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ILUSIONISMO - Uma simples recolha de números - e cito um artigo de João Duque - explica de forma clara a situação em que estamos: em 2015, quando tínhamos acabado de sair das imposições da troika, o total da despesa prevista no Orçamento do Estado para esse ano era de €63.167 milhões e representava 35,1% do PIB. Agora, para 2024 o peso económico do Orçamento do Estado será de €124.334 milhões, representando 45,5% do PIB. Ou seja, enquanto o peso do Estado duplicou, crescendo à taxa anual de 8,8%, o PIB (a preços correntes) apenas cresceu à taxa anual de 5,4%. Há portanto aqui qualquer coisa que não bate certo. Os oito anos de Governo de António Costa caracterizam-se por cada vez mais impostos, taxas, multas e outras cobranças que no final resultam na maior carga fiscal de sempre para garantir uma presença cada vez maior do Estado. E qual o resultado disso? A resposta é conhecida de todos: os serviços que recebemos desse Estado são cada vez piores: degradação na área da Saúde, problemas cada vez maiores na Educação, crise na justiça, deterioração da classe média, aumento da emigração dos portugueses mais preparados, piores transportes públicos e uma crise terrível na habitação. O Estado tira-nos cada vez mais rendimento mas não melhora o seu funcionamento. O Orçamento é um exercício de prestidigitação: diminui alguns impostos directos, aumenta os indirectos, proporciona alguns aumentos salariais mas logo a seguir faz crescer o custo de vida. O que dá de um lado, tira-se do outro basta olhar para a diminuição de portagens rodoviárias e o aumento do IUC. O mais espantoso é que a oposição, apesar de ter conseguido uma vitória política com a redução do IRS que ela própria propôs, depois analisa o orçamento com uma graçola de mau gosto, classificando-o de “pipi, bem apresentadinho e muito betinho “. É espantosa a falta de jeito de Montenegro.
SEMANADA - O Orçamento de Estado prevê uma receita adicional de IVA de dois mil milhões em relação ao ano anterior; o aumento dos impostos indirectos compensa cerca de dois terços do alívio nos impostos directos; a subida do IUC pode valer o dobro dos cortes nas portagens do interior; 63% dos veículos automóveis que estão a circular têm Mais de dez anos e 26% tê, mais que 20 anos; dois terços das novas matrículas automóveis de 2022 foram de veículos usados importados que em média têm sete anos de idade; há mais de dois mil professores que depois de darem aulas durante anos a contrato, terão que fazer agora uma espécie de estágio para entrarem nos quadros; desde abril de 2022 que não há ligação ferroviária entre Coimbra e Vilar Formoso, a Linha da Beira Alta continua fechada e não é apontada data para o fim dos trabalhos; no Instituto Português de Oncologia médicos, enfermeiros e farmacêuticos queixam-se da falta de meios; um quinto dos farmacêuticos dos hospitais do SNS pediram escusa de responsabilidade devido à crescente falta de recursos e de condições dos serviços; o investimento público na ciência está estagnado desde 2011 e actualmente situa-se ao nível de 1991; em percentagem de PIB os fundos do Estado alocados à Ciência atingiram o valor mais baixo dos últimos 30 anos; a falta de material básico nas unidades de saúde familiar nunca foi tão grande, segundo responsáveis do sector; cerca de 9% dos juízes admitem recorrer a substâncias ilícitas para lidar com o stress; segundo a Pordata1,7 milhões de portugueses vivem com menos de 551 euros por mês; mais de 200 famílias, a maioria com crianças menores, estão a receber apoio da Refood no Algarve para conseguirem sobreviver.
O ARCO DA VELHA - Os dois anos iniciais da execução do PRR deverão terminar com uma diferença negativa superior a 2,7 mil milhões de euros face às metas de investimento público.
A FORÇA DA COR - Na sua primeira exposição individual na Galeria das Salgadeiras, Martinho Costa apresenta um conjunto de sete pinturas onde as cores intensas servem para reforçar a sua interpretação pessoal de cenas e paisagens aparentemente banais.Essas sete pinturas estão montadas de forma a permitir que os visitantes tenham quase a sensação de que se trata de uma mesma obra composta por sete momentos diferentes que constroem uma narrativa. Martinho Costa trabalha frequentemente com recurso a imagens prévias que servem de modelos à sua pintura, com algumas referências a obras clássicas, como acontece na imagem aqui reproduzida, “Piquenique Vertical”, um óleo sobre tela de 200x130 cm. O preço das obras desta exposição, que se mantém até 18 de Novembro, varia entre 6000€ das quatro grandes telas e os 2000€ das três de 60x90cm. A Galeria das Salgadeiras fica na Rua da Atalaia 12. Outros destaques: na Cristina Guerra Contemporary Art (Rua de Santo António à Estrela 13), João Onofre apresenta até 18 de Novembro os seus mais recentes trabalhos que trabalham as relações e as possibilidades de cruzamento do som com a imagem. Na Fundação Carmona e Costa (Rua Soeiro Pereira Gomes 1-6ºandar) está patente até Janeiro a segunda parte da exposição “Álbum de Família”, uma continuação da mostra patente no MAAT - Central Tejo e que apresenta pela primeira vez obras da colecção formada ao longo dos anos por Maria da Graça Carmona e Costa.
JAZZ - Joshua Redman é um brilhante saxofonista tenor, com uma forma de tocar muito própria e uma enorme versatilidade. É, além disso, um criativo compositor que também se aventura por reinterpretações de canções bem conhecidas de outros autores. “Where Are We” é o seu primeiro trabalho para a Blue Note e é um disco empenhado. O primeiro tema “After Minneapolis (Face toward mo(u)ring” é uma evocação da morte de George Floyd às mão de um polícia da cidade. O tema começa com umas notas de “This Land Is Our Land”, de Woody Guthrie e o sonoro lamento do seu saxofone é acompanhado pela voz de Gabrielle Cavassa, uma jovem cantora que o acompanha neste disco em nove dos 13 temas, cantando por vezes letras escritas pelo próprio Redman. Ouçam a versão “bluesy” de “The Streets Of Philadelphia”, de Bruce Springsteen ou os arranjos que Redman fez para temas como “Going To Chicago”, a partir de um original de Duke Ellington e também “By The Time I Get To Phoenix” , “I Left My Heart In San Francisco” ou “Alabama”, de John Coltrane, com a voz de Gabrielle Cavassa a deixar a sua marca. Neste disco Redman faz-se acompanhar de músicos de eleição como os guitarristas Kurt Rosenwinkel e Peter Bernstein,, o vibrafonista Joel Ross, o trompetista Nicholas Payton, a que se juntam aos músicos que normalmente acompanham Redman: Aaron Parks no piano, Brian Blade na bateria e Joe Sanders no baixo. A revista “Downbeat” diz que este “Where Are We” é o melhor trabalho de sempre de Joshua Redman. Disponível nas plataformas de streaming.
A NOVA DITADURA - “A Religião Woke” é um ensaio sobre a cultura woke, esse movimento baseado na cultura do cancelamento, na censura, no condicionamento do pensamento, na reescrita da História e na tentativa de imposição de um pensamento único em nome daquilo que os seus defensores consideram politicamente correcto. O autor, Jean-François Braunstein procura esclarecer a origem, motivação e finalidade desse movimento. No livro, Braunstein afirma que o movimento não é, ao contrário do que se pensa, do foro da racionalidade política, mas do foro religioso. Esta é, acrescenta, uma «religião sem perdão» que tem como destruir a liberdade em nome da «justiça social». Segundo Jean-François Braunstein, um historiador do pensamento, o movimento woke configura «a primeira religião nascida nas universidades», propagada por académicos, intitulados «guerreiros da justiça social». E porquê uma religião? Tendo tomado de empréstimo um termo da cultura popular negra dos Estados Unidos da América, este movimento baseia-se numa premissa: «a razão deve, em dado momento, abrir espaço à fé para compreender as verdades mais profundas». O movimento woke está a «desconstruir» todo o património cultural e científico, impondo uma censura social, comumente intitulada «cancelamento», e policiando a linguagem e as opiniões dissonantes com o objectivo de instaurar uma ditadura em nome do «bem» e da «justiça social», querendo impor um pensamento único. Entre os dogmas que o wokismo tem propagandeado em nome da luta contra a discriminação está a «teoria de género», que “professa que o sexo e o corpo não existem e que a consciência é que importa”. Edição Guerra & Paz, com tradução de Ana Pinto Mendes, colecção “Os Livros Não Se Rendem”.
REPROVADO - Eu já devia saber que não é boa ideia frequentar restaurantes com conceito O Cícero Bistrot, apresenta-se assim: “A ementa do Cícero Bistrot aborda a relação do célebre pintor Cícero Dias com as cidades onde viveu, Paris-Lisboa-Recife, e traz um diálogo entre a culinária de autor e os ingredientes luso-brasileiros”. Este é um restaurante de contrastes: o empratamento tem um visual aliciante e o serviço é bom. Onde a coisa falha é na confecção, algo banal, por vezes formalmente cuidada mas gustativamente subalternizada. A entrada escolhida, anunciado como um carpaccio de polvo, com amêndoas torradas em canela, sobre rúcula e vinagrete de romã, é um bom exemplo de contraste entre um bonito empratamento e uma desilusão gustativa, um carpaccio com pouca graça, uma rúcula que já tinha sido mais viçosa. O lírio, um peixe gordo com uma textura compacta e macia, foi talvez maltratado, vinha cozido demais e com uma consistência diferente da esperada. Era acompanhado de ameijoas pretas, também elas vítimas de excesso de cozedura, o que resultou numa textura borrachosa. Salvou-se o arroz de coentros, verdadeiramente a melhor coisa da refeição. Do outro lado da mesa a moqueca de palmito com cogumelos frescos e crocante de papadams também se caracterizou pela banalidade, salvando-se uma vez mais, o arroz de acompanhamento. Em resumo, a casa sabe cozinhar arroz mas do resto não deu prova. Na sobremesa o carpaccio de abacaxi com especiarias foi uma desilusão: demasiado adocicado, enjoativo mesmo, sem sabores contrastantes como a designação deixava antever. No fim a conta foi alta, o que já se esperava, e seria aceitável, se a qualidade tivesse estado no mesmo patamar. Em resumo, evite-se o Cícero Bistrot.
DIXIT - “Este orçamento, o que dá com uma mão, tira com a outra” - Joaquim Miranda Sarmento
BACK TO BASICS - “Os homens mais admirados publicamente são os que mentem sem parar e os que menos simpatia geram são aqueles que tentam dizer a verdade” - H.L Mencken
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