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MANUAL DE ESTAGNAÇÃO

por falcao, em 02.12.22

 

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ULTRAPASSADOS - Visitei a Roménia no início dos anos 90, em trabalho. O regime de Ceausescu tinha caído há pouco e visitei várias zonas do país. Fiquei surpreendido com a pobreza que se via em todo o lado. Falo em pobreza ao ponto de, então, faltar comida nalgumas zonas do país. Isto foi há trinta anos. Passada uma década, no ano 2000, a Roménia continuava a ser o país mais pobre dos actuais 27 estados membros da União Europeia.  Portugal estava então na 15ª posição, atrás do Chipre e da Grécia, mas à frente de Malta e dos estados do antigo bloco de leste. Na semana passada foi conhecido um novo relatório de previsões económicas da União Europeia para 2024 que mostra como o nosso país empobreceu ao longo deste século. Se estas previsões se confirmarem Portugal terá então descido, 50 anos depois do 25 de Abril, para a 20ª posição em PIB per capita, sendo ultrapassado pela Roménia, Estónia, Chéquia, Lituânia e Eslovénia. A menos que haja alguma crise política, chegaremos a 2024 com 17 anos de governação do PS neste século e sete do PSD. António Costa, se entretanto continuar por cá, levará nessa altura quase uma década como Primeiro Ministro. Portugal, no início deste século, atravessou um período negro com a Troika, chamada pelo governo de José Sócrates, um executivo que em cerca de seis anos quase levou o país à falência. A governação do PS tem tido um padrão: estagnação e até recuo. Os sete anos que Costa já leva como Primeiro Ministro são marcados por fraco crescimento económico quando comparado, durante o mesmo período de tempo, com países de leste que estavam atrás de nós. Costa deixa também outra marca: a ausência de reformas efectivas em sectores como a saúde, educação, justiça e impostos e atrasos na execução de fundos europeus. Não há habilidade política que resista aos factos e aos números.

 

SEMANADA - Cerca de três mil escolas, públicas e privadas, não integram o Programa Nacional de Remoção de Amianto, lançado pelo Governo em 2020; um estudo europeu indica que 55% dos profissionais em Portugal já se sentiram discriminados no trabalho; a Câmara de Caminha contratou por 19.000 euros um parecer sobre um contrato que já foi anulado pela autarquia; um estudo recente indica que quase metade dos portugueses acredita em bruxaria; segundo o INE a prestação média do crédito à habitação registou um "aumento significativo" nos últimos meses, ficando em outubro 18,7% acima de outubro de 2021; a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima auxiliou, em 2021, "cerca de 28 mulheres e raparigas" por dia, vítimas de crimes como violência doméstica, difamação e perseguição, entre outros; mais de um milhão de portugueses vivem sozinhos; o número de alunos estrangeiros no ensino superior em Portugal atingiu o valor mais alto de sempre, cerca de 70 mil; na última década aumentou o número de partos em mulheres com mais de 50 anos; o interior do país perdeu 8,2% da população nos últimos dez anos; 20% da população portuguesa está amontoada em 1,1% do território; a Autoridade da Concorrência, dirigida por Margarida Matos Rosa, que completou seis anos no cargo, aplicou durante esse período coimas no valor de 1,4 mil milhões de euros.

 

O ARCO DA VELHA - O número de emigrantes por cada mil habitantes é, na última década, superior ao registado na década de 60.

 

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VER A MEMÓRIA - O trabalho de Ana Vidigal é feito da evocação de memórias e da utilização de pedaços de coisas que fizeram parte dos seus tempos - de brinquedos a recortes, de postais a fragmentos de objectos. A sua nova exposição, intitulada “Ana Beatriz”, evoca a forma como a mãe a chamava, pelos dois primeiros nomes, quando entendia que já estava a passar dos limites admissíveis, o que, aparentemente,  acontecia bastantes vezes. Sobre esta exposição Ana Vidigal sublinha que ela é feita da “memória que nos passa entre os dedos” e recorda que tudo o que ali está foi o que ela e os irmãos descobriram entre o que existia na casa onde cresceram. “What Can Be Shown Cannot Be Said” é a frase de Wittgenstein que Ana Vidigal escolheu para descrever esta sua primeira exposição na Balcony (Rua Coronel Bento Roma 12A), que ali ficará até 25 de Fevereiro. O outro destaque da semana vai necessariamente para a exposição evocativa do centenário da morte da pintora portuguesa Aurélia de Sousa, no Museu Nacional de Soares dos Reis. Sob o título “Vida e Segredo” são apresentadas 92 obras  da artista, cuja obra é ainda relativamente pouco conhecida, apesar de ser um dos mais importantes nomes da arte portuguesa do final do século XIX e início do século XX. A exposição mostra diversos aspectos do trabalho de Aurélia de Sousa, nascida na Argentina mas que cresceu e sempre viveu no Porto, dividida em quatro grandes áreas que mostram retratos, cenas do quotidiano, paisagens, naturezas mortas. Esta é a maior mostra da obra de Aurélia de Souza e ficará no Museu Soares dos Reis (Rua de D.Manuel II 44, Porto) até final de Maio do próximo ano.

 

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PORTUGAL VISTO DE FORA - É sempre curioso ver como o país é visto e vivido por estrangeiros. “Portugal - The Monocle Handbook” proporciona essa visão e, embora nem sempre as sugestões da “Monocle “ sobre as coisas portuguesas sejam acertadas, o livro proporciona um bom roteiro a quem nos visita. Mas vamos à história do grupo Monocle. O primeiro número da revista Monocle foi publicado em Fevereiro de 2007, há 15 anos portanto. Em 2011 começou a emitir a Monocle 24, uma rádio em streaming que entretanto desenvolveu uma programação variada e passou a integrar uma componente vídeo. Em conjunto com a newsletter Monocle Minute estas são as únicas operações online do grupo, que ao longo da sua existência tem permanecido fiel ao papel. Para além das dez edições anuais do título principal, “Monocle”, tem também editado publicações regulares como a "Entrepreneurs" e a “Forecast” e algumas outras edições especiais, sazonais, em formato de jornal. Em 2013 iniciou uma área de edição de livros, que vão desde guias de cidades até ensaios, como “The Monocle Companion”. E, agora, estreou-se com a edição de uma nova colecção dedicada a países. E o primeiro volume desta nova colecção, agora apresentado, é sobre o nosso país, “Portugal - The Monocle Handbook”. O livro tem sugestões desde museus a lojas de design, de música ou de revistas, até locais no litoral e no interior, percursos a fazer, como no Douro, e indicações de restaurantes desde as mais simples tascas até aos mais na moda. E mostra também a diversidade cultural em todo o país, o cruzamento de influências de outros países, sobretudo os lusófonos. Na apresentação, que decorreu em Lisboa na semana passada, o criador do grupo Monocle, Tyler Brulé, sublinhou que Portugal surge em quarto lugar em número de exemplares vendidos da Monocle em quiosques, em sétimo global em livrarias e em 19º em assinaturas. Brindou-se a tudo isto com o Alvarinho Reserva Cortinha Velha, de Monção.

 

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PORTUGUÊS CANTADO  - Uma escritora, Maria do Rosário Pedreira, e uma fadista, Aldina Duarte, deram as mãos para, em conjunto, fazerem um livro, “Esse Fado Vaidoso”,  que recolhe poemas do fado tradicional, mas também de novos autores. Maria do Rosário Pedreira tem aliás trabalhado bom vários músicos músicos e contribuído para renovar o português que se canta, escrevendo para intérpretes como a própria Aldina Duarte, Camané, Carlos do Carmo ou António Zambujo. Aldina Duarte pelo seu lado,  fez o seu primeiro disco em 2004 e o mais recente já este ano e tem sido uma das vozes mais atentas a novos escritores e poetas. “Esse Fado Vaidoso” junta uma galeria de autores e intérpretes que transformaram o modo como o fado é visto e divulgado hoje em todo o mundo. É como que uma antologia monumental dessa poesia transcrita para o fado, dos trovadores medievais a Bocage, passando por Machado de Assis,  Teixeira de Pascoaes, Pessoa, Almada Negreiros, Florbela Espanca, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner, Agustina Bessa-Luís, David Mourão-Ferreira, Alexandre O’Neill, Ary dos Santos,  Vasco Graça Moura ou Hélia Correia, entre outros. Ali encontra poemas do fado tradicional, à volta dos temas da mitologia do fado, da melancolia, da paixão, do ciúme, da saudade, da separação ou da esperança desenganada. No final do livro há um útil guia das versões cantadas dos poemas que os autores ouviram e recomendam. Edição Quetzal.



MÁS PROVAS - Uma das minhas dúvidas mais persistentes em matéria de restauração é o porquê da incapacidade, generalizada, em servir batatas fritas aos palitos que estejam fritas em vez de cozidas. Digamos que não será o prato mais emblemático do mundo, mas metade do prazer de um bitoque está no acompanhamento, ou seja, nas batatas fritas. Raros são os restaurantes onde as fazem como deve ser, como os especialistas no assunto, belgas, ensinam: com duas frituras, para ficarem estaladiças por fora, cozinhadas por dentro, mas secas e saborosas. Em vez disso, o mais frequente é aparecerem molengonas, encruadas, com um aspecto que leva a suspeitar precisarem de viagra para se restabelecerem. Dentro do mesmo género de molenguice destaco também outro clássico que são as carcaças que parecem pastilha elástica. Normalmente quando isto acontece as azeitonas que acompanham estão igualmente molengonas, talvez por solidariedade, e, nas mais das vezes, sensaboronas. Outro tema muito comum é a tentativa de colocar uma charcutaria inteira em cima da mesa, à espera que um incauto debique alguma coisa, para agravar a conta. Tudo isto atinge o seu zénite quando apanhamos um daqueles empregados que aparece a toda a hora a perguntar se está tudo bem, a meio da nossa mastigação, e que desaparece quando efectivamente precisamos dele. Outra praga, que começa a proliferar, são os pré preparados congelados que são servidos como produtos caseiros, uma verdadeira ofensa aos verdadeiros pastéis de bacalhau, croquetes e chamuças. Um dos maiores enganos que um restaurante pode cometer é servir fast food disfarçada - e isso acontece cada vez mais. Salvam-se as tascas, onde se cozinha tudo à vista, num grande tacho, e o resultado sai bem apurado. Para a semana o tema vai ser essa coisa chamada “fine dining”.

 

DIXIT - “O país e as autoridades olham para o que acontece e limitam-se a deixar acontecer (…) Deixar correr é sempre a pior das políticas “- António Barreto.

 

BACK TO BASICS - “ Toda a gente tem um livro dentro de si, e é aí exactamente que, na maior parte dos casos, ele deve permanecer” - Christopher Hitchens.

 



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