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AS ELEIÇÕES - Não vale a pena fazer prognósticos antes do final de jogo - até porque a disputa eleitoral tem cada vez mais o aspecto de um confronto clubístico com muito pouco de racional. Existe a probabilidade de o resultado manter uma diferença tão pequena entre os dois principais partidos que a situação de instabilidade vivida nos últimos anos corre o risco de se manter, se não existir um acordo entre vários partidos. Nesta campanha eleitoral debateram-se muito temas marginais e muito pouco se disse sobre propostas de mudanças necessárias em áreas cruciais para que Portugal progrida. Apesar de o caminho da democracia ter já mais de meio século, o sistema político e partidário português continua avesso a coligações pós eleitorais entre partidos que garantam estabilidade. É certo, como já foi sublinhado nos últimos dias, que estes acordos só valerão a pena se tiverem por base um programa claro que defina reformas importantes: desde logo na justiça, mas também na habitação, na saúde, no ensino, na fiscalidade e, claro, na lei eleitoral - que evite que quase 700 mil votos não sirvam para nada, como aconteceu em anteriores legislativas. O caso da justiça é particularmente importante porque mexe com os cidadãos e empresas, porque dificulta os actos mais simples, perpetua a ausência de decisões e, em especial na justiça tributária, parte do princípio que primeiro há que pagar e depois que contestar, mesmo quando o erro seja claramente do Estado. A questão da fiscalidade, sobre os cidadãos e empresas, estrangula a economia e o desenvolvimento do país e perpetua o círculo vicioso dos baixos salários e alta carga fiscal. Na hora de votar vale a pena pensar quem tem ambição reformista, quem está disposto a fazer mudanças, quem as propõe e em que termos pugna por elas nos seus programas e na sua acção quotidiana. O único voto útil é o que mostre o desejo de reformas e fortaleça quem as pode influenciar.
SEMANADA - A taxa de mortalidade infantil em Portugal subiu 20% em 2024 face ao ano anterior; a região da Península de Setúbal regista o valor mais elevado, com uma taxa de mortalidade infantil de 3,7 por cada mil nascimentos, acima da média europeia; em 2024 mais 118.011 pessoas subscreveram seguros de saúde– uma média de 323 por dia – e no total já há 3,7 milhões abrangidos por esse tipo de seguro; em 2024 cerca de 138 mil pessoas foram pelo menos cinco vezes às urgências do SNS; nos primeiros seis meses deste ano estão previstas mais de 1600 aposentações de professores; em 2024 as queixas de assédio laboral aumentaram e quase 30 % dos profissionais relatam ameaças ou abusos; quase cinco milhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido a acidentes laborais; em Dezembro de 2024 residiam em Portugal 1,5 milhões de estrangeiros; a população empregada em Portugal chegou aos 5,18 milhões, um novo máximo histórico; em 2024 registou-se um aumento de 11% nas compras efetuadas com pagamentos electrónicos; segundo a REN o apagão de 28 de Abril cortou o consumo de 62,3 GWh de energia muito além dos 2 GWh de eletricidade que foi cortada na rede operada pela REN há 25 anos, no apagão parcial do país, devido a um incidente com uma cegonha; segundo o Instituto +Liberdade, nos últimos 10 anos, foram arquivados quase 3 mil processos de corrupção e crimes conexos e por cada 4 condenações, mais de 100 processos são arquivados.
O ARCO DA VELHA - Os senhorios que praticam rendas congeladas aguardam há meio ano o pagamento da compensação legislada e estão agora a ser confrontados com notas de liquidação de IMI, do qual a lei os isenta. O Fisco diz aguardar “orientações superiores” e aconselha a pagar primeiro e reclamar depois.
A TRANSFORMAÇÃO DA MÚSICA - João Gobern é um dos mais prestigiados jornalistas da área da cultura e espectáculo, com especial foco na música. Dirigiu publicações, faz programas de rádio, escreve livros e tem um saber enciclopédico sobre a música portuguesa. Depois de há uns anos ter escrito “Quando a TV parava o país” pegou agora no que foi descobrindo sobre a edição discográfica em Portugal e em mais algum trabalho de pesquisa e escreveu “Tira o Disco e Toca ao Vivo”. Ao longo de centena e meia de páginas conta como todo o sistema económico da música se modificou nos últimos anos e que no fundo está resumido no título: os artistas, os seus agentes e as editoras obtêm hoje maiores receitas dos concertos e digressões do que da venda dos discos, uma inversão daquilo que se passava há duas décadas. Como João Gobern sublinha, “antes, faziam-se concertos para vender discos. Agora, editam-se discos para conseguir concertos. A música mudou, até na forma como a consumimos. “O autor aborda a forma como o digital e as plataformas de streaming alteraram os hábitos de quem ouve música, provocando o declínio das lojas, levando a novos modelos contratuais entre artistas e editoras. O efeito das transformações efetuadas e dos avanços tecnológicos e a alteração do modelo de negócio tiveram efeitos nos criadores, instrumentistas e cantores e tiveram consequências estéticas. e muitas vezes não foram para melhor. No final, Gobern, referindo-se à situação dos músicos, sublinha: “eles têm hoje mais muros para enfrentar do que pontes para aproveitar, quando o salto tecnológico - dos meios de gravação às possibilidades de distribuição - poderia sugerir o contrário”. O livro é editado pela colecção Ensaios da Fundação Francisco Manuel dos Santos.
IMAGENS DO ORIENTE - A nova exposição da Ochre Space, uma galeria dedicada à fotografia e focada no trabalho de fotógrafos do Oriente, apresenta uma dupla exposição: To Add One Meter to An Anonymous Mountain mostra uma performance criada em 1995 por dez jovens artistas da comunidade Beijing East Village, que se deitaram, nus, em pirâmide, sobre uma montanha nos arredores de Beijing e fizeram história. A exposição mostra as três fotografias do final da performance, captadas por Lu Nan, Bagena e Robyn Beck que estão nas colecções de alguns dos mais importantes museus internacionais, o conjunto de fotografias que compõe a integralidade da performance, incluindo algumas fotografias totalmente inéditas de um anónimo que esteve no local e que nunca tinha revelado o material, e o vídeo amador original da performance, feito por Ji Dan. Na imagem está uma das fotos mais conhecidas, de Lu Nan, um dos mais importantes fotógrafos chineses que tem documentado extensamente a vida na China. Em simultâneo a Ochre mostra uma selecção de 22 imagens de RongRong, um dos mais importantes fotógrafos chineses da actualidade, e que viveu na comunidade artística Beijing East Village, documentando extensivamente o modo de vida e a actividade dos artistas dessa comunidade, que se tornou uma das mais importantes na vanguarda artística chinesa dos anos 90. A Ochre fica na Rua da Bica do Marquês 31 (à Ajuda), a exposição, que tem curadoria de João Miguel Barros, que dirige a galeria, decorre até 21 de junho de 2025 e está aberta ao público de quarta a sábado entre as 15:00 e as 18:30.
ROTEIRO - Em 1988 Pedro Cabrita Reis realizou na Galeria Roma e Pavia, no Porto, a exposição “Cabeças, Árvores e Casas”. Agora aceitou o desafio do galerista Pedro Oliveira, ligado na época a essa galeria, e apresenta até 28 de Junho 20 obras inéditas sob o título “outras cabeças, outras árvores e outras casas” (na imagem). Todos os trabalhos são mix media em papel. No texto escrito para a exposição original, em 1988, Pedro Cabrita Reis afirmava: “Vejo uma árvore e nomeio-a: árvore. E sei que é também madeira e poderei dizer casa, barco, caixão, mesa. Vejo uma árvore e nomeio-a: árvore. E sei que é também fogo e poderei dizer território, viagem, morte, festa.”. E mais adiante: “Pertenço aos que amam na errância das aparências a possibilidade de encontrar um sentido.” A Galeria Pedro Oliveira fica na Calçada de Monchique 3, no Porto. Em Lisboa, na Sociedade Nacional de Belas-Artes (Rua Barata Salgueiro 36) está patente até 7 de Junho a exposição "Sombras Rosas Sombras" de Maria Capelo, com curadoria de Nuno Faria. Na CC11, Rua do Vale de Santo António 50, um espaço dedicado à fotografia, Filipe Bianchi apresenta “Joy Bangla”, um ensaio fotográfico que retrata o quotidiano da comunidade bangladechiana no bairro do Intendente.
NOVAS CANÇÕES PORTUGUESAS - Hesitei antes de escrever, ando a ouvir este disco há umas duas semanas. Na primeira audição pensei que era apenas mais um disco de Rodrigo Leão. Sonoridades mais do mesmo. Mas depois, numa segunda audição, percebi que este “O Rapaz da Montanha” é um disco novo, de canções diferentes. A sonoridade é a de Rodrigo Leão, a sua marca própria. Mas estas canções vão buscar algo mais. Há uma influência maior da música popular portuguesa, desde a construção das melodias aos arranjos, passando pela forma de cantar, com destaque para a utilização de coros. Os temas reflectem preocupações com os tempos que vivemos. A maioria das palavras das canções foi escrita por Ana Carolina Costa, como é hábito, mas Gito Lima, Francisco Menezes e João Pedro Diniz também participam. Uma das grandes diferenças é que neste disco as canções têm uma linguagem mais directa que aborda questões concretas deste “país do “Se” que ficou por fazer”, como “Madrugada”. No disco participam Pedro Oliveira (a voz da Sétima Legião), que canta “Esperança”, escrita por outro dos Sétima Legião, Francisco Menezes, o acordeonista Gabriel Gomes, José Peixoto na guitarra clássica, Carlos Poeiras também no acordeão e Francisco Palma na voz. E, claro, como tem sido usual em trabalhos recentes de Rodrigo leão, também participam a cantora Ana Vieira – a voz principal do disco – Viviena Tupikova (violino), Bruno Silva (viola), Celina da Piedade (acordeão), Carlos Tony Gomes (violoncelo e autor dos arranjos de cordas), João Eleutério (guitarra, baixo e sintetizador), António Quintino (contrabaixo) e Frederico Gracias (bateria e percussão). A ilustração de capa é de Tiago Manuel. Deixo-vos com o apelo de “O Rapaz da Montanha”, a canção que dá título ao disco: “Lá em baixo não há nada/ mas há tanto p’ra fazer!”. Disponível nas plataformas de streaming.
DIXIT - “O conservadorismo está bem presente, uma vez mais, nesta campanha eleitoral. Num país que odeia reformas, ninguém fala delas, com raras e honrosas excepções” - Luis Marques, no “Expresso”.
BACK TO BASICS - “A justiça deve ser o pilar do funcionamento da sociedade” - Aristóteles
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
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