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O DINHEIRO NÃO DÁ PARA TUDO....

por falcao, em 27.01.23

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AS PESSOAS - Por muito que António Costa proclame a sua preocupação com o país, a verdade é que a melhor palavra para descrever a política social do PS é cativações. Em poucos anos, Costa, Centeno e Leão encheram o bolso do Estado à custa de cortes. O sucesso propagandístico das suas contas deve-se ao aumento da receita fiscal e à redução e cortes nas despesas de funcionamento de vários sectores. O Governo diz que investe mais, mas não é o que tem feito em relação às pessoas, nomeadamente em relação a professores, médicos, enfermeiros e tantas outras profissões. O resultado está à vista nos problemas daquelas que deviam ser as principais funções do Estado, a educação, a saúde e a justiça. Houve quem tivesse esperança que pelo menos algumas reformas surgissem com a maioria absoluta, depois do período de distrações e equilibrismos da geringonça. Mas a única coisa que a maioria absoluta trouxe foi arrogância, autismo político, cumplicidades e as corruptelas fruto de demasiados anos no poder. O que se tem passado só alimenta a distância entre eleitos e eleitores. Olhemos para o caso dos professores , uma lição de vida sobre as diferenças entre os comuns mortais e a classe política e seus apêndices. Para os que ensinam as próximas gerações oferecem-se dificuldades, incerteza, carreiras mal definidas, contagens de tempo de serviço vergonhosas e salários baixos. Para a classe dirigente o tempo de serviço é amplamente recompensado em indemnizações, encontra-se sempre uma sinecura para algum histórico militante do poder a necessitar de um aconchego. Para fazer os disparates que tem feito e que têm custado milhões, como na TAP, o Governo corta noutros lados. É nesta altura que me lembro sempre da história de uma pessoa influente que acumulou dívidas e que, quando um dos credores o viu com um reluzente carro novo e o inquiriu, se limitou a responder:  “o dinheiro não dá para tudo”. 

 

SEMANADA - 22 dias depois de se ter demitido Pedro Nuno dos Santos  descobriu que afinal tinha enviado um whatsapp a aprovar a indemnização de meio milhão de euros da TAP a Alexandra Reis; António Costa leva mais de 5760 dias, cerca de 16 anos, em cargos governativos, com oito nomeações, desde meados dos anos 90; nove dos dez titulares de cargos governamentais que os exerceram durante mais tempo são do PS; um estudo divulgado na semana passada coloca a economia portuguesa na 36ª posição entre 38 países no Índice da Competitividade Fiscal para 2022;  as greves em Portugal cresceram 25% no ano passado; em 2022 foram produzidos em Portugal mais de 320 mil veículos automóveis, um crescimento de 11,2% face ao ano anterior; o emprego na construção atingiu o valor mais elevado da ultima década mas o sector ainda necessita de mais 80 mil trabalhadores para responder às obras projectadas para os próximos anos; face à instabilidade nas escolas públicas regista-se um acréscimo significativo de procura pelos colégios privados; cerca de metade da população adulta portuguesa tem dois ou mais problemas de saúde, consequência de excessiva exposição a ecrãs, má qualidade do sono e stress, concluíu um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto; o preço do arroz carolino quase duplicou no espaço de um ano; segundo as autoridades policiais há 53 crimes contra idosos cometidos por dia e o mais grave e frequente é a violência doméstica; um estudo divulgado na semana passada aponta para uma subida de 18,7% no preço das casas, a maior variação dos últimos 30 anos; segundo o BCE, Portugal está em último lugar do ranking da Zona Euro em matéria de literacia financeira.


O ARCO DA VELHA - O piso da linha ferroviária do Norte, que liga Lisboa ao Porto, sofreu quatro abatimentos em três semanas.

 

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A PINTURA - Não faltam exposições em Lisboa nesta altura do ano. Começo por “Água de Colónia" de Gonçalo Pena, com curadoria de João Maria Gusmão e que estará exposta até 11 de Março,  na Cristina Guerra Contemporary Art (Rua de Santo António à Estrela 23). Trata-se de um conjunto de 23 pinturas a óleo e cerca de noventa desenhos que têm óbvias ligações entre si, todos eles a remeterem para fragmentos de memórias, imagens fugidias, aventuras vividas (na imagem, foto da própria galeria). Há um misto de voyeurismo nos óleos e relato nos desenhos, que por vezes evocam a banda desenhada. Mas há uma história comum neste diálogo entre pintura e desenho. No MAAT, no edifício da Central Tejo, inauguraram exposições de Maria Capelo, Pollyana Freire e Jonathas de Andrade. Esta última, “Olho Faísca”, a mais impactante,  mostra as diversas facetas do autor brasileiro de braço dado com a propaganda de causas que assume. Para regressar à pintura e a coisas mais sérias recomenda-se a exposição de Pedro Chorão na Galeria  Monumental (Campo dos Mártires da Pátria 101). E termino com a derradeira exposição organizada por Mário Teixeira da Silva no seu  Módulo Centro Difusor de Arte (Calçada dos Mestres 34 A), inaugurada poucos dias antes de morrer, e que, com o título “Nocturna”, apresenta trabalhos de Nadya Ismail, Pedro Zhang, Vasco Maia e Moura e Xavier B. Tourais. Até ao fim Mário Teixeira da Silva dedicou-se sempre a descobrir novos talentos artísticos e esta exposição é ela própria um derradeiro testemunho da sua forma de estar como coleccionador e galerista.

 

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MISTÉRIO - A história é envolvente desde o início, quer na definição de personagens, quer na própria localização da acção, quer no inesperado desenrolar dos acontecimentos e no final que o autor imaginou. O livro chama-se “A Casa Do Outro Lado do Lago” e foi escrito por Riley Sager, pseudónimo de Todd Ritter, um dos mestres da literatura de mistério norte-americana. No centro da narrativa está Casey Fletcher, uma actriz recém-viúva que se refugia numa casa de família nas margens de um lago, no estado do Vermont, Canadá, para tentar escapar a uma onda de má imprensa devido ao seu alcoolismo. Aos poucos Casey observa os movimentos de Tom e Katherine Royce, uma ex-top model e um magnata da tecnologia, o casal de vizinhos que vive no outro lado do lago, numa casa de vidro. Com um par de binóculos ela espreita tudo o que se passa dentro das paredes de vidro. É essa observação que lhe permite perceber, um dia, que Katherine está prestes a afogar-se no meio do lago. Casey mergulha ela própria nas águas escuras e consegue salvá-la : ficam amigas a partir daí. À medida que a amizade se desenvolve percebe que o casamento dos seus vizinhos não é tão perfeito como inicialmente lhe parecia. Tudo se agrava quando Katherine desaparece de repente e começa a suspeitar que Tom pode estar envolvido nesse desaparecimento. Pelo meio entram novos personagens em cena,  peças de um mistério que fica cada vez mais denso e deixa no ar uma questão: até que ponto conhecemos alguém? O final, que não revelo, é uma reviravolta total e surpreende muita gente - a começar pela própria Casey. “A Casa Do Outro Lado do Lago” é uma edição da Guerra & Paz.

 

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AMBIENTE - O novo disco de  Ryuichi Sakamoto tem 12 temas e uma hora e um minuto de duração. Como título figura o número de temas e este “12” foi lançado há poucas semanas, no dia em que completou 71 anos. É  o seu 15º álbum  de originais, o primeiro em seis anos, depois de “Async” (de 2017). Cada um dos doze temas tem como título a data em que cada tema foi criado e a música é minimalista, uma primeira parte mais ambiental e outra mais clássica. Ryuichi Sakamoto, o seu piano e o seu sintetizador são os únicos protagonistas deste trabalho que reflecte muito o estado de espírito do músico. Em 2014 Ryuichi Sakamoto foi diagnosticado com um cancro da garganta, cancelou digressões agendadas e repensou o que fazia. E como disse em entrevistas de então, dedicou-se a fazer música que pudesse deixar para o futuro sem se envergonhar. Foi nesse contexto que nasceu “Async”. Nessa altura Sakamoto deixou de actuar ao vivo, mas fez vários recitais em streaming, o últimos dos quais em Dezembro,  que anunciou como sendo a sua derradeira actuação pública. Na altura explicou que lhe tinha sido diagnosticado um novo cancro e todo este disco foi feito depois de ter tido essa notícia. Há uma outra particularidade: não existe outra definição rítmica em todo o álbum à excepção do som da respiração intensa do músico enquanto toca. A parte final do disco, com peças mais curtas, é dedicada a Claude Debussy, que ele admite ter sido sempre a sua grande influência musical. De certa forma “12” é como um diário onde, em vez da escrita, se usam notas musicais para descrever o que se passa. Disponível nas plataformas de streaming.

 

A VER O MAR - Apesar de muita estragação arquitectónica, Sesimbra continua a ter um encanto especial. Tem o mar descaradamente à sua frente, um porto de pesca, uma marginal  magnífica se não olharmos para os edifícios e nos fixarmos no mar. E tem uma nova geração de restaurantes, que vieram ocupar o lugar de alguns dos clássicos que entretanto fecharam ou mudaram de vida. Um dos novos que vale a pena conhecer é o “Portofino”, um edifício discreto ao fundo da marginal, perto do porto de pesca, sem nada à frente a não ser o areal e o mar. O Portofino tem uma esplanada abrigada e a sala interior é ampla. Felizmente este é um daqueles restaurantes onde a coisa não se resume a grelhados. Há, por exemplo, lulinhas fritas com alho e coentros, polvo confitado com cebola frita ou o incontornável choco frito. Nas especialidades há uma feijoada de polvo e camarão, uma açorda de mariscos servida dentro de um pão escavado e um arroz do mar - foram pedidos nas mesas mais próximas e as pessoas estavam com cara satisfeita. Para os carnívoros há lombo do cachaço de porco preto com puré de castanhas e um entrecôte de novilho na tábua. Mas a parte dos grelhados não é descurada e na semana passada a escolha da mesa recaíu num pregado de bom porte, com batata a murro e grelos salteados. Estava muito bom e correspondeu à expectativa. De entrada vieram umas ameijoas à Bolhão Pato, um pouco abaixo das expectativas. Serviço muito bom e atento. A lista de vinhos é curta e tem preços decentes. O Portofino fica na Avenida dos Náufragos, na Praia do Ouro e o telefone é 919 480 282.

 

DIXIT - “Em vez de amadurecer a democracia portuguesa atravessa aguda fase de infantilismo" - António Barreto

 

BACK TO BASICS -"Tenho sido actor sempre e a valer. Sempre que amei, fingi que amei e para mim mesmo o finjo" - Fernando Pessoa,  Livro do Desassossego

 

 






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publicado às 11:00

A SUSPEIÇÃO VAI CRESCENDO

por falcao, em 20.01.23

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A NATUREZA HUMANA - Há quem no Governo lamente aquilo a que chamam “a cultura de suspeição generalizada” sobre os políticos. O que eu acho extraordinário é que lamentem o clima, em vez de prevenirem que existam motivos de desconfiança em relação às pessoas e de descrença em relação às instituições. Todas as semanas surgem mais casos, que envolvem mais gente - agora começou a vez dos deputados, com o caso de Jamila Madeira, do PS, que, estando no Parlamento, era consultora da REN, ou com o caso de João Pinto Moreira, do PSD, que está a ser também investigado do caso da corrupção na Câmara de Espinho. São obviamente casos diferentes, e todos são inocentes até haver condenação em julgamento - embora se saiba que os julgamentos e investigações são histórias intermináveis. Mas aquilo que se passa mostra o grau de podridão de um regime onde quem escrutina os políticos são os aparelhos partidários onde eles cresceram, que frequentam e que em muitos casos dirigiram. Não deve haver juízes em causa própria, mas o que se passa tantas vezes nos maiores partidos é isso mesmo. A maioria dos aparelhos partidários são viveiros de teias de favores, dependências, compadrios, protecção de familiares, cunhas e interesses. Dirão muitos que os pecados e pecadilhos são fruto da natureza humana e não do funcionamento da política - e que, em última análise, são as falhas de carácter que proporcionam a ocorrência dos casos mais graves. Mas existe um clima de facilitismo combinado com uma convicção de impunidade, aliado a muita falta de bom senso, que são a explicação verdadeira para isto. Não é só o sistema político que precisa de ser reformado, os partidos são hoje o viveiro onde crescem os vícios e os problemas.

 

SEMANADAEm 2021, Portugal tinha 2801 pessoas com mais de cem anos, quase o dobro do que acontecia há uma década;  no ano passado foram vendidos 12.725.898 livros, por um preço médio de 13,75 euros, num total de cerca de 175 milhões de euros, um aumento de 16,2% face a 2021; o salário médio dos portugueses cresceu apenas 3% desde 2010; as multas por carta de condução caducada duplicaram em 2022 face ao ano anterior; o preço médio da produção agrícola na UE aumentou 24% em 2022; o Tribunal Constitucional demorou três anos a indicar a direcção da Entidade da Transparência, que tem por missão verificar as declarações de rendimentos e incompatibilidades dos políticos e titulares de altos cargos públicos; alguns ex-ministros de António Costa juntam-se regularmente num jantar convocado através de um grupo de whatsapp dinamizado por Matos Fernandes, intitulado “descamisados”; em 2022 foram apreendidas em Portugal mais de 16 toneladas de cocaína; as exportações de bicicletas fabricadas em Portugal ultrapassou em 2022 a barreira dos 800 milhões de euros; em 2022 foram criadas em Portugal 48.404 empresas, um aumento de 14% face ao ano anterior; um estudo do Ministério da Defesa indica que só 1,4% dos jovens portugueses se interessa por questões de participação e cidadania; a Sociedade Portuguesa de Matemática acusou o Ministério da Educação de atirar a aprendizagem da Matemática no ensino secundário para “mínimos históricos inexplicáveis”.

 

O ARCO DA VELHA - A Comissão para a reforma da Saúde Pública pediu a demissão porque, ao fim de três anos, não vê resultados práticos das análises e das propostas que apresentou.

 

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AS LETRAS DAS ARTES - S. Martinho da Anta, distrito de Vila Real, concelho de Sabrosa, foi a terra natal de Miguel Torga e tem um museu com o nome do escritor, projectado por Eduardo Souto Moura, com um amplo espaço expositivo. Desde sábado passado e até 26 de Março ali pode ser vista uma série de obras de João Vieira, que raramente têm sido expostas em conjunto. Com curadoria de Manuel João Vieira, a mostra revela pela segunda vez - a primeira foi nos Artistas Unidos, em Lisboa, há mais de uma década - uma das mais relevantes séries realizadas pelo artista, terminada pouco tempo antes de João Vieira morrer. A exposição mostra seis pinturas de grandes dimensões (450 x 250 cm) e estas obras de João Vieira, expostas no Espaço Miguel Torga, evocam outras tantas  artes:  “Dança” , “Teatro”, “Imagem”, “Pintura” , “Palavra”, “Música”. João Vieira fez cenografia para teatro, encenações, performances, filmes, e música, além de pintura.  Segundo Manuel João Vieira, "este é, depois do políptico 'Silêncio Chinês' ou da recriação em escala real dos painéis de S. Vicente, o maior conjunto articulado na obra de João Vieira." A carreira de João Vieira nasceu em 1934 em Anelhe, Vila Real,  começou a expôr em 1956, em 1960 fundou o Grupo KWY, juntamente com Lourdes Castro, René Bertholo, José Escada, Gonçalo Duarte, Jan Voss e Christo e teve uma longa e diversificada carreira até à sua morte em  2009. (a imagem aqui publicada é do Centro Miguel Torga).

 

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DESENHAR - Pedro Cabrita Reis gosta de expôr fora dos grandes centros urbanos e de imaginar como a sua obra pode ser descoberta por públicos menos habituados a conviver com ela. Por isso aceitou um convite de Alexandre Baptista que organizou o ciclo “O Desenho como Pensamento” em Águeda.  “… queres que te faça um desenho ?...” foi o título escolhido por Pedro Cabrita Reis para a exposição que abriu na semana passada na Sala Estúdio do Centro de Artes de Águeda e que se prolongará até 22 de Fevereiro. Para esta exposição o artista escolheu 151 obras, todas em papel, desde desenho a grafite até aguarelas, e pinturas a óleo e acrílico. Todos os trabalhos expostos são recentes e foram feitos num período de dois anos. O trabalho mais antigo é a série de desenhos a grafite “Femmes”, de 2020. A exposição está montada como um Cabinet d’Amateur, a meio caminho entre um museu particular e o que se vê quando se entra num ateliê de artista durante o seu trabalho. Há obras encostadas à parede, algumas deixadas no chão (como a série de aguarelas feitas para a capa da revista “Colóquio”, da Gulbenkian), as paredes têm com todo o espaço disponível ocupado, como se pode ver na imagem (fotografia Centro de Artes de Águeda). “Gostei de imaginar e de fazer este trabalho, da mesma forma que gosto da  ideia de descobrir novos espaços e de mostrar o meu trabalho fora das grandes cidades: acharia um desafio expôr, por exemplo, numa colectividade recreativa” - afirmou Pedro Cabrita Reis. A exposição faz parte do segundo ciclo “O Desenho como Pensamento” , que integra 18 exposições individuais, três colectivas e seis conversas temáticas que decorrerão até 30 de Setembro.

 

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UM HOMEM SÓ - Frederik Beckman é um dos escritores suecos contemporâneos mais populares e a sua obra de estreia, “Um Homem Chamado Ove”, tornou-se um clássico e foi adaptado para o cinema num filme protagonizado por Tom Hanks. E de que fala o livro?  Ove não é o típico vizinho com quem nos apeteça cruzar na rua. É um velho solitário e antipático que aparentemente não gosta de pessoas. Protesta contra quem não respeita os sinais de trânsito, queixa-se de quem não sabe fazer reciclagem corretamente,  já para não falar sobre os que ignoram como preparar um café de cafeteira como deve ser. Ove é o tipo de homem que aponta o dedo a tudo o que não lhe agrada e que não consegue compreender aqueles que anseiam pela reforma: como pode alguém passar a vida inteira à espera do dia em que se torna desnecessário? Aos 59 anos, custa-lhe conceber que o mundo pula e avança, que ele não pode ficar agarrado ao passado, perigosamente sozinho e infeliz de tão rabugento, depois de ter perdido a única pessoa que dava cor aos seus dias. Esta é uma história de solidão e tristeza que o seu autor consegue transformar na redescoberta do prazer pela vida. Uma série de circunstâncias, a começar pela chegada de novos vizinhos, consegue devolver a Ove, aos poucos, a fé na humanidade. E, ao mesmo tempo, as pessoas que o rodeiam começam a perceber que o bairro não seria o mesmo sem ele: seria um lugar mais frio, menos solidário e, por mais estranho que pareça, também muito menos divertido. Fredrik Beckman foi colunista e blogger, este romance foi originalmente  editado em 2012 e depois disso já publicou mais seis romances, duas novelas e um livro de não ficção. Está traduzido em 46 línguas e, no total, já vendeu 19 milhões de exemplares de todas as suas obras. 

 

COMIDAS MAL ENCENADAS - O encerramento do restaurante dinamarquês Noma, criado e dirigido pelo chef René Redzepi, veio chamar a atenção sobre o mundo dos restaurantes de luxo, que praticam o que se convencionou chamar fine dining - refeições com extensos menus de degustação, preços altos e enormes equipas a realizar todo o trabalho, na maior parte dos casos com horários sobrecarregados e com salários diminutos ou, até, inexistentes, sob a capa de estágios. O que é certo é que aquilo que está a acontecer ao Noma começa a colocar em causa restaurantes onde o conceito é mais valorizado que a comida, em que o aparato é mais importante que a genuinidade. Investigações jornalísticas em vários restaurantes deste género, nos Estados Unidos, mostraram que afinal muitos produtos utilizados, ao contrário do que era anunciado, não vinham de produções próprias nem próximas e alguns eram até adquiridos em grandes superfícies. Um deles, o Willows Inn, perto de Seattle, parece ter sido o inspirador do filme “The Menu”. Tal como o restaurante cujo chef é representado por Ralph Fiennes, o Willow Inn ficava numa ilha, a que os comensais, que pagavam 500 dólares por cada jantar, acediam de barco. E, como no filme, os empregados não tinham horários e eram sujeitos a diversos abusos. Esta cultura de restaurantes teatralizados foi, na minha opinião, muito estimulada pelas perversas estrelas Michelin que por vezes dão mais importância à aparência que à realidade, privilegiando a decoração dos pratos e a exuberância do serviço. O bom sinal é que esta queda de reputação do fine dining está a trazer de volta a procura por restaurantes mais informais, mais acessíveis, onde os clientes podem escolher o que pretendem comer e não são obrigados a seguir uma lista que alguém imaginou. Termino a parafrasear um escrito recente de Miguel Esteves Cardoso sobre este assunto e que sintetiza o que eu também acho: “um bom restaurante é aquele onde se quer ir todos os dias almoçar”.

 

DIXIT - “As pessoas são escolhidas por quem de direito. Caso aceitem, não devem ser obrigadas a responder a questionários arbitrários e intrusivos” - António Barreto.

 

BACK TO BASICS - “A política é a arte de evitar que as pessoas participem em questões que as preocupam” - Paul Valéry

 

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POLÍTICA SEM VERGONHA

por falcao, em 13.01.23

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A 25ª HORA - Depois da mais atribulada semana de saídas do Governo eis que aquilo que se julgava impensável aconteceu: uma secretária de Estado recém nomeada para substituir uma das baixas governamentais durou 25 horas até se demitir, na sequência de informações sobre uma investigação onde estaria citada. Os casos do último mês são um retrato do funcionamento em circuito fechado, do laxismo na escolha de governantes, do autismo criado pela maioria absoluta no exercício do poder pelo PS. Em nove meses de maioria absoluta registaram-se 13 demissões. O estado em que isto deixa a democracia, a forma como abala a confiança dos eleitores, a instabilidade política que desencadeia, são um case study dos resultados da arrogância e insensibilidade por parte de quem dirige o Governo. Mas entretanto percebeu-se que não só vão para o Governo aqueles que têm telhados de vidro e nalguns casos têm mesmo o tecto todo esburacado. Nestes dias percebeu-se que também quem deixa o Governo  ignora as regras mais simples do que deve ser a separação entre funções oficiais e actividade privada. O caso de Rita Marques, que sai directa do Governo para uma empresa privada da área que tutelava, mostra outra faceta do perfil e carácter das pessoas que Costa escolheu para o círculo governamental. Como disse esta semana Adelino Maltez “o eleitorado nunca ameaçou o sistema e tem de ameaçar, os grandes partidos deviam ter medo de ser derrotados numas eleições. Funcionam melhor quando têm medo”. Para Viriato Soromenho Marques: “ É inaceitável o país ficar refém do partido a quem deu uma maioria absoluta. E o discurso de António Costa, mantendo sempre a ideia de que não se passa nada é inaceitável também”. Já agora, e só por curiosidade, “A 25ª Hora” é um romance de Virgil Georghiu que condena todo o tipo de totalitarismo.

 

SEMANADAEm 2021, Portugal tinha 2801 cidadãos com mais de cem anos e dez anos antes eram apenas 1526; 42% das crianças portuguesas têm peso a mais; o número de directores da TAP tem aumentado desde 2015, quando tinha 39 directores, número que neste momento é de 63; nos anos 80 a economia portuguesa teve um crescimento de 32,3%, nos anos 90 registou 29,4% e nas duas primeiras décadas deste século ficou nos 5,7 e 6,9% respectivamente; os preços das casas em Portugal sobem duas vezes mais que a média da Zona Euro; em Outubro, data da mobilização militar parcial, as entradas de russos em Portugal subiram 23% face a setembro e uma plataforma de arrendamento europeia diz que 94% das reservas de russos são para Portugal; no último ano e meio morreram cinco pessoas em acidentes com trotinetes eléctricas; o secretário de estado da Mobilidade, Jorge Delgado, diz que as trotinetas estão a ser diabolizadas; nos últimos dez anos seis concelhos registaram um aumento de utilizadores de bicicletas e 12 perderam; os cinemas portugueses recuperaram 60% do público de antes da pandemia e no ano passado registaram 9,5 milhões de espectadores; “Top Gun- Maverick” com Tom Cruise foi o filme mais visto em Portugal em 2022 com 714 mil espectadores e “Avatar: O Caminho da Água” registou 598 mil; o filme português mais visto foi a comédia “Curral das Moinas- Os Banqueiros do Povo” com 314 mil espectadores; em 2022, os consumidores portugueses registaram uma média de 526 reclamações por dia no Portal da Queixa; a rede de Cuidados Continuados tem uma lista de espera com mais de 1500 pessoas.

 

O ARCO DA VELHA - Rita Marques saíu do Governo para uma empresa cuja área tutelava e a quem o Governo a que pertenceu tinha atribuído 5,4 milhões de euros de apoio e um bónus fiscal de 266 mil euros.

 

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O ESTADO DO MUNDO - A actividade nas galerias regressa esta semana em força, marcando o arranque de uma série de novas exposições. O destaque vai para “New Age Dreams”, de Pedro Casqueiro, na Galeria Miguel Nabinho (na imagem), até 10 de Fevereiro. São dez pinturas de 2022, acrílico sobre tela, que mostram o olhar do artista sobre o mundo que o rodeia e sobre o que é suscitado na sua imaginação a partir da sua observação da natureza, das pessoas, dos animais, das paisagens e até da tecnologia. Mas há muitas outras exposições iniciadas esta semana. Comecemos pela fotografia com “Panorama”, uma nova mostra de Daniel Blaufuks, na Galeria Vera Cortês. Na Galeria Narrativa a sul-africana Lea Thijs, que vive e trabalha em Lisboa, mostra “Safe House” um ensaio fotográfico sobre o evoluir do transtorno bipolar do seu pai. Regressando à pintura, na Galeria Monumental Pedro Chorão apresenta até 25 de Fevereiro “Paisagem Continuada”. Outras sugestões: na Módulo, a colectiva “Nocturna” mostra trabalhos de Nadya Ismail, Pedro Zhang, Vasco Maia e Moura e Xavier B. Tourais. Na Galeria Uma Lulik, Carolina Serrano mostra os seus novos trabalhos em “Até Aos Ossos” e a Galeria Bruno Múrias mostra Obiustromos, a primeira exposição de Marco Franco. Fora do circuito das galerias está até 28 de Fevereiro uma interessante exposição, “O Apetrechar do Tempo”, de dois artistas com origens africanas, Francisco Vidal e Gonçalo Mabunda, patente no Instituto Camões, em Lisboa. Francisco Vidal teve recentemente uma importante exposição na Gulbenkian e Gonçalo Mabunda é dos mais importantes nomes da arte contemporânea moçambicana.

 

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O ARTISTA IRLANDÊS - Volta e meia faz bem reler um livro, voltar a percorrer páginas de boa memória. E perceber que obras que agora relemos, uns largos anos depois da primeira leitura, continuam  cheias de sentido.  James Joyce tinha 32 anos quando escreveu “Retrato do Artista quando Jovem”, em 1914, que foi o ano de publicação de “Gentes de Dublin”, uma colectânea de 15 contos que descreve a vida em Dublin no início do século XX. Retrato do Artista quando Jovem faz parte do tríptico a que pertencem também Ulisses e Finnegans Wake, e relata a formação espiritual do adolescente irlandês Stephan Dedalus e o processo de rebeldia em relação à rígida educação católica a que está sujeito. Trata-se aliás do primeiro romance de Joyce, publicado em 1916 e que desde logo conseguiu chamar a atenção para a inteligência e originalidade da sua escrita, ao mesmo tempo irónica e sensível. As diferentes fases da vida do protagonista, da infância à vida universitária, refletem-se em mudanças no estilo narrativo. Os aspetos biográficos são tratados com irónico distanciamento, num trajeto que culmina com a rutura com a Igreja e a descoberta de uma vocação artística. A obra é também um reconhecível auto-retrato da juventude de James Joyce, assim como uma homenagem universal à imaginação dos artistas. «Não continuarei a servir aquilo em que já não acredito, chame-se meu lar, minha pátria ou minha religião. E tratarei de exprimir-me em algum modo de vida ou de arte tão livremente como possa, tão plenamente como possa, usando para minha defesa as únicas armas que me permito usar: silêncio, exílio e astúcia.» Joyce viveu fora da Irlanda a maior parte da sua vida adulta, mas nunca perdeu a identidade irlandesa, dominante na temática da sua obra. Disponível nova edição na colecção “Dois Mundos” da “Livros do Brasil”, com tradução de Alfredo Margarido.

 

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ROCK ON - Inesperado, polémico, surpreendente - eis o novo álbum de Iggy Pop, aos 75 anos, o seu 19º, publicado agora no início deste ano. A revista norte-americana “Rolling Stone” elogia o trabalho e diz que demonstra o retorno de Iggy Pop à genialidade musical e o britânico “The Guardian” é mais céptico e afirma que “Every Loser” é mais do mesmo. Creio que a “Rolling Stone” está mais certa que “The Guardian”. É sem dúvida um disco inesperado, sobretudo porque é cheio daquela energia crua que é proporcionada por guitarras eléctricas em modo selvagem, uma imagem de marca de Iggy Pop. Mas os seus 11 temas são suficientemente variados para eliminar a imagem de monotonia ou de repetições. Na realidade esta intensidade estava ausente dos álbuns anteriores, “Préliminaires” de 2009, “Après” em 2012, “Post Pop Depression” de 2016 ou “Free” de 2019. Este novo disco, “Every Loser”, contém alguns dos temas mais rock’nroll de Iggy desde há anos, e a faixa de abertura “Frenzy”, é um exemplo disso mesmo e está muito bem acompanhado por “Modern Day Rip Off” , “Neo Punk” ou “All The Way Down”. Mas “New Atlantis” e “Morning Show” mostram outras direcções, enquanto “Strung Out Johnny” é talvez a mais conseguida canção de todo o disco. Como sempre as palavras destes temas são simples, directas, com humor e os dois temas apresentados como interlúdios, “The News For  Andy” e “Animus” são prova disso mesmo. Para este trabalho Iggy Pop foi buscar Dave Navarro, Eric Avery e Chris Chaney (Jane’s Addiction),  Chad Smith e John Klinghoffer (Red Hot Chilli Pepper), Duff McKagan ( Guns N’ Roses), Stone Gassard (Pearl Jam) e Taylor Hawkins (o baterista dos Foo Fighters entretanto falecido mas que ainda participou em “Every Loser”). Com músicos assim e a produção de Andrew Watt   a sonoridade obtida está explicada. O melhor é ouvirem, o disco está disponível desde 6 de Janeiro nas plataformas de streaming.

 

A ARTE DO ASSADO - Gosto de cenouras de qualquer maneira -  cozida, em puré, crua ou assada. E de entre os muitos legumes que ficam bem assados, a cenoura merece um destaque à parte. A cenoura é um legume para todas as situações mas hoje vou dedicar-me à versão cenoura assada para acompanhamento. Neste caso gosto de usar cenouras mais pequenas, a que é raspada a casca, sendo  depois cortadas em metade no sentido do comprimento. O passo seguinte é colocá-las numa assadeira com azeite quanto baste e temperá-las com sal, pimenta e ervas aromáticas. Gosto de colocar umas duas ou três folhas de louro espalhadas e idêntico número de dentes de alho inteiros, para perfumar. O forno deve estar a 150 graus e a assadura é coisa para demorar uns 45 minutos. De vez em quando, retire o tabuleiro e agite um pouco. Use um garfo para ver se já estão cozinhadas e tenras. O resultado produz um belo acompanhamento para carne feita de várias maneiras e fica muito bem como prato vegetariano, com fusilli envolvidos nos pedaços de cenoura assim assada. Bom apetite.

 

DIXIT - “A vergonha é um sentimento que desapareceu da política” - António Guerreiro

 

BACK TO BASICS - “Não temos senão a nossa história e ela não é só nossa” - Ortega Y Gasset.

 




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publicado às 11:00

SOBRE O ESSENCIAL E O ACESSÓRIO

por falcao, em 06.01.23

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LIBERDADE - Neste início de novo ano, dei comigo a pensar na relatividade das preocupações. Na maneira como Costa andou silencioso sobre a ruidosa guerra entre Pedro Nuno dos Santos e Fernando Medina; como o Ministro da Cultura segue o velho princípio do “quero, posso e mando”; de como Medina quer convencer o pagode que não sabia nada de uma pessoa que nomeou para sua Secretária de Estado. E olho para isto e tenho a sensação de estar no meio de uma comédia de muito mau gosto, com os governantes a desempenhar o papel de  actores que querem fazer de todos nós parvos. Todas estas aldrabices com que nos rodeiam são, afinal, pouca coisa comparado com o que se passa por esse mundo fora. Nós aqui temos uns fala-baratos que lá vão governando as suas vidinhas como podem à custa de não governarem o país. Vou aqui citar o que escrevi num depoimento que me pediram sobre 2023: “Num ano em que tanto se fala de revisão constitucional, o meu desejo é que ela facilite entrar no 50º aniversário do 25 de Abril com uma lei eleitoral mais justa, que não desperdice votos como a actual, que não beneficie uns partidos em detrimento de outros e que dê resultados que estão longe da proporcionalidade dos votos expressos, como aconteceu há um ano.” Olho à volta e vejo párias, que não conseguem fazer reformas, que preferem que a abstenção cresça a que as eleições possam reflectir melhor o sentido dos votos dos cidadãos. Mas, sobretudo, dou comigo a pensar que esta gente não é nada quando comparada com os heróis do nosso tempo na Ucrânia e no Irão, gente que resiste a uma invasão e que combate, arriscando a vida, pelos direitos básicos. Aqui gostaríamos apenas que tudo funcionasse melhor. Lá, lutam por poder falar, ter opinião, ser livres. São eles, na Ucrânia e no Irão, que defendem a fronteira da liberdade. Que o seu exemplo nos fortaleça para que possamos derrotar quem vive de nos enganar.

 

SEMANADA - Em 2023, com um país governado por Costa,  os salários reais vão valer menos que em 2014, quando Passos Coelho era primeiro ministro; os gastos com produtos alimentares sobem 22% em dez anos; desde 1995 três em cada quatro dias foram de governação do PS; mais de 600 mil euros foram roubados em assaltos a carrinhas de transporte de valores em dois anos; na prisão de Setúbal um drone que transportava um telemóvel, cartões de comunicações e carregadores foi detectado e apreendido pela GNR; em 2022 as queixas contra os serviços públicos aumentaram 41%; um estudo revelado na semana passada indica que a isenção de IVA nos alimentos essenciais permitira a uma família média poupar quase 400 euros por ano; Marcelo Rebelo de Sousa alertou para riscos de instabilidade da maioria absoluta;  diversos politólogos ouvidos pela imprensa atribuem remodelações sucessivas a uma falta de coordenação e controlo político do executivo;  João Galamba, envolto na área da energia em polémicas sobre a concessão da exploração de lítio e do projecto de hidrogénio verde em Sines, foi nomeado Ministro das Infra-Estruturas onde terá nas mãos o não menos polémico dossier da TAP; António Costa  justificou a nomeação de Galamba por ele não se embaraçar  “com as exigências da transparência e burocracia necessárias à boa contratação pública”; o Ministro da Cultura decidiu a extinção da fundação Colecção Berardo à revelia do respectivo Conselho de Administração e contra o parecer do Conselho Consultivo das Fundações; o mesmo Ministro da Cultura afirmou esta semana não ter informações sobre o desaparecimento de 94 obras da colecção de arte contemporânea do Estado.

 

O ARCO DA VELHA - Num acórdão recente os juízes do Tribunal Constitucional interrogaram-se sobre se as formigas podem ser consideradas animais de companhia.

 

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UMA CURIOSA MISTURA - Até 20 de Janeiro ainda pode ser vista no Espaço Fidelidade Arte, ao Chiado, a exposição “Mistifório”, o início do ciclo “Território”, que incluirá nove exposições coletivas, cada uma das quais concebida por um curador português convidado. Natxo Checa é o curador de "Mistifório", que inclui obras de Almada Negreiros, Anne Lefebvre, Ernesto Melo e Castro, Maria José Aguiar, Gonçalo Pena, Alexandre Estrela, Ana Hatherly, Mattia Denisse, António Areal, Pancho Guedes, Vespeira, Mané Pacheco, Malangatana, Salette Tavares, Fernando Calhau, Gabriel Abrantes ou Pedro Casqueiro,  entre outros, assim uma seleção de esculturas tradicionais, artefactos, mapas e objectos de proveniências diversas, de África à Ásia, passando pelas Américas. É uma mistura muito heterogénea de mais de uma centena de peças, montadas como um gabinete de curiosidades do século XIX, mas com a mira posta no presente e até no futuro que se abre à arte no universo digital. Natxo Checa é um dos fundadores da Galeria Zé dos Bois, onde continua a trabalhar e foi o comissário da representação portuguesa na Bienal de Veneza de 2009. Depois de estar no Espaço Fidelidade Arte (Largo do Chiado 8) até 20 de Janeiro, Mistifório seguirá para a Culturgest no Porto, de 11 de fevereiro a 14 de maio.

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OS ÁRABES NA PENÍNSULA - Em meados do ano 711, Tariq ibn Ziyad, governador do Magrebe, deu início a uma operação militar que, a partir de Ceuta, cruzando o estreito de Gibraltar, levou, até à baía de Algeciras, cerca de 12 000 soldados. Começava assim a invasão árabe da Península Ibérica, nessa altura dominada pelos visigodos, um povo que, desde o fim do Império Romano, se viu empurrado para a ocupação do único retalho imperial que restava dominar: a Hispânia. Marcos Santos, um especialista em História Militar, conta no seu livro  “Fath Al-Andalus – Os Muçulmanos na Península Ibérica (702-756)”, como foram os primeiros 45 anos de presença muçulmana no Ocidente.  O autor apresenta uma análise detalhada das operações militares, dos desenvolvimentos políticos, do armamento, da logística e do recrutamento, que permitiram a instalação de um povo, de uma cultura e de uma estrutura político‑militar que, ao longo de oito séculos, mudaram a face da Península Ibérica. O livro relata -nos também de que modo a máquina de guerra muçulmana se tornou poderosa, a importância da figura dos califas e, no período pós-ocupação, como foi consolidada a conquista dos territórios. A obra inclui mapas preparados propositadamente para esta edição e um glossário com termos maioritariamente árabes ou de origem árabe. Edição Guerra & Paz.

  

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UMA VOZ ÚNICA - Para o New York Times  o álbum “Ghost Song” , de  Cécile McLorin Salvant, é o melhor disco de jazz de 2022. Cécile McLorin Salvant é uma vocalista que escolheu o território do jazz que tem realizado versões inesperadas de temas conhecidos da música popular anglo-saxónica. Tem uma forma de cantar invulgar e um timbre vocal especial que a colocam num patamar à parte entre outros vocalistas. O seu estilo de reinterpretação é ousado, os arranjos que escolhe são inesperados. “Ghost Song” reúne 14 canções e começa por uma versão de “Wuthering Heights”, popularizada por Kate Bush em 1978. Mas a versão de Salvant é bem diferente, do ponto de vista vocal e musical, as palavras são cantadas de forma mais intensa, quase como se estivesse a enviar uma mensagem a alguém. Em “Optimist Voices/ No Love Dying” ela transita do tema que marcou o filme “The Wizard Of Oz” para uma das grandes baladas cantadas por Gregory Porter e editada em 2013. No tema “Until”, que Sting popularizou, Cécile entra num dueto com o pianista Sullivan Fortner, cruza-se com um solo de flauta de Alexa Tarantino, acompanhada por James Chirillo no banjo e Keita Ogawa na percussão e este tema é um exemplo do espírito aventureiro de Salvant. Mas ouçam-na também a cantar “The World Is Mean”, um original de Kurt Weil composto para a “Ópera dos Três Vinténs”, ou em canções como “The Moon Song”, “I Lost My Mind” ou ainda em “Dead Poplar”, inspirada numa carta do fotógrafo Alfred Stieglitz à pintora Georgia O'Keeffe. Em "Trail Mix” é Salvant que toca piano e em "Unquiet Grave” ela recupera uma canção tradicional inglesa numa versão a cappella, onde a sua voz se destaca e mostra todo o seu potencial. "Ghost Song” está disponível nas plataformas de streaming.

 

NA AVENIDA - O local é belíssimo, com uma iluminação indirecta vinda do tecto, confortável, a realçar a arquitectura do local, uma sala ampla com janelas rasgadas sobre a Avenida da Liberdade. Durante uns anos, no piso de entrada do Hotel Tivoli, em Lisboa, viveu a Brasserie Flo, substituída há já algum tempo pela actual Cervejaria Liberdade. Da lista anterior sobreviveu o bife tártaro, que continua a ser preparado junto ao cliente, com todo o preceito. A sala desenvolve-se em torno de um balcão central onde se podem apreciar alguns dos produtos frescos, como ostras de Setúbal ou do Algarve, lagosta ou lavagante. Nas carnes, além do já citado tártaro de novilho, pode provar um muito honesto pica-pau do lombo ou costeletas de borrego grelhadas. Nos peixes a escolha é vasta e vai de arroz de polvo ou de de garoupa e camarão até bacalhau à Brás. Numa recente visita, a assinalar o primeiro dia do ano, ao jantar, a casa estava cheia e o serviço de sala foi exemplar, em contraste com um mau serviço de acolhimento de uma recepcionista notoriamente pouco inclinada para dar atenção aos clientes. Nas entradas havia várias opções interessantes, desde croquetes de vitela a carpaccio de polvo mas a escolha recaiu numa casquinha de sapateira muito bem temperada, que veio acompanhada de fatias de bom pão levemente torrado. No prato principal brilharam os filetes de peixe galo acompanhado de arroz malandro de tomate com coentros - tudo belíssimo. A lista de vinhos é bem escolhida, preços acima da média mas mesmo assim com algumas boas opções ajustadas a não entrar em falência logo no início do ano. Há também uma lista de cervejas, boa companhia para o pica-pau ou o tártaro. Para quem quiser há opções vegetarianas e nas sobremesas brilham os crêpes Suzette, também feitos junto à mesa, no entanto sem o glamour de idêntico preparo no Gambrinus. Mas o facto não desmerece o serviço na sala que é atento, gentil e rápido.  A Cervejaria fica na Avenida da Liberdade 185,  telefone 933 001 457.

 

DIXIT - “ Este Governo não sabe governar: distribui o que pode. Arranja financiamentos europeus. Dá uns subsídios. Adia uns problemas. Cria mais umas comissões. Mas não sabe governar” - António Barreto.

 

BACK TO BASICS - “O que corre mal é frequentemente o resultado de mau planeamento” - Roald Amundsen



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