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LIBERAIS & AUDIOVISUAIS – Ciclicamente vem à baila o tema da privatização da RTP, sempre em nome de boas práticas liberais. Estamos num destes ciclos e mais vale encarar o assunto de frente. Geralmente existe alguma confusão entre a privatização da RTP e a concessão a privados do serviço público de televisão. Parece-me que o assunto está, nesta fase muito mal estudado. Se é a empresa RTP que se pretende privatizar vai ter que se fazer uma análise do que pode ser interessante vender, em termos de mercado, com o objectivo de conseguir um bom preço: As frequências de que tem concessão? As licenças de cabo? Os estúdios? Os meios técnicos? Os recursos humanos? O arquivo? A operação de televisão? Um dos canais? A operação de rádio?
Eu sinceramente acho que ninguém está, neste momento, em condições de responder a estas questões. E acho que a resposta é muito difícil enquanto não houver uma decisão clara sobre o que deve ser o serviço público audiovisual. Em Setembro de 2002 foi divulgado um relatório com propostas concretas sobre o que devia ser o serviço Público de Televisão, elaborado por um Grupo de Trabalho que na altura integrei. No essencial as conclusões programáticas desse relatório mantêm-se actuais mas nãoi estão aplicadas. O primeiro passo para fazer o que quer que seja é definir aquilo que deve ser assegurado pelo serviço público, estabelecer uma missão, prioridades e objectivos. No essencial isto não está feito.
Há também que ter em conta a circunstância política de saber se o Estado quer exercer um papel regulador, quer no mercado da produção audiovisual, quer no mercado dos media em geral. Nos últimos dias tenho lido diversas opiniões favoráveis a que o Estado deixe de ter esse papel regulador, em nome do livre funcionamento do mercado. Aconselho os defensores do livre funcionamento do mercado, nesta matéria, a estudarem bem o caso dos Estados Unidos ou dos países nórdicos, muitas vezes apontados como referência – talvez tenham surpresas quanto às balizas estreitas que nesses países o Estado impõe à actividade de emissão de televisão e ao condicionamentos que existem nos media. Falar de cor com base em ideias feitas é um exercício fatal, que geralmente resulta numa teimosia que é má conselheira.
Quer em relação ao papel de regulador na área conteúdos (dizendo quais são as áreas prioritárias de desenvolvimento e investimento), quer de regulador dos media (garantindo uma saudável concorrência não só entre televisões mas entre todos os media em geral), gostaria de deixar aqui uma pequena nota sobre o mercado – e neste caso sobre o mercado português. O nosso mercado é pequeno, está em recessão e não em crescimento. Um filme português de sucesso faz 300.000 espectadores e, além de alguns festivais, não tem exibição internacional. O mesmo se poderia dizer quanto aos programas de televisão. A rentabilidade da produção audiovisual portuguesa está confinada ao nosso pequeno rectângulo, não por fatalismo mas por um conjunto de questões – que vão da fonética da língua, pouco dada à exportação mesmo para o Brasil, até à falta de maturidade da maior parte dos produtos. Por isso mesmo é que vale a pena estudar muito bem o assunto, evitar pressas, promessas e ideias feitas, e ver qual a melhor forma de desenhar um serviço público que possa ser motor de desenvolvimento da produção audiovisual – partindo do princípio de que esta é a única formas contemporânea de mantermos viva a língua e a cultura portuguesa no mundo.
Usando a imagem esta semana anunciada por Steve Jobs, da Apple, os idiomas e as culturas que não estiverem na cloud não existirão num futuro próximo. E sem uma produção audiovisual não estaremos lá de certeza.
LER – Nada como um bom policial para nos reconciliar com a leitura. Há uns tempos descobri as aventuras escritas pelo italiano Andrea Camilleri e aos poucos ele está a tornar-se num dos meus autores preferidos. A escrita é concisa, não se perde em descrições maçadoras e o novelo da história é bem urdido – além disso polvilha cada romance com apetitosas descrições de refeições italianas, melhor dizendo sicilianas - que o herói das histórias é o comissário Montalbano, estabelecido em Vigata, uma vila imaginária mas que, pela descrição, fica na zona de Agrigento. «O Cheiro da Noite» é um original de 2001, editado em Portugal em 2002, pela Difel, que tem divulgado Camilleri em Portugal. Em poucas palavras é a história de um vigarista que imagina um esquema do género D.Branca/ Bernard Madoff e que engana as gentes de Vigata. O romance é a história da investigação em torno do desaparecimento do vigarista e de um seu auxiliar – e como acontece nos policiais de Camilleri, a meio dá-se um volte-face inesperado. Mas isso eu já não conto que não quero estragar a surpresa.
VER – A sugestão de hoje é para voyeurs compulsivos. Sugiro uma visita à exposição «The Last Sitting», que mostra 60 fotografias da célebre sessão realizada pelo fotógrafo norte-americano Bert Stern num hotel em Nova York, em Junho de 1962, para a revista «Vogue», apenas seis semanas antes da morte da actriz. A sessão de fotografias durou três dias e – reza a lenda - ter-se-ão bebido muitas garrafas de champage. Stern fez mais de 2500 imagens, muitas delas com Marylin nua – em 1992 foi publicado um livro com a maioria destas imagens e algumas pranchas de contacto anotadas pela própria Marylin. Esta exposição vai estar no Centro Cultural de Cascais até 17 de Julho, de terça a Domingo, entre as 10 e as 18h00.
OUVIR – Se este disco se chamasse «Cavaquinho» podia ser do Júlio Pereira. Como se chama «Ukulele Songs» vem assinado pelo ex-Pearl Jam Eddie Vedder. É um disco tão simples que chega a ser desarmante e tão sóbrio que quase não se dá por ele. O ukulele é descendente do cavaquinho português, levado por emigrantes para o Hawai, e que aí se tornou imensamente popular. No fundo é um pequeno instrumento de cordas (apenas quatro cordas), muito fácil de tocar e com uma gama de acordes limitada. Parece que Vedder o descobriu numa viagem ao Hawai e, desde então, o instrumento acompanha-o para todo o lado. Todas as canções são de Eddie Vedder, a maior parte compostas no próprio ukelele e as participações – vocais ou instrumentais – são absolutamente minimalistas. «Sleeping By Myself», «More That You Know», «Satellite» , «Tonight You Belong To Me» e «Dream A Little Dream» são as minhas preferidas - mas devo dizer que este é daqueles discos a que se vai voltando audição após audição, cada vez com mais prazer. A simplicidade musical do álbum contrasta com o cuidado posto na capa e no pequeno livro, com cuidadas fotografias e um grafismo onde a simplicidade é aparente. Já agora – na semana passada este «Ukelele Songs» foi o CD mais vendido em Portugal – o que não deixa de ser curioso. Cá por mim acho bem.
PROVAR – Cada vez que regresso ao Papa Açorda arrependo-me de não ir lá mais vezes. Já que agora, na cidade, me desloco numa scooter fica bem mais fácil visitá-lo sem perder muito tempo na deslocação, sobretudo à hora de almoço que é quando gosto mais do local. A escolha recaíu nuns filetes com arroz de berbigão e numa açorda de bacalhau, ambos em muito boa forma. Passaram-se as entradas mas havia uns belos figos com presunto de Parma e a carta oferecia ainda outras possibilidades como a deliciosa salada verde com caranguejo de casca mole. Na lista lá continuam os clássicos do Papa Açorda – pastéis de massa tenra com feijão verde, morcela assada com grelos, costeletas de borrego panadas, fritura mista de peixe com aioli e, claro, a açorda real de gambas e lagosta. Nas sobremesas nunca resisto às queijadinha de requeijão (se não estivesse a tentar ser comedido teria ido para o pudim de ameixas pretas ou a mousse de chocolate). Rua da Atalaia 57, aberto de terça a sábado, telefone 213464811
BACK TO BASICS – Nunca devemos deixar que a persistência e a paixão se tornem em teimosia e ignorância – Anthony J. D’Angelo
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