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O TELETRABALHO - Ao princípio achei piada ao teletrabalho. Desde que se disponha de uma infraestrutura tecnológica boa na empresa, de uma ligação de internet razoável e de um mínimo de condições logísticas sabe bem não gastar tempo em deslocações, ficar a observar o trabalho da equipa a uma distância virtual, ter menos interrupções, gerir a agenda de outra forma, poder ter mais tempo para pensar. Mas, depois, sobretudo ao fim de um mês, começo a sentir falta das conversas com mais pessoas, do confronto de ideias mais directo, de poder falar sem ser pelo microfone, de ouvir os outros sem o som roufenho do Zoom ou do Teams, de poder ver caras sem estarem desfocadas ou sem fundos falsos com praias e outras coisas do género. Por sorte, a empresa onde trabalho, a Nova Expressão, tinha migrado todos os sistemas, há cerca de um ano, para a cloud por causa de uma mudança temporária de instalações. Quando a pandemia começou estava tudo operacional e já havia hábito de utilização da cloud e de trabalho remoto. O problema não está na tecnologia, está na falta que as pessoas fazem e na falta do confronto directo de ideias, do debate não electrónico. Com a situação de encerramento das escolas das crianças mais novas ouço muitos pais queixarem-se que não conseguem fazer o acompanhamento das aulas virtuais dos filhos ao mesmo tempo que trabalham. Alguns estão esgotados, outros à beira de um ataque de nervos. Quando sairmos disto, além de todas as outras questões, vamos ter que enfrentar problemas na área dos recursos humanos, saber como recuperar toda a gente que ficou lesionada no meio deste jogo da clausura.
SEMANADA - Um estudo da Universidade Católica indica uma quebra de rendimento de 43% nas famílias que ganham até mil euros; diversos autarcas autarcas têm sido confrontados com o aumento do número de pedidos de comida por parte de famílias carenciadas que, no último mês, viram os rendimentos baixar; o lay-off em Portugal já atinge cerca de mil trabalhadores; um terço das mortes registadas até agora em Portugal durante a pandemia foram de idosos residentes em unidades de 3ª idade; com uma boa parte das aulas a fazer-se de forma não presencial, e porque grande parte dos docentes não são digitais nativos, a Universidade Aberta e a Direção Geral de Educação vão formar mais de 2.300 professores em ensino à distância; segundo a Marktest 69,8% dos consumidores diminuíram a frequência das compras em super/hipermercados (69,8%), e destes cerca de 38% afirmam que passaram a ir a outro tipo de lojas (maioritariamente ao comércio local: minimercados, mercearias, talhos, peixarias, padarias, etc) e a encomenda online ou por telefone foi a alternativa referida por um número muito pequeno de indivíduos; em março de 2020 RTP1, SIC e TVI emitiram cerca de 264 horas de informação regular, mais 21.5% do que no mês anterior e mais 7.4% do que o verificado no mesmo mês de 2019. num total de de 797 notícias e 35 horas de emissão sobre a pandemia, com a RTP1 a liderar com 14 horas de emissão e 327 notícias emitidas sobre o tema.
ESTE TEMPO - Entre 1 a 14 de Abril, foram matriculados em Portugal 838 ligeiros de passageiros, enquanto um ano antes, no mesmo período tinham sido 6208, o que significa uma quebra de 86,5%, em termos homólogos.
A FOTOGRAFIA - Quando se fala de fotografia é incontornável que a conversa vá parar à Magnum Photos, a agência fundada em 1947 por um grupo de fotógrafos liderados por Robert Capa e que mudou a forma de encarar o fotojornalismo, a fotografia documental e a fotografia em geral. Ao lado de Capa estavam nomes como David Seymour, Henri Cartier Bresson, Ernest Hass, René Burri e Inge Morath, entre muitos outros. Os membros da Magnum publicaram nas maiores revistas da época, fizeram trabalhos exclusivos para a Life ou a Look, acompanharam a guerra do Vietnam e muitos outros conflitos. Henri Cartier Bresson descrevia a agência da seguinte forma: “A Magnum é uma comunidade de pensamento, uma qualidade humana compartilhada, uma curiosidade sobre o que está a acontecer no mundo, um respeito pelo que está acontecer e um desejo de o interpretar visualmente''. Ao longo dos anos por lá passaram alguns dos mais marcantes fotógrafos e actualmente podemos encontrar talentos tão diversos como Antoine d’Agata, Elliiott Erwitt, Josef Koudelka, mas também Martin Parr ou Cristina de Middel entre tantos outros. Podem ir seguindo a actualidade fotográfica e a produção da Magnum, assim como os cursos e exposições que organiza no site da empresa - https://www.magnumphotos.com , em www.instagram.com/magnumphotos ou ainda em www.facebook.com/MagnumPhotos . A imagem aqui reproduzida do Instagram é de Patrick Zachmann, feita a 16 de Março, em Paris, já com a pandemia declarada.
FOLK CONTEMPORÂNEO - Laura Marling é uma das vozes mais importantes da folk contemporânea e o seu álbum de estreia data de 2008. “Song For Our Daughter”, o novo álbum lançado há dias, é, nas palavras da cantora, um trabalho quase conceptual, escrito para uma criança imaginária sobre “aquilo que é ser uma mulher na sociedade actual”. O disco é ao mesmo tempo intimista, triste e pessimista, mas cheio de melodias e arranjos magníficos. “Blow By Blow”, uma das canções chave do álbum, fala daquilo que por vezes acontece nas relações: “Note by note, bruise by bruise/Sometimes the hardest thing to learn is what you get from what you lose”. Musicalmente este é claramente um disco folk tradicional, instrumentos acústicos e voz em primeiro plano, sempre a emoção colocada em destaque, como quando os arranjos incluem um piano discreto ou um côro pontual. O ambiente anda próximo daquilo que se encontrava nos anos 70 em discos folk americanos (Marling, embora inglesa, vive há uns anos perto de Los Angeles). A produção do disco privilegia os arranjos de cordas e vozes. Destaco a canção que dá título ao álbum, “Song For Our Daughter”, mas também “For You”, “Held Down”, “Strange Girl” ou ainda “The End Of The Affair”. Disponível no Spotify.
A CHINA EXPLICADA A OCIDENTAIS - Calhou ter lido “Sob Céus Vermelhos” agora, nesta última semana, no meio de tantas notícias e especulações vindas do Oriente. É um livro sobre o passado mais recente da China, numa altura em que, pelas razões que se sabem, tanto se fala daquele país e se desenvolvem polémicas à sua volta. “Sob Céus Vermelhos” foi originalmente editado em 2019 e agora lançado em Portugal pela Quetzal. A sua autora, Karoline Kan, aliás Chaoqun Kan, nasceu numa aldeia chinesa em 1989, o ano dos protestos em Tiananmen. Cresceu e viveu nessa aldeia, e depois numa cidade do interior, até ir para a Universidade, em Pequim. Depois de concluído o curso, Kan trabalhou para o New York Times e Radio France Inter em Pequim, foi jornalista na revista “That’s Beijing”, actualmente é editora do jornal digital “China Dialogue” e em 2019 foi distinguida com o Young China Watcher of the Year. “Sob Céus Vermelhos” é essencialmente a história da vida da autora, o relato de como era o dia-a-dia na aldeia, como se estabeleciam hierarquias dentro de uma família ao longo de três gerações, o que era esperado das mulheres e o que era atribuição dos homens. No tempo da política do “filho único”, Chaoqun Kan foi a filha proibida, a que não devia ter nascido. A sua mãe desafiou as ordens do Partido Comunista Chinês ao querer tê-la e viu a sua vida profissional - era professora - prejudicada por isso. O livro relata o que eram as tradições e a cultura tradicional na China de então, quando Deng Xiaoping começou a abrir a economia. ao longo dos anos 90. Conta o choque que foi passar da aldeia para uma pequena cidade, na região de Hunan, que então se começava a desenvolver. Relata a mudança de uma sociedade rural para uma sociedade industrial, no meio de uma corrupção que vivia à sombra dos dirigentes políticos e perante a passividade que os ensinamentos de Confúcio estimulavam. À autora sempre fez confusão porque é que nos livros de História por onde estudou não havia referências ao ano de 1989, o ano dos grandes protestos estudantis - apenas percebeu o que se tinha passado quando finalmente chegou a Pequim. Este livro é a história da descoberta de um país e o relato das suas contradições por uma pessoa que nasceu no despontar da nova China. Indispensável para se perceber tudo o que ali se passou nestes últimos anos.
CULINÁRIAS - O prazer de um molho de grelos fresquíssimo, em flor, é uma das coisas que só os mercados tradicionais nos oferecem. A sua textura e o seu gosto não têm comparação com os que são sujeitos a longos períodos de frio e chegam enrugados às prateleiras dos supermercados. Um molho de grelos frescos deve lavado em várias águas e arranjado, tirando as folhas que estejam amareladas. Depois, precisam de ser muito bem cozidos, longamente, até ficarem tenros. Só se metem na água quando já estiver a ferver e obviamente destapados para ficarem bem verdes, que é uma belíssima cor - e é quando entram na água que se salgam a gosto. Depois de escorridos com cuidado são um belíssimo acompanhamento. No topo das minhas combinações preferidas está um lombo de bacalhau. Filetes de pescada também são uma ideia e em geral qualquer peixe de qualidade é boa companhia para os grelos. Uma experiência interessante pode ser desfazer uma posta de pescada já cozida e misturá-la com os grelos. Tudo bem envolvido e regado com bom azeite e está pronta uma refeição. Depois há outras possibilidades e à cabeça lembro-me de um arroz de grelos, com arroz carolino, claro. E, finalmente, um pedaço de grelos cozidos e depois levemente salteados acompanha bem uma boa carne grelhada. Sou dos que acreditam que cozinhar descontrai e que nesta época confinada é algo que estimula a imaginação.
DIXIT - “Raramente saímos das crises da mesma forma como entrámos. Acontecem coisas em nós, e na nossa relação com as outras pessoas, que fazem com que tudo mude” - Miguel Xavier, psiquiatra.
BACK TO BASICS - “Não devemos temer e sim procurar compreender. Agora é o tempo de compreender, para que tenhamos menos receios” - Marie Curie.
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