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Ao longo das últimas semanas a situação de crise nos mídia foi repetidamente notícia, devido às dificuldades sentidas por várias empresas, nomeadamente no sector da imprensa, e, também, da rádio. Para lá dos problemas de gestão recentes da Global Media, que são a face mais visível do problema, há outros indicadores. A internet veio alterar drasticamente o modelo de negócio do sector e, sobretudo, veio modificar de forma radical a forma de consumir informação. O jornal impresso tornou-se um objecto quase exótico, substituído pelos ecrãs dos smartphones, tablets ou computadores. Ninguém espera saber de manhã o que se passou na véspera - televisões, sites e redes sociais espalham em cima da hora o que aconteceu. O intervalo de tempo entre o facto e a sua percepção pelo público é cada vez mais pequeno. A guerra, os grandes desastres, as crises políticas, as investigações judiciais passaram a ser transmitidas em directo. Se isto melhorou a qualidade da informação ou não é outra conversa e, muitas vezes, constata-se que piorou, já que a falta de mediação - papel que os jornalistas devem desempenhar - desapareceu e o facto em bruto passou a ser a matéria prima da notícia.

Começo por falar do universo da televisão. Cerca de 84 % da população contacta diariamente com a televisão e em média os espectadores estão seis horas e meia por dia a olhar para o pequeno ecrã. Mas fazem-no de forma bastante diferente do que acontecia há uns anos. Há cerca de 20 anos os canais generalistas (RTP1 e 2, SIC e TVI) captavam a atenção de mais de 60% dos espectadores e a SIC, líder de mercado, tinha um share diário frequentemente na casa dos 25%. Hoje em dia tudo é diferente: em 2023 os canais generalistas foram vistos por 41% dos espectadores e o conjunto dos canais de cabo e das plataformas de streaming conseguiram 59%. E o resultado obtido por cada canal também é bem diferente. Vamos a comparações recentes: em 2022 a RTP1 tinha um share médio de 10,8% e em 2023 obteve 11,1%; a RTP2 em 22 teve 0,8% e em 23 subiu para 0,9%; a SIC em 22 alcançou 16,7% e em 23 ficou nos 14,9%; e a TVI que em 23 tinha tido 15,7% desceu para 14,4%. No cabo as coisas também mudaram. O CMTV subiu de 4,8% para 5,4%, a CNN que em 22 teve 3,1% desceu para 3% em 23, a SIC Notícias passou de 2,3 para 2,1% no mesmo período e a RTP3 também desceu de 1,3 para 1,1%. Mas a FOX  subiu de 1,9% em 22 para 2,1% em 23. Além disso, a generalidade dos subscritores de Pay TV têm à sua disposição uma centena de canais de filmes, séries, documentários, música e notícias. O resultado é que a atenção dos espectadores está cada vez mais fragmentada e a televisão deixou de ser aquele meio de comunicação que garantia uma cobertura larga da audiência com uma campanha em um ou dois dos canais principais. E isto leva-nos às alterações verificadas no investimento publicitário feito pelos anunciantes. Até há muito pouco tempo as estações de televisão generalistas captavam mais de 50% do total do investimento. Em 2023 captaram cerca de 35% enquanto o conjunto dos canais de cabo andou nos 13%. Juntos, generalistas e cabo, já não captam 50% do investimento dos anunciantes. Quem sobe então? O outdoor nas suas várias variáveis que já se aproxima dos 15%, o digital que continua a subir e já passa os 30%. A rádio desceu ligeiramente o seu share de mercado em 2023, os jornais caíram, mas as revistas, pela primeira vez em vários anos, registaram um ligeiro aumento. Em conjunto jornais e revistas, que no início do século estavam no segundo lugar da captação de investimento, agora têm 1,8% do mercado publicitário total, tendo atrás de si apenas a publicidade em salas de cinema. A razão da subida do outdoor e do digital tem a ver com a sua eficácia, por razões diferentes. O outdoor porque consegue uma cobertura larga, tocando de forma abrangente  quem anda nas ruas, e o digital porque permite alcançar de forma precisa públicos específicos.  Bastaram duas décadas para virar o universo dos mídia de pernas para o ar. E o resultado está agora à vista.

 

(Publicado no semanário NOVO de 27 de Janeiro)



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TV POLÍTICA - A campanha eleitoral oficial ainda não começou e já tivemos três fins de semana de comícios, maquilhados de Congressos e Convenções convenientemente agendados para captar tempo de antena. Primeiro foi o PS, depois veio o Chega e por fim a AD, já para não falar de iniciativas menores de outros partidos parlamentares - desde os queixumes à la Calimero de Rui Tavares sobre a falta de atenção que lhe é dada, até aos malabarismos oratórios de outro Rui, o Rocha,  da nova IL. A seguir, já no período de campanha,  vamos ter cerca de três dezenas e meia de debates em vários canais de televisão. E, claro, teremos todos os dias comentadores, analistas, oráculos de raças diversas que farão a análise de tudo o que se passou, nos mesmos canais, repetindo-se em círculo vicioso como se analisassem um jogo de futebol. É um país a falar para o umbigo, fechado no universo da política, cada vez mais distante das pessoas. Por curiosidade andei a seguir como tinha sido o comportamento das audiências das televisões nos canais de cabo que maior acompanhamento fizeram das reuniões do PS, Chega e AD, muitas vezes com transmissões quase integrais desses eventos. Olhando para os números verifica-se que nenhum deles conseguiu audiências significativas e, nalguns casos, até ficaram abaixo dos resultados da programação habitual que tinham nos mesmos horários em fins de semana anteriores. Num panorama de  queda progressiva de audiências dos canais generalistas (SIC, TVI e RTP1) será curioso ver como esta avalanche de debates e comentários impacta , ou não, nos valores da abstenção e na evolução das tendências de voto. Já agora, o programa de televisão mais visto da semana passada foi “O Preço Certo”, de Fernando Mendes. 

 

SEMANADA - Em 2023 passaram pelo terminal de cruzeiros de Lisboa 758.328 passageiros, mais 54% do que no ano anterior; o cabaz de alimentos estudado pela DECO sofreu um aumento de 28% em dois anos, superando em 16 pontos a soma dos aumentos das taxas de inflação no mesmo período; o número de casos de doenças sexualmente transmissíveis está acima dos valores pré pandemia, nomeadamente a sífilis que aumentou 125% em três anos; no ano passado foram concedidos mais de dois mil milhões de euros de empréstimos para compras de carros usados, o maior valor de sempre; a produção intensiva de fruta e hortícolas em Alcácer do Sal já ocupa três mil hectares e usa água de 130 furos, ameaçando os recursos hídricos da região; a venda de casas caíu 17% em 2023; em doze meses de liderança de Rui Rocha a Iniciativa Liberal perdeu mais de 40 membros por divergências ideológicas, acusações de nepotismo e de falta de democracia; só 0,7% dos alunos do 5º ano sabem identificar um mapa da Península Ibérica; a disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica perdeu 122 mil alunos no espaço de uma década; o número de desempregados subiu em Dezembro para 317.659 pessoas; no ano passado a Ordem dos Enfermeiros recebeu 1689 pedidos para emigrar, mais 527 do que no ano anterior, um aumento de 45%; ao longo de 2023 inscreveram-se nos centros de emprego 562 mil pessoas, num aumento de 10% em relação ao ano anterior.

 

O ARCO DA VELHA - Nas eleições de há 50 anos houve 500 mil abstenções, há 20 anos um pouco mais de três milhões e, há dois anos, perto de cinco milhões e meio.

 

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A DERROTA DOS FRANCESES - Vale sempre a pena recordar a História, neste caso as invasões francesas. E aqui está um livro mesmo bom para ler nestes tempos em que assistimos a uma nova, e por vezes desagradável, invasão francesa em algumas das nossas cidades. "Mapa Cor de Sangue", do jornalista Rui Cardoso, é uma obra sobre as lutas e tragédias vividas em Portugal no tempo das Invasões Francesas e mostra o retrato sangrento de uma época. O livro faz uma pormenorizada descrição da forma como decorreram, do ponto de vista militar, as três invasões e ajuda a compreender os movimentos das tropas em confronto. Rui Cardoso, que já anteriormente escrevera sobre as invasões francesas, salienta que “massacres como os ocorridos em Leiria, Évora e tantos outros locais estão perfeitamente documentados e não podem ser esquecidos. Pelos critérios de hoje seriam considerados genocidas e violadores dos mais elementares direitos humanos”.  Os invasores franceses fizeram reféns, executaram sumariamente guerrilheiros , saquearam localidades e cometeram horrores por onde passaram. A coisa não ficou, felizmente, sem resposta, mesmo sabendo que quem ousou rebelar-se contra os franceses seria punido. Os habitantes de Vila Viçosa, Rio Maior, Alpedrinha e Régua são brutalmente castigados pelos soldados de Napoleão, mas nada se compara aos massacres cometidos pelos franceses em Leiria e Beja. Em São João da Madeira, a retaliação pela morte de um oficial francês leva à execução de um em cada cinco homens e rapazes da Arrifana. Há duzentos anos por três vezes os generais de Napoleão invadiram Portugal e por três vezes os franceses foram derrotados pelos portugueses, com o auxílio dos nossos aliados ingleses. Às vezes é bom recordar como resistimos e vencemos os invasores. “Mapa Cor de Sangue”, de Rui Cardoso, edição Oficina do Livro.

 

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OUTRO FADO - O Estado, esse polvo sufocante, tem falta de memória e esqueceu-se das comemorações dos 500 anos do nascimento de Camões. Mas a fadista Lina (Lina Cardoso Rodrigues) é um dos expoentes da nova geração desse género musical e não se esqueceu e revisitou a lírica camoniana, com recurso a composições tradicionais do Fado. Na tarefa foi ajudada por Amélia Muge e sem pruridos recorreu aos talentos de Justin Adams, um produtor que já trabalhou com Brian Eno e vários nomes da World Music. A seu lado, musicalmente, estiveram Pedro Viana (guitarra portuguesa), John Baggott (teclas) e Ianina Khmelik (violino). Ou seja, Lina ousou a heresia de navegar fora de águas conhecidas e lançou-se à aventura, tal como Camões. E foi muito bem sucedida no cruzamento da lírica camoniana com a estrutura dos fados tradicionais. Para “Fado Camões”, o seu quarto disco, Lina e Amélia Muge escolheram, entre as melodias tradicionais, as que mais se coadunam aos temas dos poemas. O início faz-se com “Desamor”  e logo aí se percebe que estamos num patamar pouco habitual - do ponto de vista musical mas também vocal. São 12 poemas de Camões onde a guitarra coexiste com teclados, caixas de ritmo, guitarra eléctrica ou violino até ao final com “Pois Meus Olhos Não Cansam de Chorar”. Lina, que cantou no Círculo Portuense de Ópera e estudou canto no Conservatório do Porto,  estreou-se como compositora neste álbum e musicou dois dos poemas. Canta com uma voz limpa e intensa, emotiva sem ser piegas. Um grande disco, disponível em streaming.

 

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O FASCÍNIO DO ORIENTE -  Albano da Silva Pereira foi o criador dos Encontros de Fotografia de Coimbra, é ele próprio um fotógrafo reconhecido, um eterno viajante e um coleccionador compulsivo. “Netsuke”, é  exposição que preparava há anos e que está agora patente no Pavilhão Branco, das Galerias Municipais de Lisboa, com curadoria de Sara Antónia Matos, até 31 de Março. É a exposição de uma vida, que junta a obra fotográfica de Albano da Silva Pereira, as suas incursões no cinema (foi assistente de Manoel de Oliveira) e a sua colecção de objetos e talismãs provenientes da cultura japonesa. Inclui também uma alusão às referências principais do cinema japonês, da escrita e da estampa japonesa. O nome da exposição, netsuke,  evoca uma pequena cavilha entalhada ou esculpida, criada no Japão no século XVII, para prender pequenas bolsas aos quimonos. A construção da exposição baseia-se em dois eixos, que se cruzam entre si: o coleccionador e o artista. Do primeiro resulta a colecção de objectos, raros e preciosos da cultura japonesa e do segundo provém um conjunto de imagens em fotografia e filme que decorrem das viagens do autor ao Japão. As fotografias incluem imagens das ruas de Kyoto, Tóquio ou Hiroshima, mas também de objectos e uma série feita no tradicional Imperial Hotel. A exposição começa e encerra com  auto-retratos do artista, feitos na sequência de um acidente de moto, série a que deu o nome “Still Alive”. Outro destaque vai para  a exposição “Uncertain Smile - Auto Retratos e Paisagem”, que recolhe pintura e desenho de Miguel Navas, que pode ser vista até 17 de Fevereiro na Galeria Monumental (Campo dos Mártires da Pátria 101). Além de cerca de uma dezena de pinturas que nos fazem percorrer o universo que Navas vai descobrindo, há uma parede repleta de desenhos, todos eles auto-retratos, que por vezes surpreendem e por vezes inquietam.

 

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UM EXEMPLO - Maria da Graça Dias Coelho Carmona e Costa, que desapareceu esta semana aos 91 anos, é um raro exemplo do que pode ser a actuação empenhada da sociedade civil em prol da cultura. Fundadora e Presidente da Fundação Victor e Graça Carmona e Costa, foi, apesar das limitações da Lei do Mecenato, uma mecenas activa e conhecedora que gostava de falar e estar com os artistas, que apoiou exposições, projectos, patrocinou catálogos e livros. Foi galerista, coleccionadora, amiga. O desenho era a sua paixão, mas foi sempre observadora informada e atenta da produção artística contemporânea nos seus vários géneros. Ajudou o início de carreiras, seguia de forma muito presente a produção dos artistas que acompanhou ao longo da vida, desde a Galeria Quadrum, onde trabalhou com Dulce d’Agro, depois na Giefarte, que criou, e mais tarde na Fundação e nas exposições que patrocinava em diversos locais. Ainda viu a sua coleção exposta, nomeadamente na Fundação a que presidia e no  MAAT, onde continua o seu “Álbum de Família “. Criou o BAC, Banco de Arte Contemporânea , que inicialmente financiou e que continua sem ter local condigno onde o espólio dos artistas possa ser preservado, estudado e mostrado em boas condições, como ela desejava. Infelizmente não o conseguiu ver a funcionar em pleno,  apesar de todo o esforço que fez. O sorriso da Maria da Graça a entrar numa nova exposição era único. É disso que me vou recordar.


DIXIT - “E tudo poderia ser tão diferente! Poderíamos ter, neste 10 de Março, uma verdadeira revolução dentro da democracia! Poderíamos ter 230 círculos eleitorais, cada um elegendo, por maioria absoluta, um só deputado. Este seria alguém já conhecido pela comunidade, ou que passaria a sê-lo depois da campanha e da eleição” - António Barreto, no Público.

 

BACK TO BASICS- “Toda a verdade passa por três fases: primeiro é apelidada de ridícula, depois é hostilizada e por fim é considerada uma evidência” - Arthur Schopenhauer



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O PROFISSIONAL - No seu comentário habitual aos domingos, na SIC, Marques Mendes, com base num estudo das sondagens realizadas no último mês, sublinhou o crescimento do Chega em Lisboa, Setúbal e Alentejo e afirmou que se o Chega tiver 15% ou mais dos votos a AD não ganha as eleições e será Pedro Nuno Santos a ser chamado a formar Governo. Não me espanto se isso acontecer. O Chega está a encarar estas eleições de forma diferente - como se viu na Convenção que realizou no fim de semana passado. No “Público” Bárbara Reis descreve assim o que se passou na Convenção: “Preparem-se: o Chega já não é só gritos e jantares, ao quinto ano de vida, o esforço para melhorar a imagem resultou. O discurso populista radical está intacto. Mas o embrulho é de maturidade.” A isto acresce a máquina de propaganda montada, de forma muito eficaz, e que promete fazer mossa na campanha eleitoral com videos de rua feitos propositadamente para a ocasião. Basta fazer uma pesquisa na internet para se perceber a capacidade de penetração do partido de André Ventura no mundo digital - tem cerca de 150 mil subscritores no Canal Chega do YouTube, uma presença assídua no TikTok, no Facebook e no Instagram, totalizando varias dezenas de milhares de seguidores. Não é exagero afirmar que hoje o Chega, nas várias plataformas digitais, incluindo a da sua organização de juventude é já provavelmente o partido mais activo e com maior penetração. O resultado está à vista - nas sondagens recentes o Chega é o partido mais nomeado por eleitores dos 18 aos 34 anos, à frente do PS e do PSD e Ventura é ele próprio o motor de toda a actividade de propaganda do Partido. E a verdade é que ele é melhor propagandista que qualquer dos seus rivais no Parlamento e aproveita qualquer oportunidade para se mostrar. Se aliarmos esta capacidade com a exploração da insatisfação de largas fatias do eleitorado percebemos qual a razão do crescimento do Chega. E, não é demais recordar, o êxito do Chega é o maior sintoma da degradação da política, da falência do sistema e do descrédito dos partidos. Foi isto que PS e PSD não quiseram perceber. 

 

SEMANADA - A maioria dos jovens portugueses passa quatro ou mais horas por dia ligados à internet; mais de 300 mil utentes inscritos no SNS já não vivem em Portugal; Portugal é o país da Europa com  mais emigração e nos últimos 20 anos 15% da população emigrou; o número de pessoas em lay-off duplicou em 2023; 30% dos jovens nascidos em Portugal já vivem fora do país, com os países baixos a cativar o maior número destes novos emigrantes qualificados; quase um terço das mulheres portuguesas em idade fértil saíu do país; 75 mil portugueses deixaram o país por ano, em média, entre 2001 e 2020, e 2023 foi o ano que registou maior número de saídas, cerca de 130 mil; 70 por cento dos novos  emigrantes, 850 mil pessoas, têm entre 15 e 19 anos; no princípio deste século, cerca de 6% dos nossos emigrantes tinham formação superior e actualmente, quase 50% dos que emigram têm um curso superior; as remessas dos emigrantes portugueses em 2021 atingiram os 3,6 mil milhões de euros, quase tanto como os fundos europeus que vem anualmente para o país; em 2023 foram criadas em Portugal cerca de 51 mil novas empresas, o registo mais elevado de sempre; segundo dados do BCE, a riqueza das famílias em Portugal aumentou 24% à valorização dos bens imóveis (+40%), já que a riqueza dos restantes ativos cresceu apenas 6%; segundo a Marktest cerca de sete milhões de portugueses ouvem rádio regularmente e a maior parte tem entre 35 e 44 anos; as salas de cinema acolheram 12,3 milhões de espectadores em 2023, o que representa um aumento de 27,8% face ao ano anterior.

 

O ARCO DA VELHA - O centro de alto rendimento desportivo no Jamor teve infestações de baratas e de percevejos e houve atletas que desmaiaram ou tiveram de ir ao hospital com intoxicações alimentares depois de terem comido no refeitório do local. 

 

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SÓ FOTOGRAFIA - Esta semana todo o destaque vai para a fotografia e começo por uma exposição que abriu na galeria Narrativa, “Jamaika” de José Sarmento de Matos (na imagem). A exposição mostra um trabalho feito ao longo de três anos que, sublinha o autor, “ parte da história do Bairro da Jamaica – uma comunidade no Seixal composta por cerca de 700 habitantes, frequentemente racializada e marginalizada –, contando a luta dos moradores por habitação condigna. O trabalho retrata, de um modo íntimo, a vida de uma comunidade composta maioritariamente por imigrantes de ex-colónias portuguesas – Angola, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe – e por afro descendentes portugueses”. Na mesma ocasião foi lançado JAMAIKA,  o primeiro livro do autor, que reúne o trabalho efectuado por José Sarmento de Matos naquele bairro, também à venda na galeria (Rua Dr. Gama Barros 60). Também por iniciativa da Narrativa, em conjugação com o 5º Congresso dos Jornalistas,  está patente na Praça dos Restauradores até 15 de Fevereiro a exposição “Portugal Livre 1974-2024” que junta fotojornalistas de diferentes gerações - desde os que testemunharam e fotografaram o que se passou em 25 de Abril de 1974, até 14 novos fotógrafos nascidos após 1974 e que reflectem, em imagens, sobre o país democrático de hoje através das suas imagens. Em Setúbal, na Casa da Cultura, um outro fotojornalista, Luís Ramos, mostra até final de Fevereiro a exposição “Margem Sul”, que reúne o trabalho realizado ao longo de um ano em toda a zona que ficou conhecida por Margem Sul. São de José Teófilo Duarte, da Casa da Cultura de Setúbal, estas palavras: “Era o outro lado. O lado dos outros. Os do lado de lá. Percebia-se alguma distância, mas também compreensão. Do outro lado estavam os que não chegaram a este lado. Vieram de vários lados em busca de uma vida melhor. Este sítio onde viviam uns e outros era um sítio de lado nenhum.” E, finalmente, para encerrar as recomendações da semana, ainda na fotografia, destaque para “Terra Livre”, a exposição de Diogo Simões na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa (rua da Barroca 59), que resulta do trabalho entre o artista e os curadores Natxo Checa e António Júlio Duarte. Os trabalhos expostos foram realizados entre 2011 e 2020, também sempre na Margem Sul “repleta de contrastes que preservam os diálogos entre os ritmos do campo e os da urbanidade”.

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GUITARRADA - Uma das coisas boas de Janeiro é olhar para as diversas listas dos discos que são considerados os melhores dos anos anteriores. Foi assim que há dias descobri um duplo-álbum do guitarrista John Scofield que me tinha passado despercebido quando saíu em finais de Outubro passado - ora, ainda por cima, eu sou fã de discos de jazz em que a guitarra tem um papel predominante. O disco chama-se”Uncle John's Band”, uma referência a uma canção os Grateful Dead incluída neste disco, cheio de versões como “Mr. Tambourine Man” de Bob Dylan, “Old Man” de Neil Young, “Somewhere” de Leonard Bernstein, “Back In Time” de Huey Lewis & The News ou temas Bud Powell ou Miles Davis. Mas também poderá encontrar clássicos do jazz como “Ray’s Idea”, “How Deep Is The Ocean” ou “Stairway To The Stars”, além de sete originais do próprio Scofield. O título é também uma referência aos músicos presentes - além de Scofield, Vicente Archer no baixo e Bill Stewart na bateria, dois músicos com quem trabalha regularmente e que fazem um grande trabalho neste disco. O duplo álbum, que inclui ao todo 14 temas ao longo de hora e meia de boa música, foi gravado em Agosto de 2022 no Clubhouse Studio, de Nova Iorque e editado pela ECM. Disponível nas plataformas de streaming.

 

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IR AO FUNDO DA HISTÓRIA - Michael Scott-Baumann estudou em Cambridge e depois fez um mestrado na School of Oriental and African Studies,em Londres. Professor de História há mais de 35 anos, fez frequentes viagens no Médio Oriente, cuja situação tem acompanhado. “A Mais Breve História de Israel e da Palestina é um livro que descreve o conflito israelo-palestiniano desde as suas origens, até aos mais recentes acontecimentos, de 2023. Muito documentado, o livro inclui uma cronologia que começa em 1882 com a primeira migração de judeus para a Palestina. Ao longo de dez capítulos o autor percorre as diversas etapas do conflito e relata os principais acontecimentos que ocorreram ao longo do tempo. Cada capítulo apresenta uma explicação das políticas implementadas e termina com testemunhos de palestinianos e israelitas cujas vidas foram marcadas pela violência contínua. Scott-Baumann  analisa também os principais acontecimentos, incluindo o papel dos britânicos após o fim da Primeira Guerra Mundial, o estabelecimento do Estado de Israel (1948) e a crescente ocupação de territórios, a resistência palestiniana, os extremismos e os diversos planos de paz, e até os atuais confrontos, desencadeados pelos ataques surpresa do Hamas a Israel, em outubro de 2023. Em resumo, o livro proporciona dados e uma análise histórica indispensável, assim como a interpretação do autor sobre  as razões pelas quais os esforços para alcançar a paz falham continuamente . Edição  Ideias de Ler, tradução de Artur Lopes Cardoso.

 

UM CLÁSSICO REVISITADO  - Aqui há uns anos Assunção Cristas ressuscitou essa velha tradição de desenrasca culinário que é arroz de atum. Hoje trago uma variante inspirada na receita de uma newsletter americana sobre receitas de cozinha que vejo com frequência. A base é a mesma - uma lata de atum e arroz já cozido. Vamos a isto. Em primeiro lugar escolha um bom atum em azeite, escorra bem,  coloque numa tigela e desfaça-o grosseiramente com um garfo. Adicione duas colheres de sopa de maionese, ajuda a ligar o atum, acrescente uma colher de óleo de sésamo e um pouco de molho de soja. Numa outra tigela coloque o arroz já cozido (eu usei basmati), espalhe-o bem para ficar solto e depois, por cima, coloque o atum. Para rematar espalhe sementes de sésamo previamente tostadas numa frigideira sem óleo e polvilhe tudo com cebolinho fresco acabado de cortar. Acompanhe com um copo de vinho branco seco. Para sobremesa fruta da época - laranjas fatiadas. Bom apetite.

 

DIXIT - “Já vi tantas eleições, que olho para estas e desânimo. Há uma sensação no ar de que nada ficará resolvido, de que tudo será inútil.” - Manuel Soares de Oliveira

 

BACK TO BASICS - “O burocrata perfeito é aquela pessoa que evita tomar qualquer decisão e assim consegue escapar a todas as responsabilidades” - Brooks Atkinson

 



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ELEIÇÕES À VISTA

por falcao, em 12.01.24

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O PROMESSASEm meados de Novembro de 2022, Pedro Nuno Santos, então Ministro das Infraestruturas e da Habitação, apresentou o Plano Ferroviário Nacional, classificando-o como “o documento que faltava ao país”, que colocava a ferrovia “no centro do debate nacional”. E desde então, que se tem passado? Segundo a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes a coisa não tem melhorado. Num relatório publicado no final de 2023, aquele organismo chamava atenção para a deterioração do transporte ferroviário desde 2019 e concluía que há cada vez menos comboios e que estão cada vez mais atrasados. Os resultados do relatório não serão uma surpresa para os utentes de comboios. Mas são o espelho do que tem sido a carreira política de Pedro Nuno Santos: promete muito, concretiza pouco. No comício sob a forma de Congresso que o PS realizou no passado fim de semana, Pedro Nuno Santos, candidatando-se ao lugar de Primeiro-Ministro, apresentou um programa: quer um país solidário, ambicioso e acima da média europeia, se possível governado por uma nova geringonça. A imagem que traçou de Portugal esquece como os anos mais recentes de governação do PS relegaram Portugal para a cauda da Europa em vários indicadores, menos na carga fiscal, onde ocupa lugar destacado. Luciano Amaral, escrevendo sobre o panorama eleitoral, deixou estas palavras no “Correio da Manhã”, que aqui reproduzo com a devida vénia: “O PSD concorre contra um PS que esteve quase uma década no poder, no fim da qual o que consegue apresentar é uma degradação dos serviços públicos, da educação à saúde, pior do que no tempo da troika. Um PS que teve à disposição dinheiro da UE como nunca e o malbaratou. Que se afundou em casos, casinhos e casões revelando um uso do poder, no mínimo, pouco transparente. Que enterrou fortunas a brincar às privatizações e nacionalizações, como já se tinha visto no caso da TAP e se voltou a ver agora no dos CTT. A quem foi dada uma rara maioria absoluta e desperdiçou as condições de estabilidade auto-destruindo-se. Que continuou a deixar Portugal ser ultrapassado na riqueza por país de Leste atrás de país de Leste. Concorre até contra um candidato a PM que, apesar de se apresentar como pura vestal, esteve em tudo: aeroporto, TAP, CTT, os comboios que nunca saíram do apeadeiro, podendo até dizer-se que o Governo começou a cair por sua causa, no caso Alexandra Reis. Que isto tudo não dê uma deslocação maciça de votos para o PSD é algo que deveria pôr o PSD a pensar bem o que anda cá a fazer. Mas o povo, na sua infinita sabedoria, deve estar certo: de facto, é capaz de não haver por ali grande alternativa.”

 

SEMANADA - As insolvências em Portugal aumentaram 18% em 2023, face ao ano anterior, com 1.917 empresas a entrarem em processo de insolvência e o sector das indústrias foi o mais afetado, sendo responsável por mais de metade do aumento total registado no último ano; em 2023 foram inaugurados 60 novos hotéis em Portugal e haverá quase mais 100 a caminho até 2026; o número de passageiros nos aeroportos portugueses atingiu máximos históricos em 2023 e até setembro, movimentaram-se 52 milhões de pessoas em Porto, Lisboa e Faro, sendo este o melhor valor de sempre desde 2012; a riqueza média líquida das famílias portuguesas é a sexta mais baixa da Zona Euro, segundo os dados do Banco Central Europeu, está 30% abaixo da média da zona Euro e estamos apenas à frente da apenas à frente da Estónia, Eslováquia, Grécia, Lituânia e Letónia; as previsões oficiais apontam para que em 2024 se reformem 4705 professores, o número mais alto de aposentações desde 2012; segundo a Federação Nacional dos Médicos a “esmagadora maioria” das quatro centenas de médicos de Saúde Pública já recuaram a adesão à dedicação plena, o que vai agravar o funcionamento dos centros de saúde; entre janeiro e dezembro de 2023 houve um aumento de 154 841 utentes sem médico de família, fazendo crescer para 1,7 milhões o total de pessoas que não têm médico de família atribuído; nas duas ultimas semanas do ano ocorreram 1048 mortes acima do esperado e o diagnóstico elevado de infeções respiratórias pode estar na origem do excesso de mortalidade; as previsões oficiais apontam para que em 2024 se reformem 4705 professores, o número mais alto de aposentações desde 2012.

 

O ARCO DA VELHA - Segundo uma auditoria do Tribunal de Contas há um baixo nível de execução e pouca fiabilidade na informação disponibilizada pelo Governo sobre o Plano de Recuperação e Resiliência; no mesmo documento o TC  alerta para o risco da perda de fundos da UE se a situação persistir.

 

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ESCULTURA BRITÂNICA - Enquanto as galerias privadas não mostram a sua nova programação de início de ano proponho uma visita ao Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC), no Chiado, à exposição “Rare Earth”, do escultor britânico Tony Cragg, que inclui cerca de cinco dezenas das suas obras, entre esculturas e desenho, criadas entre 1979 e 2023 Tony Cragg (Liverpool, 1949) é considerado  um dos mais inovadores escultores dos últimos 50 anos. Radicado na Alemanha desde 1977, tem o seu atelier em Wuppertal, de onde estabeleceu a base da sua carreira internacional que se desdobra entre o desenho e a escultura, tendo diversa obra pública em todo o mundo. A exposição “Rare Earth”, de Tony Cragg, traz, pela primeira vez, a Lisboa, um conjunto significativo de cerca de 5 dezenas de obras do artista, entre escultura e desenho, de 1979 a 2023, numa mostra reveladora da sua obra. Esta exposição, com curadoria de Emília Ferreira, resulta de uma parceria do MNAC com a Galeria Breckner e com o estúdio do artista, tendo sido concebida para o espaço do  museu e incluíu também a apresentação de obras no espaço público, em ligação com a Câmara Municipal de Lisboa.  A exposição  pode ser vista no MNAC, ao Chiado,  até 25 de Fevereiro.

 

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MÚSICA DAS RUAS - Moondog foi uma figura incontornável de Nova Iorque, em cujas ruas viveu durante 20 dos 30 anos passados na cidade, entre finais dos anos 40 até 1972. O seu verdadeiro nome era Louis  Hardin, nasceu no Kansas em 1916 e morreu na Alemanha em 1999 . Invisual desde o final da adolescência, usava roupas que ele próprio fazia, baseadas na tradição do deus nórdico Odin - daí ter ficado conhecido como o Viking da 6ª avenida, onde tocava as suas canções e recitava poesia. Foi a música que lhe deu mais visibilidade, além das peças de artesanato que criou e de instrumentos musicais que ele próprio concebeu e fez. Auto-didacta, Moondog compôs dezenas de canções de vários géneros musicais e até madrigais e sinfonias. Inspirava-se na música clássica, no jazz, na música nativa da América e nas músicas da América Latina e Índia. Acabou por se tornar uma lenda entre os músicos folk americanos e Janis Joplin chegou a interpretar uma das suas canções, “All is Loneliness”. Em 1969 a Columbia Records editou o seu primeiro disco, “Moondog”, disponível no Spotify. Nos anos 70 mudou-se para a Alemanha, onde viveu até à sua morte. O Kronos Quartet, que em 2023 completou 50 anos de existência, resolveu homenageá-lo com “Songs and Symphoniques, The Music of Moondog”, um álbum feito em colaboração com a Ghost Train Orchestra, de Brooklyn, que assegurou os arranjos dos 17 temas do disco. As vozes das canções são de Rufus Wainwright, Jarvis Cocker, Petra Haden e Joan Wasser, conhecida como Joan As Police Woman,  que interpretou o tema que havia sido gravado por Janis Joplin. O trabalho de todos tentou aproximar-se da composição original de Moondog, quer nos temas instrumentais quer nos cantados, e o resultado é um disco que mostra todo o talento desse homem que se passeava nas ruas de Manhattan com um capacete Viking e que era apenas tomado como um excêntrico. Disponível em streaming.



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BUENOS AIRES  - O meu primeiro livro do ano é uma viagem aos subúrbios de Buenos Aires, pela mão de Jorge Luis Borges. É nesses subúrbios que Borges evoca Evaristo Carriego, figura que frequentou a casa de seus pais, quando ele era ainda criança e não o grande escritor em que se tornou. Alguns anos depois da morte prematura de Carriego, aos 29 anos, Borges dedicou-lhe este livro, na realidade um estudo sobre a obra e o mundo, que se diz, ligado ao tango e à literatura dos bairros pobres da Argentina. Este livro mostra como Borges era um exímio escritor de contos e pequenas novelas, misturando a realidade com a ficção - como acontece neste caso.  Evaristo Carriego fez-se poeta no bairro de Palermo, nos arrabaldes de Buenos Aires, terreno de brigas e boémia de facas na liga, de milongas e tangos dançados por homens. Publicou, durante a sua curta vida, um único livro de poemas, “ Misas Herejes” (1908). Em 1932 Borges publicou esta história de Carriego, agora editada pela primeira vez em Portugal. Figura maior da literatura mundial, Jorge Luis Borges (Buenos Aires, 1899- Genebra ,1986) cresceu ele próprio no Bairro de Palermo, viajou na Europa entre 1914 e 1921, ano em que regressou a Buenos Aires, e em 1923 publicou o seu primeiro livro. O reconhecimento internacional só aconteceu em 1961, ao longo da sua vida escreveu ficção, crítica e ensaio. Foi professor de literatura e dirigiu a Biblioteca Nacional de Buenos Aires entre 1955 e 1973. “Evaristo Carriego” foi editado pela Quetzal, com tradução de José Colaço Barreiros.



SOPA ITALIANA - Nestes dias frios deixo aqui uma receita que em Itália é um clássico desta época do ano - uma sopa de tortellinis em caldo de legumes. A preparação é simples, comece por um refogado leve em azeite com meia cebola roxa cortada em rodelas finas,  uma cenoura cortada em pedaços pequenos e um tomate maduro cortado em cubos com o seu sumo e duas colheres de sopa de pasta de tomate. Depois adicione meio litro de um caldo de legumes que preparou antes e espere que levante fervura. Quando estiver a ferver coloque um pacote de tortellini para duas pessoas, com o sabor que preferir (eu uso os da marca Rana e neste caso os de ricotta e espinafres ou o de cogumelos), e deixe-os cozer durante três minutos. Tempere a gosto com um pouco de vinagre balsâmico, sal e pimenta, adicione uma mão cheia de folhas de espinafre fresco,  sirva para uma tigela funda e junte queijo parmesão ralado na altura. Bom apetite, vai ver como é um prato reconfortante nestes dias frios.

 

DIXIT - “Parte da nossa esquerda abandonou a luta social em nome das modas fracturantes, deixando os milhões de portugueses pobres excluídos e explorados fora de moda “ - José Pacheco Pereira

 

BACK TO BASICS - “Justiça adiada é justiça negada” - William Gladstone



 



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2024. UM ANO CHEIO DE IMPREVISTOS

por falcao, em 05.01.24

 

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CALEIDOSCÓPIO - Imagino-me a olhar por um óculo mágico para o fim de 2024. E que vejo eu? Uma grande confusão e instabilidade e, nos piores momentos, mais uma eleição a ser convocada depois do resultado das legislativas de Março ter descambado num impasse. Improvável? - Não tanto. Arriscamo-nos a ter um longo período sem Governo estabilizado, sem novo orçamento. Em muitos países, como na Bélgica ou em Itália, situações destas acontecem sem que daí venha mal ao mundo. Aqui, se suceder, vamos ver como as coisas correm. Talvez então alguém se lembre que, 50 anos depois do 25 de Abril, pode ser boa ideia adequar a Lei Eleitoral aos tempos actuais,  evitar  um desperdício de votos tão grande como tem acontecido - criando finalmente um círculo único de compensação que corrija as distorções do método de Hondt. Mas confesso que tenho dúvidas que os políticos de serviço, seja em qual dos grandes partidos estejam, se mostrem interessados em mudar alguma coisa de relevante. São retrógrados no pensamento político, presos de ideias feitas, gostam mais de olhar para o passado, do que encontrar caminhos para o futuro. Adoram romancear o que aconteceu e fogem de criar condições para mudanças e novas soluções. Da maneira que as coisas estão, arriscamo-nos a ter uma maioria de eleitores no centro direita e direita, mas um governo de esquerda, se fôr desse lado do espectro político que estiver o partido mais votado. Resultado: uma grande confusão! Tento ser optimista mas, por mais que me esforce, continuo a pensar que há qualquer coisa que não está a funcionar nesta democracia.



SEMANADA - A economia portuguesa está prestes a sair das 50 mais competitivas do mundo, sendo ultrapassada por países como o Cazaquistão, Peru ou Iraque; Portugal é dos que mais perde numa Europa que passará de mais de um terço do PIB mundial em 2008 para menos de um quinto em 2038; é esperado um aumento de 10% no preço dos bens iniciais no início deste novo ano; a área de produção de abacate em Portugal duplicou no espaço de uma década; segundo o INE em Portugal existem 450 mil filhos e netos de imigrantes, 18,5% da população tem background migratório e a grande maioria está há mais de dez anos em Portugal; em 2023 o SNS realizou 60.000 cirurgias por mês, o número mais alto desde 2013, mas as listas de espera continuam a aumentar; a psiquiatria é a especialidade com uma taxa mais alta de incumprimento de tempo de espera para utentes em todo o SNS; há 5400 casos de cancro do pulmão diagnosticados por ano em Portugal; no dia 26 de Dezembro mais de 26 mil pessoas recorreram às urgências, o número mais elevado do ano; durante a última semana de 2023 as filas de espera em alguns serviços de urgência do SNS ultrapassaram as 16 horas; no final do ano 59,1% dos espectadores seguiram canais de cabo e plataformas de streaming, em detrimento dos canais generalistas; durante a época das festas a GNR deteve 140 condutortes, 81 deles com excesso de álcool; em 2023 nasceram mais 2386 bebés que no ano anterior.

 

O ARCO DA VELHA - A dívida total das entidades do SNS aos fornecedores externos ultrapassava, em final de Outubro, os 2420 milhões de euros, dos quais quase 1576 milhões de euros eram dívida vencida e 771 milhões eram pagamentos em atraso há mais de 90 dias.

 

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A ARTE ANTIGA - Neste início de ano recomendo uma visita ao Museu Nacional de Arte Antiga, para ver “Identidades Partilhadas - Pintura Espanhola em Portugal”, que mostra obras de artistas espanhóis existentes no país em diversas colecções, algumas provenientes de ofertas diplomáticas, outras de patrocínio eclesiástico e ainda outras, mais recentes, de aquisições efetuadas por museus e entidades públicas e privadas. A exposição decorre até 30 de Março, tem curadoria de Joaquim Oliveira Caetano, director do Museu Nacional de Arte Antiga, e Benito Navarrete, professor de história de arte na Universidade Complutense. Esta exposição calha na mesma altura em que a obra convidada do MNAA é “O Bom Pastor” (na imagem) uma pintura de Bartolomé Esteban Murillo. Nascido em Sevilha, em 1617, Murillo foi um dos mais importantes nomes do Barroco espanhol e “O Bom Pastor” do Museu do Prado, obra da fase madura do pintor, é uma das expressões mais exemplares do encontro entre o sagrado e o humano que marcam o seu trabalho. Ainda no MNAA e até 3 de Março pode também ver “Vieira Lusitano - O mito e a alegoria” que agrupa desenhos e gravuras de Francisco Vieira de Matos, mais conhecido por Vieira Lusitano, o mais importante pintor português que atravessou o século XVIII. 

 

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DE NOVO O PIANO - O catálogo da ECM tem dado uma atenção especial a gravações de piano e surge agora o primeiro trabalho a solo do pianista israelita Nitai Hershkovits, “Call on the Old Wise”, que inclui 18 temas, a maior parte dos quais improvisados, com a excepção de dois temas, um de Molly Drake, “Dream Your Dreams” e  “Single Petal of a Rose” de Duke Ellington. O álbum foi gravado em Lugano em 2022, com produção do fundador da ECM, Manfred Eicher. Anteriormente Hershkovits  já tinha gravado para a editora dois discos com o quarteto de Oded Tzur, “Here Be Dragons” e “Isabela” e também com Avishai Cohen para a Blue Note. Em nenhum dos 18 temas  deste disco Nitai Hershkovits ultrapassa os quatro minutos de duração, sempre a explorar ideias e direcções diferentes sem se repetir. Nitai Hershkovits é um pianista de jazz com formação clássica, tendo sido aluno de Suzan Cohen. Esta dedicação ao jazz e à clássica é bem patente nos temas “intermezzo 4”, mais próximo da música clássica contemporânea, e a faixa título, “The Ol Wise”, onde é evidente o seu fascínio pela improvisação. Disponível em Portugal na FNAC e nas plataformas de streaming.

 

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UM LIVRO DE FOTOGRAFIA - Saul Leiter, que morreu em novembro do ano passado, a poucos dias de completar cem anos, foi um dos mais importantes fotógrafos norte-americanos e é considerado um dos pioneiros da fotografia a cores, suporte que começou a utilizar nos anos 40 do século passado. Foi a fotografia de moda, nomeadamente para a “Harper’s Bazaar”, que lhe deu fama e fortuna mas o trabalho solitário que fez percorrendo as ruas de Nova Iorque, nos anos 50 e 60 é um marco na sua carreira. Durante mais de 60 anos todos os dias pintava ou fotografava, criando uma imensa obra, muita da qual ficou inédita durante a maior parte da sua vida. Muitas vezes era nas vizinhanças do seu apartamento em Manhattan, nos quarteirões mais próximos, que descobria a beleza nos sítios mais vulgares. Na rua usava sobretudo kodachrome, em casa, em retratos íntimos, preferia o preto e branco, ao mesmo tempo que pintava aguarelas. No ano passado a Saul Leiter Foundation, em colaboração com a editora Thames & Hudson, publicou “Saul Leiter: The Centennial Retrospective”, um magnífico álbum, de mais de três centenas de páginas, que recolhe 340 fotografias e aguarelas,  organizado por Margit Erb e Michael Parillo e inclui diversos textos sobre as várias fases da sua obra.“Esta é a história de um artista genuinamente brilhante, profundamente iconoclasta, destemidamente imaginativo, fundamentalmente afectuoso e decididamente divertido que cedo foi despertado pela arte e a encarou como a força que animou a sua vida quase centenária” - escreve Michael Parillo na introdução. O álbum mostra o seu trabalho de moda, de rua, as suas aguarelas, mas também as fotos mais íntimas. Um livro de fotografia é das melhores prendas que me podem dar e tive a boa sorte de ter recebido agora esta oferta. Disponível na Amazon.

 

COZINHA AVENTUREIRA - Gosto de começar o ano a experimentar um restaurante que não conheço, uma espécie de aposta no desconhecido. Nuno Mendes, um Chef português que tem trabalhado sobretudo em Londres, é o responsável pelo restaurante do Bairro Alto Hotel, o BAHR, no quinto andar do edifício. A vista é fantástica e, para além do terraço, existe uma sala interior com a cozinha, aberta, acessível a todos os olhares. A lista, diferente ao almoço e jantar, tem propostas tentadoras, algumas surpreendentes. Neste caso foi um jantar e nos petiscos iniciais a escolha recaíu em tostas com percebes fumados, excelente. O couvert, simples, inclui pão de trigo e aveia, crackers de alga e manteiga Rainha do Pico, talvez a melhor manteiga portuguesa. A escolha dos pratos principais apostou, no outro lado da mesa, num Brás de polvo assado à lagareiro com molho romesco, acompanhado, como extra, por um puré de batata doce e laranja. O molho romesco pode ser pedido à parte, é intenso, sabor pronunciado a pimentos e um final picante. O polvo estava excelente, muito bem temperado, os tentáculos macios, o braz com lâminas de polvo a reforçar o sabor. Deste lado da mesa houve dúvidas na escolha mas arriscou-se o lavagante azul com arroz frito e molho marrare. Confesso que a ideia de ter molho marrare no lavagante me levantou reservas, mas desvaneceram-se à primeira garfada. O lombo de lavagante era farto, o molho era perfeito (nada dessas imitações que por aí surgem) e o arroz frito revelou-se um bom complemento. A experiência valeu a pena. A refeição foi acompanhada por um espumante português da região de Távora-Varosa, com base nas castas Cerceal, Malvasia Fina e Gouveio, o Família Hehn, Velha Reserva bruto, que cumpriu muito bem a função. Sobremesas ficaram para outra ocasião, com uma a reter no futuro: a tarte tatin de marmelo e creme de groselha. O BAHR e Nuno Mendes apresentam uma cozinha inesperada com combinações pouco vulgares e um  resultado acima da expectativa. Serviço impecável, com dois pequenos reparos - a recepção na sala não esteve a par do resto e a música era dispensável: não era uma questão de a playlist ser desadequada, que era, o problema era mesmo estar num local assim, com uma cozinha tão perfeita manchada por sons escusados que apenas distraem do essencial. BAHR, Praça Luís de Camões 2, 213408253.

 

DIXIT - “Houve jeito para distribuir, faltou o talento para produzir. Houve vontade de educar, não existiu competência para ensinar. Multiplicaram-se direitos, reduziram-se os deveres. A festa acabou. Mal e tristemente. Se ao menos, em vez de festa, tivéssemos trabalho, estudo, organização, gestão, igualdade e democracia…” - António Barreto 

 

BACK TO BASICS -   “Não é de admirar que as pessoas se afastem da política quando ano após ano ouvem os políticos fazer promessas que nem sequer tencionam cumprir - discursos que são fantasias para ganhar eleições mas que não fazem os países progredir” - Bill Clinton






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