Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
SOBRE A IMPUNIDADE - Luís Montenegro é um advogado com carreira conhecida, um jurista habituado a ser chamado a dar conselhos a empresas. No entanto, parece que não falou consigo próprio quando tomou a decisão de, mesmo depois de se tornar Primeiro Ministro, manter na sua residência a sede de uma empresa, da qual continuou sócio por via do casamento, empresa que recebia avenças de diversos clientes privados, alguns com relações com o Estado. Durante semanas jurou que isso não constituía problema. A decisão, que anunciou no sábado passado, de ceder a empresa aos filhos, um ainda na Universidade e outro recém-licenciado, mostra que alguma coisa estava mal na situação que Montenegro criou. A maior declaração de culpa vem da decisão de passar agora a propriedade da empresa. A solução que encontrou foi uma boa habilidade, daquelas que os advogados costumam aconselhar aos seus clientes. Só não se percebe como é que o Dr Montenegro não explicou ao Sr. Luís que isso devia ser feito. Será que pensou que estava acima da Lei? Creio que António Barreto acertou no alvo quando há dias escreveu: “Não se compreende a razão pela qual um político, um alto funcionário não sente sequer o receio do abismo, o medo de ser apanhado (...) A resposta talvez seja o sentimento de impunidade”. Por mais que o Primeiro Ministro e seus Ministros digam que está tudo resolvido, a verdade é que não está explicada a situação, só está juridicamente resolvida. As suas desculpas não são explicações e os zigue-zagues de Luís Montenegro sobre esta questão não são o melhor para criar um clima de confiança num Governo que tem muitos pontos fracos, desde logo na Saúde. Montenegro não gosta de ser contrariado, acha que tem sempre razão e, como agora se viu, tem dificuldade em reconhecer quando erra. Além da crise que vai no mundo, temos também agora uma crise a desenhar-se em Portugal. Não precisávamos disto.
SEMANADA - As mortes por overdose aumentaram 16% em Portugal em 2023, face ao ano anterior, com o registo de 80 óbitos, 33 dos quais na Área Metropolitana de Lisboa; registou-se um aumento das overdoses por metadona, mas a cocaína continua a ser a droga que mais overdoses provoca; em Janeiro o Estado arrecadou 4,2 mil milhões de euros em impostos, o que significa que a receita fiscal aumentou 13,3% face ao mesmo mês do ano passado; os ganhos com o IVA subiram 38,6% (401,7 milhões) e a cobrança do imposto sobre combustíveis evoluiu 17,7% (49,4 milhões) e estes dois impostos indiretos representaram no conjunto 94% do crescimento da receita fiscal em janeiro; a Autoridade Tributária emite 3170 números de contribuinte por dia, dois terços dos quais são requeridos por cidadãos estrangeiros; dos 22,2 mil milhões de euros a receber ao abrigo do PRR já entraram cerca de 10 mil milhões, mas quatro anos depois do início do plano e a dois anos do seu fim apenas 30% estão executados; o programa de apoio público à habitação, designado por 1º Direito, que tem de estar concluído até Junho do próximo ano, devia garantir habitação a 26 mil famílias em situação de vulnerabilidade, mas só entregou até fevereiro cerca de duas mil casas, ou seja 7% do objectivo; o preço das casas em Portugal disparou 136% entre o primeiro trimestre de 2015 e o terceiro trimestre de 2024 e só no ano passado o preço das rendas subiu 6,98%.
O ARCO DA VELHA - O Tribunal de Contas decidiu abrir um processo disciplinar a um seu juiz jubilado suspeito de ter recorrido a prostitutos menores durante vários anos.
E, SE UMA BOMBA… - Ora aqui está um livro mesmo bom para ler por estes dias. Chama-se “Guerra Nuclear - Um cenário” e a revista Forbes considerou-o como “um thriller geopolítico de fazer gelar o sangue nas veias”, enquanto o New York Times o considerou uma leitura essencial. Annie Jacobsen, a sua autora, é finalista do Prémio Pulitzer e autora de vários livros e de programas e séries de televisão. Estudou em Princeton e foi capitã da equipa feminina de hóquei no gelo dessa universidade. O livro parte de uma constatação: até agora, ninguém fora dos círculos oficiais sabia exatamente o que acontece se um Estado pária lançar um míssil nuclear contra os Estados Unidos. A autora fez dezenas de entrevistas inéditas a peritos civis e militares que construíram as armas e que conheciam os planos de resposta. Com base nisso criou este relato de como seria uma troca de bombas nucleares e revela os protocolos actuais que serão ativados no caso de um conflito, sendo certo que, como o livro indica, decisões que afetam centenas de milhões de vidas têm de ser tomadas em escassos minutos, com base em informações parciais, sabendo-se que, em caso de retaliação, nada conseguirá parar a destruição. Os capítulos do livro têm subtítulos como “os primeiros 24 minutos”, “os 24 minutos seguintes” e “para onde nos encaminhamos depois de um confronto nuclear”. Gráficos, imagens e apontamentos e enquadramento histórico tornam este livro uma leitura fascinante para quem se interessa por estas questões. Edição D. Quixote.
JAZZ COM BLUES - Billy Hart é um dos grandes bateristas de jazz e, aos 83 anos, continua activo e a gravar com o seu quarteto de duas décadas, onde é acompanhado por Mark Turner no saxofone, Ethan Iverson no piano e Ben Street no baixo. É esta formação, Billy Hart Quartet, que está também presente no disco agora editado pela ECM, “Just”, gravado em 2021 em Nova Iorque. O disco inclui dez temas, quatro delas compostas por Ethan Iverson e três de Hart e outras tantas de Mark Turner. Dois dos temas de Hart são novas versões de composições mais antigas, “Layla Joy” e “Naaj”. O disco tem, segundo Hart, um”conceito sonoro multi-direccional”, no qual os músicos que com ele trabalham têm um papel importante. O resultado é um disco que combina a tradição musical do jazz com momentos de evocação dos blues, como na faixa “South Hampton”, num virtuosismo de execução instrumental que combina a elegância com uma noção de ritmo e harmonia exemplares. Disponível nas plataformas de streaming.
FOTOGRAFIAS - O Centro Cultural de Cascais volta a apostar na fotografia na sua nova exposição, focada na obra de Rodney Smith, com mais de uma centena de imagens que abrangem trabalhos feitos entre 1947 e 2016, ano em que morreu. Smith foi um fotógrafo norte-americano, com uma produção diversificada, mas sempre baseada num sólido conhecimento técnico, que combinou ao longo da carreira os seus trabalhos mais pessoais com encomendas de revistas como a Vanity Fair, a New York Magazine ou a Departures e fotografia publicitária para marcas como Neiman Marcus, Bergdorf Goodman e Ralph Lauren. Smith enamorou-se pela fotografia ao visitar a colecção de imagens do MOMA, estudou com Walker Evans e seguiu os ensinamentos de rigor técnico de Ansel Adams, escolhendo meticulosamente as câmaras, o filme e o papel fotográfico que permitiam proporcionar a materialização das suas fotografias como ele as imaginara. Sempre usando luz natural e película, Smith nunca retocava as suas fotografias. Em meados dos anos de 1980, após a publicação do seu primeiro livro, “In the Land of Light”, o seu trabalho chamou a atenção de diretores de arte e editores de revistas. Foi nesse período que Smith produziu alguns de seus trabalhos mais significativos com fotografias feitas em lugares reais, mas com uma encenação que favorecia a fantasia e se aproximava do surrealismo. “Rodney Smith – A Alquimia da Luz” está patente até 25 de maio no Centro Cultural de Cascais (Avenida Rei Humberto II de Itália 16), numa iniciativa da Fundação D. Luís I e da Câmara Municipal de Cascais.
ROTEIRO - O destaque da semana vai para a exposição “O Brasil são muitos: um recorte da coleção do Instituto PIPA”, feita em parceria com as Galerias Municipais de Lisboa e que está no Torreão Nascente da Cordoaria Nacional até 15 de Junho. Trata-se da primeira mostra internacional da instituição e reúne parte da colecção do Instituto Pipa (na imagem uma das obras expostas), um acervo construído ao longo dos últimos 15 anos, com trabalhos de duas dezenas de artistas que, segundo o curador da exposição, Luiz Camillo Osorio, “demonstra um Brasil marcado por polarizações políticas e conflitos culturais”. O instituto PIPA foi criado por Lucrécia e Roberto Vinhaes, uma arquitecta e curadora de arte e um engenheiro ligado ao imobiliário e fundos de investimento, ambos brasileiros, vivendo em Londres. Até 8 de Março na Sociedade Nacional de Belas Artes pode ver a exposição “Surrealismo - Um Salto no Vazio”, com obras de artistas portugueses e estrangeiros ligados ao movimento surrealista, e que integram a colecção da Fundação Cupertino de Miranda. Até 31 de Março no espaço Belo Campo da Galeria Francisco Fino (rua Capitão Leitão 76) pode ainda ver a exposição “Diplomacia”, de Diogo Pinto. Na Galeria Sá da Costa (Rua Serpa Pinto 19) pode ver até 29 de Março “Teogonia 1”, uma exposição que apresenta pinturas a acrílico sobre tela de Manuel Valente Alves e fotografias impressas sobre chapas de zinco de Carlota Mantero.
ALMANAQUE - Durante anos fui um leitor regular da revista britânica The Face, que foi editada entre 1980-2004. Descobri nas suas páginas, antes de serem conhecidos em Portugal, muitos nomes da música, da moda e das artes. Fiquei deslumbrado com a utilização da fotografia, o critério editorial das imagens e a sua paginação, uma obra desse génio do design gráfico chamado Neville Brody. Se o jornal Blitz foi o que foi, em muito se deve ao que vi e aprendi nas páginas da revista “The Face”. As fotografias eram assinadas por nomes como Anton Corbijn, Ellen von Unwerth, David Sims, Fredericke Helwig ou Corinne Day - que pôs a então desconhecida Kate Moss no mapa e na capa da edição de Julho de 1990, tinha ela apenas 16 anos. Agora algumas das melhores fotografias publicadas na The Face podem ser vistas em Londres na exposição “Culture Shift”, dedicada à revista, que está patente na National Portrait Gallery até 18 de Maio.
DIXIT- “O homem pequenino e vestido de preto fez pouco daquelas fatiotas empoderadas, daqueles cabelos esticados, daquelas gravatas intermináveis que escondem tanto a barriga como uma fila de cabras esconde os Alpes. Deu-nos uma lição de dignidade que jamais será esquecida” - Miguel Esteves Cardoso, no Público.
BACK TO BASICS - “Fiz um curso de leitura rápida e li “Guerra e Paz” em 20 minutos. Percebi que a Rússia está envolvida” - Woody Allen
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.