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PRÓXIMO FUTURO - Cada vez que temos uma crise vem à baila o problema da nossa dimensão. Foi uma coisa que sempre me fez alguma impressão quando olhava para outros países europeus e comparava connosco. E, quando olhei para a nossa História, e percebi que há uns séculos tínhamos sido precursores da globalização, fiquei ainda mais convencido de que, se um dia descobrimos rotas novas, adequadas aos tempos presentes, podemos voltar a descobrir um caminho. Os descobrimentos foram a nossa via de expansão. Hoje em dia, quando a globalização está em retrocesso, podemos ser os beneficiários de, pelo menos, segmentos da desglobalização. Isto aplica-se à indústria, onde temos produção de excelência em várias áreas, e tendo em conta o posicionamento da nossa localização em termos de logística comercial. Se temos uma posição geo estratégica relevante em termos políticos e militares, só temos que criar condições para que isso reverta de forma positiva noutras áreas, nomeadamente na economia. Tal como há séculos a nossa via de expansão vai passar pela nossa capacidade, de descoberta e investigação. Estes tempos muito recentes mostram que temos conhecimento e pessoas que conseguem avançar, em diversas áreas, desde a investigação biomédica até ao desenvolvimento tecnológico. As decisões e medidas para conseguirmos este próximo futuro é que serão a pedra de toque da capacidade política de quem nos governa. Na política o que interessa é o que se faz, não o que se promete.

 

SEMANADA - Cerca de 150 mil famílias já têm sérios problemas para comprar comida e pedem assistência a várias instituições; desde o início da pandemia de covid-19 já chegaram ao Banco Alimentar mais de 11.600 pedidos de ajuda de agregados familiares;  a Segurança Social já analisou cerca de 62 mil pedidos de lay-off, mas, até agora, só 62% das candidaturas têm condições para serem aprovadas e, das 38 mil empresas que viram o seu processo viabilizado, 88% preferiram parar totalmente a atividade e só 12% preferiram reduzir o horário aos trabalhadores;  desde o início das medidas de confinamento as autoridades das fronteiras já impediram a entrada em Portugal de 1852 pessoas; na Alemanha é obrigatório o uso de máscaras nos transportes públicos e lojas e as multas por desobediência atingem os dez mil euros; de acordo com a Direcção Geral de Saúde, até agora, o excesso de mortalidade foi de mais 307 óbitos comparativamente com a média dos últimos cinco anos; segundo o barómetro de opinião Covid-19 da Marktest, os portugueses dedicaram uma média diária de 5h54m ao teletrabalho, 4h29m a ver TV, aceder à Internet ou ouvir rádio e 3h13m a estudar; ainda segundo a Marktest 76% dos portugueses consideram que o uso de máscara fora de casa deveria ser obrigatório, mas apenas 47% dispõem delas; finalmente a mesma sondagem indica que ser contaminado, continua a ser o maior receio dos portugueses, logo seguido dos receios de falência da economia nacional e com o aumento do desemprego; em março registaram-se mais 53 mil desempregados que no mesmo mês do ano passado, um aumento de 34%.



ARCO DA VELHA - O Supremo Tribunal de Justiça reduziu e suspendeu a pena de prisão aplicada a um homem de 55 anos, que abusou sexualmente de duas meninas de seis e nove anos, filhas de militares do Exército.

 

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O ESTILO PARR - Martin Parr é um dos mais conhecidos fotógrafos da agência Magnum e criou um estilo muito pessoal de observação do mundo à sua volta. Foca-se em temas que vão do dia-a-dia à moda e a cenas de rua, do quotidiano das praias e espaços públicos. à intensidade da comida e das suas cores e aos contrastes das sociedades. Frequentemente usa teleobjetivas para “aplanar” as perspectivas e colocar em primeiro plano pormenores. Muitas vezes usa um anel de flash à volta da objectiva para criar uma iluminação que faz sobressair as cores. É um observador por natureza e é isso que faz dele um dos mais procurados nomes da Magnum. Tem quatro dezenas de livros publicados (alguns resultantes de encomendas, como um, magnífico, que fez para a Universidade de Oxford), realizou dezenas de exposições (uma esteve em Lisboa, há uns anos, numa galeria dedicada à fotografia, a Barbado, entretanto já extinta), criou em Bristol, onde ainda vive, uma fundação com o seu nome, à qual ofereceu a sua colecção de photobooks, considerada uma das maiores do mundo - e co-escreveu os três volumes da maior obra de referência sobre livros de fotografia, “The Photobook: A History”. No Instagram podem ver a página da fundação, martinparrfdn, e ter uma visão do trabalho do fotógrafo em martinparrstudio , de onde é tirada a fotografia que aqui apresentamos, realizada em Ialta. Vale a pena também a ver o seu site, martinparr.com .  

 

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SEM REGRAS - Lucinda Williams, 67 anos, disse numa recente entrevista que não compreende porque é que as pessoas têm a ideia de que devem ficar mais suaves e contemporizadoras com a idade. O seu novo álbum, “Good Souls, Better Angels” , o 14º disco de originais da sua carreira de quatro décadas, é testemunho disso mesmo, com canções intensas nas palavras e na música  e com a guitarra em destaque. A voz rouca e forte de Lucinda Williams destaca-se logo desde a primeira faixa, no afirmativo “You Can’t Rule Me”, uma declaração de princípios dela própria sobre aquilo de que não abdica - a sua alma, os seus pontos de vista e o seu dinheiro. Cada vez mais bluesy, Williams diz que este é o seu disco garage rock - guitarra, bateria e baixo, um pano de fundo musical que vai bem com o lado explosivo das canções. Eis um belíssimo disco para estes tempos - energia, vontade de mudança, convicções fortes. Destaco uma balada irresistível, “Big Black Train” onde as guitarras se destacam, “Man Without Soul” onde ela proclama “You bring nothing good to this world”, um “Shadow & Doubts” onde promete  “I’m gonna pray the devil back to hell.”. E sobretudo o tema final, “Good Souls”, com o desejo “Help me stay fearless, help me stay strong”. Disponível no Spotify.

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NÚMEROS & ENGANOS - “Como estatísticas, percentagens e análises nos enganam e desenganam” é um subtítulo que chama logo a atenção.  A frase justifica o título, “O Poder Dos Números”, da holandesa Sanne Blauw, escrito em 2018 e que por estes dias ganhou especial relevância com a torrente de informação que envolve a conjuntura actual. Blauw é doutorada em Econometria e divulgadora de Numeracia, procurando guiar-nos a destrinçar a verdade no meio dos gráficos e dados com que somos bombardeados todos os dias. Afirma que a sua missão é pôr os números no seu lugar.  A autora explora as falsidades escondidas pelas análises quantitativas descontextualizadas, muitas vezes usadas para fazer interpretações distorcidas que podem inspirar decisões políticas e, até, pretender explicar comportamentos. Sanne Blauw sublinha que este livro é sobre números, mas é acima de tudo sobre as pessoas por detrás deles e para todas aquelas são levadas a fazer erros de julgamento. Ela revela como até perigosos absurdos são anunciados com base em números, ensinando-nos a olhar de forma crítica para os resultados de estudos. Como Blauw afirma, “as histórias por detrás dos números são mais interessantes que os próprios números”



OVOS BÊBADOS - Antes da receita que experimentei esta semana aqui vai um desabafo: sinto falta dos meus restaurantes preferidos, de coisas tão corriqueiras como ver pessoas que não conheço mas que são também clientes regulares, e com quem acaba por se estabelecer uma cumplicidade de frequentadores de um  local, mesmo que nunca tenhamos trocado uma única palavra. Um restaurante é muito mais que comida, é um ponto de encontro, uma roda de amigos, um espairecer. A este propósito, no fim de semana li uma das melhores coisas sobre o que é um restaurante num ensaio escrito para o New York Times pela proprietária e chef do Prune, Gabrielle Hamilton - o Prune fechou por causa da pandemia e ela duvida que o mundo da restauração, dos pequenos bistrôs onde os clientes são amigos, volte a existir como era antes de tudo isto. Com restaurantes fechados resta-me ir lendo receitas, experimentando e inventando. Esta de hoje foi uma invenção, depois aprimorada por umas leituras que se encaixavam na ideia. Noutro dia tive que aproveitar gemas de ovo que tinham sobrado de um cozinhado e resolvi batê-las com um pouco de espumante, Murganheira Bruto, que é o português que normalmente existe cá em casa. O resultado foi interessante, levou-me a ler sobre o tema e descobri uma receita que encaixa: uma fatia de pão de boa qualidade, levemente tostada, barrada com manteiga, com ovos mexidos com champagne por cima, e com umas fatias de salmão fumado a rematar . O segredo está nos ovos mexidos - depois de os bater levemente, adicionar um pouco de espumante (pouco, não exagerem), temperar com sal e pimenta a gosto e misturá-los depois de forma enérgica com um batedor manual ou, melhor ainda, com o batedor do 1-2-3. Entretanto já ficou a derreter uma colher de sopa de manteiga na frigideira onde se farão os ovos - com lume brando e os cuidados necessários para ficarem cremosos - na realidade o espumante acentua a cremosidade e dá-lhes um leve toque de um sabor diferente. Também experimentei colocar espinafres salteados em vez do pão e o resultado foi interessante - embora prefira o pão. Boas experiências é o que vos desejo.

 

DIXIT - "As plantas não tiram férias, nem fazem lay-off e não podemos cuidar delas em teletrabalho", diz Manuel Silva, presidente da Associação de Horticultores da Póvoa do Varzim.

 

BACK TO BASICS - “É das grandes complexidades que as soluções de maior simplicidade nascem” - Winston Churchill






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publicado às 11:00

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DINOSSAUROS EXCELENTÍSSIMOS - A Assembleia da República e os seus deputados continuam a dar uma triste imagem ao país. Nesta semana foram protagonistas, sobretudo o seu Presidente, de um lamentável pretexto que fomentou  a intolerância a propósito do 25 de Abril. Criaram o anátema de rotular como anti democratas aqueles que chamaram a atenção para as medidas em vigor no âmbito da pandemia e que se opunham a uma reunião alargada. Quem projectou um debate de saúde pública em debate ideológico colocou-se  no lugar, não de quem deve dar o exemplo, mas daqueles que se julgam acima de qualquer lei e ostentam como argumento privilégios que julgam ter para contrariar as instruções do próprio Governo sobre matéria de saúde pública. Deram mais uma vez prova de um completo autismo e de uma incapacidade em compreender a comunicação - podiam ter aproveitado para criar uma celebração virtual da liberdade melhor que os discursos monótonos e repetitivos com que brindam as reduzidas audiências que seguem as cerimónias oficiais, e que cada vez se assemelham mais a exéquias que a festa. Foram, em última análise,  o reflexo do pior que existe no degradado sistema político-partidário actual, verdadeiros dinossauros excelentíssimos. Um ex-deputado socialista, mais lúcido que os actuais, escreveu no Facebook sobre a polémica criada: “A AR, com o seu Presidente à cabeça e a pronta anuência do Presidente da República, conseguiu o que não passaria pela cabeça de um cão tinhoso: pôr uma boa parte dos portugueses contra as comemorações do 25 de Abril “.

 

SEMANADA - Desde o início da pandemia cerca de 38,0% dos consumidores inquiridos num estudo da Marktest deixaram de fazer compras em hiper e supermercados e passaram a fazer compras noutro tipo de lojas, sobretudo no comércio local; segundo os dados da última sondagem do Barómetro Marktest, na semana passada os portugueses dedicaram mais de 5 horas ao teletrabalho, cerca de duas horas a ajudar os filhos nas tarefas escolares e 4 horas a ver Tv, aceder à Internet ou ouvir rádio; o governo britânico consignou uma verba adicional de 40 milhões de libras  exclusivamente para uma campanha de publicidade especificamente concebida para aparecer nos próximos três meses em centenas de jornais locais e nacionais como medida de apoio à imprensa, realçando o seu papel na informação e na liberdade; segundo a GFK, no sector livreiro, o efeito da pandemia e das medidas de confinamento provocou uma queda de faturação de dois milhões de euros relativamente ao período homólogo do ano passado. que equivale a cerca de menos 150 mil livros vendidos; na semana passada registou-se uma diminuição no tempo médio de visionamento de televisão por espectador, que desceu de 8 horas e 9 minutos por dia, para 7 horas e 42 minutos e após um mês de confinamento começa a notar-se uma quebra de audiência nos programas informativos e um ligeiro aumento no cabo; segundo a Marktest em março de 2020, o Primeiro ministro, António Costa, manteve a liderança do top de exposição mediática, ao protagonizar 244 notícias com 13 horas e 36 minutos de duração, Marta Temido, ministra da Saúde subiu para a segunda posição, com 175 notícias de 9 horas e 29 minutos de duração, o Presidente da República  baixou para a terceira posição, com 130 notícias, que ocuparam 8 horas e 5 minutos, Paulo Portas, comentador político, foi quarto, esteve em ecrã cerca de 4 horas e 4 minutos e Pedro Siza Vieira, ministro de Estado, Economia e da Transição Digital, subiu ao quinto lugar, com 70 notícias de 3 horas e 50 minutos de duração.

 

ARCO DA VELHA  - A Câmara Municipal de Lisboa não sabe quantas pensões há para refugiados requerentes de asilo e ignora o número de refugiados nessas pensões,  entre os quais já foram detectados 138 casos de infectados.

 

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SONS E IMAGENS - Agora percebe-se melhor a importância da existência de um serviço público de rádio e de televisão - e não estou só a falar na telescola. Por isso talvez seja interessante aproveitar para conhecer o museu virtual da RTP, onde se pode percorrer a história da sua actividade, desde os primórdios da Emissora Nacional de Radiodifusão, em 1935, até aos dias de hoje. Neste site podemos descobrir cenários antigos de programas de televisão que ficaram na História, aceder a numerosos conteúdos de vídeo e de áudio, a episódios de bastidores, fazer uma visita aos pormenores do primeiro carro de exteriores da RTP, assim como ver um documentário sobre a época do teatro radiofónico, antecessor das telenovelas de hoje em dia. No acervo deste museu virtual estão mais de mil peças, 16 horas de conteúdos e visitas em realidade aumentada. Na secção de exposições temporárias, é possível espreitar  modelos antigos de receptores de rádio, altifalantes ou grafonolas. O Museu proporciona um percurso sobre a evolução da radiodifusão e da televisão em Portugal. Para quem quiser brincar às televisões, há um Estúdio Virtual onde maiores de 13 anos são convidados a vestir a pele de pivôs e a apresentar o Telejornal. O museu virtual da RTP pode ser visitado por todos em museu.rtp.pt

 

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EMOÇÕES CANTADAS - Fiona Apple nasceu em 1977 em Nova Iorque, gravou o seu primeiro disco em 1996 e rapidamente tornou-se conhecida pela pela intensidade das suas canções e pela forma como combina a sua voz com o piano.. Desde 2012 não tinha nenhum novo trabalho, até surgir agora “Fetch The Bolt Cutters”, o seu quinto álbum. Musicalmente estimulante, por vezes quase experimental, este disco é ainda mais assertivo nos temas que aborda e nas palavras que Fiona Apple usa, do que os seus trabalhos anteriores. O novo álbum aborda a vulnerabilidade humana, a dor e o leque de emoções que atravessam uma vida.  O disco foi quase todo gravado na casa da cantora, na Califórnia com um grupo de músicos de sessão, usando arranjos onde a percussão - por vezes quase acidental - tem mais peso que habitualmente nas suas composições. Fiona Apple construíu o disco em cima da sua visão de vida: criamos uma espiral de sentimentos e desilusões, remetendo no final a expressão artística como a forma de expôr as mentiras da sociedade. O título “Fetch The Bolt Cutters”, que pode ser traduzido livremente por “tragam um alicate corta-arame” evoca a necessidade de nos livrarmos das armaduras que construímos à nossa volta. Este é talvez o melhor trabalho da carreira de Fiona Apple, com as canções mais fortes, musicalmente mais trabalhadas. Temas como “Under The Table” são uma janela aberta para a sua forma de pensar:   “Kick me under the table all you want/I won’t shut up.” Disponível no Spotify.

 

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LEITURAS CASEIRAS - A edição de Maio da revista Monocle é já fruto da pandemia e está dedicada à casa - o título de capa é “Why Home Matters” . No seu editorial Tyler Brulé, o editor da Monocle, escreve que estas últimas semanas têm sido as mais complicadas desde que a revista nasceu em 2007 - aliás este número de maio é uma das edições com menos páginas desde que começou a sua publicação - a quebra da publicidade atinge toda a gente. Brulé faz algumas perguntas incómodas, como por exemplo porque é que as pessoas em tantos países permitiram que os respectivos governos deixassem degradar os sistemas de saúde, porque é que se permitiu que tantas cidades tivessem um péssimo planeamento urbanístico e porque é que tantas grandes empresas pensaram que deslocalizar a produção de tanta coisa para a China era uma boa ideia a longo prazo. A revista aponta oito mandamentos para aproveitar a casa onde vivemos e mudarmos os nossos hábitos, dá conselhos sobre exercício simples que se podem fazer, recomenda que se fuja de estar constantemente em cima das notícias, que se ajude os vizinhos e deseja que o hábito de lavar sempre as mãos perdure. Depois há conselhos sobre coisas que se podem fazer para melhorar a casa de cada um e, claro, um conjunto de receitas culinárias provenientes de vários países. Por falar em casas, Portugal está presente, através do trabalho de arquitectos como Alcino Soutinho e Alfredo Viana de Lima na zona de Esposende. Uma reportagem sobre os criativos que estão por trás de alguma da publicidade política mais interessante para as próximas eleições presidenciais nos Estados Unidos é outro ponto alto desta edição da Monocle.

 

PETISCO NO FORNO -  Na presente situação, cozinhar, sobretudo ao jantar, depois de horas em teletrabalho, pode ser um momento de descontracção. É só combinar a happy hour de fim de dia com um pouco de experimentalismo culinário. Basta seguir duas ou três newsletters gastronómicas internacionais para surgirem boas ideias de receitas, que vou ensaiando. Esta semana fiquei atraído por uma sugestão de brócolos no forno com camarões e um tempero algo oriental. Dito assim, reconheço, a coisa pode parecer um bocado estranha. Mas se seguirem algumas indicações básicas verão que são recompensados por uma bela surpresa. Primeiro os brócolos: cortem só a flor, com muito pouco caule. Numa taça grande misturem os brócolos com duas colheres de sopa de azeite, uma colher de chá de coentros moídos, outra de cominhos e outra de gengibre ralado, uma de sal, meia colher de pimenta preta moída de fresco, um toque de piri piri e uma colher de raspa de lima (ou limão, se não tiverem). Misturem tudo bem e reservem enquanto aquecem o forno a 200º. Noutra taça coloquem os camarões crus (convém que sejam de bom tamanho, descascados) e misturem com mais duas colheres de azeite, raspa de meio limão, meia colher de chá de sal e meia colher de chá de pimenta preta. Misturem bem e deixem repousar. Quando o forno estiver à temperatura, coloquem os brócolos bem espalhados num tabuleiro de metal e deixem no forno durante dez minutos. Passado esse tempo colocam-se os camarões no mesmo tabuleiro, borrifa-se tudo com uns salpicos de óleo de sésamo (em havendo)  e agita-se para se misturarem bem com os brócolos, indo o tabuleiro ao forno mais dez minutos. Quando os camarões estiverem opacos e os brócolos tenros está pronto. Retirem do forno e espremam o limão de que usaram a casca por cima de forma generosa. E pronto, basta servir e esperar que gostem. Se quiserem acompanhem com um bom pão ou, até, um arroz. Cá em casa passou a ser coisa a repetir. Vai bem com um vinho branco fresco, no caso foi um Duorum. 

 

DIXIT - “Não aceito que um ritual seja transformado numa autêntica linha vermelha que separa os democratas dos outros” - Sónia Sapage

 

BACK TO BASICS - “Todos recebemos tanta informação ao longo do dia que corremos o risco de perder o bom senso” - Gertrude Stein.

 

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publicado às 11:30

CLAUSURA, TELETRABALHO E LESÕES

por falcao, em 17.04.20

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O TELETRABALHO - Ao princípio achei piada ao teletrabalho. Desde que se disponha de uma infraestrutura tecnológica boa na empresa, de uma ligação de internet razoável e de um mínimo de condições logísticas sabe bem não gastar tempo em deslocações, ficar a observar o trabalho da equipa a uma distância virtual, ter menos interrupções, gerir a agenda de outra forma, poder ter mais tempo para pensar. Mas, depois, sobretudo ao fim de um mês, começo a sentir falta das conversas com mais pessoas, do confronto de ideias mais directo, de poder falar sem ser pelo microfone, de ouvir os outros sem o som roufenho do Zoom ou do Teams, de poder ver caras sem estarem desfocadas ou sem fundos falsos com praias e outras coisas do género. Por sorte, a empresa onde trabalho, a Nova Expressão, tinha migrado todos os sistemas, há cerca de um ano, para a cloud por causa de uma mudança temporária de instalações. Quando a pandemia começou estava tudo operacional e já havia hábito de utilização da cloud e de trabalho remoto. O problema não está na tecnologia, está na falta que as pessoas fazem e na falta do confronto directo de ideias, do debate não electrónico. Com a situação de encerramento das escolas das crianças mais novas ouço muitos pais queixarem-se que não conseguem fazer o acompanhamento das aulas virtuais dos filhos ao mesmo tempo que trabalham. Alguns estão esgotados, outros à beira de um ataque de nervos. Quando sairmos disto, além de todas as outras questões, vamos ter que enfrentar problemas na área dos recursos humanos, saber como recuperar toda a gente que ficou lesionada no meio deste jogo da clausura.

 

SEMANADA - Um estudo da Universidade Católica indica uma quebra de rendimento de 43%  nas famílias que ganham até mil euros; diversos autarcas autarcas têm sido confrontados com o aumento do número de pedidos de comida por parte de famílias carenciadas que, no último mês, viram os rendimentos baixar;  o lay-off em Portugal já atinge cerca de mil trabalhadores; um terço das mortes registadas até agora em Portugal durante a pandemia foram de idosos residentes em unidades de 3ª idade; com uma boa parte das aulas a fazer-se de forma não presencial, e porque grande parte dos docentes não são digitais nativos, a Universidade Aberta e a Direção Geral de Educação vão formar mais de 2.300 professores em ensino à distância; segundo a Marktest 69,8% dos consumidores diminuíram a frequência das compras em super/hipermercados (69,8%), e destes cerca de 38% afirmam que passaram a ir a outro tipo de lojas (maioritariamente ao comércio local: minimercados, mercearias, talhos, peixarias, padarias, etc)  e a encomenda online ou por telefone foi a alternativa referida por um número muito pequeno de indivíduos; em março de 2020 RTP1, SIC e TVI emitiram cerca de 264 horas de informação regular, mais 21.5% do que no mês anterior e mais 7.4% do que o verificado no mesmo mês de 2019. num total de de 797 notícias e 35 horas de emissão sobre a pandemia, com a RTP1 a liderar com 14 horas de emissão e 327 notícias emitidas sobre o tema.

 

ESTE TEMPO - Entre 1 a 14 de Abril, foram matriculados em Portugal 838 ligeiros de passageiros, enquanto um  ano antes, no mesmo período tinham sido 6208, o que significa uma quebra de 86,5%, em termos homólogos.

 

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A FOTOGRAFIA - Quando se fala de fotografia é incontornável que a conversa vá parar à Magnum Photos, a agência fundada em 1947 por um grupo de fotógrafos liderados por Robert Capa e que mudou a forma de encarar o fotojornalismo, a fotografia documental e a fotografia em geral. Ao lado de Capa estavam nomes como David Seymour, Henri Cartier Bresson,  Ernest Hass, René Burri e Inge Morath, entre muitos outros. Os membros da Magnum publicaram nas maiores revistas da época, fizeram trabalhos exclusivos para a Life ou a Look, acompanharam a guerra do Vietnam e muitos outros conflitos. Henri Cartier Bresson descrevia a agência da seguinte forma: “A Magnum é uma comunidade de pensamento, uma qualidade humana compartilhada, uma curiosidade sobre o que está a acontecer no mundo, um respeito pelo que está acontecer e um desejo de o interpretar visualmente''. Ao longo dos anos por lá passaram alguns dos mais marcantes fotógrafos e actualmente podemos encontrar talentos tão diversos como Antoine d’Agata, Elliiott Erwitt, Josef Koudelka, mas também Martin Parr ou Cristina de Middel entre tantos outros. Podem ir seguindo a actualidade fotográfica e a produção da Magnum, assim como os cursos e exposições que organiza  no site da empresa - https://www.magnumphotos.com  , em www.instagram.com/magnumphotos ou ainda em www.facebook.com/MagnumPhotos . A imagem aqui reproduzida do Instagram é de Patrick Zachmann, feita a 16 de Março, em Paris, já com a pandemia declarada.

 

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FOLK CONTEMPORÂNEO - Laura Marling é uma das vozes mais importantes da folk contemporânea e o seu álbum de estreia data de 2008. “Song For Our Daughter”, o novo álbum lançado há dias,  é, nas palavras da cantora, um trabalho quase conceptual, escrito para uma criança imaginária sobre “aquilo que é ser uma mulher na sociedade actual”. O disco é ao mesmo tempo intimista, triste e pessimista, mas cheio de melodias e arranjos magníficos. “Blow By Blow”, uma das canções chave do álbum, fala daquilo que por vezes acontece nas relações: “Note by note, bruise by bruise/Sometimes the hardest thing to learn is what you get from what you lose”. Musicalmente este é claramente um disco folk tradicional, instrumentos acústicos e voz em primeiro plano, sempre a emoção colocada em destaque, como quando os arranjos incluem  um piano discreto ou um côro pontual. O ambiente anda próximo daquilo que se encontrava nos anos 70 em discos folk americanos (Marling, embora inglesa, vive há uns anos perto de Los Angeles). A produção do disco privilegia os arranjos de cordas e vozes. Destaco a canção que dá título ao álbum, “Song For Our Daughter”, mas também “For You”, “Held Down”, “Strange Girl” ou ainda “The End Of The Affair”. Disponível no Spotify.

 

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A CHINA EXPLICADA A OCIDENTAIS - Calhou ter lido “Sob Céus Vermelhos” agora, nesta última semana, no meio de tantas notícias e  especulações vindas do Oriente. É um livro sobre o passado mais recente da China, numa altura em que, pelas razões que se sabem, tanto se fala daquele país e se desenvolvem polémicas à sua volta. “Sob Céus Vermelhos” foi originalmente editado em 2019 e agora lançado em Portugal pela Quetzal. A sua autora, Karoline Kan, aliás Chaoqun Kan, nasceu numa aldeia chinesa em 1989, o ano dos protestos em Tiananmen. Cresceu e viveu nessa aldeia, e depois numa cidade do interior, até ir para a Universidade, em Pequim. Depois de concluído o curso, Kan trabalhou para o New York Times e Radio France Inter em Pequim, foi jornalista na revista “That’s Beijing”, actualmente é editora do jornal digital “China Dialogue” e em 2019 foi distinguida com o Young China Watcher of the Year. “Sob Céus Vermelhos” é essencialmente a história da vida da autora, o relato de como era o dia-a-dia na aldeia, como se estabeleciam hierarquias dentro de uma família ao longo de três gerações, o que era esperado das mulheres e o que era atribuição dos homens. No tempo da política do “filho único”, Chaoqun Kan foi a filha proibida, a que não devia ter nascido. A sua mãe desafiou as ordens do Partido Comunista Chinês ao querer tê-la e viu a sua vida profissional - era professora - prejudicada por isso. O livro relata o que eram as tradições e a cultura tradicional na China de então, quando Deng Xiaoping começou a abrir a economia. ao longo dos anos 90. Conta o choque que foi passar da aldeia para uma pequena cidade, na região de Hunan, que então se começava a desenvolver. Relata a mudança de uma sociedade rural para uma sociedade industrial, no meio de uma corrupção que vivia à sombra dos dirigentes políticos e perante a passividade que os ensinamentos de Confúcio estimulavam. À autora sempre fez confusão porque é que nos livros de História por onde estudou não havia referências ao ano de 1989, o ano dos grandes protestos estudantis - apenas percebeu o que se tinha passado quando finalmente chegou a Pequim. Este livro é a história da descoberta de um país e o relato das suas contradições por uma pessoa que nasceu no despontar da nova China. Indispensável para se perceber tudo o que ali se passou nestes últimos anos.

 

CULINÁRIAS - O prazer de um molho de grelos fresquíssimo, em flor, é uma das coisas que só os mercados tradicionais nos oferecem. A sua textura e o seu gosto não têm comparação com os que são sujeitos a longos períodos de frio e chegam enrugados às prateleiras dos supermercados. Um molho de grelos frescos deve lavado em várias águas e arranjado, tirando as folhas que estejam amareladas. Depois, precisam de ser muito bem cozidos, longamente, até ficarem tenros. Só se metem na água quando já estiver a ferver e obviamente destapados para ficarem bem verdes, que é uma belíssima cor - e é quando entram na água que se salgam a gosto. Depois de escorridos com cuidado são um belíssimo acompanhamento. No topo das minhas combinações preferidas está um lombo de bacalhau. Filetes de pescada também são uma ideia e em geral qualquer peixe de qualidade é boa companhia para os grelos. Uma experiência interessante pode ser desfazer uma posta de pescada já cozida e misturá-la com os grelos. Tudo bem envolvido e regado com bom azeite e está pronta uma refeição. Depois há outras possibilidades e à cabeça lembro-me de um arroz de grelos, com arroz carolino, claro. E, finalmente, um pedaço de grelos cozidos e depois levemente salteados acompanha bem uma boa carne grelhada. Sou dos que acreditam que cozinhar descontrai e que nesta época confinada é algo que estimula a imaginação. 

 

DIXIT - “Raramente saímos das crises da mesma forma como entrámos. Acontecem coisas em nós, e na nossa relação com as outras pessoas, que fazem com que tudo mude” - Miguel Xavier, psiquiatra.

 

BACK TO BASICS - “Não devemos temer e sim procurar compreender. Agora é o tempo de compreender, para que tenhamos menos receios” -  Marie Curie.

 

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publicado às 11:00

O PERIGOSO VÍRUS DA ROTINA

por falcao, em 09.04.20

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O CONFINAMENTO - A rotina é nestes dias o nosso pior inimigo. A rotina a que estamos forçados, a rotina do confinamento, a falta de socialização, a rotina da avalanche de notícias. Aos poucos os números elevadíssimos de consumo de internet e de televisão começam a voltar a valores mais próximos das médias anteriores ao Estado de Emergência. Embora continue alto o consumo de notícias, já começa a subir o consumo de entretenimento - filmes, séries, musicais, documentários, e, claro, culinária. O teletrabalho fez explodir a venda de impressoras domésticas e de máquinas de café. Na realidade as antigas rotinas são substituídas por novas. Olhamos para o horizonte e o ar está mais límpido. No espaço de poucas semanas a vida mudou imenso - desde o vazio das ruas das cidades até à maneira como reorganizamos os nossos hábitos. Há um contraste enorme que percorre a sociedade - entre aqueles que estão em casa a trabalhar, com tudo o que isso comporta, e aqueles que estão nos hospitais, na rua, nas tarefas essenciais que garantem a nossa vida colectiva. O Estado, esse ser sem cara e nas mais das vezes com pouco coração, até deu uns laivos de humanidade nestas semanas. Mas falta imenso - há sectores básicos da sociedade e da economia, sobretudo nas microempresas, que continuam a braços com tratamentos discriminatórios. O Estado, que há uns anos fomentou a criação dessas microempresas e a criação de postos de trabalho com a consequente redução dos números e custos do desemprego, ainda tem muito para fazer neste sector. Se nesta altura se criarem novas barreiras e diferenças entre vários áreas de actividade todos vamos perder. A pior de todas as rotinas é a da resignação, e há muita gente que conta com ela e com a aceitação do mal menor. E, no entanto, só recuperaremos se nos excedermos, se ambicionarmos reconstruir e recuperar. É isso que devemos exigir da Europa, é isso que devemos exigir dos Governos. Ficarmos na rotina não basta - é demasiado perigoso.

 

SEMANADA - Foram apreendidos mais de 100 quilogramas de cocaína no Porto de Sines durante uma operação de controlo a um contentor proveniente da América do Sul;  segundo a CNN dois pandas do Jardim Zoológico Ocean Park, em Hong Kong, China, que não acasalavam há dez anos, fizeram-no quando o zoo fechou devido ao coronavírus; uma cobra pitão com 2,60 metros de comprimento que foi capturada na quinta-feira, no Percurso Pedestre da Fonte Benémola, em Querença, no interior do concelho de Loulé, foi transportada para o Zoo de Lagos; foram criadas duas áreas de refúgio para cavalos-marinhos na ria Formosa e as capitanias de Olhão e Faro, determinaram para estas zonas a "suspensão temporária da circulação de todas as embarcações"; um relatório do Conselho da Europa mostra que as penas de prisão em Portugal continuam a ter uma duração muito superior às dos outros países europeus e a taxa de mortalidade nas cadeias portuguesas está entre os 12 países onde essa estatística é a mais elevada; Portugal reciclou mais 10% em 2019, face ao ano anterior, tendo sido encaminhados para reciclagem mais de 388 mil toneladas de resíduos de embalagens, anunciou a Sociedade Ponto Verde; a pandemia está a afectar a indústria livreira e segundo a GFK, na semana de 23 a 29 de Março, venderam-se menos 66,7% de livros que na semana homóloga do ano passado; também segundo a GFK, na semana de 23 a 29 de Maio as vendas online de aparelhos eléctricos alcançaram 33% do total, quando antes do confinamento valiam 8%; comparando com igual período do ano passado a venda de impressoras domésticas aumentou 172% , as consolas aumentaram 122% e as máquinas de café 54% e os portáteis 33%.

 

ARCO DA VELHA - A Junta de Freguesia de Santa Clara, em Lisboa, deixou de ceder as suas instalações aos 150 idosos da Associação Unitária de Reformados e Idosos da Charneca que ali conviviam diariamente, para ceder o espaço ao Instituto de Emprego e Formação Profissional. 

 

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FOTOGRAFIAS - O Instagram tornou-se na galeria que vou visitando. Esta semana dei com a foto que reproduzo, da autoria de João Miguel Barros, um advogado português que trabalha em Macau e que tem desenvolvido intensa actividade como  fotógrafo, curador independente e editor da publicação de fotografia “ZinePhoto”. Esta fotografia é um auto-retrato “Self-portrait of a not so young artist in times of crisis”  e foi uma das imagens seleccionadas e premiadas pelo júri do Fotofestival Lenzburg, para a série “Times Under Pressure”. Pode saber mais sobre o festival em https://www.fotofestivallenzburg.ch/en/. O trabalho deste autor pode ser seguido em www.instagram.com/joaomiguel.barros e em http://www.jmb.photo/ . Outras sugestões, ainda no instagram: David Guttenfelder é um fotógrafo que trabalha regularmente para a revista National Geographic e tem estado a publicar no Instagram imagens de uma viagem que fez por estrada pelos Estados Unidos ainda antes do início da pandemia - podem encontrá-lo em instagram.com/dguttenfelder . Para terminar sugiro que visitem o instagram da cooperativa de fotógrafos Magnum, que tem feito uma série de iniciativas ligadas com estes tempos que vivemos - podem ver em instagram.com/magnumphotos . E um dos fotógrafos da Magnum é o britânico Martin Parr, cujo trabalho pode ser visto em instagram.com/martinparrstudio .

 

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A VOZ - Cantora, pianista, compositora, Nina Simone  percorreu muitos territórios musicais ao longo da vida. Entre os discos da última fase da sua carreira “Fodder on My Wings” é um registo que tem andado esquecido e que teve sempre uma divulgação reduzida. A editora Verve resolveu agora relançá-lo. Editado originalmente em 1982, gravado em Paris, o disco é influenciado pelos músicos africanos que ela encontrou na capital francesa - Paco Sery na percussão, Sydney Thaim nas congas e Sylvin Marc no baixo. A própria Nina Simone assegurou a voz, o piano, os arranjos e a produção musical e fez um dos discos mais pessoais e intimistas e que é dos melhores trabalhos da sua carreira, injustamente pouco conhecido. Há faixas surpreendentes, como “Liberian Calipso”, que juntamente com “Le Peuple en Suisse” e “I Sing Just To Know That I’m Alive”,  são três faixas inéditas incluídas na nova edição. O álbum inclui 13 temas que exploram uma vasta gama de emoções, desde o “Heaven Belongs To You” que evoca os espirituais negros, cantado em francês e inglês, um primor de utilização da voz de Nina Simone em “Vous Êtes Seul Mais Je Désire Être Avec Vous” e a homenagem ao seu pai feito numa pessoalíssima versão de “Alone Again Naturally” (de Gilbert O’Sullivan), completamente transfigurado nesta interpretação - a cantora altera a letra, os arranjos e até a composição musical. “Fodder On My Wings” está disponível no Spotify.

 

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DOIS MUNDOS - “Sementes Mágicas”, de V.S. Naipaul, é a continuação de um anterior romance, também já editado em Portugal, “Metade da Vida”. Destaca-se aqui de novo a forma de escrita de Naipaul, muito bem transmitida e interpretada pela tradução de Maria João Lourenço. Os dois romances acompanham a vida e as dúvidas de Willie Chandran, um homem de identidade incerta que, aos quarenta e cinco anos, se interroga sobre o seu papel no mundo e o sentido da sua vida. Willie Chandran tem atrás de si uma vida errante: saiu da Índia, onde nasceu, viveu em Londres, em Moçambique e em Berlim. E é a partir de Berlim, para onde regressara depois de deixar África e um casamento, que decide regressar à Índia. O seu regresso é estimulado pela irmã, Sarojini, uma realizadora de documentários empenhada politicamente, que considera que Willie leva uma vida passiva, sem direcção nem objectivo. Influenciado pela irmã resolve juntar-se a um grupo revolucionário clandestino e regressa à Índia - mas encontra-se perante uma organização dividida e é apanhado, digamos, pelo lado errado da História. Quando depois de muitas peripécias volta ao Reino Unido, onde a sua demanda começara trinta anos antes, encontra um país que virou costas ao seu passado colonial. Willie dá consigo a reflectir sobre aquilo em que a sociedade britânica se transformou e na sua própria vida. De certa forma “Sementes Mágicas” é a forma de Naipaul reavaliar a sua carreira e a sua obra e a personagem de Willie, assim como a sua evolução, têm não poucos paralelos com o que foi também a evolução da carreira literária de Naipaul e a sua visão do mundo - dos dois mundos da sua vida e da sua escrita, o da colónia e o da potência colonial.

 

COZINHADOS - Hoje aqui fica uma receita de época. Costeletas de borrego cortadas de forma generosa, não demasiado finas, conte entre 3 a 4 por pessoa, dependendo da respectiva volumetria dos convivas. Em casos acentuados, carregar na dose. Tempere-as generosamente com muito sumo de limão, sal e pimenta preta moída na hora. Faça-lhes uma cama e um cobertor com alecrim e deixe-a assim durante uma hora ou duas. Comece por cozinhar ao lume, numa frigideira que vá ao forno. Basta colocar um pouco de azeite no fundo bem espalhado. Com o lume alto cozinhe-as de um lado e outro até começarem a ganhar côr e a própria gordura das costeletas começar a invadir o recipiente. Quando estiverem a começar a tostar leve-as ao forno previamente aquecido a 200º e deixe-as estar durante dez minutos, virando-as a meio. Se gosta delas muito bem passadas (não é o meu caso), deixe ficar mais cinco minutos. Eu gosto de as acompanhar com ervilhas, levemente cozidas, e depois salteadas com hortelã picadinha bem misturada. Para companhia experimentei um vinho regional da península de Setúbal, da Quinta do Piloto, em Palmela - o Cabernet Sauvignon 2017 e a coisa correu muito bem.

DIXIT - “Há um velho ditado grego que apetece recuperar agora: “Aquele a quem os deuses desejam destruir, primeiro enlouquecem”. A Europa, antes de se destruir, está a enlouquecer” - Fernando Sobral

BACK TO BASICS - “Uma das grandes falhas da raça humana é que toda a gente quer construir de novo, mas muito poucos querem preservar e manter o que existe” - Kurt Vonnegut

 

 

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E DEPOIS? NA EUROPA ? E CÁ?

FICA TUDO NA MESMA? OU MUDAMOS DE RUMO?

por falcao, em 03.04.20

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E A EUROPA? - A situação que vivemos mostra aquilo  que é de facto a Europa: uma confluência egoísta de interesses económicos, não uma federação de vontades nem uma aliança de princípios, muito menos um mecanismo de entreajuda. Cada vez que há crise, há clivagem. É o salve-se quem puder. Olha-se para o que é a estrutura central da Comunidade Europeia e não se vê direcção, não se vê liderança, não se vêem estadistas. Há silêncios, há alarvidades da Hungria à Holanda, noutros países há a procura de uma solidariedade que embate em limites apertados e rigorosamente vigiados. O Banco Central Europeu é uma anedota de capacidade de acção quando comparado com a Reserva Federal Americana. A realidade é esta: ao fim de todos estes anos a Europa não existe como o paraíso prometido quando é mais necessária. Os burocratas convivem mal com a acção e este é um momento de acção. Esta crise vai ser longa. O PIB vai baixar de forma generalizada, muitos sectores vão defrontar-se com a sua própria sobrevivência. Portugal, que tem um mercado interno pequeno, viveu anos de crescimento porque teve uma população visitante, de passagem, que alargou o  mercado muito para além do seu tamanho real. Agora, quando ficarmos outra vez no nosso pequeno rectângulo, provavelmente com menos visitantes, que acontecerá? O Governo português tem reagido bem à situação em termos de prevenção e defesa da saúde pública, atrevo-me a dizer que para além do que era previsível - e ainda bem. Mas a seguir vão sentir-se os efeitos de falta de estratégia de competitividade económica, da falta de reformas. E é quando isto acabar que é preciso começar a pensar no que tem de se fazer para o país poder voltar a prosperar, sem bóias passageiras de salvação. Contando com os nossos recursos e a nossa capacidade. 

 

SEMANADA - A aldeia de São Pedro Velho, em Mirandela, conhecida pela produção de morango, teme pela colheita deste ano com toneladas do fruto que podem ficar por apanhar por falta de trabalhadores e de procura devido à pandemia de Covid-19; técnicos de som e de palco de norte a sul do país, que tinham as suas agendas cheias nos próximos meses, ficaram sem um único trabalho; nos primeiros 22 dias de Março, o número de domínios registados com palavras-chave associadas à pandemia subiram de 3000 para 53 mil; a pandemia está a gerar o maior número de ciberataques alguma vez realizado; o índice mundial dos mercados de ações recuou 13,7% em março, com as maiores quedas registadas na América Latina e na Zona Euro;  as praças de Bogotá, São Paulo, Buenos Aires e Viena foram as mais penalizadas e Lisboa perdeu 16%; o montante médio das compras no comércio online aumentou 6% desde o registo do primeiro caso de Covid-19 em Portugal; segundo as projeções do Instituto Nacional de Estatística, a população residente em Portugal poderá baixar de 10,3 para 8,2 milhões de habitantes em 2080 e o índice de envelhecimento quase duplicará; Portugal continua dependente de outros países para se alimentar, pois só produz 85% dos bens de que precisa para pôr no prato.; a superfície semeada dos principais cereais em Portugal diminuiu pelo sétimo ano consecutivo e a sua produção está no mínimo dos últimos 100 anos.

 

ARCO DA VELHA -  A organização sindical de professores do Sr. Mário Nogueira exigiu que as escolas suspendam já o acolhimento de filhos de profissionais de saúde e forças de segurança.

 

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ARTE NO INSTAGRAM - Nestes tempos o Instagram tornou-se numa imensa galeria virtual - de museus, de artistas e claro de pessoas que mostram o que estão elas próprias a ver. Mas concentremo-nos hoje nos artistas. Um dos que tem estado mais activo durante estes tempos da pandemia é Todd Hido, um americano que hoje em dia vive em São Francisco. O seu trabalho está focado em casas, muitas delas em ambientes rurais, outras em ambientes urbanos pouco densificados. O domínio da luz e da côr, uma cuidadosa escolha da luminosidade natural em que prefere fotografar, são a sua imagem de marca - nomeadamente na série “Homes At Night”. Todd Hido tem trabalhos seus publicados na Artforum, The New York Times Magazine, Eyemazing, Wired, Elephant, FOAM e Vanity Fair. Tem obras suas nas colecções permanentes de museus como o Getty, o Whitney Museum of Art, o Guggenheim, San Francisco Museum of Modern Art e The Smithsonian, entre outros. Por vezes surgem paisagens rurais e muitas vezes foca-se em questões ambientais, como aconteceu com o seu mais recente livro, “Bright Black World”, fotografado fora dos Estados Unidos. Poucas vezes surge o elemento humano, excepto numa série em que fotografa interiores de casas onde surgem corpos de mulheres. Do ponto de vista técnico utiliza grandes formatos, exposições longas e uma enorme profundidade de campo, na tradição de alguns fotógrafos paisagistas americanos de meados do século passado - só que desta vez a cores e não a preto e branco. A imagem que aqui se reproduz é extraída da sua página do Instagram, que merece ser visitada.

 

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O TRIO DE JAZZ - Uma das minhas formações preferidas no jazz é o trio - o mais frequente é ter piano, bateria e baixo, mas outra formação de que gosto particularmente é guitarra, bateria e baixo. “Angular Blues” é o novo disco do guitarrista austríaco Wolfgang Muthspiel, acompanhado por Scott Colley no baixo e Brian Blade  na bateria. Muthspiel tem uma forma de tocar guitarra eléctrica muito característica, com um dedilhar marcante e preciso e um sentido melódico notável. Editado pela ECM, o disco tem uma produção simples que deixa os três músicos mostrarem as suas capacidades de improvisação e sobretudo a forma como se conseguem ligar uns aos outros. “Angular Blues” é um dos discos de jazz que mais gostei de descobrir nos últimos tempos e dos melhores de que me lembro onde a guitarra desempenha o papel principal. O primeiro tema, “Wondering” é uma espécie de manifesto daquilo que se vai poder ouvir ao longo do disco. Logo a seguir, a faixa título, “Angular Blues” mostra como a guitarra de Muthspiel se cruza de forma perfeita com o baixo e a bateria. “Huttengriffe” é uma faixa apaixonante, a mais bluesy de todo o disco. “Camino” é uma ode à guitarra e “Ride” uma demonstração de virtuosismo colectivo. “Kanon in 6/8” é um percurso que evoca o blues-rock e “Solo Kanon in 5/4” é o único tema tocado a solo por Wolfgang Muthspiel. O álbum termina com uma versão do standard “I’ll Remember April”, já interpretada por muitos músicos mas que aqui vive do diálogo entre a guitarra e o baixo. Disponível no Spotify.

 

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HISTÓRIAS DE MACAU -  Os mais recentes livros de ficção de Fernando Sobral são orientais, passados entre a China e a Índia. Não são orientais apenas na localização geográfica das histórias que contam, são-no, sobretudo, na forma como estão escritos, nos reparos que as personagens fazem, nas reflexões que evocam ao longo da narrativa, nos pensamentos que deixam no ar. “A Grande Dama do Chá” é o mais recente livro de Fernando Sobral e foi publicado originalmente como folhetim semanal no diário “Hoje Macau” em 2019. O cenário é Macau, em 1937, no momento em que o Japão tinha atacado a China, tomado Xangai, o que leva a um êxodo de refugiados em direcção a Macau - que assim se torna numa plataforma onde se vigiam mutuamente chineses nacionalistas, comunistas e agentes japoneses. É neste ambiente que se desenrola a história de Jin Shixin, que abre a mais famosa casa de chá de Macau, cobertura para a sua ligação com a tríade do Bando Verde que dominava Xangai. O livro retrata o que era a vida em Macau, o papel dos funcionários portugueses da administração local, os conflitos, cumplicidades, pequenas corrupções e também histórias de sedução. O livro conta a noite, os bares, a música, deixa antever todos os vícios e negócios, os segredos e as conspirações. Macau é uma terra de encontros e desencontros, e , como uma das personagens diz no final do livro, “Macau é bela e sem saída. Sejam sempre bem-vindos a esta cidade. Para jogar, para fugir do passado, para encontrarem o futuro. Assim continuará a ser”. É certo que eu tenho um fascínio pelo oriente, mas de cada vez que leio um livro assim fico com vontade de lá voltar. Pelos vistos, agora, infelizmente, não vai ser tão cedo.



VINHOS DURIENSES - Durante uns anos os vinhos do Alentejo dominaram o mercado doméstico português e João Portugal Ramos foi o enólogo decisivo para criar uma marca e uma personalidade que antes estavam difusas. Sem nunca deixar o seu Alentejo, aqui há uns anos aventurou-se, em parceria com José Maria Soares Franco, por terras do Douro. Assim nasceu a gama Tons do Duorum, inicialmente com Tinto e Branco e agora, pela primeira vez, com um Rosé, uma surpresa nas colheitas agora lançadas. As uvas são de terreno xistoso, com as vinhas a uma cota alta, entre os 400 e 600 metros. O Tons do Duorum Rosé 2019 é feito a partir de uvas Touriga Franca, Touriga Nacional e Tinta Roriz, tem aroma marcado por frutos vermelhos, um final de boca prolongado, acidez equilibrada, fresco, graduação de 12%. É uma boa surpresa na gama Duorum, ideal para acompanhar pratos leves e saladas. O Tons do Duorum Tinto 2017 é feito a partir das mesmas castas, Touriga Franca, Touriga Nacional e Tinta Roriz com um processo de vinificação muito controlado. Tem dominante de frutos vermelhos, taninos suaves, aroma intenso, fresco, graduação de 13,5% e vai bem com carnes temperadas. O Tons do Duorum Branco 2019 foi feito com uvas das castas Viosinho, Robigato, Verdelho, Arinto e Moscatel Galego Branco. Tem graduação de 12,5%, aroma intenso, citrinos pronunciados, perfeito para acompanhar uma massa com gambas ou massada de peixe. 

 

DIXIT - “Fazer as duas coisas que parecem ou são contraditórias: este é o grande problema. Fazer com que os cientistas e os técnicos, sem se envolver em política, encontrem os remédios e tratem de quem necessita. Mas fazer também com que os políticos façam as leis necessárias, sem se envolver em ciência.” - António Barreto 

 

BACK TO BASICS - “Por melhor que uma estratégia pareça ser, são os resultados alcançados o que verdadeiramente conta” - Winston Churchill

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