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ISTO ESTÁ TUDO EMARANHADO

por falcao, em 21.07.23

 

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A NUDEZ DO REI - Este rectângulo à beira mar plantado é um emaranhado de casos insólitos, onde a realidade ultrapassa a ficção e a responsabilidade e a coerência são inexistências. Confrontado com indícios de corrupção no Ministério da Defesa, António Costa disse que essa não era a preocupação principal das pessoas. Seguiu-se uma pequena tempestade, obviamente urdida na “bolha político-mediática”, que hoje em dia é a mãe de todos os males: curiosa situação esta em que os factos não são assumidos como a causa dos problemas,  mas as reacções a esses factos são consideradas malfeitorias.  A propósito ocorreu-me isto: a política só é lugar de crime quando quem a pratica comete crimes, mas não vejo ninguém na direcção dos partidos reconhecer esta evidência. O ladino Ministro da Cultura, Adão e Silva, agora investido em amplificador das palavras de Costa, empinou-se a criticar a bolha e rezou a lengalenga  dos casos e casinhos, jurando sempre as boas intenções do Governo. E António Costa, tal vestal a caminhar para o sacrifício de algum cargo internacional, declarou-se incompreendido no que queria ter dito. Sucessivamente incompreendido, digo eu, já que, tantas vezes, o que diz não corresponde ao que se passa - ou que ele imagina que pensou. Mas o insólito não é acolhido só no PS. Do lado do PSD constata-se, por escutas gravadas numa investigação policial, que um deputado, no exercício de anteriores funções de autarca, estabelecia o módico valor de 25 mil euros por cada acto de favorecimento que cometesse. E o facilitador lá tem estado ainda sentado no Parlamento, dois meses depois de tudo isto se saber, com o líder do PSD a confessar-se impotente para resolver a situação.  Cereja no topo do bolo: a corte política de múltiplos sectores do regime uniu-se em torno da justeza de utilização de verbas parlamentares para desígnios partidários e insurgiu-se contra quem acha estranha a coisa, que, sendo prática corrente, não será legal. Como escreveu Susana Peralta, a propósito de Rui Rio, "para uma pessoa que nos prometeu um banho de ética, é curioso que não perceba que uma prática ser comum não a torna aceitável; pelo contrário: só piora a gravidade dos factos.” Não é o rei que vai nu, é o regime.

 

SEMANADA - O Conselho de Finanças Públicas alertou para o facto de a execução do PRR estar muito abaixo do previsto e em 2022 o Orçamento de Estado gastou apenas um quarto das verbas da bazuca que estavam inscritas; o secretário geral da CAP alertou para o facto de o PRR não contemplar investimentos na área da eficiência hídrica, nomeadamente em relação à agricultura; as obras na linha circular do Metro de Lisboa têm um atraso de 30 meses em relação ao previsto, confirmou o presidente da empresa; as exportações portuguesas tiveram um recuo de 6,9% em Maio, em comparação com o mesmo mês do ano anterior; o crescimento de vendas da Porsche em Portugal no 1º semestre foi de 34,1%, número que compara com os 15% de aumento que a marca registou a nível global; em 2022 foram feitas 168.000 transações imobiliárias, um novo recorde; os pedidos de despejo aumentaram mais de 20% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado; há dez anos que a média a matemática do exame do 9º ano não era tão baixa e este ano quase 60% dos alunos não chegaram à nota positiva; mais de 40% dos atropelamentos registados em Portugal ocorrem em passadeiras e Portugal é o país da Europa com mais mortes de peões; os bancos e financeiras emprestaram quase 3,2 mil milhões de euros com a finalidade de consumo nos cinco primeiros meses do ano, o que representa o valor mais elevado desde 2013; 3400 professores aposentaram-se no ano lectivo passado; no primeiro semestre de 2023 em Portugal, verificou-se um aumento de 6% no número de nascimentos, em comparação com o período homólogo.

 

O ARCO DA VELHA - Notícias da justiça: um processo judicial considerado simples arrastou-se durante 11 anos, arruinou uma firma familiar do Cartaxo e provocou três dezenas de despedimentos.

 

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PINTURA E FOTOGRAFIA - Na Galeria Cristina Guerra Contemporary Art pode ser vista até 2 de Setembro uma das mais interessantes exposições patentes em Lisboa. Trata-se de “Neo-Pós-Neo”, de Mariana Gomes, um conjunto de nove obras de pintura, inesperadas, marcantes, com cores vivas, formas soltas, como se cada uma tivesse vida própria. E, no entanto, elas estão no espaço de uma tela, inequivocamente fruto de um trabalho diligente e criativo de pintura, que não é frequente encontrar hoje em dia. Passando da pintura para a fotografia, há várias sugestões. Começo por aquela que mais me marcou - “Volterra, Portraits of Local People”, de Eurico Lino do Vale, uma série realizada em 1997 na Toscânia e que agora é exposta, até 16 de Setembro, pela primeira vez na Galeria Belard, um espaço recente localizado na Rua Rodrigo da Fonseca 103. Como escreveu João Pinharanda, “as fotografias de Eurico Lino do Vale ocupam-se de personagens, e não de cenários” e o resultado é marcante. A seguir sugiro “Interior”, de Ricardo Lopes, um ensaio fotográfico sobre o despovoamento da Região Centro, uma visão da ruralidade portuguesa.  O trabalho recebeu a Bolsa Estação Imagem em 2020, além de ter sido distinguido internacionalmente no LensCulture Portrait Awards. Está na Casa da Imprensa até 28 de Julho (Rua da Horta Seca 20). “Fading”,  de Luís Campos, é uma exposição sobre a memória e o desaparecimento. Trata-se de um conjunto de fotografias de animais selvagens no seu habitat natural, tiradas ao longo de 12 anos em 14 países. São fotografias a preto e branco, com uma elipse preta esbatida à volta de uma imagem central, que alude a um processo cinematográfico de desaparecimento da imagem. Até 16 de setembro na Galeria Carlos Carvalho (R. Joly Braga Santos, Lote F).

 

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 LER PORTUGUÊS - Quem gosta de livros gostará desta síntese das principais obras e autores desde o início da escrita em língua portuguesa até aos anos 70 do século XX. Originalmente escrito em 1971, “Literatura Portuguesa - Das Cantigas de Amigo às Vanguardas do Século XX” é um ensaio escrito por Jorge de Sena em 1971 para a 15ª edição da Enciclopédia Britânica. O texto original é agora publicado em edição autónoma pela Guerra & Paz e o editor considera-a “a mais justa, a mais inteligente, a mais exaltante história já escrita da nossa literatura”. São cerca de cem páginas que deveriam ser matéria de conhecimento geral para todos. São de Jorge de Sena estas palavras: “O século XVI, durante o qual Portugal atingiu o seu máximo em poder imperial, foi uma Idade de Ouro na Literatura Portuguesa, e muitos autores e obras foram na altura importantes no desenvolvimento das literaturas ocidentais. Mas desde cerca de 1200 até 1350 já Portugal tinha criado um dos mais importantes corpus de poesia lírica e satírica da Idade Média numa língua que se tornou quase universalmente aceite na Península Ibérica como o veículo literário das composições líricas de quase três décadas”. Na parte final do ensaio surgem nomes como Natália Correia, David Mourão-Ferreira, Herberto Hélder e Luis de Sttau Monteiro. O livro aborda ainda, num capítulo separado, outra literatura escrita em português - a brasileira, lembrando a importância de nomes como Mário de Andrade, Gilberto Freyre, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Sérgio Buarque de Holanda, Erico Veríssimo, Vinicius de Moraes e Jorge Amado. 

 

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MÚSICA MELOSA - Jaime Fernandes, um dos grandes radialistas portugueses, tinha em tempos um programa dedicado à country music e foi aí que aprendi a gostar deste género musical.  Lembrei-me disto ao ouvir “One Thing At A Time”, o terceiro álbum de Morgan Wallen, um músico country que está a ser um caso de sucesso. “Last Night”, um dos temas deste disco,  ocupou o primeiro lugar do Hot 100 chart do Billboard durante 13 semanas, algo que é uma raridade - desde que  a tabela existe, apenas 15 canções conseguiram essa proeza. O álbum, pelo seu lado,  esteve durante 15 semanas à frente da tabela de vendas de discos da revista Billboard, desde que foi editado em Março passado. Wallen mostra que existe um ressurgimento na música country, depois de um progressivo apagamento ao longo dos últimos anos. O consumo de música country nas plataformas de streaming cresceu 20 por cento desde o início deste ano. O álbum de Wallen tem 36 canções  - o seu disco anterior tinha 30. Os temas das canções são recorrentes: engates, copos, noitadas, paixonetas variadas. O novo disco tem duas horas disto,  canções sentimentalonas, alegres, de festa, choramingas, de abandono, doridas, de ressaca. Disponível nas plataformas de streaming.

 

PETISCO - Gostam de comer moluscos cefalópodes cozidos com ervas aromáticas? Não torçam o nariz - são apenas caracóis, biologicamente ainda aparentados com as lesmas. As suas conchas, que atacamos de palito em punho, são o seu esqueleto externo. Se olharem para a cabeça dos caracóis quando os estão a comer verão os olhos na ponta dos corninhos e saibam que ao lado da boca fica o aparelho genital - atenção que são hermafroditas e para fecundar formam casais e copulam em média 4 vezes por ano num acto que pode durar até dez horas. Não comecem agora com más ideias e limitem-se à iguaria que, nesta altura do ano, é um pratinho de caracóis cozidos e temperados como deve ser. A maioria destes petiscos que comemos ao longo do verão são oriundos de Marrocos. A boa maneira de os cozinhar, depois de muito bem lavados durante uns 20 minutos, é colocá-los numa panela e tapá-los com água. Devem cozer em lume brando por uns dez minutos. Ao fim deste tempo pode adicionar sal, azeite, dentes de alho esmagados, cebola picada, folha de louro, orégãos e, em querendo, piripiri. Suba o lume e quando levantar fervura deixe estar cinco minutos e depois desligue e deixe arrefecer uns 15 minutos para que ganhem bem o gosto do tempero. Em Lisboa, para além do Menino Júlio dos Caracóis, uma casa de referência, sportinguista, é o Lutador, perto de Alcântara, Rua da Junqueira nº1, com uma bela esplanada. Ou então o Pomar de Alvalade, na rua Marquesa de Alorna. Acompanhamento? Uma imperial bem tirada. Às vezes remata-se com um prego no pão. Aqui está a happy hour lisboeta de verão por excelência.


DIXIT - “Há problemas que a democracia não pode e não sabe resolver. Um deles é a corrupção partidária. Outro é a crise da justiça” - António Barreto.

 

BACK TO BASICS - “Numa altura em que a desilusão prolifera, dizer a verdade é um acto revolucionário” - George Orwell






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