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O PASSADO, EM VEZ DO FUTURO - Quando se olha para a coqueluche de Costa, o seu Plano de Recuperação, constatamos que os 12,9 mil milhões de euros de subvenções europeias vão ser utilizados sobretudo para investir na máquina do Estado, deixando as empresas com as migalhas. Uma análise mais fina permite questionar se a distribuição da bazuca de dinheiro europeu, da maneira que está planeada, não se destina a financiar o programa político da nova geringonça que se vai preparando nos bastidores, mas com o pano de boca de cena escancarado. O Governo defende-se dizendo que o investimento planeado se destina a criar um Estado melhor, mas só o tempo dirá se vai servir para proporcionar melhor educação, um sistema de saúde mais eficaz, uma justiça mais célere ou a combater desigualdades territoriais ou, se em vez disso, irá servir para satisfazer sindicatos, reivindicações de grupos profissionais e financiar um programa político estatizante. Uma sondagem divulgada esta semana indica que 60,6% dos portugueses não acreditam que os fundos europeus que aí vêm sejam bem aplicados e geridos. Quando olhamos para o que se passou desde a adesão à União Europeia e ao que se vai conhecendo das intenções anunciadas para o dinheiro que aí vem, só se pode pensar que aqueles que não acreditam têm razão. Este plano não foi feito para criar bases para o futuro, mas sim para remendar os buracos deixados pelas cativações dos últimos anos.
SEMANADA - Os inscritos nos centros de emprego de todo o país atingem os 409 mil e não havia tanto desemprego registado desde janeiro de 2018; no Algarve, em Agosto, estavam inscritos 13.072 desempregados, uma subida de 178% num ano; os primeiros indicadores dos últimos meses indicam que o turismo correu bastante pior do que o que se antevia, mas a indústria e as exportações recuperaram no verão acima das expectativas; segundo a Marktest, na última década, o número de portugueses que utiliza o smartphone para aceder à Internet, octuplicou e representa agora 72% do total de acessos e as SmartTV já ultrapassam os tablet no acesso à internet; segundo um estudo da DECO dois terços dos agregados familiares em Portugal ainda usam gás de botija e o seu custo médio é de mais 230 euros por ano, cerca do dobro do gás natural; estrangeiros compraram 8,5% das casas vendidas em Portugal em 2019; a venda de casas caíu 21,6% no segundo trimestre deste ano; em seis meses foram registadas no portal da queixa 8033 reclamações relativas ao acesso aos serviços públicos, um aumento de 47% face ao período homólogo; no primeiro semestre deste ano, a Assistência Médica Internacional apoiou, em média, 114 novos casos de pobreza por mês, os serviços mais procurados foram a distribuição de alimentos e o apoio social; a dívida pública atingiu 133,8% do PIB; no Domingo passado a entrevista a Ana Gomes feita por Ricardo Araújo Pereira na SIC teve mais espectadores que Teresa Guilherme no Big Brother da TVI.
ARCO DA VELHA - A Continental Mabor, em Famalicão, corre o risco de perder um investimento de 100 milhões de euros e a criação de cerca de 400 empregos por causa da demora na construção de uma estrada que anda a ser falada há duas décadas.
PAISAGENS - Pedro Chorão nasceu em 1945, começou a expôr em 1975. Começou por estudar biologia e o seu interesse pela pintura nasceu já tinha passado dos 20 anos. Estudou biologia em Liverpool, história de arte e arqueologia em Paris e pintura em Lisboa. Goa é um destino que procura que seja tão frequente quanto possível e as paisagens que vê da casa onde normalmente lá se aloja, junto ao mar, são a base de trabalho para esta nova série de obras que foi apresentada na semana passada na Galeria Monumental e que tem por título “O Princípio da Paisagem”. Em Goa, durante as estadas longas que gosta de realizar, faz desenhos que depois utiliza por vezes como base de trabalhos futuros. Em Lisboa, no seu estúdio, paredes meias com a casa em que vive, pinta entre a memória e a imaginação, sempre a ouvir música - Bach muitas vezes, o piano de jazz de Bill Evans outras tantas. Tem um falar calmo, tranquilo como as suas pinturas. “O Princípio da Paisagem” fica até 31 de Outubro, na Galeria Monumental, Campo dos Mártires da Pátria 111, visitas por marcação pelo telefone 918 744 548.
A DESCOBERTA DE UMA COLECÇÃO - A FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento) foi criada em 1985 e desde relativamente cedo começou a constituir uma colecção de obras de arte centrada em artistas portugueses contemporâneos. Manuel Castro Caldas, posteriormente em colaboração com Manuel Costa Cabral e Rui Sanches, iniciou a colecção e reuniu um conjunto importante de 765 obras entre 1986 e 2002. É deste núcleo que sai grande parte da selecção organizada por António Pinto Ribeiro e Sandra Vieira Jurgens para “Festa.Fúria.Femina”, a exposição que esta semana abriu no maat-Central Tejo e lá ficará até 25 de janeiro. Reunindo 228 obras de 61 artistas, maioritariamente portugueses, de várias gerações, a exposição permite ver trabalhos de diversos contextos e períodos, possibilitando uma nova visão sobre o trabalho desenvolvido em Portugal nas artes plásticas no último quarto do século passado. Ao mesmo tempo são apresentadas algumas obras provenientes das novas aquisições da FLAD, retomadas em 2019, já com António Pinto Ribeiro, que admite procurar seguir o conceito de colecção inicialmente delineado por Manuel Castro Caldas. O objectivo desta mostra é precisamente, nas palavras dos seus curadores, celebrar a história e a continuidade da importante colecção da FLAD, dando-lhe uma inédita exposição que permite descobri-la, afastada que estava do olhar público. Também na Central Tejo abriu “Ballad Of Today”, uma exposição de fotografia e instalações sonoras de André Cepeda, apresentada como “uma longa caminhada contínua através de uma cidade”. Ao longo de 80 fotografias André Cepeda apresenta uma visão inesperada, mas também muito desigual, por vezes desnecessariamente apostada no óbvio. Outras sugestões: na Galeria Belo Galsterer destaque para novas obras de Paulo Brighenti e na Galeria 111 o fotógrafo moçambicano Mauro Pinto apresenta “Blackmoney”, uma visão do universo sempre emocional, mas já muito explorado, da dura realidade do trabalho em minas em sociedades pós-coloniais.
AS PALAVRAS DE AMÁLIA - - Este livro é autenticamente uma descoberta saída do fundo de um baú: em 1973, a Editora Arcádia encarregou o escritor Manuel da Fonseca de escrever uma biografia de Amália Rodrigues. A ideia era pôr um escritor famoso e conhecido pela sua militância comunista a traçar o perfil daquela que era então considerada o ícone do Fado e ligada ao anterior regime. Essa biografia nunca foi escrita, mas ficaram gravadas nove horas de conversa entre os dois, quer na casa da Rua de São Bento, quer na herdade que Amália tinha no Brejão, uma conversa feita em três momentos distintos. Entretanto, a Arcádia acabou e as gravações ficaram esquecidas. Até hoje. As edições Nelson de Matos e a Porto Editora conseguiram localizar essas gravações, promovendo a sua transcrição integral, a cargo de Pedro Castanheira, que também elaborou as mais de três centenas de notas que surgem no final da edição, enquadrando aspectos da conversa agora publicada sob o título “Amália Nas Suas Palavras”. Rui Vieira Nery, que escreveu o prefácio, intitulado certeiramente “Amália e Manuel da Fonseca: entre a cumplicidade e o jogo do gato e do rato”, descreve o encadeamento original, respeitado na edição, das perguntas e respostas como «itinerário errático de um diálogo informal». A conversa está recheada de saltos cronológicos, de mudanças de tema, de associações imprevistas, de interferências externas, de pontos mortos e até graças ocasionais. Mas na longa conversa destacam-se três tópicos centrais em relação aos quais o texto presta informações relevantes e por vezes inéditas: a infância dura da artista, a relação de Amália com o fado e as suas opções políticas. “Amália Nas Suas palavras” surgida no ano das comemorações do centenário da fadista, teve o apoio da Fundação Gulbenkian e do Museu do Fado.
PASTRAMI AO DOMICÍLIO - Já aqui o escrevi mais que uma vez, sou um adepto confesso de sanduíches - mas não as anémicas, em pão borrachoso, de folha transparente de fiambre e queijo flamengo de inferior qualidade que desgraçadamente são as mais frequentes nos cafés deste rectângulo à beira-mar plantado. Nos locais que frequento mais regularmente fiz questão de negociar a confecção de sanduíches como eu gosto e não me tenho dado mal com o resultado. Mas é muito difícil encontrar uma das minhas preferidas, a clássica sanduíche de pastrami, uma deliciosa carne feita do peito bovino, ou seja, a parte dianteira do boi, temperada, fumada e depois cozinhada lentamente. O resultado é magnífico mas difícil de encontrar. Os supermercados do El Corte Inglés têm nas suas charcutarias um bom pastrami, a que recorro para liquidar fomes súbitas caseiras. Mas agora, para minha alegria, descobri uma sanduíche de pastrami no Uber Eats. Passo a explicar: os serviços de entrega de comida pronta apostam em novos modelos e um dos mais recentes é a criação de espaços virtuais. A Pica-Miolo é a primeira «padaria virtual» a abrir no País e a estar disponível apenas online. Apresenta seis variedades de pães artesanais: trigo, mistura, espelta, jalapeños e tâmaras, trigo, sésamo e carvão activado e outro que incorpora na massa queijo da ilha e cebola crocante. O pão pode ser pedido inteiro (a forma é cilíndrica) ou já fatiado. A partir do pão de trigo a Pica Miolo elaborou cinco sanduíches, a que chamou Picas: a tradicional Club (com frango, ovo e tomate), a de presunto com queijo brie e nozes; a minha sempre desejada de pastrami e coleslaw (uma salada de repolho cortado muito fino e temperada), a de salmão fumado com queijo Philadelphia e molho de endro e, para terminar, a de atum com tempero kimchi. Na minha preferida gostaria que tivesse um pouco mais de pastrami e um pouco menos de coleslaw. Mas pelo menos já sei onde recorrer quando de repente me apetecer esse petisco. E se encomendar também o pão de jalapeños e tâmaras fique a saber que ele é uma excelente base das sanduíches que decidir fazer em casa. Sou testemunha.
DIXIT - “Precisamos de um chefe de Estado que una, e não que divida mais os portugueses” - Carlos César, Presidente do PS defendendo Marcelo e criticando Ana Gomes.
BACK TO BASICS - “A simplicidade é o último grau da sofisticação “ - Leonardo da Vinci
A PSP E A CENSURA - Tenho a certeza que o cidadão António Costa é um firme defensor da liberdade de expressão e sei que cresceu num ambiente onde a literatura e a poesia eram estimadas. Não tenho disto a menor dúvida. Por isso mesmo não consigo perceber porque é que, enquanto Primeiro Ministro, permite que a actual direcção da PSP, nomeada pelo seu Governo, seja reincidente em tentativas de limitação da liberdade de expressão. Há pouco tempo a PSP anunciou que apresentou uma queixa-crime contra um cartoon humorístico, que envolvia aquela força policial, publicado no suplemento satírico “Inimigo Público”. Entretanto soube-se que há uns meses a PSP deteve um homem que colava cartazes alusivos a uma exposição e que reproduziam um poema, já publicado em livro, que abordava a violência policial. O colador de cartazes e a curadora da exposição foram alvo de uma queixa da força policial ao Ministério Público, já que referido poema foi considerado ofensivo pela PSP. Imagino que a direcção da PSP tenha criado uma comissão de censura prévia à revelia do Governo e do Primeiro-Ministro e que agora considere que referências que lhe sejam feitas em cartoons ou poemas constituam um crime de “ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva” . No meio de tudo o que se passa no país estas acções da PSP não são enganos fortuitos nem incidentes menores. Reflectem uma atitude e uma linha de conduta preocupantes. Acredito que, inquieto como está com o futuro do Benfica, o cidadão António Costa não queira tomar posição em defesa da liberdade de expressão, mas acredito que o Primeiro-Ministro deva fazer alguma coisa para que ninguém tenha medo de fazer cartoons ou poemas onde as polícias sejam criticadas.
SEMANADA - O Ex Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Orlando Nascimento, foi acusado pelo Ministério Público de crime de abuso de poder; o Ministério Público aceitou arquivar um processo de falsificação de documentos da deputada socialista Hortense Martins a troco de um pagamento de mil euros ao Estado; António Pires de Lima afirmou esperar “que o CDS acorde”; mais de um milhão e duzentos mil utilizadores estiveram registados na Escola Virtual, uma plataforma de ensino à distância, durante o período de suspensão das atividades lectivas presenciais; segundo um inquérito realizado pela Porto Editora, num contexto em que o digital assumiu um novo protagonismo na educação, 76% dos encarregados de educação e 50 % dos professores sublinharam a importância do manual escolar em papel, que foi utilizado por 96% dos alunos; as exportações de Portugal para a China cresceram 77,14% em junho, enquanto as importações sofreram uma queda de 17,45%, em relação a maio; na primeira semana de aulas há cerca de 600 escolas com falta de professores; o transporte fluvial entre as duas margens do Tejo teve uma queda de 45% nos meses de verão; o Metropolitano de Lisboa registou uma quebra na procura de 59% entre os meses de junho e agosto face ao mesmo período de 2019, ou seja menos 24,7 milhões de passageiros;
O MUNDO EM QUE VIVEMOS - Segundo a Fundação Bill e Melinda Gates o desenvolvimento global regrediu mais de duas décadas devido à pandemia, a pobreza extrema aumentou 7%, a cobertura da vacinação está a cair para níveis dos anos 1990 e os impactos económicos reforçam as desigualdades.
AS FOTOGRAFIAS DA LUÍSA - Por uma feliz coincidência neste fim de semana podem ser vistas em vários locais imagens de Luísa Ferreira, uma das mais interessantes fotógrafas portuguesas, persistente no trabalho, paciente no olhar. A sua actividade enquanto fotojornalista leva-a a olhar para o dia-a-dia de uma forma muito particular, aliando o espírito crítico à abordagem da realidade. Como ela diz, está sempre a ver o que se passa. Gosta de trabalhar temas durante períodos largos de tempo - por exemplo, o seu projecto académico é uma tese onde segue através da fotografia as transformações ocorridas no Porto de Lisboa ao longo de vários anos. Da mesma forma desenvolveu desde 1994 “Há Quanto Tempo Trabalha Aqui” no qual documenta as pessoas que trabalharam a vida inteira numa loja, dando-lhe vida própria durante décadas. Sábado à tarde, no MAAT, vai falar sobre este seu trabalho, que evidencia o desaparecimento de pessoas e de lugares com história. A conversa está inserida no ciclo “O Lado B”, que decorre paralelamente à exposição The Peepshow. Luísa Ferreira estará também presente no Museu da Água, em Lisboa, de 17 a 20 de setembro com o projecto Engrácia, a santa passageira, uma exposição promovida pela Associação Portuguesa de Arte Fotográfica, com imagens de João Tuna, Luís Pavão, Rosa Reis, Susana Paiva e, claro, Luisa Ferreira. Ainda no mesmo dia, às 19h00, e para assinalar os 20 anos do laboratório FinePrint (Rua Gonçalves Crespo 6C), o seu fundador, Nuno Soares, juntou vários dos fotógrafos cujas imagens tem impresso, e faz uma exposição onde também estará uma fotografia de Luísa Ferreira. Por último, na CC11, uma associação cultural constituída por profissionais ligados ao jornalismo visual (Rua do Centro Cultural 11, em Alvalade), Luísa Ferreira apresenta a instalação “Claro e Escuro” (pormenor na imagem), integrada na exposição “Diário de Uma Pandemia” que ali decorre até 31 de Outubro. A instalação de Luísa Ferreira agrupa imagens recolhidas em Lisboa ao longo do confinamento e da pandemia e, nas palavras da própria, é uma metáfora sobre os efeitos na cidade e na nossa vida de tudo o que se tem passado, dos novos lixos produzidos e da falta de respeito pelo ambiente quotidianamente evidenciado nas ruas.
UM OLHAR HUMANO - O ponto de partida de Francisco Timóteo para a sua exposição de estreia, “A Pequenez Humana”, é este: “A escala do universo é algo que nos ultrapassa. Não somos realmente capazes de processar a sua imensidão devido à nossa proporcional insignificância.” Francisco Timóteo faz parte da nova geração de artistas plásticos, nasceu em 1998, estudou música e pintura em Lisboa, com passagens por Barcelona e Sevilha, tendo participado em exposições colectivas desde 2017. Esta é a sua primeira exposição individual. Num texto sobre a exposição Raul Pérez sublinha que “a temática do espaço, do infinitamente grande e do infinitamente pequeno”, é bem expressa num dos seus quadros (na imagem) que representa um minúsculo homem só, caminhando num imenso bloco de gelo. A “Pequenez Humana” fica até 30 de Outubro na biblioteca da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova , no Campus do Monte da Caparica. Outras sugestões: na galeria Módulo inaugurou “Natureza do Gesto” de Tiago Santos (Calçada dos Mestres 34A). Na Galeria Monumental (Campo dos Mártires da Pátria) Pedro Chorão apresenta até 31 de Outubro “O Princípio da Paisagem” e na Cisterna (Rua António Maria Cardoso, ao Chiado), pode ser vista a colectiva Contiger, com trabalhos de Ana Fonseca, Bettina Vaz Guimarães, João Távora, Jorge Leal, Liene Bosquê, Maya Weishof, Miguel Santos, Susana Anágua, e Zoë Sua Kay . Na Galeria Filomena Soares (Rua da manutenção 80, ao Beato) Fernanda Fragateiro apresenta sábado “A Monotonia É Fixe”, até 14 de Novembro. Na Galeria Salgadeiras ( Rua da Atalaia 12) Rui Horta Pereira apresenta até 7 de Novembro uma série de desenhos sob o título “A Maioria das Pedras Não Tem Fôlego e etc”.
O ESCRITOR E O SONHO - Maria Gabriela Llansol, considerada como um dos nomes mais inovadores e importantes da ficção portuguesa contemporânea, nasceu em Lisboa em 1931, viveu na Bélgica entre 1965 e os anos 80, altura em que regressou a Portugal e a sua vida profissional foi centrada em questões relacionadas com problemas educacionais. Entre 1974 e a sua morte Maria Gabriela Llansol escreveu 76 cadernos manuscritos, numerados, escritos como diários e com a designação genérica de “Livros das Horas”. A Assírio & Alvim tem vindo a editar estes cadernos, com selecção, organização de textos, introdução e notas de João Barrento e Maria Etelvina Santos. O novo volume agora editado, “O Sonho É Um Grande Escritor”, reúne um número importante de sonhos que foram registados pela escritora nos seus cadernos entre 1969 e 2006, muitos por sugestão do psicanalista que a acompanhou em Lovaina. Além dos textos esta edição reproduz desenhos da própria Llansol, as capas dos cadernos utilizados e reproduções de ilustrações que são referenciadas na escrita. Muitas vezes os textos começam com “hoje tive este sonho”, que depois é contado - e que pode ser a música que sonhou ouvir, encontros ou percursos imaginados. É um livro perturbante e envolvente. Como Maria Gabriela Llansol escreveu, «se é o sonho que cria o homem, vou criar o sonho que me cria».
PEIXE NO AREAL - Gosto do mês de Setembro, mais do que de Agosto. A temperatura está mais amena, menos calor, o sol é menos intenso, menos incómodo. E, junto ao mar, há menos gente. Muito menos gente. Isto aplica-se também a restaurantes de praia. Há poucos dias tive ocasião de comprovar isso mesmo na Praia das Maçãs, num clássico da região, o Neptuno, paredes meias com o areal. Sala ampla, esplanada protegida do vento. Nestes tempos de pandemia, sobretudo durante a semana, neste caso uma sexta-feira, há menos gente e tudo funciona de modo escorreito. Um cliente habitual disse-me que ainda por cima a sexta-feira é um bom dia para o peixe. Na bancada havia um pregado com óptimo aspecto, infelizmente grande demais para apenas duas pessoas. A alternativa foi avançar para dois sargos, que vieram bem grelhados, inteiros, sem o truque muitas vezes fatal de serem escalados. Antes disso tinham sido provados uns belos percebes e uma salada de polvo, ambos muito apreciados. Os vinhos têm preços ajuizados e no final o melão cumpriu muito bem o seu papel patriótico num duelo com um abacaxi tropical. O serviço foi atento e simpático, a vista do areal e da praia são um argumento de muito peso para as coisas correrem bem. O telefone é o 219 291 222.
DIXIT - “Debatemo-nos por um modelo ideal de educação cívica, mas somos incapazes de manter um debate cívico e civilizado. Há aqui uma preocupação deplorável de intimidar as pessoas. Passam a saber que há um custo a pagar se pensarem pela sua própria cabeça”. - Sérgio Sousa Pinto
BACK TO BASICS - “Nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo” - António Costa a 7 de abril de 2016.
A PSP E A CENSURA - Tenho a certeza que o cidadão António Costa é um firme defensor da liberdade de expressão e sei que cresceu num ambiente onde a literatura e a poesia eram estimadas. Não tenho disto a menor dúvida. Por isso mesmo não consigo perceber porque é que, enquanto Primeiro Ministro, permite que a actual direcção da PSP, nomeada pelo seu Governo, seja reincidente em tentativas de limitação da liberdade de expressão. Há pouco tempo a PSP anunciou que apresentou uma queixa-crime contra um cartoon humorístico, que envolvia aquela força policial, publicado no suplemento satírico “Inimigo Público”. Entretanto soube-se que há uns meses a PSP deteve um homem que colava cartazes alusivos a uma exposição e que reproduziam um poema, já publicado em livro, que abordava a violência policial. O colador de cartazes e a curadora da exposição foram alvo de uma queixa da força policial ao Ministério Público, já que referido poema foi considerado ofensivo pela PSP. Imagino que a direcção da PSP tenha criado uma comissão de censura prévia à revelia do Governo e do Primeiro-Ministro e que agora considere que referências que lhe sejam feitas em cartoons ou poemas constituam um crime de “ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva” . No meio de tudo o que se passa no país estas acções da PSP não são enganos fortuitos nem incidentes menores. Reflectem uma atitude e uma linha de conduta preocupantes. Acredito que, inquieto como está com o futuro do Benfica, o cidadão António Costa não queira tomar posição em defesa da liberdade de expressão, mas acredito que o Primeiro-Ministro deva fazer alguma coisa para que ninguém tenha medo de fazer cartoons ou poemas onde as polícias sejam criticadas.
SEMANADA - O Ex Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Orlando Nascimento, foi acusado pelo Ministério Público de crime de abuso de poder; o Ministério Público aceitou arquivar um processo de falsificação de documentos da deputada socialista Hortense Martins a troco de um pagamento de mil euros ao Estado; António Pires de Lima afirmou esperar “que o CDS acorde”; mais de um milhão e duzentos mil utilizadores estiveram registados na Escola Virtual, uma plataforma de ensino à distância, durante o período de suspensão das atividades lectivas presenciais; segundo um inquérito realizado pela Porto Editora, num contexto em que o digital assumiu um novo protagonismo na educação, 76% dos encarregados de educação e 50 % dos professores sublinharam a importância do manual escolar em papel, que foi utilizado por 96% dos alunos; as exportações de Portugal para a China cresceram 77,14% em junho, enquanto as importações sofreram uma queda de 17,45%, em relação a maio; na primeira semana de aulas há cerca de 600 escolas com falta de professores; o transporte fluvial entre as duas margens do Tejo teve uma queda de 45% nos meses de verão; o Metropolitano de Lisboa registou uma quebra na procura de 59% entre os meses de junho e agosto face ao mesmo período de 2019, ou seja menos 24,7 milhões de passageiros;
O MUNDO EM QUE VIVEMOS - Segundo a Fundação Bill e Melinda Gates o desenvolvimento global regrediu mais de duas décadas devido à pandemia, a pobreza extrema aumentou 7%, a cobertura da vacinação está a cair para níveis dos anos 1990 e os impactos económicos reforçam as desigualdades.
AS FOTOGRAFIAS DA LUÍSA - Por uma feliz coincidência neste fim de semana podem ser vistas em vários locais imagens de Luísa Ferreira, uma das mais interessantes fotógrafas portuguesas, persistente no trabalho, paciente no olhar. A sua actividade enquanto fotojornalista leva-a a olhar para o dia-a-dia de uma forma muito particular, aliando o espírito crítico à abordagem da realidade. Como ela diz, está sempre a ver o que se passa. Gosta de trabalhar temas durante períodos largos de tempo - por exemplo, o seu projecto académico é uma tese onde segue através da fotografia as transformações ocorridas no Porto de Lisboa ao longo de vários anos. Da mesma forma desenvolveu desde 1994 “Há Quanto Tempo Trabalha Aqui” no qual documenta as pessoas que trabalharam a vida inteira numa loja, dando-lhe vida própria durante décadas. Sábado à tarde, no MAAT, vai falar sobre este seu trabalho, que evidencia o desaparecimento de pessoas e de lugares com história. A conversa está inserida no ciclo “O Lado B”, que decorre paralelamente à exposição The Peepshow. Luísa Ferreira estará também presente no Museu da Água, em Lisboa, de 17 a 20 de setembro com o projecto Engrácia, a santa passageira, uma exposição promovida pela Associação Portuguesa de Arte Fotográfica, com imagens de João Tuna, Luís Pavão, Rosa Reis, Susana Paiva e, claro, Luisa Ferreira. Ainda no mesmo dia, às 19h00, e para assinalar os 20 anos do laboratório FinePrint (Rua Gonçalves Crespo 6C), o seu fundador, Nuno Soares, juntou vários dos fotógrafos cujas imagens tem impresso, e faz uma exposição onde também estará uma fotografia de Luísa Ferreira. Por último, na CC11, uma associação cultural constituída por profissionais ligados ao jornalismo visual (Rua do Centro Cultural 11, em Alvalade), Luísa Ferreira apresenta a instalação “Claro e Escuro” (pormenor na imagem), integrada na exposição “Diário de Uma Pandemia” que ali decorre até 31 de Outubro. A instalação de Luísa Ferreira agrupa imagens recolhidas em Lisboa ao longo do confinamento e da pandemia e, nas palavras da própria, é uma metáfora sobre os efeitos na cidade e na nossa vida de tudo o que se tem passado, dos novos lixos produzidos e da falta de respeito pelo ambiente quotidianamente evidenciado nas ruas.
UM OLHAR HUMANO - O ponto de partida de Francisco Timóteo para a sua exposição de estreia, “A Pequenez Humana”, é este: “A escala do universo é algo que nos ultrapassa. Não somos realmente capazes de processar a sua imensidão devido à nossa proporcional insignificância.” Francisco Timóteo faz parte da nova geração de artistas plásticos, nasceu em 1998, estudou música e pintura em Lisboa, com passagens por Barcelona e Sevilha, tendo participado em exposições colectivas desde 2017. Esta é a sua primeira exposição individual. Num texto sobre a exposição Raul Pérez sublinha que “a temática do espaço, do infinitamente grande e do infinitamente pequeno”, é bem expressa num dos seus quadros (na imagem) que representa um minúsculo homem só, caminhando num imenso bloco de gelo. A “Pequenez Humana” fica até 30 de Outubro na biblioteca da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova , no Campus do Monte da Caparica. Outras sugestões: na galeria Módulo inaugurou “Natureza do Gesto” de Tiago Santos (Calçada dos Mestres 34A). Na Galeria Monumental (Campo dos Mártires da Pátria) Pedro Chorão apresenta até 31 de Outubro “O Princípio da Paisagem” e na Cisterna (Rua António Maria Cardoso, ao Chiado), pode ser vista a colectiva Contiger, com trabalhos de Ana Fonseca, Bettina Vaz Guimarães, João Távora, Jorge Leal, Liene Bosquê, Maya Weishof, Miguel Santos, Susana Anágua, e Zoë Sua Kay . Na Galeria Filomena Soares (Rua da manutenção 80, ao Beato) Fernanda Fragateiro apresenta sábado “A Monotonia É Fixe”, até 14 de Novembro. Na Galeria Salgadeiras ( Rua da Atalaia 12) Rui Horta Pereira apresenta até 7 de Novembro uma série de desenhos sob o título “A Maioria das Pedras Não Tem Fôlego e etc”.
O ESCRITOR E O SONHO - Maria Gabriela Llansol, considerada como um dos nomes mais inovadores e importantes da ficção portuguesa contemporânea, nasceu em Lisboa em 1931, viveu na Bélgica entre 1965 e os anos 80, altura em que regressou a Portugal e a sua vida profissional foi centrada em questões relacionadas com problemas educacionais. Entre 1974 e a sua morte Maria Gabriela Llansol escreveu 76 cadernos manuscritos, numerados, escritos como diários e com a designação genérica de “Livros das Horas”. A Assírio & Alvim tem vindo a editar estes cadernos, com selecção, organização de textos, introdução e notas de João Barrento e Maria Etelvina Santos. O novo volume agora editado, “O Sonho É Um Grande Escritor”, reúne um número importante de sonhos que foram registados pela escritora nos seus cadernos entre 1969 e 2006, muitos por sugestão do psicanalista que a acompanhou em Lovaina. Além dos textos esta edição reproduz desenhos da própria Llansol, as capas dos cadernos utilizados e reproduções de ilustrações que são referenciadas na escrita. Muitas vezes os textos começam com “hoje tive este sonho”, que depois é contado - e que pode ser a música que sonhou ouvir, encontros ou percursos imaginados. É um livro perturbante e envolvente. Como Maria Gabriela Llansol escreveu, «se é o sonho que cria o homem, vou criar o sonho que me cria».
PEIXE NO AREAL - Gosto do mês de Setembro, mais do que de Agosto. A temperatura está mais amena, menos calor, o sol é menos intenso, menos incómodo. E, junto ao mar, há menos gente. Muito menos gente. Isto aplica-se também a restaurantes de praia. Há poucos dias tive ocasião de comprovar isso mesmo na Praia das Maçãs, num clássico da região, o Neptuno, paredes meias com o areal. Sala ampla, esplanada protegida do vento. Nestes tempos de pandemia, sobretudo durante a semana, neste caso uma sexta-feira, há menos gente e tudo funciona de modo escorreito. Um cliente habitual disse-me que ainda por cima a sexta-feira é um bom dia para o peixe. Na bancada havia um pregado com óptimo aspecto, infelizmente grande demais para apenas duas pessoas. A alternativa foi avançar para dois sargos, que vieram bem grelhados, inteiros, sem o truque muitas vezes fatal de serem escalados. Antes disso tinham sido provados uns belos percebes e uma salada de polvo, ambos muito apreciados. Os vinhos têm preços ajuizados e no final o melão cumpriu muito bem o seu papel patriótico num duelo com um abacaxi tropical. O serviço foi atento e simpático, a vista do areal e da praia são um argumento de muito peso para as coisas correrem bem. O telefone é o 219 291 222.
DIXIT - “Debatemo-nos por um modelo ideal de educação cívica, mas somos incapazes de manter um debate cívico e civilizado. Há aqui uma preocupação deplorável de intimidar as pessoas. Passam a saber que há um custo a pagar se pensarem pela sua própria cabeça”. - Sérgio Sousa Pinto
BACK TO BASICS - “Nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo” - António Costa a 7 de abril de 2016.
UM POUCO DE FICÇÃO POLÍTICA - Imaginemos que Marcelo Rebelo de Sousa não se recandidata. Ou seja, imaginemos que, quem neste momento lidera as sondagens de intenção de voto para as próximas presidenciais, decide não ir a jogo. Nos últimos dias ficaram a conhecer-se as declarações de candidatura de Marisa Matias e de Ana Gomes. André Ventura já anda em campanha há um tempo e o PCP deverá anunciar o seu candidato nos próximos dias. Marcelo Rebelo de Sousa continua a reservar a sua decisão para mais tarde. Chegaremos a segunda feira, a menos que Marcelo tenha entretanto um sobressalto, com quatro candidatos certos - Ventura, Gomes, Matias e quem o PCP decidir indicar. Gostava de ver uma sondagem de intenções de voto para as presidenciais apenas com estes quatro candidatos que já estão certos, ou seja, sem a inclusão do actual Presidente - que por enquanto não é candidato. Quem venceria? Conseguiria Ana Gomes recolher mais votos que Ventura ou Marisa Matias? Ou será que Marisa Matias conseguia vencer Gomes e Ventura? Ou será que, na ausência de Marcelo, Ventura conseguia ter mais votos que os outros? Imaginemos agora por um breve momento que o horizonte das próximas presidenciais seria assim, apenas com estes quatro candidatos. Qual deles se iria sentar na reunião semanal com António Costa em Belém? Se porventura Marcelo decidir que não vai a votos, que fará Costa? Irá levar Ana Gomes às cavalitas até Belém? Às vezes é engraçado imaginar a política como se fosse uma ficção, ainda mais absurda do que ela já é nestes dias.
SEMANADA - Portugal está entre os sete países europeus com piores resultados em relação à pandemia de Covid-19; a diretora geral da saúde, Graça Freitas admitiu que, a informação proveniente dos dados recolhidos nos inquéritos epidemiológicos que fazem aos pacientes, não é tratada; de acordo com um estudo publicado no início do verão mais de metade dos jovens com 18 anos afirmou que a sua saúde mental “piorou” desde o início da pandemia e que o facto de não irem à escola agravou esse estado; um estudo da OCDE revela que os cursos profissionais têm maior saída no mercado de emprego que as licenciaturas; segundo a Marktest 76% dos portugueses têm já acesso à Internet ; o mesmo estudo indica que o smartphone lidera como forma de acesso à internet, sendo já mais utilizado para navegar na web que o computador; a CP perdeu 26 milhões de passageiros durante os primeiros seis meses deste ano; 48% dos europeus afirmam que seu bem-estar financeiro diminuiu nos últimos 6 meses; quase 4 em cada 10 europeus viram o emprego afetado pela pandemia, enquanto mais da metade (54%) viu uma queda no seu rendimento; um em cada cinco consumidores endividou-se para cobrir as despesas diárias durante o período Covid-19 e essa taxa aumenta para 24% quando se analisa a geração “Millennials”; segundo o Banco de Portugal é preciso recuar a 1928 para encontrar uma contracção da economia superior aos 9,5% previstos para 2020.
ARCO DA VELHA - O célebre relatório da Deloitte detectou 140 falhas nas regras de concessão de crédito desde a venda do Novo Banco à Lone Star.
AGENDA VISUAL - JonOne é um artista norte-americano, de origem dominicana que actualmente divide o seu tempo entre Paris e Nova Iorque. A sua actividade começou como graffiter de rua em Nova Iorque, a partir do Harlem, onde vivia, desenvolveu a sua obra de rua na segunda metade dos anos 80 e daí evoluíu para a pintura, utilizando na tela um sistema de cores e uma técnica que provêm do próprio graffiti. No dia 11 inaugura a sua primeira exposição em Portugal, “The Border” (na imagem). A exposição, na galeria Underdogs ( Rua Fernando Palha, Armazém 56, a Marvila) inclui pinturas e instalações, e foi propositadamente concebida para o espaço desta galeria. Entretanto as próximas semanas são animadas em termos do recomeço de actividade das galerias de arte e existem até duas novidades - a abertura de duas novas galerias em Lisboa nestes tempos de pandemia: a Muñoz Carmona Art & Gallery abre dia 15 de Setembro com a exposição “Natureza Morta” de André Ribeiro e Juan Carmona, na Rua do Alecrim 109, ao Chiado; e a No-No contemporary art gallery (Rua de Santo António à Estrela 39A) que dia 12 inaugura com obras de “Um Tempo Sem Medida”, de Carlos Mensil.
JUNTOS OUTRA VEZ - Em 1994 saíu o disco MoodSwing, assinado pelo Joshua Redman Quartet - um grupo de jovens músicos, então no início de carreira mas já com créditos firmados e com colaborações com nomes importantes do jazz de então. O quarteto integrava Redman no saxofone, Brad Mehldau no piano, Christian McBride no baixo e Brian Blade na bateria. A formação fez uma digressão e durou ano e meio. Depois cada um seguiu a sua vida e cada um construiu a sua própria carreira. Agora, um quarto de século depois, os mesmos músicos voltaram a juntar-se no quarteto de Joshua Redman e gravaram RoundAgain, o álbum que saíu há semanas e que inclui sete temas inéditos compostos pelos vários músicos - três de Redman, dois de Mehldau e um de McBride e outro de Blade - um contraste com MoodSwing que era integralmente composto por Redman. Agora os quatro já não são talentos promissores, são músicos conceituados. Os três temas compostos por Redman são muito marcantes, assim como o é o seu saxofone ao longo de todo o disco. Os três temas de que falo, “Silly Love Song”, “Right Back Round Again” e “Undertow” são bem diferentes entre si, mas todas proporcionam espaço para qualquer dos músicos do quarteto, sobretudo a última, que aliás abre o discos, e que é a mais ousada das composições do saxofonista. Outros temas interessantes são “Your Part To Play”, de Blade e “Father” e “Moe Holde” de Mehldau. Nestes temas sente-se como o quarteto está vivo e os músicos continuam a procurar novas soluções. Os solos de todos os participantes equilibram-se e o sentido de grupo é forte, esbatendo protagonismos individuais. Se querem um resumo, este “RoundAgain” é o registo do estado do jazz da geração que no final dos anos 90 refrescou a música e lhe trouxe novos públicos. Disponível no Spotify.
O SEM FIM DA HISTÓRIA - A ideia central é esta: “os sistemas políticos baseados em crenças radicalmente simples são mais cativantes, em especial quando recompensam e beneficiam os verdadeiros crentes, os soldados leais e os amigos e familiares do líder - e mais ninguém.”. Quem o escreve é Anne Applebaum, jornalista galardoada com o Pulitzer, e que escreveu para a revista The Atlantic o artigo “A Warning For Europe” onde falava da interferência russa nas eleições dos Estados Unidos que deram a vitória a Trump. O artigo foi o ponto de partida para o livro “O Crepúsculo da Democracia - O fracasso da política e o apelo sedutor do autoritarismo”, agora editado em Portugal. Applebaum é professora no Institute Of Global Affairs da London School Of Economics e cofundadora do Democracy Lab, uma parceria que envolve a revista Foreign Affairs. Neste livro Anne Applebaum faz uma análise histórica da transformação política e social que está a deformar as nossas sociedades. A autora analisa como as sociedades estão em mutação e as tendências antidemocráticas estão a crescer, tendo por consequência deste fracasso da política tradicional o facto de os sistemas autoritários e radicais estarem a ganhar terreno em todo o mundo. Applebaum sustenta que as teorias da conspiração, a polarização da opinião pública, as redes sociais e a nostalgia por um passado idealizado são armas utilizadas pelos adeptos do iliberalismo, com enorme sucesso, para obter seguidores, conquistar votos e tomar o poder. A leitura do livro é particularmente oportuna neste momento, não só no contexto, mas também proporcionando-nos dados para olharmos de forma mais abrangente para o que se passa agora em Portugal. No capítulo final, “O Sem Fim Da História”, escrito já com a pandemia em pano de fundo, ela termina assim: “Sempre soubemos, ou deveríamos ter sabido, que a história poderia, mais uma vez, entrar pelas nossas vidas e reorganizá-las. Sempre soubemos, ou deveríamos ter sabido, que as visões alternativas acerca das nossas nações nos tentam cativar. Contudo, ao escolhermos o nosso caminho através da escuridão, talvez possamos ver que, juntos, lhes conseguiremos resistir”.
QUI QUÊ? - Tenho encarado a quinoa como algo sensaborão, fruto de modas em matéria de nutrição e confesso que nem vontade tinha em experimentar. Mas recordando-me do velho princípio de que não se deve dizer que não se gosta do que ainda não se provou, lá me dediquei ao assunto. O racional foi este: há alimentos que por si sós não têm grande graça e é a arte do bem temperar e combinar sabores que os pode salvar. Em vez de fazer uma preparação neutra, optei por inventar, baseado noutras experiências com outros alimentos. Assim comecei por cortar lâminas finas de gengibre fresco e rodelas igualmente finas de funcho, a que adicionei um pouco de azeite no fundo do tacho para fazer uma espécie de refogado base pouco puxado. Adicionei a dose pretendida de quinoa, depois de muito bem lavada em água corrente e convenientemente escorrida. Depois de um minuto a tostar no azeite temperado adicionei água já a ferver na proporção de um pouco menos do que o dobro da quantidade de quinoa utilizada. Entretanto escaldei abóbora e courgette cortadas em pequenos cubos e após muito breve cozedura, reservei. Por volta dos dez minutos de cozedura da quinoa, tapada, adicionei a abóbora e a courgette e mexi bem. Voltei a tapar e deixei mais cinco minutos. Nessa altura deitei para o tacho o conteúdo de uma lata de atum Tenório em azeite temperado com tomate seco e manjericão, desfiz e misturei tudo bem com um garfo, e deixei tapado mais cinco minutos. No fim temperei com pimenta preta acabada de moer e cebolinho picado e servi. Só posso dizer que a experiência foi bem recebida e que volta e meia vou recorrer à quinoa para fazer uns jantares leves...
DIXIT - “Para evitar que a escola seja um território de disputas e polémicas que nela não deveriam entrar, impor-se-ia mais bom senso da parte de quem fez a lei, de quem a aplica agora e, naturalmente, dos pais e encarregados de educação destas e de todas as outras crianças portuguesas, que não mereciam ser tratadas como soldados involuntários de guerras que não são delas.” - Vasco M. Barreto e António Araújo.
BACK TO BASICS - “Os fins não justificam os meios, mas os meios acabam, quase sempre, por triunfar sobre os fins” - Vicente Jorge Silva
UM ARTISTA DE VARIEDADES - A curiosidade é uma coisa tramada. Dizem até que os gatos correm risco de vida quando são demasiado curiosos. Os portugueses, pelo contrário, têm a sua curiosidade estancada pelas autoridades, e cada vez com maior frequência. Os gatos, por estas bandas, correm risco de vida quando andam nas cercanias dos governantes. Tomemos quatro casos recentes neste rectângulo à beira-mar plantado: a anulação dos debates quinzenais com o Primeiro Ministro na Assembleia da República, cozinhada a meias entre Rui Rio e António Costa com o pretexto de deixar tempo ao Governo para trabalhar; as manobras do Governo para considerar ilegítimo o relatório da Ordem dos Médicos sobre o Lar de Reguengos que criticava as autoridade de saúde locais; a tentativa de esconder o relatório e as recomendações da Direcção Geral da Saúde sobre a festa do Avante!; e, finalmente, o caso da auditoria ao Novo Banco, que foi considerada confidencial. Cada vez que existe um tema quente a primeira reacção deste Governo é esconder os detalhes, negar seja o que fôr, procurar atirar as culpas para cima de quem estiver à mão. Por vezes os protestos são eficazes, outras vezes nem tanto. No caso do Novo Banco a auditoria retoma aquela imagem da montanha que pariu um rato: afinal estava tudo bem. Lê-se o que nos deixam ler, procura-se um culpado e chega-se à conclusão de que afinal havia outro, como numa célebre canção de Ágata. O Governo está a assemelhar-se a uma estação de rádio especializada em música pimba, para iludir a multidão e distrair as consciências. Costa é um grande artista de variedades, troca de papel com rapidez e à vontade e aparece sempre sorridente em palco. E quando não é aplaudido, lança ele próprio os foguetes - veja-se a sua recente entrevista a um jornal, cheia de fogo de artifício...
SEMANADA - O Fisco abriu uma página no Facebook mas ainda não se sabe se é para ter seguidores ou para ir seguindo contribuintes; o Portal das Finanças recebeu 4383 queixas; entrou em vigor o novo regimento da Assembleia da República que contém o acordo de Rio e Costa para acabar com os debates quinzenais entre deputados e o Primeiro Ministro; segundo o Instituto de Conservação da Natureza e Floresta um terço dos incêndios tem mão criminosa; nas últimas três décadas o valor investido em obras na linha ferroviária que liga Lisboa ao Porto foi de 1,5 mil milhões de euros, o mesmo valor que teria custado fazer uma linha de alta velocidade; as vítimas mortais de acidentes rodoviários em Julho deste ano aumentaram 50% em relação ao mesmo mês do ano passado; mais de metade das estradas portuguesas têm má ou muito má qualidade, revela um estudo do Programa Europeu de Avaliação de Estradas; entre Abril e Junho deste ano o gasto das famílias em produtos alimentares foi de 6,2 milhões de euros, o valor mais alto de sempre num trimestre; as famílias portuguesas gastaram menos 52 milhões de euros por dia na compra de bens e serviços durante o segundo semestre deste ano, em comparação com igual período do ano passado; o desemprego entre jovens até aos 24 anos cresceu 37% este ano; um estudo da Marktest indica que este ano descobrir o país é uma das actividades de que os portugueses mais gostam e 2,5 milhões revelaram essa preferência; cerca de mil parques infantis estão em risco de falência num sector que emprega mais de 3 mil pessoas; a mortalidade em Agosto voltou a ser superior ao normal mas só um em cada cinco mortes em excesso foi devida ao Covid-19, sendo estimado que a redução de assistência médica e de cuidados sociais é a causa mais provável das restantes mortes.
ARCO DA VELHA - O PCP continuou a vender bilhetes para a festa do Avante! mesmo depois de já ter ultrapassado a lotação permitida pelas autoridades de saúde.
CONFINAMENTO EXPOSTO - Isabel Garcia desenvolveu o projecto da sua exposição “Seed”, que inaugura dia 5 de Setembro na galeria Arte Periférica (CCB) , durante o período do confinamento. No texto que escreveu para a exposição, Filomena Serra sublinha que os trabalhos apresentados são “um convite urgente a pensar a negociação entre a natureza e o ambiente”. A exposição apresenta pequenos objectos em bronze patinado que são simultaneamente pequenos cofres e sementes e também pinturas sobre tela em duas séries - “Floating Seeds” e “Another Green World”, na imagem, esta última criada a partir da evocação de uma composição de Brian Eno. Em Lisboa a Galeria Vera Cortês prossegue o ciclo de exposições de curta duração que coloca em diálogo obras de dois artistas. Até 9 de Setembro poderão ver os trabalhos de José Pedro Croft e Catarina Dias (Rua João Saraiva 16-1º). No Espaço Exibicionista (Av. Casal Ribeiro 18) Valentim Quaresma apresenta entre 4 e 28 de Setembro a exposição “Once Upon A Time”, feita com base no conceito de criação de peças novas a partir da reutilização de materiais. E para terminar Paulo Brighenti apresentou esta semana um projecto a que devotou muito trabalho, a RAMA - Residências Artísticas da Maceira, localizada na Aldeia da Maceira em Torres Vedras. A RAMA destina-se a artistas, investigadores e curadores nacionais e internacionais e quer nomeadamente organizar residências artísticas, oficinas, exposições e palestras, de forma a fomentar a relação com a comunidade local, a cultura, os ofícios e os saberes tradicionais, a história e a paisagem rural, aprofundando o conhecimento da região. Mais informações em www.ramastudios.pt .
UMA VOZ À PARTE - Há uma dezena de anos Gregory Porter era um ilustre desconhecido. Agora a sua voz de barítono e o seu visual tornaram-se uma imagem de marca entre os cantores de jazz contemporâneos. Em 2017 lançou um álbum basicamente de versões de temas celebrizados por Nat King Cole e o seu último disco de originais datava de 2016. Quatro anos depois regressa às suas próprias composições com o novo álbum “All Rise”, agora editado. Aqui ele mostra de novo os seus talentos de compositor, destacando-se a forma como escreve tendo em conta as suas próprias características vocais e aproveitando-as ao máximo. A sua voz é notável, mas o seu talento de compositor também. Dos 16 temas deste disco destacam-se “Phoenix”, “Merry Go Round”, “Long List Of Troubles” ( e se puderem vejam como neste tema a voz se harmoniza com o som do orgão Hammond tocado por Ondrej Pivec, “Thank You”, “Revival Song” e a balada “If Love Is Overrated”. Neste seu sexto álbum Gregory Porter vai do jazz à soul, passando pelo gospel. Fez-se acompanhar por uma secção de metais, um côro de 10 vozes e pela secção de cordas da London Symphony Orchestra. O trabalho de produção de Troy Miller ( que entre outros trabalhou com Amy Winehouse), abriu toda a sonoridade do álbum. Disponível no Spotify.
UM MISTÉRIO PESSOANO - Em Portugal há escritores que trabalham angustiados a pensar no prémio Nobel. Foi coisa que nunca passou pela cabeça a Fernando Pessoa. Mas, e se tivesse acontecido? Este é o ponto de partida para “A Segunda Vida de Fernando Pessoa”, de João Céu e Silva. Editado originalmente durante o confinamento sob a forma de folhetim no “Diário de Notícias”, esta foi a maneira que o jornal escolheu para evocar os 150 anos da publicação de um outro folhetim que ficou célebre, “O Mistério da Estrada De Sintra”, de Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão. “A Segunda Vida de Fernando Pessoa” conta a história de um homem que, através de experiências esotéricas, encarna um dos heterónimos de Fernando Pessoa e continua a obra do poeta rumo ao Nobel. O livro conta-nos a história de um misterioso especialista em estudos pessoanos que atrai um professor para a sua investigação sobre a relação de Pessoa com Aleister Crowley. Revive-se uma viagem ao passado, desde as primeiras correspondências até ao ponto em que o poeta português ajudou o ocultista britânico a forjar o suicídio na Boca do Inferno. Sem se aperceber, e através de experiências esotéricas e descobertas perturbadoras, o professor vai sendo moldado física e espiritualmente para encarnar Vicente Guedes, o heterónimo a quem inicialmente foi atribuído “O Livro do Desassossego”, e continuar a obra do poeta, rumo ao Nobel. O romance de João Céu e Silva reata a tradição do folhetim, e mantém o seu elemento de suspense entre capítulos, criando uma atmosfera de mistério até ao final. Edição Guerra & Paz.
A ARTE DO FILETE - Tudo começou quando me gabaram os filetes de um restaurante na estrada de Birre, a Caminho do Guincho, mais precisamente numa localidade chamada Areia. Disseram-me que “O Correio” era um restaurante simples, com decoração antiga, mas bom serviço, boa confecção e boa matéria prima. A recomendação mostrou-se certeira e numa mesa alargada provou-se de tudo um pouco - os filetes de pescada, acompanhados de arroz de tomate no ponto, eram suculentos, o peixe era fresco e bem cortado, a fritura impecável e foram unanimemente elogiados: noutra ponta da mesa era gabada a carne de porco à alentejana e, no meio, uma massada de peixe com gambas e um arroz de bacalhau com amêijoa também obtiveram sucesso, assim como uns belos carapaus de bom porte. A lista de vinhos tem sugestões correntes sem grandes desvarios, na mesa do lado foram muito gabados os mexilhões à espanhola acompanhados de batatas fritas caseiras. Confirmo pois o que me disseram: a comida é muito boa, o serviço é atencioso e a conta não é pesada. “O Correio” fica na Rua da Areia 1406, com o telefone 214 860 039.
DIXIT - “A arte mais exigente da saúde pública é percorrer o estreito caminho entre proteger a saúde das pessoas (...) e evitar excessos na natureza e oportunidade das medidas a adoptar” - Constantino Sakellarides e Francisco George.
BACK TO BASICS - “É verdade que o conhecimento pode criar problemas, mas não é permanecendo ignorantes que os evitaremos” - Isaac Asimov
(A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE NO SUPLEMENTO WEEKEND, QUE SAI COM O JORNAL DE NEGÓCIOS DE SEXTA-FEIRA)
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