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TELEVISÕES - Que a RTP precisa de ser reestruturada – e muito – ninguém duvida. Que a reestruturação tem que ser feita por forma a não provocar danos irreversíveis no sector dos Media em Portugal é que é o ponto da questão, e esse é o tema que o Ministro Miguel Relvas persiste em iludir. A solução apresentada no início da semana pelo Presidente da RTP, Guilherme Costa, e que foi anunciada como tendo luz verde do Governo, é, a ser executada, uma bomba que deixará marcas em todas as áreas – provavelmente com maior intensidade na imprensa e na redução da diversidade dos orgãos de informação actualmente existentes.
Existem neste momento duas questões diferentes: a alienação da concessão de um canal e a forma como a RTP passará a viver e que tipo de serviço público prestará. Em relação à primeira, e se o Governo não puxar uns cordelinhos ou estimular uns accionistas, não se vislumbra grupo de media em Portugal interessado em correr o risco; em relação à segunda uma questão fulcral desde o início é libertar de vez o Serviço Público de publicidade, afastando-o do espectro de concorrência de audiências e da concorrência com os privados no mercado publicitário – basta aliás ver que as estações de rádio de serviço público não têm publicidade e que crescentemente as estações de televisão de serviço público de diversos países têm abandonado a venda de espaço publicitário, exactamente para evitar a concorrência com os privados e ajudar a manter a diversidade dos órgãos de informação.
Em termos de publicidade a questão é simples: actualmente a oferta de mercado é de 30 minutos por hora nos três canais (12 minutos na TVI e outros tantos na SIC e seis na RTP). Com a alienação de um canal, ele terá acesso aos 12 minutos que os outros privados também têm – e o lógico seria a RTP abandonar o mercado. Mas com a anunciada intenção de continuar com os seis minutos, a oferta total de espaço publicitário em canais de sinal aberto cresce dos actuais 30 minutos para 42, ou seja, um aumento de oferta de 40%. Não é preciso ser génio para perceber que quando a oferta aumenta desta maneira, o preço inevitavelmente cai. Acontece que o preço da publicidade de TV em sinal aberto já está tão baixo que a diferença em relação a outros Media, como a imprensa e a rádio, é menor que na generalidade dos mercados europeus – o que quer dizer que os canais portugueses de sinal aberto, que já captam 50% do total do investimento publicitário (o valor mais elevado da Europa), irão tendencialmente aumentar a sua quota de captação do investimento publicitário - mas paradoxalmente sem aumentar as suas receitas, já que o preço baixará (e já nem falo que muito provavelmente nem serão ocupados os 42 minutos disponíveis, porque na maior parte deste ano nem os 30 actuais têm sido integralmente utilizados). Convém aqui recordar que o investimento publicitário está a cair de forma acentuada há três anos seguidos, o que só por si deveria fazer pensar os responsáveis governamentais por estas medidas.
Tudo isto tem duas consequências – menos dinheiro nas estações para investir em conteúdos, que são a base de captação de audiências - o que provocará menor eficácia das campanhas publicitárias e iniciará uma espiral de degradação de consequências imprevisíveis; e um desvio ainda mais acentuado do investimento publicitário da imprensa para a televisão, o que terá consequências na sobrevivência de uma série de títulos e na qualidade e diversidade dos títulos que ficarem. Por isso mesmo é que Francisco Balsemão se referia esta semana aos efeitos nefastos que esta medida, a ser cumprida, poderá ter em termos do pluralismo da informação e da qualidade da nossa democracia. Mas com um panorama destes também os anunciantes ficarão pior servidos – com queda de qualidade de conteúdos, a saída dos públicos dos media tradicionais para outros acentuar-se-à e nenhum, no imediato, lhes dará a cobertura e eficácia que as televisões de sinal aberto proporcionam quando têm boas audiências (qualitativas e quantitativas).
Aliás é o próprio Guilherme Costa, Presidente da RTP, quem faz um retrato certeiro do futuro ao admitir que, com o cenário de reestruturação do grupo RTP que anunciou, o impacte nas receitas de publicidade atingirá os 50% - e eu acho que este é um cenário optimista.
Só para sabermos do que estamos a falar, o total do investimento publicitário em Portugal deverá cair este ano na casa dos 10%, depois de ter caído 3% no ano passado e cerca de 15% em 2009. Mas este ano as televisões de sinal aberto já vão, nesta altura, a perder 11,5% e a imprensa vai a perder 15% .
Por tudo isto as decisões parecem ter sido tomadas à pressa, com pouca preparação e reflexão, apenas para fechar mais um dossier e, talvez, favorecer algum grupo interessado em entrar no mercado mesmo com os riscos que isso comporta. Será que o Governo está a levar ao colo algum potencial comprador?
Mas existe um outro aspecto do plano de reestruturação que é também, a outro nível, bastante inquietante. Daquilo que já foi revelado, o potencial comprador do canal da RTP que for alienado, terá que utilizar meios de produção da própria RTP, ficando mesmo obrigado a ser sócio de uma unidade autónoma que será criada para o efeito. Esta situação ataca directamente os produtores independentes de audiovisuais, que assim verão o mercado limitado – é um pouco paradoxal que o Governo utilize o argumento da concorrência nuns casos e que em outros o meta na gaveta. De qualquer forma, a confirmar-se esta situação, existirá um eventual incumprimento das normas europeias sobre as percentagens de produção independente que devem existir no mercado de produção audiovisual. A questão da produção independente é relevante porque ela já está a ser comprimida face aos cortes no investimento em conteúdos das televisões, e com este modelo de negócio previsto para a RTP e o eventual novo operador, o seu mercado ficará ainda mais limitado. Recordo apenas que a produção independente de audiovisual é fundamental para o crescimento de uma industria multimédia, a única forma de garantir que o português continue uma língua viva no novo mundo digital e que a nossa História e Cultura sejam salvaguardadas. Eu acho que o Governo nunca pensa nestas coisas – mas faz mal e vai deixar uma péssima herança se continuar nesta via.
SEMANADA – Business as usual: Cavaco atacou as medidas do Governo; Cavaco reuniu o Conselho de Estado e de lá saiu um esfíngico comunicado a apelar ao diálogo; o PS entendeu logo isto como um puxão de orelhas ao Governo e elogiou Cavaco; Merkel vetou mais algumas propostas; Teixeira dos Santos anunciou que no início de 2010 esteve prestes a demitir-se; descobriu-se que há roupa de hospitais a ser vendida em feiras.
ARCO DA VELHA – Ricardo Rodrigues, o deputado que roubou gravadores a jornalistas da “Sábado” quando foi confrontado com perguntas que não lhe agradavam, e que está por isso acusado, foi o escolhido pelo PS para seu representante no Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários. Quem diz que o crime não compensa?
VER – No Museu Berardo, CCB, a exposição “A Arte da Guerra”, que apresenta uma extraordinária colecção de cartazes e outras formas de propaganda, criadas em vários países durante a segunda guerra mundial. Como se recorda no catálogo, as obras ali expostas “cumprem com o objectivo de qualquer outra obra de arte: provocar emoções nas pessoas e mudar o mundo”.
OUVIR – “Biophilia”, o novo disco da islandesa Bjork, é um trabalho multidisciplinar, onde o CD convive com uma aplicação (fabulosa, aliás) para iPad. É um trabalho inesperado, ousado por um lado, complexo por outro, mas delicado e encantador no final. Há algum tempo que Bjork não mostrava de forma tão clara como consegue combinar sensibilidade com inovação.
PROVAR – As delícias da Castella do Paulo, uma casa de chá luso-japonesa, na Rua da Alfandega 120 em Lisboa, que também serve almoços. A sugestão é roubada ao magnífico blogue Mesa Marcada que recomenda o Kare-paan, um salgado de brioche crocante recheado com caril japonês de vaca e legumes. O telefone é 218880019.
BACK TO BASICS – Com o tempo descobrirão que o Estado é o tipo de organização que, para além de fazer disparates nos grandes assuntos, também faz erros sucessivos nas mais pequenas coisas – John Kenneth Galbraith.
(Publicado no Jornal de Negócios de 28 de Outubro)
Quando não chove, as ruas de Lisboa cheiram mal; em paradoxo, às primeiras chuvas, começam as inundações. Há muito tempo que a cidade não era tão maltratada no dia-a-dia como desde que António Costa se tornou Presidente da Câmara. Neste Outono quente, antes de chegarem as chuvas, havia ruas pestilentas, passeios sujos, detritos por todo o lado. Percebeu-se agora que as sarjetas, mais uma vez, não foram mantidas limpas.
Graças à forma como está organizada a recolha selectiva de lixo, há contentores cheios, dias seguidos, a exalar maus cheiros e muitas vezes a derramar lixo. A Câmara Municipal trata Lisboa seguindo aquele velho truque dos meninos rabinos que não gostam de lavar as mãos: para quê lavar as ruas se elas se sujam a seguir? Tudo isto penaliza quem vive em Lisboa. Penaliza quem cá fica depois das sete da noite, quem persiste em viver numa cidade que se desabita ao fim de cada dia de trabalho.
Numa das noites quentes da semana passada, quem passeasse no Chiado via as esplanadas cheias – de estrangeiros. Mal se ouvia português. É claro que isto é simpático – embora as ruas estivessem sujas e alguns dos turistas comentassem isso. O que me custa é ver tão poucos lisboetas na rua a aproveitar o que a cidade lhes podia oferecer. À medida que a cidade se foi desertificando o comércio de rua foi fechando portas cada vez mais cedo – sem clientes, para quê estar aberto? O investimento e o trabalho de base para garantir conforto, limpeza e segurança foi sendo substituído por ciclovias, hortas e outras obras do regime. O essencial foi-se desleixando.
Cuidar de uma Câmara Municipal exige que se goste da cidade, exige que se goste dos seus habitantes. O Presidente de qualquer Câmara Municipal não pode olhar para os cidadãos apenas como eleitores – tem que os olhar como clientes, que efectivamente pagam, nos impostos e nas taxas, um serviço que, infelizmente, muitas vezes não lhes é dado. Suspeito que António Costa não gosta de servir clientes, prefere manipular eleitores. (Publicado no diário Metro)
INDIGNADO – Eu sinto-me indignado cada vez que estou a ver um telejornal e vejo uma série de pessoas, que agora se afirmam muitíssimo indignadas e chocadas, mas que, nos últimos anos, no Governo ou em outras funções, na política ou nos sindicatos, contribuíram para o descontrolo orçamental, para a diminuição da produtividade, pessoas que anos a fio defenderam só direitos sem confirmarem deveres, que arquitectaram um sistema laboral onde o objectivo era trabalhar menos horas, produzir menos e ganhar e consumir mais. Estamos a viver a prova de que distribuir o que nāo temos ė uma pėssima ideia com catastróficos resultados.
Agora é preciso pôr um ponto final na fantasia e está a ser doloroso. Vai ser ainda mais doloroso e ninguém em seu perfeito juízo poderá dizer quanto tempo vai durar esta austeridade. Muitos dos protestos que se anunciam parecem ignorar a realidade em que estamos. Parecem nāo ter em conta a necessidade de mudar. Persistem em perseguir objectivos que têm pouco a ver com a realidade. Uma coisa é ter uma utopia, outra é fazer dela um programa político e convencer os cidadãos que essa utopia pode ser alcançada e é o milagre que nos pode salvar. Acontece que essa utopia é que nos levou até onde estamos. Brincar com os sentimentos das pessoas é sempre reprovável. Em política produz resultados péssimos.
RESPONSABILIDADE - Nos últimos dias tem-se falado muito na necessidade de averiguar responsabilidades pelo estado a que as finanças do país chegou. Algumas pessoas insurgem-se contra isso e, paradoxalmente, algumas sāo as mesmas que há meses atrás apontavam a Islândia como exemplo por ter julgado alguns dos responsáveis pela derrocada do sistema financeiro do país. É de facto importante avaliar quem fez o quê, atribuir responsabilidades políticas e, nalguns casos, eventualmente, responsabilidade civil. Investigar estas situações é um dever do regime - não por vingança, mas por dever de conhecimento e obrigação cívica. Para nāo repetirmos os mesmos erros e nāo permitirmos os mesmos comportamentos é fundamental sabermos o que de facto se passou. Retardar o encontro com a realidade, como durante meses o anterior Governo de Sócrates andou a fazer, é uma forma perigosa - e criminosa - de manipulaçāo. Ao longo dos anos Sócrates desempenhou um papel, criou ele próprio um personagem, uma espécie de avatar da modernidade, das reformas em causas fracturantes e politicamente correctas, ao mesmo tempo que evitava reformar o regime e fechava os olhos ao que se passava em nome da concretizaçāo dos seus projectos. Pessoas que entendem do assunto dizem que o comportamento de Sócrates tem pontos de contacto com a esquizofrenia. Seja como fôr, ele e o seu Governo nāo melhoraram a situaçāo em que encontraram Portugal. Entregaram-se a comprometer o futuro de todos para gáudio de alguns. E esse balanço tem que ser rigorosamente feito.
SEMANADA – Cavaco Silva teceu críticas ao orçamento de Estado; João César das Neves teceu duras críticas ao OE; António José Seguro teceu fortes críticas ao OE; Sarkozy e Merkel encontram-se a sós uma vez por semana; subsídios políticos às energias renováveis já representam 50% da despesa mensal da electricidade ; a Câmara de Lisboa não sabe quantos inquilinos tem; o número de desempregados ultrapassou os 700.000; Rui Rio defendeu reforma profunda e urgente do regime político; militares preparam protestos contra a austeridade.
ARCO DA VELHA – No Brasil, a equipa de Dilma Rousseff vai a caminho de perder o sexto ministro, em menos de um ano, por suspeita de corrupção.
LER – O tema de capa do número especial da Egoísta, com a data de capa de Setembro, não podia ser mais actual: “Juízo” – uma coisa que notoriamente nos tem faltado ao longo das últimas duas décadas . Logo no início da edição está uma “Tabuada de Multiplicar”, onde Rui Zink resume assim o estado da nação: “Se fores casto e mui cauto/E esperares sempre a tua vez/Não voarás talvez mui alto/ Mas serás um bom português”. Em termos de imagens o portfolio de Mark Laita é excepcional e o de Augusto Brázio uma colecção de preciosidades. Também gostei do “esta noite” de Maria Manuel Viana e de “A Bolsa E A Vista” de Ricardo Costa. Uma bela edição especial, esta da “Egoísta”.
VER – No Museu da Electricidade a Fundação EDP inaugurou na semana passada três exposições muito diferentes entre si e que se prolongam até Dezembro. José Loureiro apresenta uma gigantesca instalação pictórica – não encontro outro nome - com base em 162 fragmentos de tela pintada a óleo, que exploram as sensações de cor e de luz numa enorme parede. Julião Sarmento apresenta um muito curioso trabalho, “What Makes a Writer Great”, em que imagens, originais ou replicadas, privadas ou públicas, se combinam com frases e palavras, na construção de uma narrativa que faz lembrar por vezes o conceito de edição cinematográfica – diálogos curtos, constante mutação de planos. Finalmente Edgar Martins apresenta um trabalho de fotografia, encomendado pela própria EDP (bem encomendado, de resto), que tem o título “The Time Machine” e que faz uma viagem ao universo das barragens, mostrando o que se esconde para além da banalidade das máquinas, do cimento, dos espaços. É uma visão própria, cuidada, exemplarmente encenada e talvez uma das melhores exposições de fotografia, de autor português, dos últimos anos.
OUVIR – Quando ouço dizer que meia dúzia de nomes sonantes se juntam para fazer um super-grupo tenho uma tendência para ficar de cabelos arrepiados e esperar o pior – algo de chato, excessivo, uma feira de egoísmos. Foi um pouco de pé atrás que me meti a ouvir “SuperHeavy”, o disco que resulta da reunião de Mick Jagger com Dave Stewart, Joss Stone, Damian Marley e A.R. Rahman. Que esperar da junção de um Rolling Stone, com um Eurythmic, mais uma estrela britpop-soul, um herdeiro de reggae e o recordista indiano de composição de bandas sonoras? Mick Jagger disse numa recente entrevista que alinhou neste projecto porque queria juntar estilos musicais diferentes – e isso garantidamente conseguiu. O mais incrível é que o disco é divertido, tem meia dúzia de boas canções, sente-se que deu gôzo aos músicos gravarem, e o mais engraçado é que dá bastante gôzo ouvi-las – como o single “Miracle Worker”, a influência indiana em “Satyameva Jayathe”, o lado da mística rock de “One Day. One Night” ou a suavidade de”Never Gonna Change”. Boas canções, muito bem tocadas e interpretadas, ritmos inesperados e sonoridades supresa – há muito tempo que não encontrava isto tudo num só disco.
PROVAR – Vou confessar um dos meus pequenos vícios: enguias de conserva. Gosto delas sozinhas, como aperitivo, ou então numa salada de alface fresca ripada. Também vão bem com um pão escuro cortado fininho ou então acompanhadas de pickles. Aquelas de que gosto mais são as enguias em molho de escabeche da Murtosa, fabricadas pela Comur, orgulho da nossa indústria conserveira. A mesma fábrica tem uma proposta alternativa interessante: filetes de enguias fumados, em caixas um pouco maiores, e que ficam particularmente bem numa salada. As latas pequenas de enguias de escabeche também estão disponíveis numa versão picante, mas eu prefiro a normal. Se juntar muitos apreciadores de enguias também pode adquirir uma réplica dos antigos barris, com 1,250 kgs. Um festim!
BACK TO BASICS – É absolutamente impossível ter uma nova crise na próxima semana, a minha agenda está completamente cheia – Henry Kissinger
António Costa é o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa há quatro anos, desde 2007. É o tempo de um mandato inteiro. Todos os autarcas gostam de dizer que quatro anos é o tempo para apresentar obra. O período dos quatro anos de um mandato costuma ser o horizonte temporal que os políticos gostam de usar para fazer uma apreciação da sua obra.
Olhemos então para Lisboa ao fim destes quatro anos e para estes mandatos presididos por António Costa. Conseguiu trazer população de volta para a cidade? Conseguiu criar um sistema de recuperação de imóveis degradados? Tem uma política de reabilitação urbana? Conseguiu fazer obras estruturantes? Conseguiu reanimar o comércio de rua? Conseguiu acabar com o estacionamento em dupla fila? Conseguiu reduzir custos?
Não me podem acusar de má vontade se disser que a resposta a estas perguntas é, em todas, um triste NÃO.
Mas olhemos de outro ponto de vista: Aumentou as taxas em Lisboa? Reforçou os poderes e a prepotência da EMEL? A cidade está mais suja? Há mais comércio fechado? A cidade está mais incómoda para os seus habitantes? A cidade está mais insegura? Aqui, em todos os casos, a resposta é SIM.
Os mais optimistas dirão: no entanto a gestão de Costa faz parques hortícolas e ciclovias. E eu acrescento: essas obras decorrem à mesma velocidade a que Lisboa perde munícipes. António Costa encara a cidade como uma rampa de lançamento político para as suas ambições no PS - o discurso que proferiu no 5 de Outubro foi o de um líder da oposição e não o de um autarca.
Pessoalmente simpatizo com António Costa, mas acho que ele tem sido um mau presidente da Câmara, muitas vezes a colocar interesses partidários à frente dos interesses da cidade. Por isso mesmo tem vivido politicamente graças a alianças espúrias e a compromissos muitas vezes incompreensíveis. António Costa é um honesto político à moda antiga: primeiro os seus objectivos, só depois o serviço aos cidadãos - esta é a razão de fundo para a cidade estar como está.
(Publicado no diário Metro de 18 de Outubro)
Este mês de Outubro tem sido fértil em solavancos políticos. A celebração da intentona que instaurou a confusão republicana foi o pretexto para os primeiros dislates. Na ocasião o Presidente da República apelou ao fim do consumo fácil – mas esqueceu-se que o consumo fácil nasceu enquanto ele próprio era Primeiro Ministro. Também foi nesse tempo que a política do betão, da auto-estrada e da rotundomania se tornou a prioridade nacional e se começaram a liquidar as pescas e a agricultura.
Quem não se lembra das campanhas de arranque de vinha, de olival e até de sobreiros? Quem não se lembra das cedências em matéria de pescas a Bruxelas, em troca de dinheiro para o betão? O mesmo Cavaco Silva que se baseou numa estratégia de obras públicas, é o que agora vem falar da necessidade de desenvolver a agricultura e as pescas. Se isto não fosse dramático passava por anedota – ou por arrependimento de circustância, como há dias li numa bem humorada nota no Facebook.
Na mesma ocasião, em plena praça do Município, António Costa, em nome da cidade de Lisboa, fez o discurso de líder da oposição. Quem assistisse a isto tudo ficava siderado pela troca dos papéis, pela pinderiquice da cerimónia e pelo retrato de inconstância dos políticos. Ele há cerimónias que só agravam a má imagem que os políticos têm.
Dias depois, dos Açores veio a notícia que Carlos César não se recandidata nas próximas eleições regionais. Fico na dúvida se o faz por querer candidatar-se à liderança do PS nacional ou por ter em mente voos mais altos – sei lá, a Presidência da República. Esta decisão de Carlos César, palpita-me, é das que terá mais repercussões na política deste nosso pequeno rectângulo à beira-mar plantado.
Finalmente, a semana findou com a Madeira – com a descida de Jardim e a subida do PP, com a queda do PS, com o desaparecimento eleitoral do Bloco de Esquerda e com os resultados de pequenos partidos fora do núcleo tradicional da política à portuguesa. Aposto que também estas eleições deixam muitas pistas para o futuro – em todo o país.
Na semana passada fui ver o novo filme de Woody Allen, “Meia Noite em Paris”. O filme foi rodado na capital francesa, com diversos apoios oficiais e a presença, num simbólico papel de guia, de Carla Bruni. Como se sabe Woody Allen anda há uns anos a realizar bilhetes postais sobre cidades europeias, aproveitando de forma hábil os financiamentos que as respectivas “film commissions” e outras entidades lhe prestam.
O filme não tem grande interesse e parte de uma situação de regresso ao passado. O personagem principal é um escritor norte-americano em crise criativa, farto de fazer guiões para Hollywwod, actividade que lhe dá sucesso e dinheiro mas de que ele não gosta. Num passe de mágica, ao bater da meia noite, ele é apanhado para dentro de um clássico modelo de carro francês dos anos 20, que o leva de volta a essa época – cruzando-se em ambientes boémios com nomes como Hemingway, Gertrude Stein, Cole Porter, Picasso, Dali e vários outros.
O ponto curioso de tudo isto é que o personagem principal, o tal escritor, é um apaixonado por aquilo a que chama “Lojas da Nostalgia” – onde pode viver como se estivesse no passado, rodeado de objectos de época, num universo de fantasia que lhe permite escapar da realidade.
Este Woody Allen tem no entanto um mérito: fez-me ver que vereadores lisboetas como José Sá Fernandes, Nunes da Silva ou Manuel Salgado, vivem com o objectivo de transformar Lisboa numa “Loja de Nostalgia”. Uma série de medidas que tomam parecem inspiradas no regresso ao passado, sem carros, com poucas pessoas, a forçar as suas obsessões pessoais no mundo contemporâneo, num delirante regresso ao passado que é a principal linha política da vereação de António Costa, em Lisboa.
É engraçado como um sector que se afirma de esquerda acaba por ser essencialmente conservador, incapaz de pensar em soluções contemporâneas, preferindo a ilusão romântica dos bons selvagens. Em Lisboa, tal como no filme, vamos comprovando que quando vivemos para mundos que já não existem, a coisa sai furada.
(publicado no diário Metro de 4 de Outubro)
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