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AS TEIAS DE ARANHA DAS ELEIÇÕES

por falcao, em 24.11.23

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OS VOTOS PERDIDOS - Temos eleições marcadas para 10 de Março e nada da Lei Eleitoral foi alterado desde há décadas. 50 anos depois do 25 de Abril os partidos do chamado arco da governação protegem-se mutuamente para manter um sistema que protege os grandes, dificulta os partidos mais pequenos e, mais grave ainda, divide os eleitores entre duas categorias - os que têm um voto que elege e os que votam mas não elegem ninguém - aqueles votos desperdiçados graças ao método de Hondt . Nas eleições legislativas mais recentes aproximadamente 13 % dos votos expressos não serviram para eleger ninguém: caíram no limbo. Várias entidades , entre as quais a SEDES, já apresentaram sugestões para remediar esta situação. Uma dessas propostas, da Iniciativa Liberal, pega nos vários estudos realizados e, mantendo o numero actual de deputados, 330,  propõe a criação de 150 círculos uninominais e um círculo de compensação nacional de 80 deputados, que garanta a tradução em eleitos do número total de votos conseguidos por cada partido. O processo é simples, o racional é claro, a injustiça da situação actual é evidente. Tenho a firme convicção que esta é uma das razões da elevada abstenção e do descrédito em que caíu o sistema político, já que muitos cidadãos temem que o seu voto não sirva para nada. Este é também o albergue onde é alimentada a nefasta teoria do voto útil que, como temos visto em eleições sucessivas, acaba por ser bastante inútil porque o resultado obtido não cumpre o prometido na campanha nem altera o estado das coisas. A frustração dos eleitores é terreno adubado para crescerem os extremistas e populistas. A actual crise política é um bom pretexto para pensarmos nisto. Cada vez mais vamos caminhar para resultados que obrigarão a acordos pós-eleitorais para garantir a possibilidade de governos funcionais, mas o nosso sistema eleitoral é uma teia de aranha que paralisa as mudanças necessárias. Seria bom que, no programa dos partidos para as eleições de Março, cada um dissesse o que pretendem fazer sobre isto para garantir que cada voto conta. E já agora gostava de ouvir o que os candidatos à liderança do PS têm a dizer sobre isto.



SEMANADA - Esta semana há 36 hospitais com serviços de urgência limitados, quase metade das 80 urgências que existem no SNS; segundo a Ordem dos Médicos nas duas últimas décadas os Governos travaram as vagas para seis mil novos médicos de várias especialidades;  a Polícia Judiciária registou 2479 vítimas de crimes sexuais nos primeiros nove meses deste ano; em cinco décadas, o país perdeu quase metade dos seus habitantes mais jovens e actualmente, Portugal é o segundo país da União Europeia com menor proporção de crianças e jovens na sua população; no ranking dos beneficiários do PRR, os maiores e os principais são entidades públicas e a primeira entidade privada beneficiária surge em 15.º lugar;  ao fim de mais de um ano, a taxa de execução do PRR é de apenas 18%, cerca de 20% dos investimentos estão em estado preocupante e 3,5% em estado crítico; desistências, incumprimentos e correcções já levaram à anulação de 160 milhões de euros do PRR em operações que já estavam aprovadas; segundo o Banco de Portugal, o investimento direto estrangeiro no imobiliário português voltou a bater um novo máximo nos meses de julho a setembro, com mais de 1,1 mil milhões de euros e até setembro o valor das transferências de investidores internacionais para o sector supera já os três mil milhões de euros; as vendas de bens e serviços online representaram 19% da faturação das empresas em 2022, atingindo os 68.000 milhões de euros, mais 36,3% que no ano anterior. 

 

O ARCO DA VELHA - Na noite do auge da crise política o Presidente da República arrastou as televisões ao local onde os Távoras foram executados, acusados de conspirarem para matar o Rei.

 

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DESENHOS DE SARMENTO - A exposição “A Pedra e o Desenho”, que mostra 60 desenhos feitos por Julião Sarmento para o livro homónimo de Gonçalo M. Tavares, abriu segunda-feira passada e pode ser vista apenas até quarta 29 na Universidade Católica de Lisboa, na Galeria Fundação Amélia de Mello (na foto). Vale a pena contar a história destes desenhos. Em 2016 Julião Sarmento foi convidado para comissariar uma exposição em Barcelona a partir das colecções da Fundação La Caixa, do Museu de Arte Contemporânea de Barcelona e da Fundação Gulbenkian. Para título, Julião Sarmento escolheu “O Peso de um gesto”, o nome de uma das suas próprias obras. Para escrever um texto para o catálogo dessa exposição, convidou Gonçalo M. Tavares. Passados uns anos, Julião Sarmento e Gonçalo M.Tavares voltaram às palavras criadas para essa exposição. Sarmento escolheu excertos do texto original, com ligeiras adaptações, e fez 60 desenhos, baptizando cada um deles com o nome dos artistas representados nessa exposição de Barcelona. Criou assim uma relação entre essa exposição, os textos então feitos e os desenhos posteriormente criados. São esses desenhos, feitos pouco tempo antes da morte de Julião Sarmento, que deram origem ao livro “A Pedra e o Desenho”, editado pela Relógio d ' Água. Agora é possível ver, pela primeira vez, esses desenhos na exposição patente na Universidade Católica, com curadoria de Bruno Marchand.  No texto que acompanha esta exposição, Bruno Marchand sublinha “ que o poder lacónico de uma frase solta era, para Sarmento, semelhante ao mistério das grandes obras de arte”. Outro destaque a não perder, desta vez a norte: em Serralves André Romão um dos artistas portugueses mais relevantes da geração nascida nos anos 80, apresenta a sua primeira exposição individual no Museu de Serralves. Com o título “Calor”, a exposição , com curadoria de Inês Grosso, “abre caminho para novas perspectivas e níveis de consciência na nossa relação com o Outro, aquele que é diferente, que habita o mundo de maneira distinta”. 

 

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UM PIANO DIFERENTE  - Se gostam de piano e têm espírito aventureiro experimentem ouvir o novo álbum da pianista e compositora norte-americana Celia Hollander. Pianos há muitos, mas o modo de tocar de Hollander é mais raro, muito mais raro. Ela mistura o instrumento que todos conhecemos com a manipulação digital dos sons, o trabalho de alteração de samples que utiliza, combinando depois tudo como se de um único instrumento se tratasse. Neste seu novo disco, “2nd Draft”, utiliza gravações que fez de si própria durante uma residência artística no centro de arte no Nevada. Improvisou, percorreu técnicas  e estilos e depois trabalhou as gravações originais em pós produção. Fragmentos das gravações das suas improvisações são acelerados ou retardados, reproduzidos de trás para a frente e sujeitos a uma série de manipulações digitais . Este novo trabalho tem 18 curtas faixas num total de 35 minutos, todas elas rápidas sequências de notas que por vezes se transfiguram de forma completamente inesperada. Há influências claras, de Brian Eno, de Philip Glass, mas também evocações de estilos mais clássicos, que convivem com demolições de harmonias que trazem o punk à memória. Não conhecia Hollander e descobri-a através de uma nota do jornal “The Guardian” sobre este disco. Não é música ambiente - é música que nos tira da zona de conforto, como acontece quase sempre quando nos deparamos com a diferença. Hollander avançou pelo piano de uma maneira até agora não experimentada. Há sempre algo de novo a descobrir. “2nd Draft” está disponível nas plataformas de streaming.

 

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SURREALISTA - Por ocasião do centenário de Mário Cesariny a Assírio & Alvim publicou “Poesia de Mário Cesariny: antologia” uma revisitação de toda a obra do grande poeta surrealista, com edição de Fernando Cabral Martins, que permite conhecer uma obra poética fundamental em língua portuguesa. Mário Cesariny será o poeta homenageado no encontro de poesia Carmina 4, que decorrerá de 23 a 26 de novembro em Vila Nova de Famalicão, por  iniciativa da Fundação Cupertino de Miranda, em parceria com a Câmara Municipal local e que reúne um grupo de especialistas em literatura numas jornadas em torno da palavra poética: conversas, debates, apresentações. Ao mesmo tempo a Assírio & Alvim publica“Poetas do Amor, da Revolta e da Náusea”, uma antologia inédita, organizada por Cesariny logo após o 25 de Abril de 1974, e que desenha uma imagem da literatura portuguesa de uma perspectiva surrealista, desde o século XII até ao século XX. Este projecto começou por ser um espectáculo de teatro, mais tarde reformulado como uma série de filmes para televisão, ideia nunca concretizada. Esta antologia recolhe textos de Camões, Mariana Alcoforado,  Bocage, Natália Correia, Florbela Espanca, Almeida Garrett, Guerra Junqueiro, Almada Negreiros ou Fernando Pessoa entre outros. A edição é de Fernando Cabral Martins e de Luís Manuel Gaspar.

 

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DIVINAL -  E, se em vez de vos falar de um restaurante ou de petiscos, optasse por um livro que faz o levantamento de todas as referências a comida que surgem na Bíblia? Trata-se de “A Mesa de Deus”, um enciclopédico trabalho que demorou dez anos a fazer, nascido de uma conversa entre a autora, Maria Lecticia Monteiro Cavalcanti, e José Tolentino de Mendonça, que escreveu um texto, delicioso, de apresentação do livro. A autora, investigadora de gastronomia,  jornalista e colunista que escreve sobre essa área,  anotou todas as referências sobre os alimentos, a cozinha, a refeição, o prazer e a dádiva da comida, estudando hábitos alimentares no  Antigo e Novo Testamento. Ou seja, o que se comia, como se comia, como se preparavam os alimentos e que regras e interditos foram aceites ao longo do tempo. É uma viagem pelo universo dos rituais, da etiqueta alimentar no tempo de Jesus e da época da travessia do deserto, mencionando alimentos e temperos, o vinho ou o azeite, tudo o que está ligado à alegria da mesa. Na introdução o cardeal Tolentino de Mendonça sublinha: “ O livro constitui uma espécie de micro-história da Bíblia; dá nos uma ideia dos produtos acessíveis, do impacto do clima, do tipo de economia; abre-nos a janela para a sociologia das suas gentes; faz-nos participantes de rituais religiosos, do conteúdo do espaço familiar, da hierarquia e da versatilidade das relações.” Edição Quetzal

 

DIXIT - “Um parlamento dissolvido, a prazo, aprova um Orçamento do Estado, a correr, antes de partir para a campanha eleitoral (...) É possível que nunca se tenha ido tão longe, nas últimas décadas, no desrespeito pelo Estado de direito” - António Barreto.

 

BACK TO BASICS -“Tantos livros e tão pouco tempo” - Frank Zappa



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