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A COMUNICAÇÃO - Num curioso regresso ao passado o novo Governo retirou a comunicação social da tutela do Ministério da Cultura e passou-a para o centro político do executivo, na dependência do Ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, um dos pesos pesados do núcleo duro de Luís Montenegro. Esta área passa a tutelar directamente a RTP, a Agência Lusa, e o enquadramento regulamentar e legal de um sector que é maioritariamente privado. Os argumentos para a mudança, ainda não enunciados publicamente, podem surgir como bondosos - por exemplo criar mecanismos que ajudem os mídia a ultrapassar a crise existente; mas podem também querer dizer uma maior interferência política - e não só económica - no sector, nomeadamente nas duas empresas acima referidas, de que o Estado é accionista. Creio que a actuação do Estado nesta área devia dar prioridade à nossa presença num mundo digital fortemente audiovisual, garantindo a existência de conteúdos que proporcionem a salvaguarda do peso da língua e cultura portuguesas nesse mundo, em clara ligação com o Instituto do Cinema e Audiovisual, ICA e com os privados do sector. E sinceramente, creio que se for dada importância a esses conteúdos, faz mais sentido a localização desta área na Cultura que nos Assuntos Parlamentares. As eventuais medidas de apoio aos privados têm mais a ver com uma política de incentivos fiscais do que com negociatas entre partidos na Assembleia da República e, na minha opinião, não devem passar por criar uma política de atribuição de subsídios que coloque os privados na dependência do Estado - e tão pouco na utilização geral e gratuita do serviço da Lusa que assim seria rebaixada a um canal de transmissão, sujeita ainda mais a todas as pressões. Mas faria sentido que um dos apoios ao sector tivesse a ver com incentivos à leitura e à compreensão digital, por exemplo, o que nos faz voltar à Cultura. Não me canso de dizer que o accionista Estado deve definir o que quer do serviço público audiovisual - nomeadamente se pretende que ele seja concorrente dos canais privados e que continue a investir mais em transmissões desportivas e concursos variados do que na criação de conteúdos estruturantes, em programas que fiquem para o futuro e não se esgotem no momento em que são emitidos.
SEMANADA - A concessão de crédito para habitação a famílias de menores rendimentos passou de 32% em 2018 para 3% em 2023; segundo o Eurostat o preço das casas na UE caíu pela primeira vez desde 2013 mas em Portugal continua a subir e regista o terceiro maior aumento da zona euro; as pensões médias encolheram 15% nos últimos 15 anos; 26,% dos pensionistas portugueses optaram por reforma antecipada; o mercado automóvel cresceu 13% no primeiro trimestre do ano em Portugal, para um total de 68.520 novos veículos e os carros com motor eléctrico representaram 16% dos automóveis ligeiros; em Fevereiro foram registados mais 7,2 mil desempregados no país; Em termos de PIB per capita expresso em paridades de poder de compra Portugal está no 18º lugar dos 27 países da UE, já foi ultrapassado pela Eslovénia, República Checa, Estónia e Lituânia e atrás de si tem países como a Polónia, a Hungria e a Roménia; mais de 65% dos jovens portugueses abaixo dos 30 anos recebem menos de mil euros líquidos mensais; o SNS só presta tratamento adequado de reabilitação a 30% dos doentes que sofreram um AVC.
O ARCO DA VELHA - Um relatório do Tribunal de Contas acusou o anterior Governo de não ter seguido as suas recomendações em relação ao controlo de falhas nas matrículas dos alunos e na detecção de situações de risco de abandono escolar precoce.
UM VELÁZQUEZ - Na Galeria Principal do Museu Gulbenkian pode ver até 9 de Setembro uma das mais importantes obras do pintor espanhol Diego Velázquez, integrada no programa Obra Visitante, desta vez proveniente da Frick Collection. A pintura do Rei Filipe IV de Espanha era uma das obras favoritas do grande colecionador americano Henry Frick e foi realizada na primavera de 1644, altura em que Velázquez acompanhou o monarca na sua incursão militar na Catalunha. Velázquez terá realizado esta pintura num curto espaço de tempo, em condições pouco habituais, num ateliê improvisado, em Fraga, quartel-general das tropas espanholas. Filipe IV é representado no papel de chefe militar vitorioso após a reconquista da cidade de Lérida. Uma vez terminada, a pintura foi enviada para Madrid, a fim de representar simbolicamente o rei numa missa na Igreja de San Martín, que celebrou o acontecimento. Calouste Gulbenkian era um grande admirador da obra Velázquez - em 1919, adquiriu uma sua obra, Retrato de D. Mariana de Áustria, quadro que viria a ser doado ao Museu Nacional de Arte Antiga. O ciclo Obra Visitante do Museu Calouste Gulbenkian, foi inaugurado há dois anos, com outra obra-prima da pintura europeia, o Autorretrato com Boina e Duas Correntes, de Rembrandt, então cedido pelo Museo Nacional Thyssen-Bornemisza, de Madrid.
ROTEIRO - Uma boa surpresa é a exposição “Escavar Uma Nuvem” (na foto), que apresenta trabalhos de Rui Horta Pereira, desenhos e esculturas feitas a partir de materiais recolhidos no Parque Natural da Arrábida, mostrando vestígios d a acção da Natureza ao longo de anos, que pode ser vista até 24 de Maio na Galeria das Salgadeiras (Avenida dos Estados Unidos da América 53D). No MAAT pode ver “Shining Indifference” com pinturas de Luísa Jacinto e “Mar Aberto”, com fotografias, vídeos e peças escultóricas de Nicholas Floc’h. De 12 a 27 de Abril Alfredo Cunha apresenta “Viva a Liberdade”, uma exposição de fotografias datadas de 1975 que mostram as paredes ocupadas por cartazes e pinturas de palavras de ordem (Rua Franciso Palha, 56 em Marvila). Se for a Paris poderá ver até 9 de Setembro, no Centre Pompidou, a exposição “Amadeo de Souza-Cardoso/Sonia et Robert Delaunay- Correspondances”, com curadoria de Sophie Goetzmann, Helena de Freitas e Angela Lampe. Em Algés, no Palácio Anjos, pode ver uma exposição sobre a obra de João Abel Manta, nomeadamente com com pintura, cartoon, ilustração e design gráfico, além de outras áreas que o artista praticou. Em Castelo Branco abriu uma nova Galeria, Castra Leuca Arte Contemporânea, que até 21 de Abril apresenta a exposição “4 Elementos” com obras da ceramista Yola Vale (Rua de Santa Marta 129). E na Galeria Santa Maria Maior, o repórter fotográfico João Marques Valentim apresenta, numa dupla exposição, imagens que recolheu em 1974, sob o título “ E Depois do Adeus” e “O Insubmisso” (Rua da Madalena 147).
O ANTES E O DEPOIS - Estes dois livros, que hoje vos trago, entram na categoria de auxiliares de memória. O “Era Proibido”, de António Costa Santos, recorda o Portugal de antes do 25 de Abril numa nova edição revista e aumentada . Como o seu autor escreve, “os leitores nascidos em democracia poderão duvidar da realidade dos factos que aqui são narrados (...) quem viveu sempre em liberdade terá dificuldade em imaginar um país onde os filmes eram cortados aos bocadinhos para defender os bons costumes e se ía parar à cadeia por ouvir a BBC ou ler um determinado livro. Foi um tempo caricato, mas sem graça. Um tempo que convém reconhecer e recordar, porque, como dizia o filósofo espanhol George Santayana, os que esquecem o passado estão condenados a repeti-lo”, o que não se deseja. O outro livro, “No Princípio Era O Verbo” recolhe alguns dos lemas, pinturas de parede e palavras de ordem, das mais diversas proveniências políticas, que invadiram as ruas depois do 25 de Abril de 1974, com texto de Manuel S. Fonseca e ilustrações de Nuno Saraiva. Manuel S. Fonseca começa por um preâmbulo onde visita e descreve, hora a hora, os incidentes e o suspense da noite de 24 de Abril, da madrugada de dia 25 e e da manhã e da tarde desse dia onde os militares de Abril derrotaram o estado a que isto chegara. A seguir, na segunda parte, saltam as ilustrações de Nuno Saraiva, a mostrar frases, palavras de ordem, diálogos que hoje podem parecer inacreditáveis, mostrando como da direita à esquerda, reacionários e revolucionários, sociais -democratas e socialistas, comunistas, maoístas e anarquistas cruzaram com palavras a paisagem de Portugal. Os dois livros são editados pela Guerra & Paz.
UM QUARTETO DE EXCELÊNCIA - O saxofonista e flautista Charles Lloyd é um dos nomes de referência do jazz norte-americano. Tinha nove anos quando recebeu o seu primeiro saxofone e já adolescente tocou com músicos de blues como Howlin’ Wolf e B.B. King. Aos 18 anos foi estudar música na Universidade da Califórnia e depois das aulas tocava em clubes de jazz com nomes como Ornette Coleman, Don Cherry, Charlie Haden ou Eric Dolphy. No início dos anos 60 tocou ao lado de grandes nomes do jazz, mas também de bandas como os Beach Boys. Em 1966, aos 28 anos, formou o seu quarteto com músicos como o baterista Jack DeJohnette, o pianista Keith Jarrett e o baixista Cecil McBee, grupo que fez uma actuação histórica no festival de Monterey desse anos, registada no álbum “Forest Flower”. Hoje com 86 anos Charles Lloyd continua a tocar e acabou de lançar um novo disco, “The” Sky Will Be There Tomorrow”, que recupera temas antigos que interpretou ao longo da sua carreira e também alguns inéditos e foi buscar para o seu lado músicos como o pianista Jason Moran, o baixista Larry Grenadier e o baterista Brian Blade. Ao longo de 15 temas e hora a meia o novo álbum mostra como Lloyd é um saxofonista notável, capaz quer de improvisações, quer de seguir as melodias sugeridas pelo piano de Moran, como acontece em “Monk’s Dance”, um tema de homenagem a Thelonious Monk, ou na faixa de abertura, “Defiant, Tender Warrior”. Sugiro que ouçam com atenção o seu saxofone em “The Lonely One” e a flauta em “Late Bloom”. “The Ghost Of Lady Day” é uma homenagem a Billie Holiday que nasce com o baixo de Grenadier, pontuado pela delicadeza de apontamentos rítmicos de Brian Blade, até o piano de Moran e o sax de Lloyd começarem a dialogar. Este tema é um bom exemplo da qualidade e entendimento dos membros deste quarteto que se juntou para esta merecida homenagem a Charles Lloyd. Disponível nas plataformas de streaming.
DIXIT - “A qualidade do debate político aproxima-se a grande velocidade do mais perfeito cafarnaum” - António Barreto
BACK TO BASICS - “Afirma com energia o disparate que quiseres, e acabarás por encontrar quem acredite em ti” - Vergílio Ferreira
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
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