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40 ANOS - A IDADE DA INDIFERENÇA ?

por falcao, em 24.04.14

CICLOS - O 25 de Abril foi há 40 anos, menos oito que o total do tempo de poder do antigo regime. O que se passou antes de 1974 já não pode, em boa verdade, ser invocado como desculpa para o estado em que o país agora se encontra. O novo regime tem vivido em zigue-zagues, mas há uma substancial diferença entre os primeiros 20 anos e as duas décadas seguintes, as mais recentes. Em pouco mais que as duas primeiras décadas pós 74 fizeram-se reformas e alterações estruturais na saúde, na educação em infra-estruturas básicas; nas décadas seguintes, marcadas pela adesão à União Europeia em 1986, engordou-se o Estado, os partidos engordaram os seus aparelhos e perderam militância, as obras públicas consumiram demasiados recursos, as empresas de construção cresceram enquanto as indústrias exportadoras encolheram; a pesca diminuíu e a agricultura foi subsidiada nuns anos para arrancar o que noutros anos era plantado com outros subsídios. O Bloco Central, que fez alternar no poder PS e PSD, fomentou auto-estradas para além do necessário, construíu aeroportos que não têm utilização, permitiu bancos que enganaram depositantes e o Estado não melhorou a Justiça. O Estado, aliás, destacou-se por gastar o que tinha e, sabe-se agora, o que não tinha. De tudo o que delapidou, sobretudo dos finais dos anos 90 para cá, sobra pouco. Não admira que as pessoas se afastem da política e não queiram ter participação cívica, como estudos recentes bem revelam. Mas nem eram precisos estudos: quando mais facilmente se juntam milhares de pessoas para celebrar na rua, à noite, uma vitória futebolística, do que aquelas que protestam e agem, dia a dia, contra a corrupção, a prescrição de processos de milhões, a falta de justiça ou a ingerência, está tudo dito sobre os 40 anos que passaram desde 25 de Abril de 1974. As pessoas não se importam e o Estado agradece.

 

SEMANADA - A Associação de Inspectores de Jogos acusa o sorteio do fisco de falta de transparência e afirma que não está a ser cumprida a lei; uma parte do governo quer taxar o consumo do açucar e do sal, outra parte quer taxar o consumo de alcoól e tabaco; ao longo desta legislatura o Governo tem ignorado um terço das perguntas dos deputados; o deputado socialista Miguel Coelho publicou esta semana a sua tese de doutoramento onde defende que o recrutamento partidário no caso do PS e do PSD está nas mãos de um núcleo restrito, que é quem comanda o acesso a cargos políticos remunerados; António Costa defendeu eleições primárias no PS abertas a não militantes e uma reforma dos sistema eleitoral; numa sondagem da Universidade Católica publicada esta semana 86% dos portugueses dizem não ter qualquer actividade política actualmente e apenas 2% afirmam ter actividade política regular - os outros 12% apenas de forma esporádica.; a mesma sondagem indica que 83% dos portugueses estão insatisfeitos com o funcionamento da democracia; no mesmo estudo de opinião os Tribunais foram considerados a instituição com pior funcionamento e 73% dos inquiridos manifestaram confiança na imprensa; a Autoridade para as Condições do Trabalho inspeccionou 37 mil locais de trabalho em 2013 e apurou 37 milhões de euros de salários em atraso, um aumento de 66% em relação ao ano anterior; nos últimos dez anos a CP comprou 25 locomotivas de mercadorias por 105 milhões de euros e deixou de utilizar 26 locomotivas, também de mercadorias, usadas, mas que tinham tido um forte investimento de reparação e modernização e estavam em bom estado.

 

ARCO DA VELHA - Uma juíza do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa deixou acumular 8 mil processos atrasados em 2010, mais que a soma de todos os que estavam pendentes em todos os juízos daquele Tribunal.

 

FOLHEAR - “A Liberdade Livre” é o título de um livro dedicado a Cruzeiro Seixas, um dos mais importantes artistas surrealistas portugueses, e que é baseado numa conversa com José Jorge Letria. O livro começa com uma citação de Cruzeiro Seixas que não resisto a reproduzir: “Sonho com uma bola perfeita toda feita de ar. Por agora só nos faltam os argumentos suficientemente convincentes para convencer o ar”. E ainda esta: “por toda a parte há sonhos a empurar outros sonhos para o abismo”. O livro tem numerosas fotografias do autor, muitas na companhia de outros membros do grupo dos surrealistas, como Mário Cesariny, Mário Henrique Leiria ou António Maria Lisboa, além de reproduções de algumas obras do artista. A conversa com José Jorge Letria recorda o percurso de Cruzeiro Seixas, mas também um relato dos tempos que viveu, a forma como o grupo dos surrealistas marcou uma época. E Seixas recorda episódios, encontros que teve, conversas que lhe ficaram na memória, como uma com Amália Rodrigues, em que ele, referindo-se à fadista, termina assim “Acho extraordinária a voz dela. É como a voz deste país, se este país tivesse voz”.

 

VER - Algumas sugestões para estes dias. Começo pela exposição que abriu na Gulbenkian no dia 23 de Abril, integrada nas comemorações dos 450 anos do nascimento de William Shakespeare e que, entre outras edições, apresenta um exemplar da tragédia Hamlet, traduzida para francês e apresentada por André Gide, com ilustrações gravadas a buril por Albert Decaris. Este exemplar desta obra foi adquirido por Calouste Gulbenkian, em 1947.  Ainda na Gulbenkian destaque para a exposição “Os Czares e o Oriente”, que reúne um conjunto de peças da coleção do Kremlin de Moscovo composto pelas ofertas aos czares provenientes do Irão safávida e da Turquia otomana dos séculos XVI e XVII. Em exibição estão 66  peças entre joias, tecidos, armas e arreios de cavalo, utilizadas nos atos cerimoniais dos czares russos, na vida da corte, nas campanhas militares, e nos ofícios divinos celebrados nas igrejas do Kremlin. Anteriormente apresentada na Arthur M. Sackler Gallery da Smithsonian Institution em Washington, é a primeira vez que estas coleção é vista na Europa. Finalmente estes são os últimos dias para ver a colecção de máscaras portuguesas, do actor André Gago, que até Domingo estão expostas no Museu da Marioneta, que fica no Convento das Bernardas, Rua da Esperança 46.

 

OUVIR - “Crónicas da Grande Cidade”, de Miguel Araújo, é o contraponto rural aos discos contemporâneos, mais urbanos. Aqui contam-se histórias da terra e o espanto pela vida na cidade. Miguel Araújo é um bom contador de histórias, as canções são construídas como episódios de uma série que conta a viagem de alguém que veio do interior para a grande cidade. Há momentos em que, na música, nas palavras e até na forma de cantar, este disco faz lembrar o primeiro trabalho dos “Rio Grande”. Não se pode dizer que isto seja música folk, nem que esteja particularmente baseado na música tradicional portuguesa - mas há lá sinais de tudo isto, desde os instrumentos à forma de cantar, passando pelos arranjos. É curioso notar o enorme contraste entre este disco e outro grande trabalho de histórias cantadas, já aqui referido, que é o disco de Capicua. Um, o dela, completamente urbano, musicalmente contemporâneo; outro, de forte influência rural, musicalmente conservador. Estas características não fazem com que um seja melhor que o outro - mas mostram a diversidade da música que hoje se está a fazer em Portugal. O facto de os dois cantarem em português, e de ambos serem bem escritos, contradiz aqueles que por preguiça evitam o português e se escondem no inglês. Tenho sempre a sensação de que quem o faz, não é capaz de assumir dizer coisas simples na nossa língua - como “gosto de ti”, preferindo sempre dizer o mesmo em inglês. As minhas canções preferidas são “Cidade Grande (Canção de Acordar)”, “Romaria das Festas de Santa Eufémia”, “Cartório”, “Contamina-me” e “Valsa Redonda”. É bem curioso que este disco saia precisamente nesta altura do calendário comemorativo. Não há-de ter sido por acaso. Tem um lado de saudade.

 

PROVAR - A partir desta semana o Sky Bar voltou a ser uma possibilidade para um aperitivo ao fim da tarde ou para uma refeição ligeira da carta concebida para o local. O Sky Bar é já uma tradição que vai das primeiras semanas da Primavera ao fim do Verão e que fica no último andar do Hotel Tivoli, da Avenida da Liberdade, ao fundo da sala do restaurante “Terraço”. O Sky Bar este ano tem algumas mudanças - na localização do bar por exemplo, e é garantidamente um dos locais com melhor vista sobre Lisboa. Quando o tempo está bom não há melhor local para passar o fim de tarde ou o início da noite. Nas noites de 5ª, 6ª e sábado há DJ’s convidados.

Num registo completamente diferente, e se estiver em Lisboa no sábado à tarde, não perca o “Levar a Vida a Degustar” que a Vida Portuguesa do Largo do Intendente promove - pelas 16h00 há provas de cerveja artesanal “Letra” e as novas conservas da marca José Gourmet - moelas de pato, rojões à minhota, lampreia à bordalesa ou caril de lulas.

 

DIXIT - “Hoje a legislação laboral não constrange a actividade económica” - António Saraiva, Presidente da CIP

 

GOSTO - Da forma como Ricardo Araújo Pereira e Miguel Guilherme fazem “Melhor Do Que Falecer”.

 

NÃO GOSTO - De quem autorizou fogo de artifício depois da meia noite, no centro de Lisboa, em véspera de dia de trabalho.

 

BACK TO BASICS - Aqueles que prescidem das liberdades fundamentais invocando a necessidade de assegurar temporariamente a segurança não merecem ter nem liberdade nem segurança - Benjamin Fraklin

 

 

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publicado às 14:30

CONSERVADORES - Em 1994 Mira Amaral, então Ministro da Indústria de um Governo de Cavaco Silva, convidou Michael Porter, um Professor de Harvard, a fazer um estudo sobre a economia portuguesa. O relatório Porter, como ficou conhecido, foi feito já há 20 anos e defendia a aposta imediata nos sectores tradicionais, identificando “clusters” estratégicos: calçado, têxteis, cortiça, indústria automóvel, turismo, madeira e vinho, que deviam conviver com melhorias na educação, na capacidade de investigação científica, no desenvolvimento da tecnologia aplicada à realidade económica, na capacidade de gestão, em financiamentos mais acessíveis e numa melhor gestão florestal. Ao fim de 20 anos percebemos que se perdeu muito tempo a evitar seguir as recomendações que hoje se verificam, no essencial, acertadas. Pouco tempo depois do estudo ser divulgado, em 1995, Guterres era eleito Primeiro Ministro e guardou as recomendações na gaveta, deslumbrando-se com modas passageiras - modas que ainda hoje pesam no nosso dia-a-dia. Foram precisos vários anos e crises duras nestes sectores tradicionais para que eles começassem a recuperar - incorporando tecnologia, design, melhor gestão e melhor promoção. Fica aqui este número para mostrar o que há 20 anos alguns não quiseram ver:  em 2013 a indústria portuguesa de calçado exportou mais de 75 milhões de pares de sapatos, no valor de 1700 milhões de euros, para 132 países. No fundo conservadores foram os que fugiram a desenvolver aquilo que sabíamos fazer e que foram imitar o que outros já tinham. Deu mau resultado, como agora se sabe.

 

SEMANADA -  Foi anunciado que o Hospital de Santa Cruz, uma unidade especializada em cardiologia e que por isso mesmo se notabilizou, pode perder a valência de cirurgia cardiotoráxica;  o centro hospitalar de Lisboa norte deixou prescrever 4,6 milhões de euros em taxas moderadoras; 439 escolas com menos de 21 alunos estão em risco de fechar e seis mil crianças poderão ter de mudar de local de ensino no próximo ano lectivo; depois das mudanças introduzidas pelo Ministério da Educação a disciplina de Inglês deixou de chegar a todos os alunos do 1º ciclo; uma estimativa de uma associação do sector considera que em Portugal existem cerca de três mil lares de idosos ilegais; segundo dados do INE existem 1,9 milhões de pessoas em risco de pobreza e 120 mil crianças têm alimentação deficiente; a maioria dos elementos do gangue do multibanco recebia rendimento social de inserção; a justiça arquivou 45% dos casos de corrupção; 39,7% dos processos relativos a corrupção dizem respeito a autarquias; em Portugal foram apresentadas 16 listas concorrentes às eleições europeias, meia dúzia delas de novas organizações ou de organizações sem actividade política regular; cada lista concorrente pode gastar até 2,9 milhões de euros na campanha eleitoral; António Barreto deixou a Fundação Francisco Manuel dos Santos em divergência com o dono do Pingo Doce e da Fundação, Alexandre Soares dos Santos.

 

ARCO DA VELHA - As obras de remodelação da estação de Metro do Areeiro, em Lisboa, estão a decorrer desde 2009 e, ao fim de cinco anos de transtornos constantes para quem vive  no local, foram suspensas devido a um litígio judicial com o empreiteiro.

 

FOLHEAR - “1914 - Portugal no ano da Grande Guerra”  é uma viagem do jornalista Ricardo Marques ao dia a dia de há um século atrás. Ele leva-nos aos usos e costumes do ano em que começou a I Grande Guerra e diz-nos como viviam as pessoas, fala do que se relatava nos jornais, abundantemente citados. Por ali se encontram notícias da  Lisboa do tempo da febre tifóide, e também se  fica a saber que já então a Universidade de Coimbra pensava acabar com as praxes ou que havia um movimento contra as touradas. Ricardo Marques, que nasceu em 1974, percorreu arquivos em busca do passado para nos fazer uma reportagem do tempo que não vive nas nossas memórias. Ao longo de 300 páginas, com ilustrações da época, recorda-nos como era então encarada a ciência e vista a natureza, como se passava a vida pública e a vida privada - das lutas operárias às festas e às modas, passando pelo mundo visto a partir de Portugal e, inevitavelmente, pela Guerra que então começava. (Edição Oficina do Livro)

 

VER - “O Burel da cortina antepara o céu opaco” é o título da exposição de obras de Pedro Calapez que podem ser vistas na galeria Appleton Square até 10 de Maio. Nas obras expostas, quase uma instalação, o desenho a computador  mistura-se com a pintura a pincel japonês sobre papel e  o preto, branco e cinzentos contrastam com explosões de côr. Nos dois momentos da exposição, no piso de entrada e na sala do piso inferior,  evidencia-se a variedade e o contraste do trabalho contemporâneo de Calapez, que continua com uma agenda de exposições com um ritmo invulgar, em Portugal e no estrangeiro. A Appleton Square fica em Alvalade, na Rua Acácio Paiva 27.

 

OUVIR - “Yellow Brick Road”, o álbum de 1973 de Elton John, oitavo disco da sua carreira,  foi o seu primeiro grande sucesso discográfico - e o álbum figura aliás em diversas listas dos melhores discos pop de sempre. Talvez se possa dizer, mesmo à distãncia de quatro décadas, que este foi o ponto mais alto da colaboração com Bernie Taupin, o co-autor de todas estas canções e que muitas vezes é injustamente esquecido. Aqui estão temas como “Candle In The Wind” e a faixa título “Goodbye Yellow Brick Road”, além de outras como “Saturday Night’s Allrright For Fighting”, “Roy Rogers”, “Your Sister Can’t Twist (But She Sure Can Rock ‘n’ Roll”, o provocador ”All The Girls Love Alice” e “Bernie The Jets” - esta tornou-se um êxito nas estações de rádio de soul music dos Estados Unidos. Elton tinha 26 anos quando o disco foi gravado e o êxito de algumas das canções fez esquecer como o álbum, no seu conjunto é uma obra consistente - e como a canção título é, afinal, sobre o facto de a fama e o sucesso serem uma coisa tão difícil de gerir e de viver - como a sua carreira ao longo das últimas décadas sobejamente tem provado. Por ocasião do 40º aniversário do lançamento original do álbum foi agora lançada uma edição especial, com uma nova remasterização digital e um CD extra que inclui diversas versões de canções pouco conhecidas de Elton John por alguns nomes contemporâneos. Há várias boas versões mas eu destaco a de John Grant em “Sweet Painted Lady”, embora as pretações de Imelda May e Emeli Sandé também mereçam destaque. Finalmente este disco extra ainda inclui alguns clássicos da carreira de Elton John, gravados ao vivo no Hammersmith Odeon, em Londres, em Dezembro de 1973.

 

PROVAR - Aqui há uns anos a Rua Barata Salgueiro, era a rua da Sociedade Nacional de Belas Artes e da Cinemateca. Agora é conhecida pelos três restaurantes que nos últimos anos ali abriram - o Guilty, que entretanto perdeu a graça, o D’Oliva, que continua engraçado e o Sushi Café que mantém uma qualidade constante e que do ponto de vista do conforto e decoração é o melhor de todos. As origens do D’Oliva, estão no Porto, em Matosinhos, onde os seus proprietários, sob o mesmo nome, fizeram fama e ganharam experiência antes de virem para Lisboa, há 4 anos. Ao almoço há um menu executivo a 18 euros e à noite o serviço é apenas à carta. Teoricamente este é um restaurante italiano, mas a lista tem muitas e boas aventuras portuguesas. Com o correr dos tempos o D’Oliva tornou-se num daqueles sítios que grupos de amigos escolhem para se encontrarem, o que leva a que por vezes à noite não seja o sítio mais sossegado do mundo. A sala de cima tem um confortável balcão, há vinho a copo de várias boas proveniências e a cerveja é bem tirada. Também há cocktails e as numerosas entradas da lista são bons petiscos. Na lista a alhada com raia é muito decente e o bife de lombo alentejano é decentíssimo, assim como os mini hamburgueres. O serviço é simpático, há zona de fumadores e não fumadores - a de não fumadores acaba inevitavelmente por ser mais sossegada. Feitas as contas, continua a valer a pena lá ir. Rua Barata Salgueiro 37, telefone 21 352 8292.

 

DIXIT - “Toda a gente crê que a democracia garante o bom governo, quando na verdade apenas garante que podemos mudar de Governo” - Felipe Gonzalez, na conferência promovida pelo “Expresso”, na Gulbenkian.

 

GOSTO - Os prémios Pulitzer foram atribuídos aos jornais “The Washington Post” e “The Guardian” pelo conjunto de notícias sobre os programas de espionagem da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos.

 

NÃO GOSTO - Das confusões e constantes alterações daquilo que o Governo diz sobre as pensões e reformas.

 

BACK TO BASICS - Não se pode dar um aperto de mão com o punho fechado - Indira Gandhi

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publicado às 16:18

RETRATO -  As últimas semanas têm sido particularmente exemplares para se poder comprovar que, em Portugal,não temos um sistema baseado na Justiça mas sim um sistema baseado em manobras, truques e desleixos diversos para iludir a justiça. Ficou claro que a prescrição é agora um estado normal da justiça portuguesa, quer o crime seja financeiro ou de vida e morte, ou de costumes. A maior especialidade desenvolvida em Portugal pelo sistema judicial é o arquivamento de casos prescritos. A coisa chegou a um ponto em que o Governador do Banco de Portugal recomenda como medida para o assunto que se alargue o prazo de prescrição  - mas não ocorre atacar as causas do problema : as habilidades dos advogados que empatam julgamentos, a displicência de juízes e de procuradores, a falta de meios dos tribunais. Em Portugal quem tiver bom advogado e alguma influência pode ter esperança em passar pelo crime sem castigo - infelizmente é esse o ponto a que a percepção do cidadão comum chegou.

 

SEMANADA - Uma procuradora adjunta de Santa Maria da Feira deixou prescrever 19 processos; a procuradoria de Lisboa afirma que o novo mapa judicial não é viável; o crédito malparado nos empréstimos à habitação já subiu 7,85% face ao ano passado; o Banco de Portugal recebeu 17.911 queixas contra Bancos  em 2013, mais 15% que no ano anterior sobretudo por causa de créditos à habitação e ao consumo; os pedidos de ajuda à DECO no 1º trimestre só subiram entre os trabalhadores do Estado e os reformados; o volume dos depósitos das famílias nos bancos voltou a diminuir em Fevereiro pelo terceiro mês consecutivo;  o acordão do julgamento do processo “Face Oculta”, que se arrasta há dois anos e cinco meses, foi marcado para 5 de Setembro, daqui a cinco meses; o realizador Manoel de Oliveira, 105 anos de idade, iniciou esta semana no Porto a rodagem de um novo filme, “O Velho do Restelo”, graças a financiamentos públicos portugueses e franceses; Helena Roseta, presidente das Assembleia Municipal de Lisboa eleita pelo PS, criticou a actuação do município no processo da Colina de Santana e exigiu publicamente “lealdade e transparência” ao executivo de António Costa; os vistos gold fizeram disparar em 54% os preços dos imóveis de luxo em Lisboa; a Presidência da República, a Assembleia da República, diversas Cãmaras Municipais e numerosas empresas públicas não divulgaram qualquer contrato de aquisição de bens ou serviços, ao contrário do que o Tribunal de Contas exige; o deputado Miguel Frasquilho foi indicado para presidente do AICEP sem parecer prévio do Sr. Bilhim; um protocolo assinado no Ministério da Agricultura criou o o Centro de Competências do Tomate.

 

ARCO DA VELHA - O secretário de Estado do Orçamento, Hélder Reis, interrogado por deputados na Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças, teve esta resposta: “Eu sou como o Pinóquio: quando minto o meu nariz cresce. Não está a ver o meu nariz a crescer - eu não estou a mentir”.

 

FOLHEAR - No panorama livreiro português restam poucas editoras independentes e a “Guerra & Paz”, dirigida por Manuel S. Fonseca, é uma delas - e uma das que trabalho mais interessante tem feito ao longo dos oito anos que leva de vida. «Fama e Segredo na História de Portugal», de Agustina Bessa-Luís, foi um dos primeiros livros que editou e quis o destino que fosse o último livro escrito pela escritora, antes de a sua saúde ter fraquejado. Talvez por isso, neste momento de aniversário da edtora, a “Guerra & Paz” relançou, em novas edições, dois títulos do seu catálogo:  “O Livro de Agustina - uma autobiografia”, que nesta versão editorial inclui o conto preferido da autora, “Um Inverno Frio”; e também esse maravilhoso encontro da escrita de Agustina com a pintura de Paula Rego sobre a série “As Meninas” - “Estão sempre alerta, sabem coisas proibidas, em volta delas as mulheres conspiram, inspeccionando a sua roupa de baixo. As Meninas são profundamente perigosas”. São duas edições verdadeiramente fundamentais - uma para entrar, sorrindo, dentro da vida da escritora e, outra, para ver a sua capacidade de observação e o encanto da sua cumplicidade com a criatividade de Paula Rego. São duas edições de excepção nestes tempos que correm.

 

VER - Raras vezes uma exposição de fotografia provoca uma impressão tão marcante como  “Este é o Lugar”, do sul-africano Pieter Hugo, que ficará na Fundação Gulbenkian até 1 de Junho. As imagens são duras, não são retratos passivos, são testemunhos de um tempo, de pessoas e de lugares. São imagens do quotidiano, mas não são instantâneos. São fotografias cuidadosamente produzidas, feitas em película e em câmara de grande formato. Pressupõem o estabelecimento de uma relação entre o fotógrafo e o fotografado que ultrapassa o momento. Cada uma permite adivinhar conversas, imaginar o que se estabeleceu, o que levou cada sujeito fotografado ou local escolhido até ali - ao momento da imagem fotográfica. Na realidade a exposição compõe-se de 15 ensaios diferentes, feitos entre 2005 e 2012, num trabalho persistente de rigor e coerência, de imaginação e de provocação. Esta é mais uma mostra exemplar da iniciativa “Próximo Futuro”, da Fundação Gulbenkian, programada por António Pinto Ribeiro.

 

OUVIR - Volta e meia há discos que me despertam e surpreendem. Discos em português, com letras que são histórias para além de rimas e tretas, palavras que contam testemunhos e relatos - que nos falam das vidas e de pessoas. Confesso que, distraído, nunca tinha ouvido falar de Capicua. No seu site dá como referência que nasceu em Cedofeita em 1982, descobriu o hip hop aos 15 anos, estudou e doutorou-se em sociologia. Tem uma longa lista de colaborações musicais, o primeiro trabalho foi editado pela Optimus Records e o segundo foi editado já este ano pela Norte-Sul. Chama-se “Sereia Louca” e evoca Kafka em abono do título. A edição tem dois discos, um de originais, outro de versões acústicas de trabalhos anteriores e qualquer deles é bom - mesmo o brinde acústico é muito bom. Rapper por etiqueta, o que me interessa mais em Capicua é o que ela canta, aquilo que escreve e a forma como conjuga as palavras com a música. Escreve boas histórias, retoma aqui e ali cantigas antigas, como “O Soldadinho”, de Reinaldo Ferreira, a que dá uma volta completa com a ajuda de Gisela João. Sente-se que tem gôzo em subverter as coisas, em ensaiar colaborações inesperadas como aquela “Lupa” em que a angolana Aline Frazão canta José Gomes Ferreira. Gostava de não colar uma etiqueta de género a este disco e dizer apenas que aqui está música contemporânea de Portugal. É coisa rara, cada vez mais rara hoje em dia. Não é saudade, mas tem passado; e ao mesmo tempo desenha o futuro com os pés no presente. Há muito que não ouvia um disco assim.

 

PROVAR - Em Setúbal, frente à doca dos barcos de pesca, há um passeio largo, que permite andar a pé ao longo do Sado, desde a saída dos barcos para Tróia, com a baía bem à vista.. Toda a zona tem sido recuperada nos últimos anos e entre velhos armazéns começaram a surgir novos restaurantes. O local onde tudo isto se cruza é a Rua da Saúde. Já se sabe que Setúbal é uma das cidades onde se come melhor peixe e numa recente visita deixei-mer seduzir pelo apelo de D. Manuela, que acolhe os clientes no restaurate “Baía do Sado”: esplanada confortável e bem protegida do sol e do vento, interior amplo. Logo à entrada está um balcão com o peixe e mariscos frescos. Havia uma bela dourada de 700 gramas que chamava por nós e umas navalhas, que por recomendação da casa e curiosidade nossa, foram feitas à moda de Bulhão Pato. Nunca as tinha provado neste preparo e gostei. A dourada estava primorosamente grelhada, mantendo a frescura e o sabor, sem secura nem estorricanços. Os legumes cozidos no ponto foram o acompanhamento. O pão, que se provou com azeitonas e, depois, na infusão criada pelo Dr. Bulhão, estava denso e saboroso. Acompanhou um vinho branco da região, fresco e levemente frutado. O serviço foi escorreito e no final a conta foi uma agradável surpresa. A esplanada foi um prazer para a vista e o peixe e as navalhas excederam o que se esperava. A Baía do Sado fica no nº 46 da Rua da  Saúde e o telefone é o 265 553 247.

 

DIXIT - “Muito bem. Fica registado o seu insulto, ao qual não vou responder” - José Rodrigues dos Santos, em reação à afirmação de José Sócrates: “não basta papaguearmos tudo aquilo que nos dizem para fazer uma entrevista”.

 

GOSTO -Catarina Sobral foi escolhida na Feira do Livro Infantil de Bolonha como a melhor ilustradora para a infância, garças ao seu livro “O Meu AvÔ”.

 

NÃO GOSTO - Continuam a prescrever processos no caso BCP


BACK TO BASICS - Não esperem pelo julgamento final, ele realiza-se todos os dias - Albert Camus

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publicado às 15:32

ELEIÇÕES - Um homem que eu me habituei a considerar inteligente, e que de certa forma parecia destoar da pobreza da classe política, é Paulo Rangel. E, no entanto, empolgado pelo clima eleitoral e pela sua condição de cabeça de lista do PSD e PP às europeias, ei-lo que se deixou enebriar pelas próprias palavras e criou um caso onde o prazo de validade da notícia já tinha quase esgotado - o manifesto pela reestruturação da dívida. Confesso que me custa a perceber a relação entre a falta de jeito para a táctica política com a abundância de dotes oratórios. Ele há pessoas que gostam tanto de se ouvir a si próprias, que depois se embrulham no discurso e nas palavras, que degustam, deliciados, sem lhes ocorrer que o sabor que os entusiasma é o da cicuta. Estes oradores kamikaze, que nos últimos tempos têm feito escola no PSD em diversos níveis, são quem alimenta a desconfiança nos políticos. Quem está a dar brasa ao manifesto é quem faz declarações como as de Paulo Rangel sobre a falta de adesão do tal manifesto - gerou instantaneamente pretexto para uma petição que cresceu velozmente e que chegou a recolher assinaturas de três dezenas de oficiais generais e oficiais superiores das forças armadas. Não havia necessidade, mas o tiro no pé está dado e Rangel vai andar coxo até ao fim da campanha. Mas esta campanha das europeias é coisa pequena comparada com a outra que está em curso - no PSD decorrem umas verdadeiras primárias para as presidenciais: este fim de semana Durão Barroso saíu de Bruxelas e deu à costa mais ocidental da Europa para tactear terreno; no dia a seguir Marcelo Rebelo de Sousa aproveitou o espaço que tem na TVI para comentar Durão e desfazer metodicamente o governo, como quem arranca asas a moscas - de Poiares Maduro a Passos Coelho ninguém escapou; e Santana Lopes, claro, comentou sibilinamente as intenções do regresso de Durão às primeiras páginas dos jornais portugueses. O diário das primárias para as presidenciais arrisca-se a ser mais animado que o diário das europeias.

 

SEMANADA - Foi divulgado um relatório de um organismo oficial  a concluir que a fuga de cérebros pode causar sérios danos à economia nacional;O total de inscritos com mais de 30 anos em licenciaturas no ensino superior público caíu cerca de 30% ; aqui ao lado, em Espanha, registou-se, no mesmo grupo, um aumento de cerca de 18%; os alunos do ensino obrigatório com mau aproveitamento escolar custam 250 milhões de euros por ano ao Estado; quase 8500 crianças e jovens foram retirados às famílias em 2013; há mais de cinco mil pessoas sem abrigo em Portugal; o abastecimento de água corrente foi cortado por falta de pagamento a mais de 42 mil casas; desde a chegada da troika os impostos aumentaram 35% para os particulares e 15% para as empresas; uma em cada dez casas na orla costeira está desocupada; as vendas de carros novos cresceu 48% nos primeiros meses de 2014, com as marcas Mercedes e BMW em destaque;  Bruxelas anunciou que não financiará a construção de  mais estradas em Portugal; 207 milhões de cupões concorrem ao primeiro sorteio dos Audis da sorte; a assembleia distrital de Vila Real foi ameaçada de penhora por salários em atraso;  os sectores dependentes do salário mínimo mais que duplicaram desde Abril de 2011;  o total de familias com rendimentos anuais inferior a 10 mil euros passou de 2,3 milhões em 2010 (48% do total) para 3 milhões (66%) em 2012; em 2013 o número de manifestações caíu 6%  e estas manifestações foram vigiadas por 31 257 polícias, quase o dobro de agentes ocupados na mesma actividade que no ano anterior no qual, no entanto, se registaram mais protestos; o PSD considerou que o secretário de Estado que anunciou cortes permanentes nas pensões, José Leite Martins,  teve “um momento infeliz”; a agência de publicidade Mosca decidiu dar novo nome ao dia 1 de Abril, passando a chamar-lhe Dia do Político.

 

ARCO DA VELHA - Um procurador adjunto de Braga deixou prescrever vários processos, entre os quais um de burla e falsificação, que lesou o Estado em mais de um milhão de euros, e outro que permitiu o arquivamento de uma investigação aos rendimentos do ex presidente da Câmara de Braga, Mesquita Machado.

 

FOLHEAR - A edição de Março do British Journal of Photography é dedicada a David Bailey, apresentado como “o mais conhecido fotógrafo britãnico, cronista visual dos agitados anos 60 londrinos e ainda cheio de energia a trabalhar”. A revista, que é uma das melhores fontes de informação sobre o que se faz de novo em fotografia,, aborda desde edições de livros até novas exposições e publica sempre portfolios que resultam de projectos pessoais. Nesta edição destaco o trabalho de Salvi Danés, um catalão que mostra o seu olhar sopbre Moscovo, e da californiana Elizabeth Moran, sobre espaço habitados. Este número de Março reproduz os principais trabalhos escolhidos na edição deste ano do World Press Photo, mas o prato forte é uma entrevista com Martin Parr, o fotógrafo da Magnum que meteu mãos à obra a mostrar ao mundo a importância dos photobooks - já vai no terceiro grande volume da série. E, claro, há Bailey, David Bailey - 12 páginas com imagens e história desta figura de referência da fotografia e da sua carreira de mais de 50 anos -  aqui se mostram retratos  de Joseph Beuys, Patti Smith, Marianne Faithfull e Man Ray, entre outros.

 

VER - O ponto forte da Galeria Ratton está nos azulejos e na relação que consegue estabelecer com pintores, convencendo-os a experimentar aquele suporte cerãmico. Foi o que aconteceu quando em 1989 convidou Luisa Correia Pereira a experimentar o azulejo. Desde esta semana e até 20 de Junho a Ratton mostra obras dessa época, feitas pela artista nos anos 80 e 90, muitas inéditas, umas em azulejo, outras aguarelas, outras em técnica mista sobre papel e outras em acrílico sobre tela. Olhos amigos dirigiram-me para as pequenas aguarelas, que aproveito para juntar aos azulejos avulsos que são seus familiares próximos. A Ratton, bem perto do sempre polémico Tribunal Constitucional, é uma espécie de oásis onde se mostra o que não se epera ver e onde se descobre o que apetecia conhecer - é isso que se passa com a obra de Luisa Correia Pereira. Rua da Academia das Ciências 2C, das 15h00 às 19, mais informações em galeriaratton.blogspot.com .

 

OUVIR - Em 1998 os Silence 4 ganharam súbita fama e notoriedade com o seu álbum de estreia, “Silence Becomes It”. que ao longo do tempo vendeu 230 mil exemplares, um número muito respeitável no panorama das edições discográficas portuguesas. As vozes de David Fonseca e Sofia Lisboa, as melodias das canções e as histórias contadas nas letras, escritas em inglês mas rapidamente assimiláveis, como o hit “Sorrow” bem mostrou, foram a chave do sucesso da banda. O segundo disco, “Only Pain Is Real” continua o encanto, mas perde o efeito surpresa. É destes dois discos que se faz a lenda e eles são a matéria prima de uma belíssima edição, em caixa- “Silence 4- Songbook 2014”, agora editada. Além dos dois discos de originais inclui-se um disco de gravações avulsas feitas entre 1996 e 2000, e que inclui demos, registos ao vivo e remixes, apropriadamente intitulado “Rarities”. A edição fica completa com um DVD que agrupa  os concertos do Pavilhão Atlântico em 1998 e do Coliseu dos Recreis em 2000, e que inclui ainda os videos de “Borrow”, “My Friends”, “To Give” e “Only Pain Is Real”. Como David Fonseca dizia no início da carreira da banda, é mais fácil cantar sobre sentimensos pessoais em inglês, porque assim há menos gente que percebe… Cá por mim continuo a ter saudades da maneira como Sofia Lisboa cantava nesses tempos.

 

PROVAR - Esta é a época da lampreia e ainda não provara uma até há uma semana atrás. Nos últimos anos tinha continuado a poder degustar a lampreia minhota que se fazia no antigo “Manel” do Parque Mayer, e que o herdeiro da casa  tinha levado para o restaurante do Clube de Ténis de Monsanto - que entretanto deixou. Fiquei contente por saber que Júlio Calçada vai abrir nova casa na Rua do Salitre, mas a verdade é que fiquei sem lampreia. Foi o pretexto para regressar à Adega da Tia Matilde, ao Rego, na Rua da Beneficência, onde já não ía há uns anos.. A qualidade continua a ser superior e não é por acaso que a lampreia servida na Tia Matilde está no top do que, na matéria, se faz em Lisboa. Desta vez preferi à bordalesa: no fundo é uma lampreia estufada, muito bem estufada, num molho cremoso que incorpora o sangue do bicho, servida sobre fatias de pão frito e acompanhada de arroz carolino no forno. A lampreia estava na boa fase, com ovas saborosas, a dose era abundante, o molho e o tempero estavam a preceito e o arroz era exemplar. Convém sempre marcar, apesar de a casa ser grande. Rua da Beneficência 77, telefone 21 797 2172, tem parque de estacionamento nas traseiras com acesso directo por elevador ao restaurante.

 

DIXIT - “Em vez de riqueza só nos sobejam dívidas para redistribuir” - Medina Carreira

 

GOSTO - A iniciativa Art On Chairs, da Câmara Municipal de Paredes, foi distinguida em Bruxelas como o melhor projecto europeu na área do desenvolvimento regional.

 

NÃO GOSTO - Da fuga às reponsabilidades ensaiada por Vitor Constâncio, e apadrinhada por vários notáveis, no caso da falta de supervisão do Banco de Portugal ao BPN.


BACK TO BASICS - Ler é mais importante que escrever - Roberto Bolaño

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publicado às 14:00

Informação na charneira da Mídia

por falcao, em 04.04.14

Aos poucos, a noção de Mídia que tínhamos há uma década está a alterar-se. Mais do que falarmos em meios, devíamos falar em canais de distribuição de conteúdos: é isso que, hoje em dia, são a Internet, a rádio, a televisão, os jornais e as revistas.

Já nenhum produto vive exclusivamente no meio para o qual foi inicialmente concebido – as séries de televisão são também vistas num computador portátil ou num tablet, as notícias de um jornal são vistas mais depressa no digital que no papel, a rádio ouve-se tanto nas suas transmissões hertzianas como no streaming digital. Nenhum grupo de comunicação pode, hoje em dia, ignorar que a combinação otimizada entre os vários canais de distribuição à sua disposição é a chave do sucesso.

O tempo tem mostrado que as marcas de informação que melhor funcionam – e que mais rendimentos conseguem de assinaturas ou de publicidade, ou de ambas – são aquelas que melhor exploram a convergência entre as diversas plataformas.

Ainda não existe um modelo de negócio sedimentado, mas é possível perceber que, ao fim de alguns anos, o The Guardian, de Londres, cujo site tem acesso totalmente livre, já conseguiu começar a sair do encarnado; e que os resultados do The New York Times, que tem um sistema misto, são também animadores.

Por outro lado, constata-se que os jovens adultos que ingressam na vida ativa mostram uma tendência para deixar de aceder exclusivamente a noticiário online, e começam a consumir informação impressa, através de um sistema em que uma assinatura é válida em todas as plataformas.

A informação continua a ser um dos maiores motores de captação de audiências – o Twitter tornou-se uma fonte de notícias de última hora e cerca de 50% dos utilizadores do Facebook usam a rede social para saberem notícias de atualidade. Uma organização noticiosa hoje não se limita a ter uma edição tradicional – usa também as redes sociais para alargar a sua influência e a notoriedade da sua marca.

É cada vez mais evidente que as marcas mais antigas e prestigiadas de informação, e que na maioria provêm de empresas editoras de jornais e revistas, são aquelas que conseguem maior confiança e reconhecimento dos seus consumidores.

Um recente estudo feito nos Estados Unidos mostra que, em relação a produtos de comunicação essencialmente baseados em notícias, os jornais e revistas captam a maior fatia do investimento publicitário, à frente das estações de televisão noticiosas (cable news channels). Aqui está um caso em que a televisão não bate a imprensa.

Mesmo nesta época digital, as notícias da morte da imprensa são largamente exageradas – e as notícias da perca de influência da informação são completamente erradas. Mudam-se os tempos, mudam-se os canais de distribuição, mas a essência das coisas continua.

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publicado às 11:55


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