser especialista para perceber uma coisa: a capacidade de influência de promotores imobiliários e construtores nas autarquias e no sistema partidário tem aumentado nos últimos anos e a razão é simples, mas toda a gente prefere meter a cabeça na areia a falar dela: o financiamento de partidos políticos, e, no caso autárquico, o financiamento de campanhas eleitorais tem sempre, maioritariamente os mesmos protagonistas - aqueles que querem construir mais, deitar a mão a terrenos públicos, acelerar a crónica morosidade das decisões. A situação atinge todos os partidos há anos e a todos interessa manter. O financiamento da actividade política de forma ilícita – estimulado por uma lei utópica e por uma fiscalização infantil – é o cancro que corrói partidos e autarquias, mas ninguém quer falar dele ou pôr cobro à situação porque todos dependem da sua manutenção.
LER – No site da «Vanity Fair» procurem, na edição de Janeiro, o artigo «The Esquire Decade», de Frank DiGiacomo, uma viagem à época em que, nos anos 60, a «Esquire» se tornou numa referência, ajudou a lançar o «new journalism» e revolucionou a forma de editar fotografia e fazer capas: na origem de tudo esteve um homem, Harold Hayes, e é ele o tema central deste belo artigo que todos os que gostam de revistas deviam ler em www.vanityfair.com .
OUVIR – Há franceses que devem estar a arrancar cabelos: a única cantora decente que apareceu a cantar em francês nos últimos dez anos, Carla Bruni, resolveu ao segundo CD mudar para a língua inglesa e fez um disco onde musicou poemas de autores como Dorothy Parker, William Butler Yeats, Emily Dickinson, Wystam Auden, Walter de la Mare ou Christina Rossetti. O resultado é fascinante e a voz de Bruni continua surpreendente, sensual, envolvente. Carla Bruni, CD «No Promises», edição Naive.
VER – A exposição, perturbante e inesperada, de Gustavo Sumpta, na VPFcreamarte (Rua da Boavista 84-2º, Lisboa) intitulada «Quando se reúne muito, trabalha-se pouco», que coexiste com algumas peças do acervo da Galeria, como quadros de Inez Teixeira, Ana Cardoso, João Fonte Santa e uns preciosos desenhos de Jorge Feijão.
BACK TO BASICS – A coisa mais importante em política é ter uma memória curta – John Kenneth Galbraith
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GULAG – Os grandes organismos internacionais estão em vias de se tornarem numa espécie de Gulag dourado para as vozes incómodas ao socratismo. Depois de Ferro Rodrigues, aí vai Cravinho para Londres e, sabe-se agora, Carrilho para Paris. Esqueçam as aparências – isto não é uma distribuição de benesses aos companheiros de partido, é uma maneira de limitar as oposições internas e as memórias socialistas daqui a ano e meio, quando se estiver no trabalho preparatório das próximas legislativas. Outros se seguirão certamente, de muitas e variadas formas, desde que preencham uma condição: deixarem de falar sobre o que se passa no nosso querido rectângulo.
SOCORRO – O caso de Odemira veio mostrar como a vida humana é tão frágil em Portugal – da mesma maneira que se evidenciou com os pescadores da Nazaré. O Ministro da Saúde veio dizer que os procedimentos foram cumpridos. Se calhar é esse o busílis da questão – e se calhar o que valia a pena era avaliar se os procedimentos são os mais indicados: não parece normal que uma vítima de traumatismo crâneo-encefálico com várias facturas expostas vá primeiro para um simples centro de saúde sem nenhumas condições, e não parece lógico que alguém em tais condições tenha que passar por uma via sacra de procedimentos até se decidir, cerca de cinco horas depois do acidente, chamar um helicóptero. Na realidade os problemas no 112 avolumam-se desde que há uns meses atrás – lembram-se? – profissionais de emergência médica chamaram a atenção para o facto de alterações de procedimentos então implementadas poderem agravar situações de risco.
INJUSTIÇA – Se quiserem beber uns copos antes de conduzir, o melhor é tornarem-se jogadores de futebol. O que se passou com Luisão mostra que a justiça tem dois pesos e duas medidas. Houve um juiz que pelo simples facto de se tratar de um futebolista, figura pública, estrela do Benfica, resolveu deixar passar uma condução em estado de embriaguez e atribuíu como castigo o cumprimento de serviço cívico. Se fosse eu ou qualquer outra pessoa provavelmente ficaríamos com carta apreeendida, no mínimo. Por esta e por outras é que não dá mesmo para acreditar que temos um sistema de Justiça, nem dá para acreditar na bondade e sageza de juízes e tribunais.
ESTACIONAR – A EMEL está a tornar-se num caso de polícia – com a via sacra de arbitrariedades que os seus agentes cometem, com a sua tolerância a quem de facto incomoda o trânsito e a sua ferocidade na mera caça à multa. com o rosário de dificuldades para obter dístico de estacionamento residencial Os agentes da EMEL trazem consigo um livro de reclamações? Ou acham apenas que reclamar é insultar a autoridade, como já ouvi um a dizer a um cidadão, que não se conformava por ter sido multado num local de estacionamento, enquanto o agente nem queria saber de quem estava em dupla fila ali ao lado?
VER – Passear pelas galerias de arte lisboetas neste sábado : 17 inaugurações simultâneas em mais uma Lisboarte, desde os «Territórios de Transição» na Luís Serpa Projectos, Marta Soares na Módulo e Teresa Figueira na Monumental. Se quiserem ver gravuras e litografias de Paula Rego podem vê-las na 111 e na S.Bento. Todas as informações em www.apga.pt/lisboarte .
OUVIR – Volta e meia sabe bem revisitar um disco mais antigo. Esta semana foi a vez de uma das vozes injustamente menos conhecidas do jazz, Steve Tyrell, com o seu «Standard Time», irresistível em interpretações de temas como «What A Little Moonlight Can Do», «It Had To Be You» ou «Our Love Is Here To Stay» - daquelas canções que nos transportam para quem elas nos fazem evocar. CD Columbia, via Amazon.
PROVAR – Comida nepalesa no restaurante Everest Montanha. Sala simpática, serviço agradável, combinação de sabores inesperada. Bom local para jantar de amigos à conversa. Rua Artilharia Um 26, tel 213 866 218.
BACK TO BASICS – Tenho observado que pessoas sem vícios têm na realidade muito poucas virtudes, Abraham Lincoln
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METRO – O Metropolitano de Lisboa aborrece-me muito: por causa das greves de sindicatos que pretendem apenas manter privilégios; e por causa das obras a céu aberto que transformam parte da cidade num inferno – é inadmissível o que se passa nas avenidas novas e perto do Corte Inglês. Alguém devia pôr cobro a isto e obrigar as obras a serem feitas de outra forma. O desprezo pelos cidadãos têm três níveis de actuação: o dos sindicatos que agridem os utentes; o da administração que se está nas tintas para a circulação em Lisboa; e o das autoridades competentes que fecham os olhos a todos estes abusos. Uma pouca vergonha.
SÍMBOLOS - Cavaco Silva rumou à Índia naquilo que parece ser uma visita guiada a um «case study». Levou alguns dos mais criativos empresários portugueses e colocou, na página da Presidência da República na net, uma área especial inteiramente dedicada à visita e ao país visitado, cheia de dados e exemplar do ponto de vista da construção (www.presidencia.pt) . Cavaco é um homem de símbolos e esta viagem é simbólica do ponto de vista dos convidados escolhidos e da forma como foi preparada, longe das incomodidades históricas sobre Goa, Damão e Diu. Gostava que alguém lhe tivesse mostrado, antes da viagem, dois filmes portugueses: «A Dama de Chandoor», de Catarina Mourão e «Pátria Incerta», de Inês Gonçalves e Vasco Pimentel. E não tinha ficado nada mal que estes autores fossem também parte das preocupações de quem elaborou a lista dos convidados. Também as áreas de intervenção dos convidados presidenciais são simbólicas. Assim como as ausências.
ESCALA - No final do mês Sócrates parte para a China, repetindo alguns dos convidados que Cavaco Levou à Índia. É típico: quando temos qualquer coisinha, esgotamo-la até à medula. Adiante. A realidade chinesa é difícil de abarcar: 666 cidades, 1,3 mil milhões de pessoas, 393 milhões de telemóveis, 3243 estações de televisão, 123 milhões de utilizadores de net. São números de estarrecer - se o jogo com Cristiano Ronaldo que a Y Dreams de António Câmara está a desenvolver conseguisse vender a apenas um por cento desses utilizadores, despacharia mais de um milhão de unidades. É outra escala – uma escala que vai alterar completamente a face do mundo nos próximos anos.
LER – Na edição deste mês da revista «Atlântico» está mais um incontornável artigo de Rui Ramos, desta vez sobre o Partido Socialista, uma abordagem histórica da sua evolução tendo em conta o pano de fundo da actualidade. Rui Ramos defende que o PS não cocretizará muitas das reformas que hoje estão em cima da mesa, porque concretizar não faz parte do modelo social do PS, um partido cujo oxigénio político sempre foi o Estado: « O PS – escreve – fez sempre tudo, desde que fosse imposto pelas circunstâncias. Mas nunca mais do que isso. É, de algum modo, o verdadeiro partido conservador do regime. Nunca começou nada de novo em Portugal».
OUVIR - Um grande disco para começar o ano e pensar bem na importância do amor e no valor das cumplicidades: «Love Sublime», um encontro entre um pianista de jazz, Brad Mehldau, e uma soprano, Renée Fleming, em torno da poesia de Rainer Maria Rilke e Louise Bogan. CD Nonesuch.
PROVAR - Come-se muito bem, o serviço é muito simpático, a sala continua lindíssima, as cadeiras e mesas são confortáveis, a garrafeira é razoável e a preços honestos – falo do Alcântara Café, que me aconteceu revisitar por estes dias ao fim de longa ausência. Criado no final dos anos 80, este continua a ser um local de referência. O meu risotto estava rico e no ponto, todos os comensais concordaram que mais valia revisitar um bom clássico que descobrir uma novidade fracota. É evidente, mas às vezes as modas impedem-nos de pensar. Aqui está um bom sítio onde voltar mais vezes, tanto mais que é dos poucos onde se pode jantar em condições até bem tarde – a cozinha fecha à uma, o espaço às três. R. Maria Luísa Holstein, 15, Tel. 213637176.
BACK TO BASICS – A coisa mais difícil de entender no mundo é o imposto sobre rendimentos, Albert Einstein.
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GOVERNAR - Este Governo promete imenso. Faz imensas apresentações. Elabora muitos planos. Planeia muitíssimas reformas. O grande problema é que as promessas não se vêem a serem cumpridas. A grande dúvida é que as apresentações pouco passam do papel. O grande mistério é saber porque os planos não se concretizam. A enorme incógnita é saber se alguma reforma será efectivamente concretizada. Na realidade, o Presidente da República veio apenas chamar a atenção para a diferença entre as palavras e os actos, entre a ilusão e a realidade. O Governo não pode continuar muito mais tempo a viver de construções na areia.
LIMITAR - Há no entanto uma área em que o Governo cumpre: há Ministérios que regulamentam; Direcções Gerais que restringem; reguladores que dificultam; entidades que reprimem; serviços que limitam. O rol de prepotências sobre os cidadãos, o rol de poderes especiais de vários patamares do Estado, começa a ser insuportável. Cada vez que o Estado aumenta os seus poderes, os cidadãos diminuem os seus direitos. Esta equação é incontornável e não traz nada de bom.
FALHAR - Os sucessivos casos de inoperância das Comissões de Protecção de Menores dão que pensar. Alguma coisa está mal e não é conjuntural – é estrutural. O Estado falha onde era mais necessário que funcionasse. Aqui e ali há sinais de que o Estado deixou de ser funcional. Na protecção de menores, mas também em serviços de urgência. O desastre dos pescadores da Nazaré é um dramático exemplo, mas a demora cada vez maior registada nos tempos de intervenção do serviço 112 em casos de emergência começa a ser preocupante. E este é o papel que o Estado tem que cumprir. A nossa carga fiscal, enquanto cidadãos, não é pequena. Temos direito à protecção da vida. É isso que o Estado dá sinais de não estar a fazer.
MANOBRAR - Um leitor atento de «O Princípe», de Maquiavel, saberá que esse é o texto inspirador do Ministro da Saúde que, com a sua acção, mais não faz que diminuir cada vez mais as capacidades e funcionalidades dos serviços públicos de saúde, abrindo caminho, da pior forma possível, para a inevitabilidade de mais serviços privados. O que se está a fazer tem pouco a ver com responsabilidade social e alguém tem de dizer que o rei vai nu. É preciso desenvolver a área privada, mas era bom que isso não fosse feito à custa da qualidade dos cuidados públicos de saúde.
IGNORAR – É fácil legislar sem ouvir, produzir textos sem estudar, ignorar a realidade- como se sabe o pior cego é o que não quer ver. O que se está a passar no sector da comunicação – e em primeiro lugar nas empresas em que o Estado mantém posição – é um sinal da prepotência dos dias que correm. O Estado não deixa crescer, limita como quer, impede o que pode. No último ano sugeriu nomes em empresas privadas para permitir negócios mediante garantias de compadrio. Hugo Chavez é mais directo – aponta a direito e elimina o que não quer; aqui cilindra-se e achata-se aquilo de que se torna incómodo.
FALTAR - O Ministério da Cultura não pode ser apenas um verbo de encher – não pode ser uma máquina de nomeações de compadrio, de reestruturações imbecis, nem de lugares comuns. Não é só na macro economia que perdemos competitividade, é também na capacidade de inovação e no desenvolvimento da expressão artística. A nossa pobreza atávica nessa matéria está a ficar ao nível da indigência, o repúdio do Estado português, que é ancestral, à criatividade, está a atingir níveis que nos colocam na cauda da Europa – e é mais por falta de ideias e por gastos disparatados do que propriamente por falta de dinheiro. Leiam a entrevista do galerista Luís Serpa ao site www.artecapital.net e vejam como o modelo português privilegiou a dependência em vez do fomento. É essa, quase de certeza, a raiz de tantos disparates ao longo dos anos, e de tão fracos resultados. Se há um sector que precisa de estudo, definição estratégica e de um pacto de vontades, do Governo às autarquias, é o da Cultura.
BACK TO BASICS –O poder tem tendência a corromper e o poder absoluto corrompe completamente, Lord Acton, 1887.
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MARCHA ATRÁS
A vereação que era suposta desenvolver políticas culturais em Lisboa esclareceu hoje que o que ontem disse sobre a Lisboa Photo já não tem validade hoje. É extraordinário, mas é real. O senhor vereador aparece agora aflito a dizer que a bienal continua «sob outra forma» e integrada num pouco interessante Mês Europeu da Fotografia. Só uma cabecinha pequenina, tacanha e ignorante é que se podia lembrar de misturar uma celebração folclórica com uma bienal, de misturar uma escolha estruturada com uma miscelânea. Pobre cidade que andas entregue a tais arremedos de faunos...
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O FIM DA LISBOA PHOTO
O «Diário de Notícias» de hoje anuncia o fim da bienal «Lisboa Photo», das poucas coisas interessantes feitas em matéria de exposições em Lisboa nos últimos anos. Uma criatura que dá pelo nome de Rui Cintra, e que trabalha com o Vereador que teoricamente tem a seu cargo o pelouro da Cultura, diz uma série de barbaridades, fruto da pesporrência, que como se sabe é a mãe de todas as ignorâncias. Delfim Sardo, ex- Director do Centro de Exposições do CCB, sublinha, sobre esta bárbara decisão, o essencial: « A Lisboa Photo poderia necessitar de ajustes, mas havia uma base para melhorar. Infelizmente em Portugal deixa-se cair as coisas sem lhes dar tempo para avaliação. Há uma cultura de desperdício». Nada é mais certo - mas quem conseguirá explicar isto a essa cabeça duríssima do Dr. Amaral Lopes (o tal Vereador), um diletante que prefere gerir a actividade cultural da cidade em função das suas afectividades e amizades profundas, em vez da razão?
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BILHETE POSTAL
Lisboa está invadida de jeeps, o Lisboa Dakar está a começar. Além dos jeeps parece que Lisboa está invadida pelos pombos - a Câmara Municipal, à falta de melhor para fazer, calculou o seu número: 27 mil pombitos esvoaçam nos céus lisboetas. Uma breve revisitação das revistas dos tablóides no fim de semana dá para perceber que existem duas figuras do ano, em 2006, em Portugal: Cavaco Silva e Carolina Salgado. Querem melhor retrato do rectângulo?
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A COLECÇÃO – Na área cultural 2006 ficará marcado pela decisão de manter em Portugal a Colecção Berardo, embora, na prática, a qualquer preço. O tempo revelará se foi uma decisão acertada, se o valor e as responsabilidades que o Estado assumiu são justos, se o seu depósito no Centro de Exposições do CCB não vai acabar por asfixiar a autonomia e a diversidade daquele espaço. Teria sido bem melhor, a manter-se a colecção, utilizar o Pavilhão de Portugal, mas a verdade é que a política de espaços culturais em Lisboa anda pela hora da morte, sem norte nem tino. Sócrates ganhou por assegurar a permanência da colecção, mas um dia alguém lhe terá que explicar que os fins não justificam os meios.
A FUSÃO – A anunciada fusão entre a Companhia Nacional de Bailado e o Teatro Nacional de S. Carlos significa um claro desinvestimento na dança, na manutenção de uma companhia com capacidade de criação de repertório – como se vê na nova produção de «O Lago dos Cisnes» - e não vai ajudar em nada o Teatro Nacional de S. Carlos. Sob a imagem que se vão resolver dois problemas financeiros (e sobre isso tenho as maiores dúvidas de que os resultados sejam os que estão nas previsões e diagnósticos anunciados) vão na realidade criar-se dois pesadelos de gestão criativa e cultural. Alguém poderá explicar isto às luminárias que no Governo tomam decisões destas?
COMUNICAÇÃO – Ano negro, títulos a encerrarem, a crise chega a todo o lado e Portugal não foi excepção. Ano negro também pelo papel do Estado, através da Entidade Reguladora, que à primeira casca de banana se estatelou ao comprido e exorbitou claramente das suas funções.. Não é demais chamar a atenção para o que o Ministro Santos Silva anda a fazer no sector, reforçando o controlo do Estado (veja-se o projecto de nova Lei da Televisão), penalizando os privados, restringindo a liberalização. Ainda está por se perceber exactamente que compromissos existem já em relação à entrada de futuros «players» na televisão em Portugal – mas que os há, há. A este título 2007 promete ser um ano com surpresas e apostava que algumas coisas importantes vão mudar no panorama audiovisual. Saúda-se o surgimento de projecto consistentes de televisão na net, como a www.tvnet.pt , um projecto originário dos Açores que cresceu bem e agora tem conteúdos globais.
MÚSICA – Ano de boa colheita, três discos portugueses absolutamente excepcionais: «Unreal:Sidewalk Cartoon» de Bernardo Sassetti, «Believer» de Carlos Bica, ambos na esfera do jazz, e numa outra área, a da música urbana contemporânea, «Pratica(mente)», de Sam The Kid, um disco que ficará uma referência pela qualidade das palavras, pela riqueza dos arranjos e instrumentação.
ESCRITA – Finalmente Francisco José Viegas viu reconhecido o seu trabalho de escritor com «Longe de Manaus», o seu romance deste ano, que lhe trouxe o Grande Prémio de Romance e Novela de 2006, da Associação Portuguesa de Escritores. Na área das crónicas de imprensa é incontornável assinalar «O Pulo do Gato», publicado diariamente neste jornal por Fernando Sobral, que com tiro certeiro foi apontando a dedo as feridas de uma forma de governação que cada vez mais tem por lema esquecer que é suposta governar em nome dos cidadãos e não contra eles. Temporariamente suspensa por motivo de doença, o pulo do gato ganhou entretanto uma outra vida, a outro ritmo, na blogosfera, www.pular-do-gato.blogspot.com
VER – No mesmo ano em que o Museu Nacional de Arte Antiga ganhou novo protagonismo, Lisboa viu surgirem uma série de novas galerias, extensões de espaços que existiam no Porto – a Fernando Santos ( Rua de São Paulo 98), a Graça Brandão (Rua dos Caetanos 26) ou a Quadrado Azul (Largo Stephens 4), ao mesmo tempo que a Luís Serpa Projectos (Rua Tenente Raul Cascais 1B) experimentou novas formas de tocar os públicos com os seus «Cabinets dÁmateur», ou que a VPF Cream Arte e a Plataforma Revólver (Rua da Boavista 84-2º e 3º) se afirmaram como locais de ensaio, descoberta e revelação – muito bem continuados pela publicação on line www.artecapital.net . Cada vez mais as galerias representam um circuito complementar, que merece ser visitado e conhecido, uma das poucas oportunidades de conhecer o trabalho contemporâneo de artistas portugueses.
BACK TO BASICS – O tempo é a única coisa que verdadeiramente nos pertence – mesmo os que nada têm, continuam a ter tempo - Baltasar Gracian.
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