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Não sou muito de subir escadas, em havendo necessidade prefiro um elevador. Mas já descer é coisa que faço com gosto. Se não tivesse descido a pé, lentamente, umas certas escadas não teria dado com esta figura, presa dentro de uma vitrine. Está ali há décadas, assim, quase melancólica, com pouca luz, um corpo incompleto a mostrar-se. Ponho-me logo a pensar que talvez alguém já tenha caído naquelas escadas, distraído com as promissoras curvas, apesar de barradas ao tacto pelo vidro que as enclausura. Uma das coisas que me fascina é deparar-me com encontros inesperados como o que tive com esta figura, algures dentro de um edifício, aparentemente à vista de todos, mas na realidade pouco visível. Já desci aquelas escadas dezenas de vezes, com escassa luz, é certo, e nunca tinha reparado nesta figura. Mas um dia destes surpreendeu-me o seu recato tentador. Parei frente a ela, a meio do lance de escadas que levava ao patamar onde se exibe.Se porventura estivesse na rua, podia ser uma janela, mas esta não seria certamente a menina que Vitorino tão bem canta, com o cabelo à lua. Os recantos nos vãos de escada são muitas vezes arcas do tesouro à espera de serem descobertas. Se os olhos não visualizam esses tesouros basta puxar pela imaginação. Uma coisa é o que vemos, outra coisa é o que a imaginação cria a partir do que olhamos. A imaginação não tem limites, é ela que nos permite criar fantasias que nos auxiliam a viver melhor no meio do caos que marca estes nossos tempos.
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