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FISCO - O Supremo Tribunal Administrativo deu razão a um cidadão que se queixou porque uma nota de pagamento do IMI, recebida da Autoridade Tributária, não cumpria a lei, já que não explicava como chegou ao valor que pretendia tributar. O caso, que na opinião de juristas pode fazer jurisprudência e pôr em causa cobranças efectuadas do IMI nos últimos anos, vem também colocar sob escrutínio as novas avaliações de imóveis que estão a ser efectuadas, e que devem ter incidência no futuro próximo. Por outro o caso lado comprova a displicência com que a Autoridade Tributária actua, não zelando pelo cumprimento da lei, e regendo a sua actividade sob o lema de cortar caminho, desprezando os direitos dos contribuintes. O contribuinte que moveu o processo, que persistiu até ao Supremo e que no final venceu o fisco, é uma excepção entre os milhões de contribuintes silenciados pelas ameaças constantes da Autoridade Tributária, vítimas de lapsos e de atrasos, e sem recursos para poderem protestar e levar o caso á justiça. O Provedor de Justiça faria bem em exercer a sua autoridade sobre o fisco, utilizando esta decisão do Supremo Tribunal Administrativo para defender os direitos dos cidadãos. Nenhum contribuinte alemão, desse país de que Vítor Gaspar tanto gosta, toleraria comportamentos como os da Autoridade Tributária portuguesa.
SEMANADA – Em cada dia entram nas prisões portuguesas três novos detidos; um em cada três homicídios ocorre em contexto conjugal; o Procurador Geral da República afirmou numa entrevista que as polícias fazem escutas ilegais; ao primeiro dia de chuvas, de Outono, houve logo inundações em Lisboa; as exportações de ouro portuguesas aumentaram 75 por cento nos primeiros seis meses do ano; o défice real deverá chegar este ano a 6,1%, o que sai fora das previsões do Governo; o IVA caíu 2,2% em vez de ter uma subida de 11,6% prevista pelo Ministério das Finanças; a venda de raspadinhas disparou 80%; provando que o ridículo mata, a anedota da semana veio do PS que reivindica que o abandono da TSU se deveu à sua ameaça de moção de censura; ex-ministros do PS da área das obras públicas foram alvos de buscas por causa das PPP ao fim deste tempo todo; a factura do abastecimento de água ao consumidor triplicou entre 2009 e 2011; desde 30 de Agosto que os Conselhos de Ministros terminam sem comunicado – deixou de valer a pena explicar às pessoas o que anda o Governo a tratar?
ARCO DA VELHA – As rações de combate da tropa, incluindo, uma feijoada à transmontana enlatada, estão a ser compradas a fabricantes espanhóis, de Alicante.
VER – Gosto de fotografia de rua, mesmo quando é um pouco encenada, como é o caso das “Suites Brasileiras” do francês Raphael Blum, que fotografou pessoas em vários ambientes de cidades brasileiras. Há um misto entre o instantâneo e a estética do fotógrafo “a la minute” que me atrai nestes retratos, que fazem parte de uma exposição repartida entre o Instituto Francês (Avenida Luis Bivar) e a Casa da América Latina (Av 24 de Julho 118). “Suites Brasileiras” está nestes locais durante todo o mês de Outubro.
OUVIR – Bill Fay é um dos segredos bem escondidos da música popular britânica, com dois álbuns quase clandestinos, do início da década de 70. Aqui há uns anos os Wilco voltaram a colocar o seu nome na ribalta com uma versão do tema “Be Not So Fearful” – Jeff Tweedy é um fã de Fay, tal como Nick Cave, por exemplo. Agora, quatro décadas depois do seu ultimo disco de originais, com sessenta e poucos anos, eis que Bill Fay reaparece com “Life Is People”, um disco denso, onde em 12 canções, grande parte delas com um simbolismo religioso, que se mistura com questões ambientais e reflexões sobre a vida nos tempos que correm, ele mostra como consegus continuar a fazer canções intensas (There Is A Valley, City Of Dreams, This World, Cosmic Concerto, The Coast No Man Can Tell). Para retribuir o apoio dado nos ultimo’s anos por Jeff Tweedy, que também colabora neste album, Fay interpreta uma das canções dos Wilco, “Jesus, Etc”. O produtor do disco é um norte-americano, Joshua Henry, que em miúdo descobriu os discos originais de Fay na discoteca do pai e se apaixonou por eles . Felizmente não descansou enquanto não o conseguiu convencer a voltar a estúdio. (CD comprado na iTunes).
FOLHEAR – A “Monocle” de Outubro tem andado muito exposta no Facebook lusitano e o motivo é simples. O título de capa é “Geração Lusophonia: Porque é que o português é o próximo idioma do poder e do comércio”. Lá dentro há numerosas referências ao Brasil, a Portugal (os encantos da ilha de S. Miguel e dos Açores, as maravilhas da Comporta, as vantagens da cortiça), mas também a todos os outros países que falam português – por acaso todos com costa marítima, como a revista faz questão de notar. Luanda é mostrada como uma cidade em desenvolvimento para onde os quadros portugueses querem ir, Maputo é o tema do portfolio fotográfico, e são indicados grupos financeiros, de media, de comunicações ou industriais, como o BES, a PT, a Sonangol ou a Soporcel, mas também a livraria Ler Devagar, a loja A Vida Portuguesa ou as conservas Ramirez. E são falados os nomes dos Deolinda, de Pedro Gadanho (que está no MOMA em NY), dos Buraka Som Sistema, assim como Álvaro Siza, com direito a destaque. O próprio editorial do editor, Tyler Brulé, é dedicado às nações que falam português. As nações lusófonas têm a dispersão geográfica certa e a escala necessária para serem potencialmente mais ágeis e eficazes que outros conjuntos de nações com um idioma comum – escreve ele. Fica o recado. E, lá no meio dos textos, uma nota que faz sorrir: Portugal tem a localização certa para desenvolver a indústria naval e a vocação marítima.
PROVAR – Esta semana provei os efeitos da crise. O Frascati, um restaurante simples e despretensioso, de que muito gostava, situado na Rua Padre António Vieira, em Lisboa, encerrou portas. Não resistiu aos efeitos colaterais dos aumentos do IVA. Isso aconteceu porque, como tantos outros, tentou não aumentar os preços na proporção dos aumentos provocados pelo IVA nas matérias primas e no valor final a cobrar ao cliente. Tentou não penalizar as faturas, com medo que os clientes fugissem. Acabou por não resistir. Tive lá muitas boas conversas com amigos e era um daqueles sítios simpáticos onde se entrava e se encontrava sempre alguém conhecido. Estes locais estão a desaparecer, aquelas casas onde se comia bem com contas leves, estão a ficar condenados, esmagados entre as taxas do Estado e as taxas dos cartões de pagamento. Neste Outono já comecei a sentir aumentos de preços em cafés e pequenos restaurantes que até aqui não tinham mexido nos valores de forma significativa. A espiral vai girando – e não traz nada de bom.
GOSTO – Do filme “Portugal- A Beleza da Simplicidade”, uma peça de promoção do país encomendada pelo Instituto do Turismo e que tem ganho vários prémios internacionais, provocando algumas invejas nacionais.
NÃO GOSTO – Do silêncio do Gabinete do Primeiro Ministro sobre a forma como um segurança de Passos Coelho tratou um repórter de imagem da TVI.
BACK TO BASICS – "Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo" – Eça de Queiroz
Todos os dias o Governo vem com uma nova ideia para aumentar impostos ou taxas. Mas não tem igual destreza no que toca a diminuir os custos do seu funcionamento sem ser cortar na saúde, na educação ou nas prestações sociais. Carlos Moreno, ex-Juiz Conselheiro do Tribunal de Contas elencou este fim de semana, no Facebook, algumas sugestões para cortar na despesa que, com a devida vénia, aqui deixo.
«O governo devia apresentar e quantificar o montante que dos 1.300 milhões de euros de rendas a pagar em 2013 às concessionárias de PPP vai cortar; o governo devia também apresentar e quantificar o montante que em 2013 vai cortar nas rendas excessivas a pagar às produtoras de energia que vivem praticamente em monopólio; o governo devia apresentar e quantificar o montante que vai cortar em 2013 às fundações, associações, institutos e outras entidades que têm atravessado a crise sem perder um cêntimo; o governo devia apresentar e quantificar o montante que vai cortar em 2013 às despesas de consultoria externa, que deviam ser reduzidas ao mínimo e substituídas pela organização de bolsas de competências compostas por técnicos do sector público; o governo devia apresentar e quantificar o montante de despesa que vai cortar em 2013 com despesas no sector público empresarial; o governo devia apresentar e quantificar o montante de despesa que prevê cortar com a obrigatoriedade, a introduzir na próxima Lei do orçamento para 2013, de subordinar todo o dispêndio público aos critérios da economia, eficiência e eficácia, sob pena de reintegração nos cofres do estado pelos que autorizassem pagamentos que não observassem aqueles critérios, incluindo os decisores políticos e os próprios membros do governo.»
(Publicado do diário Metro de 25 de Setembro)
MUNDO – Tenho para mim que muitos dos nossos queridos políticos, de todos os partidos, reconheça-se, acordam frequentemente irritados pela existência de cidadãos, de opiniões, até do próprio mecanismo do regime que os ocupa e faz viver. Parece-me que existem dias em que acham uma grande maçada terem que se confrontar com pessoas, em vez de andarem por uma reserva protegida onde se vêem ao espelho e estão apenas rodeados por outros escolhidos, semelhantes a si próprios. Prefeririam, talvez, um mundo perfeito onde pudessem fazer tudo sem serem contrariados, onde realizassem as experiências que querem sem protestos. Estou certo que ficam muito aborrecidos por terem que dizer mentiras nas campanhas eleitorais, imagino que entrem em depressão por sistematicamente dizerem aldrabices para conseguirem votos. E todos os dias, desde há anos, vejo as suas caras arrependidas e sofridas por estarem a fazer as coisas ao contrário do que haviam prometido, argumentando sempre que a realidade era pior que imaginavam. Vivemos há décadas nesta alternância de protagonistas da aldrabice, de gente que nunca é responsabilizada pelo que faz, pelos efeitos das decisões que toma. Como vimos ainda esta semana eles próprios reconhecem que, no Governo, encomendam estudos que se revelam erros clamorosos e, com base nesses estudos, fazem contratos que delapidam milhões, como em várias parcerias público-privadas. A seguir, fazem um acto de contrição - e basta. Com um pouco de sorte encontram colocação no estrangeiro porque definitivamente não têm paciência para aturar a ingratidão dos locais. Vivemos nisto há tempo demais. Talvez por tudo isto, o PSD cai nas sondagens mas o PS não sobe.
MOEDA - Quanto vale de facto um euro em Portugal, depois de deduzidos todos os impostos aplicáveis – os profissionais, as taxas e impostos municipais, as alcavalas de empresas públicas, o IVA, tudo o que metodicamente vai ao bolso dos cidadãos? Para todos nós um euro, feitas as deduções, em termos reais, vale sempre menos que 50 cêntimos. E mesmo assim o Estado quer sempre, em nome do euro e da sua mãe Europa, espremer mais um bocadinho o pouco que já nos cabe. Só vejo medidas para encolher, não vejo decisões que façam crescer. Recentemente voltámos a conquistar mercados, em sectores tradicionais, pela qualidade e pelo cumprimento de prazos, mesmo com preços superiores a outros fornecedores, como a China ou a Índia. O crescimento das exportações nos últimos anos tem a ver com a capacidade de produzir diferente e melhor que a concorrência, e já se viu que os mercados percebem que a qualidade tem um preço – o mesmo preço que, noutra escala, se paga pelo design italiano ou os automóveis alemães. O que nos faz falta é uma estratégia de crescimento económico – em vez de experiências que produzem um ciclo de empobrecimento. O que precisamos é de valor acrescentado, não é de valor diminuído. Eu estou para ver como esta crise politica acaba – no fim disto tudo ainda nos arriscamos a levar com mais uma imaginativa nova carga fiscal em cima e há-de haver uns pândegos que nos quererão convencer que tudo foi resultado de uma explosão de cidadania. Por este andar não precisamos de um Seguro no Governo, mas de um seguro contra as malfeitorias governamentais. Tinha ficado bem à Comissão Política do PSD reconhecer esta semana que a crise política teve uma origem chamada TSU, criada por Passos & Gaspar, em vez de sacudir a água do capote.
SEMANADA – O número de casais em que os dois cônjuges estão desempregados duplicou em relação ao ano passado; várias autarquias começaram a cortar apoios a infantários; A Polícia Judiciária resolveu contratar ex-espiões envolvidos no ano passado no escândalo das secretas; dívidas do Estado a fornecedores sobem 84% para mais de 330 milhões; a Câmara de Cascais pagou subsídios mediante facturas falsas apresentadas por um juiz que dirige uma associação de coleccionadores de armas; a economia paralela já chega a 24,5% do PIB; erros de cálculo na expectativa de tráfego da PPP estabelecida com a Fertagus, no tempo de João Cravinho, provocaram pagamentos suplementares do Estado de 45 milhões de euros – o que praticamente fez duplicar os custos a suportar pelo erário público – e Cravinho acha a coisa normal; o título adequa-se que nem uma luva à situação que vivemos - “Balas & Bolinhos- O Último Capítulo”, é o nome do filme mais visto nos cinemas portugueses na última semana – uma produção nacional que vai com 80 mil espectadores.
ARCO DA VELHA – É mais barato comprar um iPhone 5 que uma acção da Apple
VER – Duas exposições imperdíveis de fotografia. A primeira está no No Bes Arte, ao devastado Marquês do Pombal, onde Paulo Nozolino mostra Usura, uma exposição comissariada por Sérgio Mah, que reúne fotografias realizadas de 1999 para cá, apresentadas como trípticos. A segunda está no espaço Vera Cortês Art Agency, na Avenida 24 de Julho 54-1º-Esq, e mostra “Utz”, de Daniel Blaufuks, uma incursão pela evolução da imagem fotográfica.
OUVIR –Saíu um livro novo de Bob Dylan. Leram bem e não me enganei. Tem a forma de um disco, parece um disco, tem canções, mas conta histórias. Belíssimas histórias. É uma deliciosa colectânea de contos. Chama-se “Tempest”, um nome que naturalmente tem a ver com os tempos que vivemos – embora a canção-título conte ao longo de 14 minutos o naufrágio do Titanic. Trata-se do 35º disco de estúdio de Dylan, que aos 71 anos continua a manter-se fiel musicalmente aos blues e à country, ao mesmo tempo que continua a surpreender em canções como “Scarlet Town”, “Early Roman Kings”, “Tin Angel” ou “Roll On John”, uma evocação decente de John Lennon.
FOLHEAR – Se tem iPad pode fazer o download gratuito da boa edição digital da revista “Intelligent Life”, publicada bimestralmente pelo grupo “The Economist”. À medida que o tempo passa e o foco editorial se aperfeiçoa, a “Intelligent Life” está cada vez melhor, a abordar temas invulgares, a partir de uma perspectiva inesperada. A capa desta edição é dedicada a Sergei Polunin, e lá dentro conta-se como uma das estrelas em ascensão no Royal Ballet de Londres decidiu, de repente, aos 22 anos, deixar a carreira. O filme “Tabu”, do português Miguel Gomes, tem honras de destaque na secção de cinema, e a aventura de David Byrne com Annie “St. Vincent” Clark é a escolha da música. Nos livros, o destaque é para o novo Tom Wolfe, “Back To Blood”. A secção dedicada à comida e a vinhos continua deliciosa (falando de chili con carne) e um pouco à frente existe um artigo divertidíssimo sobre a tendência actual de fazer parecer as casas com quartos de hotel. Em resumo: uma bela noite na companhia do iPad.
PROVAR – Se são assumidamente carnívoros abriu em Lisboa um restaurante perfeito. Chama-se “Carne Alentejana” e pertence à marca homónima de produtos elaborados a partir de bovinos criados no Alentejo. Dizem-me que há dias em que se encontra essa especialidade que é rabo de boi, mas eu não tive essa sorte. A lista é extensa em carnes diversas e eu deliciei-me com um belíssimo e abundante naco de alcatra, que pode vir acompanhado de migas, batatas fritas domésticas, legumes grelhados ou salada. O couvert tem um belíssimo e escuro pão alentejano, saboroso e denso, umas azeitonas bem temperadas e azeite obviamente alentejano, como tudo o resto que ali se serve – até o vinho, claro, neste caso o honestíssimo Enjeitado. O único problema da sala é a acústica – bem lhe podiam colocar umas cortiças alentejanas, que ficava de certeza melhor. O serviço é bom, a carne é fantástica e o preço é razoável. Rua da Beneficência 229, telefone 218 237 126 .
GOSTO – Da fotografia da manifestante que foi abraçar um polícia frente às instalações do FMI em Lisboa.
NÃO GOSTO – Da crítica, com veladas insinuações pelo meio, do Secretário de Estado Carlos Moedas aos empresários que criticaram as alterações à TSU.
BACK TO BASICS – O génio dos dirigentes políticos está em conseguir que a maior parte das pessoas pague taxas e impostos elevados pelos quais recebem cada vez menos em troca - Gore Vidal
Por falta de jeito, ou por falta de vontade, o Governo criou, com a questão da TSU, uma situação delicada e colocou-se a ele próprio numa posição fragilizada. A legitimidade eleitoral que o Governo tem não lhe permite fazer tudo o que quiser ou entender, ao contrário do que alguns governantes querem fazer crer. Se as coisas estão pior que se pensava ou se surgiram novos problemas, e se é preciso tomar novas opções e decisões, a prudência recomenda que elas sejam estudadas por forma a que não se crie um côro de protestos que varre todo o espectro social, ideológico e partidário e que enfraquece oi Governo numa altura em que não precisamos de falhas.
Qual a solução para a situação criada? Derrubar o Governo, miná-lo por dentro? Não me parece que promover o inseguro Seguro a governante seja uma boa opção; não me parece que a tropa de choque ainda fiel a Sócrates queira queimar as mãos com as brasas que deixou ao lume. Assim sendo, tenho uma sugestão: Pedro Passos Coelho pode admitir que não é infalível e que por vezes se engana; pode ter a humildade de rever decisões que – já o sabemos hoje – foram insuficientemente discutidas no Governo (com o aliado de coligação), com a oposição e com os parceiros sociais.
A melhor coisa que nos podia acontecer seria o Primeiro Ministro compreender isto, recuar nas precipitações e, em conjunto com quem também assinou o memorando com a troika, procurar uma nova solução.
A melhor alternativa que nós temos disponível neste momento é que um novo Passos Coelho seja a alternativa ao anterior Passos Coelho. Eu acho que ele é suficientemente inteligente e bem intencionado para se deixar de teimosias. É altura de o Primeiro Ministro mostrar que percebe a realidade e se preocupa com o país.
(Publicado no diário Metro de 18 de Setembro)
POLÍTICA – O que aconteceu nesta última semana foi o expoente daquilo que vinha sendo construído nos últimos meses, e que é uma subalternização da política. É curioso que esta subalternização venha de um Primeiro-Ministro que foi durante cinco anos dirigente de uma organização política de juventude (JSD) e que tem muito tempo de actividade partidária. Dá que pensar se o seu processo de aprendizagem política não terá sido essencialmente virado para dentro, para a movimentação no aparelho partidário e para a consequente intriga palaciana, tudo com o objectivo de conquistar o poder, primeiro na organização, e , depois, onde for possível. Quiseram as circunstâncias que o poder, no país, estivesse maduro para ser colhido. É um exercício de humor negro reler por estes dias o livro “Mudar”, uma espécie de manifesto que Pedro Passos Coelho lançou em Janeiro de 2010, como uma das peças da sua candidatura à liderança do PSD. Quem ler as propostas que estão no livro, ironicamente subtitulado “Passos para a Mudança”, dificilmente acreditará que o seu autor é o Primeiro Ministro actual. O que se passa é que, uma vez cumprido o objectivo de conquistar o poder, se torna evidente que não se sabe como exercê-lo, e sobretudo, se evidencia a anulação da actividade politica, entendida como um diálogo constante com a sociedade, uma gestão de expectativas e um exercício de construção de soluções. Pior que isso, existe uma insensibilidade politica e social, patente não só no tipo de medidas, mas que é também a verdadeira razão de ser daquilo a que alguns chamam “problemas de comunicação”. Esses problemas só existem porque o papel e a importância da actividade politica foram preteridos para o exercício cego do poder - que é a razão de ser do autismo, da substituição da negociação pela imposição e da ponderação pela experimentação. Um dia destes, no PSD, no meio das criticas internas cada vez mais ruidosas, alguém começará a falar da necessidade de um Congresso. O tempo da politica volta sempre – não se consegue exterminá-la.
SARJETA – Por um daqueles acasos do destino, no preciso momento em que António Costa mostrava à imprensa as maravilhas do novo Marquês do Pombal, um reformado da construção civil, de 74 anos, que ali passava, apontou a inexistência, na nova obra, de sarjetas - e vaticinou a inevitabilidade de ocorrência de inundações na zona em caso de chuvada. Graças a este homem, Luís Garcia, soube-se que foram feitos 750 mil euros de obras provisórias que não estavam a contar, neste inverno, com a drenagem das águas pluviais. António Costa, que assim gere os dinheiros da cidade, admitiu aliás que o investimento se destinava a experimentar algo que foi baseado em modelos teóricos e que pode até ser anulado – numa curiosa colagem ao método Vítor Gaspar. Dois dias depois da chamada de atenção do reformado começou a ser escavacado o asfalto recentemente colocado, agora para instalação de escoadouros. É uma variante do método tentativa e erro: constrói/destrói. É todo um programa politico para o futuro de Costa.
SEMANADA – Portugal está entre os dez países da Europa com as propinas mais altas no ensino superior; a dívida dos municípios à Águas de Portugal disparou 16% no primeiro semestre; o crédito malparado subiu de 10,3 para 15 mil milhões de euros nos primeiros sete meses de 2012, em comparação com igual período do ano passado; a venda de automóveis na China cresceu 8,3% em Agosto; Vítor Gaspar não disse uma única vez a palavra crescimento na conferência de imprensa desta semana;na mesma ocasião o Ministro considerou que não houve rotura do governo com o eleitorado e sublinhou que não lhe passaria pela cabeça fazer experiências com os portugueses; o representante do FMI assegurou que a alteração da TSU não foi uma exigência da troika; os dois últimos jogos da selecção foram antecedidos de anúncios de mais medidas de austeridade – o próximo jogo é dia 12 de Outubro; Miguel Relvas anunciou, no Brasil, que o caso RTP está resolvido mas não disse se pelo lado da privatização ou da concessão; António Barreto garantiu que existem cláusulas secretas nos contratos das PPP’s.
ARCO DA VELHA – Agentes da PSP identificaram e intimidaram um cidadão que fotografou um veículo da segurança do Ministro da Defesa, que estava parado em cima do passeio, obstruindo a circulação de peões, frente ao escritório de advocacia do Ministro, no Porto, num momento em que ele se encontrava no edifício.
VER – Eduardo Gageiro é um dos nomes incontornáveis do foto-jornalismo português. Começou a sua carreira em 1957 e as suas imagens iluminaram muitas vezes as páginas das publicações do “Século”. Nos últimos anos tem fotografado Lisboa e são essas imagens, a preto e branco, que agora foram recolhidas num livro e numa exposição, “Lisboa Amarga e Doce”. A exposição está na galeria dos Paços do Concelho até 9 de Outubro.
OUVIR – Um recente spot de publicidade televisiva evoca uma máquina do tempo. Podia ter sido inspirado pelo disco evocativo dos 50 anos de existência dos Beach Boys, “That’s Why God Made The Rádio”. Mal o disco começa a tocar somos transportados para as sonoridades que fizeram a imagem de marca da banda, nas praias da Califórnia, no início dos anos 60 – desde as melodias, aos coros, passando pelos temas sempre presentes – a praia, o sol, o amor, o tempo a passar e o desejo de solidão recorrente em Brian Wilson, no fundo o mentor desta reunião da banda – sim porque aqui estão de novo os verdadeiros Beach Boys com canções de encantar como a que dá título ao álbum , “That’s Why God Made The Rádio”, mas sobretudo verdadeiras pérolas (sem ironia e com apreço) como “Isn’t It Time”, “Pacific Coast Highway” ou a faixa que encerra o CD, inevitavelmente “Summer’s Gone”. Há 16 anos que não gravavam juntos, mas ainda conseguem fazer sorrir com canções tão inacreditavelmente nostálgicas que se tornam divertidas.
FOLHEAR – A edição norte-americana da revista Vogue deste mês de Setembro tem 916 páginas. Assinala os 120 anos da revista e, quando se abre a capa, vê-se logo uma outra capa de 1949 com uma fotografia de Irving Penn e, ao lado, a capa da primeira edição da Vogue, de 17 de Dezembro de 1892, baseada numa ilustração - custava então dez cêntimos, hoje está nas bancas por $5.99 e em 1949 ficava por apenas 50 cêntimos. É a economia, como dizia o outro. Por falar nisso, um bom sinal da retoma publicitária que já vai acontecendo nos Estados Unidos é visível por esta edição ter mais de metade das suas páginas - entre as quais as primeiras 200 - com publicidade. Claro que a publicidade da Vogue é especial - é um catálogo de tendências e novidades das grandes marcas e folhear esta publicidade com atenção faz parte do prazer visual que a revista proporciona. Na capa está Lady Gaga vestida por Marc Jacobs, numa evocação aliás do desenho da primeira capa da revista, de 1892. Há muito para ler e ver nesta fabulosa edição, sobretudo artigos evocativos de vários momentos da História, paralelos à própria história da Vogue.
PROVAR – Se um dia destes lhe apetecer uma pequena viagem a um café parisiense no centro de Lisboa, vá direito às avenidas novas e procure a cafetaria do Instituto Francês, na Avenida Luís Bívar 91. O Bistrot L’Escale par Praline, dirigido pela pasteleira Béatrice Dupasquier, gaba-se de ter o original croque-monsieur. Se nunca provou, vale a pena – e não caia na asneira de dizer que quer uma tosta mista. Não é bem a mesma coisa – a começar pelo queijo, que deve ser gruyére ou emmental, cortado fino. O presunto, também cortado fino, acompanha o queijo derretido no meio do pão. Resta dizer que o queijo derrete igualmente por cima da sanduíche, e, se descontarmos o molho, percebemos que existem algumas semelhanças com a francesinha portuense. O croque-monsieur (assim chamado por o pão ficar estaladiço quando se tosta), nasceu num café parisiense em 1910 e surgiu pela primeira vez na literatura pela mão de Marcel Proust, no segundo volume de “Em Busca Do Tempo Perdido”. Conversas à parte, o croque –monsieur do Bistrot L’Escale é recomendável. E no fim, para sobremesa, pode rematar, a acompanhar o café, com um canelé, um pequeno bolo originário da região de Bordeaux, caramelizado por fora e suave por dentro – pecaminoso, na verdade.
GOSTO – Da afirmação de Manuela Ferreira Leite: "Só por teimosia se insiste numa receita que não está a resultar, esta segunda dose de xarope já ninguém a consegue engolir”
NÃO GOSTO – Do estilo conta-gotas de ir anunciando cada vez mais impostos e novas medidas de austeridade, deixando sempre no ar novas veladas ameaças.
BACK TO BASICS – “A eternidade pode às vezes durar um ano. E ferir-nos, num grito calado, a vida inteira" – Manuel de Freitas, em "Marilyn Moore"
Benjamim Franklin foi um dos fundadores dos Estados Unidos e uma das suas citações mais conhecidas reza mais ou menos assim: “na vida tudo é incerto, menos a morte e os impostos”. Sexta-feira passada o Primeiro Ministro português veio relembrar isto da pior forma possível numa intervenção cheia de pontos mal esclarecidos. E depois do discurso do novo imposto partiu para um concerto de Paulo de Carvalho onde esteve de cara alegre, a entoar o refrão de algumas cantigas. Para rematar, foi ao Facebook dizer ter pena das opções que tinha de tomar. Poucas coisas me espantam – mas estas deixaram-me perplexo. Nesse dia Passos Coelho divorciou-se do país.
Nada disto faz sentido. Até o Partido Popular, que se gabava de não aceitar mais impostos, se conformou e sucumbiu – argumentando que se trataria de uma taxa. Bagão Felix, histórico do PP e ex-Ministro das Finanças no anterior Governo de coligação, foi claro a criticar a medida: “É um verdadeiro imposto. Deixou de ser uma contribuição social para ser um imposto único”. Foi uma das muitas vozes do PSD e do PP que criticaram o rumo escolhido.
Os atos mostram um Governo de políticos que escolhem sempre o caminho mais simples. Como o sistema de controlo nos impostos e segurança social, criado para verificar as contribuições do trabalho, é o único que funciona, é utilizado à exaustão pelo Estado para aumentar receitas – porque é mais fácil que cortar as gorduras do Estado.
O melhor resumo da situação é de Fortunato Frederico, que lidera o grupo de calçado Kyaia, que faz a marca Fly London: “Estas medidas não têm pés nem cabeça. As empresas precisam é de trabalhar. Não me adianta nada que desçam a taxa social única para as empresas, se as pessoas não tem dinheiro para me comprar sapatos”.
(Publicado no "Metro" de 11 de Setembro)
CONTEÚDOS – Durante alguns anos trabalhei directa e indirectamente com a música e a indústria discográfica e, por dever de ofício, estudei o desenvolvimento dessa indústria, que era considerada, até finais dos anos 80, como um exemplo perfeito da combinação da criatividade com um modelo de negócios eficaz. Como toda a área dos conteúdos, cada nova obra tem uma componente, digamos, de protótipo - por mais estudos de mercado que se façam nunca se tem a certeza absoluta da possibilidade de êxito e popularidade de determinada obra até o público se confrontar com ela. A história da música popular, sobretudo no pós-guerra, está cheia de exemplos de rupturas totais com o saber instituído, as quais se revelaram marcantes do ponto de vista do impacte criativo e da rentabilidade da sua edição. Mesmo alguns artistas e obras que não tiveram sucesso imediato, conseguiram, décadas depois do lançamento de determinado disco, obter um sucesso e uma persistência de vendas que acabou por tornar muito rentável um projecto que parecia condenado ao fracasso. Isto aconteceu porque nessa época as grandes editoras, mesmo as multinacionais, eram dirigidas por gente que reconhecia o talento, que tinha sensibilidade para os conteúdos e que apostava em opções arriscadas – algo que hoje em dia se encontra quase limitado às operações independentes. Quando num processo de consolidação, que ocorreu ao longo dos anos 90, as multinacionais de conteúdos musicais foram tomadas por financeiros e os gestores de conteúdos foram afastados – literalmente removidos nalguns casos - começaram os grandes problemas que levaram a indústria discográfica à crise em que hoje está mergulhada: insensibilidade a novos formatos, resistência à inovação (como no caso da internet), fim de apostas arriscadas, persistência em produtos de êxito fácil e imediato mas com reduzido retorno futuro (como hoje se constata), diminuição da procura de novos talentos. Foi assim, por exemplo, que a EMI, a casa-mãe dos Beatles e de tantos outros, se afundou no meio de disputas entre fundos, bancos e gestores sem rasgo, para chegar a uma situação terrível no início desta década. Esta história vem a propósito da gestão dos conteúdos e do cuidado que deve existir no seu desenvolvimento, sob pena de a cura matar o paciente. Uma discussão que um dia destes por certo ocorrerá por estas bandas.
SEMANADA – O PSD desistiu de fazer nova lei eleitoral autárquica; a empresa que vendeu blindados à PSP foi proibida de negociar armas; o mercado de venda de automóveis novos está a cair 40,4% desde Janeiro; entre Janeiro e Junho venderam-se menos 29.500 jornais por dia; vendas de telemóveis caíram 21% no segundo trimestre; em 2011 encerraram 152 agências bancárias; em dois dias desta semana ardeu o equivalente aos concelhos de Lisboa e Odivelas; prejuízos das empresas públicas duplicaram no segundo trimestre do ano e chegam aos 700 milhões; empresas públicas devem 30 mil milhões de euros; o Estado já emprestou 1,7 mil milhões de euros às empresas públicas desde o início do ano; a troika disse que os resultados do programa de ajustamento são da responsabilidade do Governo; a balança de pagamentos esta semana teve evolução positiva graças às compras efectuadas em Portugal pelos russos do Zenit; o novo co-líder do Bloco deu a primeira entrevista para dizer que “o problema da esquerda é o PS estar poluído por concepções neoliberais”.
ARCO DA VELHA – As empresas do sector empresarial do Estado realizaram um conjunto de contratos de derivados financeiros avaliados em 16 mil milhões de euros, os quais em Junho registavam perdas potenciais de 2,5 mil milhões de euros – um buraco superior à derrapagem que se conhece do défice público.
VER – A exposição “Os Comedores de Batatas” da pintora Maria Beatriz inaugura um mês cheio de exposições interessantes. Na Holanda, terra de acolhimento da artista quando saíu de Portugal, em 1962, nasceu uma obra que tem muitas referências a Van Gogh – e esta série de trabalhos é precisamente inspirada por uma das obras do pintor holandês, “Os Comedores de Batatas”. Fica até 25 de Novembro no Museu da Electrcidade, na Central Tejo. Para a semana, dia 13, no espaço BES Arte e Finança, na devastada praça Marquês do Pombal, inaugura uma exposição dedicada ao centenário de John Cage e dia 20, no mesmo local, é inaugurada a exposição “Usura”, que agrupa trípticos de Paulo Nozolino. Finalmente no fim do mês na Galeria João Esteves de Oliveira, no Chiado, Pedro Cabrita Reis apresentará novos trabalhos em papel.
OUVIR – Austríacos, os Sofa Surfers fazem canções envolventes, onde palavra, ritmo e música integram um todo trabalhado como uma peça de filigrana sonora, feita com cuidado, devoção e electronica comedida. Melodias subtis, ritmos persistentes e as vozes da nigeriana Many Obeya e do vienense Jonny Sass cruzam-se no oitavo album deste grupo, “Superluminal”, editado pela Rough Trade e já disponível em Portugal. Destaque para os temas “World In a Matchbox”, “In Vain”, “Superluminal” e para o tema de abertura, “Out, Damn Light” que cria desde o início as sonoridades que marcam este disco.
FOLHEAR – Mais cedo ou mais tarde tinha que acontecer: a Monocle já tem oficialmente uma imitação. Trata-se de uma publicação francesa intitulada “The Good Life” e que se apresenta, cito, como “Le premier magazine masculine hybride”. Estranho? Se folhearem a coisa vão ficar ainda mais perplexes. Os curiosos de revistas, como eu, recordar-se-ão de uma revista francesa dos anos 70, chamada “Lui”. Isto é, do ponto de vista de conceito editorial e conteúdos, salvaguardadas as distâncias e as diferenças, uma espécie de “Lui”, para pior, mais confusa e com uns toques fingidos de modernidade. As semelhanças com a Monocle esgotam-se na cópia do grafismo, porque editorialmente aqui falta o rasgo que permite à revista de Tyler Brulé dedicar – com graça e saber - uma edição inteira a forças militares por esse mundo fora, como a última que está nas bancas, e aqui referida na semana passada. Um outro paradoxo desta auto-intitulada revista híbrida é o facto de em França custar cinco euros e em Portugal se vender por dez – o câmbio dentro da zona euro anda pela hora da morte.
PROVAR – Neste rectângulo à beira-mar plantado temos a tradição de nos queixarmos de que há poucas esplanadas e, quando existem, queixamo-nos do vento – nós e as nossas circunstâncias, como diria um filósofo; por acaso hoje em dia as esplanadas já vão existindo, algumas bem simpáticas. Uma delas é a “Portas do Sol”, no Largo com o mesmo nome, um pouco acima da Sé de Lisboa e perto do Castelo de S.Jorge. Instalada no terraço por cima do parque de estacionamento ali construído há uns anos, com uma vista magnífica sobre o Tejo e o casario de Alfama, a “Portas do Sol” tem uma sala para os dias mais invernosos, mas é o terraço ao ar livre que verdadeiramente chama a atenção. De um lado está reservado para serviço de restaurante e do outro, o maior, funciona ao longo de todo o dia um serviço de bar onde as mesas alternam com sofás confortáveis. O restaurante é uma boa opção a considerar nestes dias de fim de verão, com as noites a boa temperatura. As propostas são variadas e muito honestas. Não se pode dizer que o local seja um templo da gastronomia, mas está várias estrelas acima da média e justifica bem uma noite bem passada com uma vista de arrasar: por exemplo o caril de frango recomenda-se e o bacalhau à Brás com gambas é uma boa surpresa. A lista de vinhos tem preços razoáveis e o serviço é simpático. Telefone 218 851 299 .
GOSTO – Dos resultados dos atletas paraolímpicos portugueses, infelizmente na mesma altura em que foi conhecida a intenção do Governo em retirar benefícios fiscais a cidadãos com capacidades diminuídas.
NÃO GOSTO – Da irresponsabilidade do Vereador do Trânsito em Lisboa, Nunes da Silva, que diz que a circulação no Marquês não está “assim tão caótica”.
BACK TO BASICS – A televisão possibilita termos a sala invadida por pessoas que em nenhuma circunstância quereríamos ter em nossa casa – David Frost
(Publicado no Jornal de Negócios de7 de Setembro)
Eu acho compreensível que os funcionários da RTP estejam preocupados com o seu futuro. Se a empresa fosse governada racionalmente, um terço deles não teria lugar. Mas a verdade é que graças à forma desastrada como o tema tem sido tratado, eles conseguiram que se confunda serviço público com RTP. E essa confusão é uma das piores coisas que pode acontecer se quisermos, com seriedade, continuar a ter um serviço público de rádio e televisão.
Uma coisa é serviço público, outra é o universo da RTP- não podem ser confundidos e como se tem demonstrado ao longo dos anos a RTP proporciona pouco serviço público, mas em contrapartida faz mais concorrência aos privados, na televisão e na rádio. Por estes dias li, sem surpresas, que os famosos 150 milhões da contribuição para o audiovisual, que pagamos na fatura da eletricidade, chegavam para pagar o funcionamento da SIC ou da TVI. Como se sabe não tem chegado para pagar a da RTP – já que ainda recebe indemnizações compensatórios e receitas de publicidade. Aqueles que defendem um serviço público de televisão e rádio devem pensar no que é preciso fazer para que ele exista dentro desses 150 milhões.
Não será difícil perceber que a estrutura terá de diminuir, que o número de canais terá que ser menor, que a programação deverá ser complementar, em vez de concorrencial em relação aos privados. Não é um processo fácil e demorará uns três anos a executar. Mas é possível, e é a única forma de conseguir que daqui a alguns anos exista outra produção audiovisual, que retrate melhor o país, as pessoas, a sua cultura e os seus hábitos – quer nas notícias, quer na programação. Só mais uma coisa – no momento atual esta não é a discussão mais importante sobre o futuro de Portugal. Mas é uma questão cuja resolução sinalizará a vontade de mudança.
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