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À minha volta vejo que vários amigos meus este ano optaram por não fazer as férias que nos últimos anos faziam. Vários tiveram diminuições consideráveis de rendimento – ou pelo desemprego ou simplesmente porque a crise lhes tocou à porta. Alguns optam por praias perto de Lisboa e outros redescobriram as suas origens no interior - e em vez de partirem para fora, resolvem ir mostrar Portugal aos seus filhos. Alguns voltam mesmo às aldeias que eram dos seus pais ou avós.
Este é o lado positivo da crise – as pessoas agarram-se ao que têm e não se deixam deslumbrar com fantasias. Andámos anos demais a imitar as telenovelas – e as telenovelas não são a vida real. Portugal criou um padrão de consumo que nos era estranho. Começámos a importar frutas tropicais e esquecemos a pêra rocha, os abrunhos, as laranjas do Algarve. O Miguel Esteves Cardoso fala muito destes prazeres portugueses a que virámos costas. Na edição de ontem do Público um produtor das belas laranjas do Algarve, José Mendonça, fazia uma boa descrição do que se passa: «O problema deste país não é produzir, que nós sabemos fazê-lo, o problema é comercializar, é vender. Os grandes grupos - Sonae, Jerónimo Martins, Auchan - abafaram tudo o que havia de retalho, as mercearias de bairro. Morreu tudo. São eles que ditam as regras. E nós temos que produzir como eles querem e ao preço a que querem».
Crescemos de forma desequilibrada – permitimos demasiados centros comercias dentro das cidades, ajudámos a destruir o comércio tradicional e deixámos de querer os produtos nacionais, preferindo laranjas envernizadas e sensaboronas às da nossa própria produção. Também isto tem que mudar – e o regresso às raízes, que aos poucos se nota, pode ajudar-nos a pensar como é importante mudarmos alguns dos nossos hábitos de vida. Algumas pessoas, como este produtor de laranjas, mostram que é possível voltar a trabalhar a terra. E que é nas coisas simples que se pode reinventar o futuro.
(publicado no diário Metro de 27 de Julho)
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