Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

O MOVIMENTO ELEITORAL - Ao fim de uma semana já foi (quase) tudo dito sobre as autárquicas de domingo passado. O maior dos vencedores é o bipartidarismo, a hegemonia de PSD e PS, que havia sido seriamente atingida nas legislativas de Maio deste ano: em conjunto os dois partidos dominam 262 das 308 Câmaras do país. O Chega não alcançou o que pretendia, mas os vereadores que elegeu podem ser determinantes para a governabilidade de 39 câmaras. Já o PCP de uma assentada perdeu Évora, Setúbal e a simbólica Grândola. Há também um reforço das candidaturas independentes, em número de candidatos e em resultados obtidos. E há o caso de Lisboa, que merece atenção. Vejamos o que se passou: Carlos Moedas, com mais de 110 mil votos, aumentou a votação dos partidos que o apoiaram, em quase 20% em comparação com o resultado de 2021, e isto apesar de um Chega que passou de dez mil para quase 27 mil votos. Já o PS, coligado com o BE, o Livre e o PAN, viu diminuir em cerca de 12% a votação obtida em conjunto por esses partidos em 2021. Os 15.000 votos então obtidos pelo BE evaporaram-se em boa parte. O PCP teve até um ligeiro aumento. apesar do insistente apelo ao voto útil por parte de Mariana Leitão. A estratégia de alianças da candidata do PS não funcionou e o Bloco afugentou muitos eleitores, o que não deve ser surpresa para ninguém excepto para os próprios. Mas os números mostram também outra coisa: a esquerda, entendida em sentido lato, englobando PS, Livre, BE e PCP teve um total de quase 117 mil votos, mas os partidos à sua direita, PSD, CDS, IL e também o Chega, todos juntos, somaram mais de 137.000 votos. Ou seja, a diferença entre esquerda e direita em Lisboa nunca foi tão acentuada, o que é uma novidade, e isto num cenário em que em Lisboa votaram agora mais 23 mil eleitores do que em 2021. É um sinal de que houve mudanças demográficas acentuadas na cidade, a gentrificação produz efeitos políticos e não se ganham eleições com campanhas que não percebem estas mudanças. A cidade está a mudar, não para melhor como quem lá vive sabe, e a nova demografia tem reflexos eleitorais. Durante quatro anos Carlos Moedas usou como argumento para uma gestão pouco ambiciosa o facto de não dispor de uma maioria. A grande curiosidade será ver como agora, com estes resultados, ele irá actuar nas áreas onde a cidade não tem funcionado. Os maiores problemas, verdade seja dita, vêm do tempo de Costa e Medina, como a limpeza ou os transportes públicos, o excesso de turismo e de alojamentos locais, mas nestes quatro ano alguns até pioraram. A ver vamos como Moedas se portará com esta votação reforçada, se tem rasgo, ideias e coragem para as pôr em prática e fazer aquilo que há quatro anos prometeu e não cumpriu: tornar Lisboa uma cidade agradável para quem lá vive e não só para os visitantes.
SEMANADA - Segundo a PJ, o número de mulheres detidas desde o início do ano por provocarem incêndios florestais aumentou de forma considerável: das 88 detenções registadas em 2025, 18 são mulheres, e há até octogenárias detidas; a quase totalidade dos suspeitos é responsável por mais do que uma ignição; um estudo da OCDE revela que apenas metade dos adultos portugueses têm competências básicas de literacia; o mesmo estudo indica que um licenciado português tem um nível de literacia equivalente ao de um adulto finlandês com o ensino secundário; nos primeiros nove meses de 2025, até setembro quase milhão e meio de chamadas para linha saúde 24 do SNS ficaram por atender, um aumento de cerca de 941% em relação ao mesmo período do ano passado; 79% dos portugueses usufruem de algum tipo de seguro, plano ou subsistema de saúde; 24% dos portugueses recorrem a um hospital privado em caso de necessidade de recurso a um médico; Portugal importa da China mais de 10 mil euros por minuto, sendo já o maior fornecedor de Portugal fora da Europa; Pequim representou 16,7% do défice comercial português em 2024; este ano, até setembro, foram vendidos, em média 50 carros por dia; em agosto de 2025 estavam registados 35.958 veículos afectos à actividade TVDE, dos quais 8,5% usam motores de combustão e há 39.049 condutores activos desses veículos, 50% dos quais são portugueses, 20% brasileiros, e 23% da Índia, Paquistão, Bangladesh e Nepal; na segunda-feira passada um comboio Intercidades da CP que ligava Lisboa a Faro perdeu uma carruagem a meio da viagem, quando o engate que ligava duas carruagens se partiu, aparentemente por deficiente manutenção do equipamento.
O ARCO DA VELHA - Durante os preparativos para as Jornadas Mundiais da Juventude, em 2023, as coroas de palmas das colunas monumentais de Keil do Amaral no Parque Eduardo VII foram retiradas com a indicação de que iriam para manutenção e restauro. Nunca mais voltaram a ser colocadas e em vez de restauro estão ao abandono num talhão vazio do Cemitério de Carnide, sem proteção adequada.
SOBRE A PINTURA - Na Galeria Diferença, que está com nova dinâmica desde há algum tempo, Isabel Garcia apresenta até 31 de Outubro uma série de novos trabalhos sob o título “Poppy Day”, com pinturas de maior dimensão que o habitual na artista e que se inspiram nas cápsulas das papoilas depois da floração, muitos com cores intensas. Outros mostram as plantas na altura em que as flores vermelhas já partiram mas permanece a sua memória com os caules delgados a erguerem-se rasgando o azul do céu. Estes trabalhos são um testemunho da força da pintura, da capacidade de comunicação que pode ser estabelecida entre o artista e os seus públicos. A exposição inclui ainda duas instalações que simbolizam a permanente renovação das plantas. A Galeria Diferença fica na Rua São Filipe Neri 42.

ROTEIRO - Na Galeria Cristina Guerra (Rua de Santo António à Estrela 33), a artista brasileira Rosângela Rennó mostra até 15 de Novembro um conjunto de obras que, com recurso à fotografia como base de trabalho, exploram imagens geradas a partir de fotografias, umas actuais, outras provenientes de arquivos, todas elas manipuladas e que têm em comum a evocação dos laços históricos, coloniais e contemporâneos, entre Portugal e o Brasil, incluindo terras brasileiras, portuguesas e personagens dos dois lados do Atlântico (na imagem). Por curiosidade, na mesma rua, foram apresentadas na semana passada as novas instalações da galeria Movart, que nasceu em Luanda e tem também este espaço em Lisboa, no nº 74 da Rua de Santo António à Estrela. As exposições inaugurais apresentam trabalhos de Jules Be Kuti (“Fragment from an Invisible Masculinity”) e Fidel Évora (“Coisas do Coração e Não Coisas”), esta com curadoria de João Silvério.

O DESEJO - O novo livro de fotografia de Alfredo Cunha é dedicado primordialmente ao corpo humano e o seu título é o relato das imagens: “Cartografia do Desejo”. Conhecido pelas suas reportagens fotográficas e pelo testemunho de épocas como o 25 de Abril e o período de 1974 e 1975, Alfredo Cunha sai da sua trajetória habitual de fotojornalista e, a partir de fotografias efetuadas durante a preparação do espectáculo de dança “Há Qualquer Coisa Prestes A Acontecer”, de Victor Hugo Pontes, no Teatro Nacional de S. João, fotografa a nudez e o corpo, numa narrativa de imagens que ocupam boa parte do livro. Já no final mostra um lado de imaginação que evolui a partir das formas do corpo. O livro inclui uma série de textos de Ana Aragão, que de alguma forma enquadram, bem, as suas quatro partes: “Do Desejo”, “Abismo, Encontro, Intimidade” e, porventura as mais interessantes, “Miopia” e “Plástico Fetiche”. Com uma paginação cuidada e uma impressão muito boa, esta obra permite conhecer uma outra dimensão do trabalho de Alfredo Cunha. Edição Guerra & Paz, com o apoio da SPA e da empresa DST.

O FADO DO PAÍS - De entre toda a nova geração de fadistas, Carminho é a intérprete que mais procura experimentar, romper tradições, ousar o acompanhamento de instrumentos improváveis, da guitarra eléctrica até teclados electrónicos. E, desde há algum tempo, é ela que faz questão de assumir a produção musical dos seus discos. No anterior álbum, de 2023, “A Portuguesa”, utilizou guitarra eléctrica. A seguir gravou um EP em Nova Iorque nos estúdios Electrical Audio com sonoridades simples e também inesperadas, e a participação de Caetano Veloso numa versão de “Os Argonautas”. Agora, o novo disco vai ainda mais por terrenos musicais pouco explorados pelo fado, ao incluir alguns instrumentos como o mellotron. “Eu Vou Morrer de Amor ou Resistir” é o nome deste disco em que dois dos principais temas são baseados em poemas de Ana Hatherly - “Balada do País Que Dói” e “Saber” - este último com a participação de Laurie Anderson, que canta, em dueto virtual, este poema que gravou em inglês a pedido de Carminho. O disco inclui ainda poemas de Amália Rodrigues, Pedro Homem de Mello, a participação de Mário Laginha em “Dia Cinzento” e uma versão de um clássico de Norberto Araújo e Raul Ferrão, “Lá Vai Lisboa”. São onze temas onde a voz e a capacidade de interpretação de Carminho surgem de forma perfeita, quer na entoação, quer na maneira como diz as palavras que canta e que atinge o expoente na forma como interpreta “Balada do País Que Dói”. É um disco emocionante. Disponível nas plataformas de streaming.

A NÃO PERDER - Baseado num livro de José Cardoso Pires, adaptado a cinema por António Pedro Vasconcelos e realizado e fotografado a preto e branco por Mário Barroso, “Lavagante” é um filme que vale a pena ser visto, com grandes interpretações de Júlia Palha, Francisco Froes, Nuno Lopes e Diogo infante, entre outros. É o retrato de um Portugal que não se deve esquecer e é, também, uma grande história de amor.
ALMANAQUE - No Rio de Janeiro, no Centro Cultural do Banco do Brasil, José Pedro Croft tem até 17 de Novembro uma grande exposição que, sob o título “Reflexos, Enclaves, Desvios”, apresenta 170 obras, entre esculturas, desenhos, gravuras e pinturas. A exposição foi adaptada à arquitectura do edifício e Croft criou uma instalação especialmente para o espaço da rotunda do edifício. Utilizando espelhos, construíu uma ilusão de ótica que transforma a claraboia do CCBB Rio de Janeiro num poço de 40 metros de profundidade.
DIXIT - “(Nestas eleições) o fenómeno maior é o da rejeição dos partidos dos extremos. Não foi a moderação que triunfou – foi o extremismo que foi rejeitado” - Miguel Esteves Cardoso
BACK TO BASICS - “Perdoem aos vossos inimigos mas nunca se esqueçam dos seus nomes” - John F. Kennedy.
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.