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OS INCENDIÁRIOS DA HISTÓRIA - É uma terrível coincidência que dias depois de o Governo tentar fazer esquecer e subalternizar o relatório sobre o incêndio de Pedrógão Grande uma nova catástrofe tenha colocado ainda mais a nu o que então tinha corrido mal, e que agora se repetiu. Os spin doctors que na semana passada andaram a tentar colocar o relatório debaixo de resmas de assuntos saíram-se agora com uma teoria de conspiração terrorista que atribui à direita a autoria dos incêndios, como estratégia para enfraquecer o Governo da esquerda. Da Roma antiga à ascensão nazi na Alemanha a História está cheia de manobras destas e sabe-se o que elas provocaram. A conspiração que existiu foi a que mudou em Abril a maioria da estrutura de comando da Protecção Civil, trocando quadros experientes por boys inexperientes, da direcção nacional aos comandantes distritais, como o relatório que se queria esquecer diz claramente; a conspiração que existiu foi a de quem, contra as previsões metereológicas e conselhos de especialistas, desmobilizou a 1 de Outubro o dispositivo de combate a incêndios retirando operacionais e meios pesados, reduzindo praticamente a metade a capacidade antes existente. Nesta matéria Centeno e Costa têm responsabilidades - o primeiro porque com as sua austeridade camuflada apertou os ministérios e forçou poupanças perigosas e o segundo porque não resistiu ao apelo de umas nomeações de favor que uma governante incapaz executou com mais desvelo do que a sua missão principal, que é a de proteger os cidadãos. Os erros do passado, de várias décadas, contam a nivel estratégico (florestas, ordenamento, etc) mas os erros tácticos e conjunturais contam muito - e este ano foram múltiplos, com o desgraçado resultado que se conhece. Há o nível do ordenamento florestal, há o nível do combate aos incêndios e há o nível da proteção das vidas humanas. O Estado falhou em todos os níveis. O único terrorismo que aqui vislumbro é o terrorismo de Estado. Não podemos mudar o passado, mas podemos melhorar o futuro.
SEMANADA - Este ano já morreram mais pessoas em incêndios florestais que no conjunto dos últimos 15 anos; no orçamento de Estado de 2017, em vigor, o governo fez um corte de 12% nas verbas para meios de prevenção e combate a fogos florestais, em relação ao que estava no Orçamento de 2016; a Rede Nacional dos 236 Postos de Vigia à floresta foi desactivada a 1 de Outubro por fim do contrato a prazo dos elementos que os integravam; na mesma data o Governo reduziu para metade os meios de combate a incêndios, apesar das previsões metereológicas desfavoráveis; os gastos de gabinetes governamentais estimados no orçamento para 2018 estão acima dos verificados nos governos de Sócrates, que eram superiores aos verificados no governo de Passos Coelho; as novas despesas do Estado somam quase 500 milhões de euros em 2018; o corte no défice de 1% é todo feito pela via da receita, ou seja, mais impostos, taxas e taxinhas; o orçamento prevê um aumento de 2,6% nas receitas com taxas e multas, que atingirão 3 mil milhões de euros; aumento do orçamento do Ministério do Ambiente: 75,8%; aumento do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros: 10,9%; aumento do orçamento do Ministério das Finanças: 18,7%; aumento do orçamento do Ministério do Planeamento: 20,1%; aumento do orçamento do Ministério da Cultura: 11,3%; aumento do orçamento do Ministério da Administração Interna: 5,9% aumento do orçamento o Ministério da Saúde: 2,4%; diminuição do orçamento do Ministério da Educação: 2,9%.
ARCO DA VELHA - Segundo o Tribunal de Contas a Administração central do Sistema de Saúde falseou tempos de espera a consultas e cirurgias nos hospitais e entre 2014 e 2016 mais de 27 mil doentes ficaram em lista de espera por uma cirurgia, dos quais 2600 morreram antes de serem operados.
FOLHEAR - Em Portugal, como em muitos países com História e tradições, há variações idiomáticas regionais, que vão da pronúncia até à existência de palavras e expressões que só se usam localmente - é o que acontece por exemplo em Trás-Os-Montes onde uma capilota é uma sova, um farsolento é um vaidoso, uma novilheira é uma pessoa que tem sempre novidades ou unguento pode querer dizer dinheiro. Por isso mesmo Cidália Martins, José Pires e Mário Sacramento compilaram o “Dicionário de Palavras Soltas do Povo Transmontano”. Com mais de 10 200 palavras e expressões típicas de Trás-os-Montes, desde o vocabulário em vias de extinção, passando pelo calão, pela gíria, até às palavras e expressões castiças reinventadas pela nova gente transmontana, este dicionário surge como um valioso instrumento para dar a conhecer o vasto património da língua portuguesa cuja grande riqueza reside na sua diversidade. No prefácio, o Professor Adriano Moreira classifica este dicionário como “uma obra prática, leve e lúdica” e recorda que “ a língua é uma essencial expressão da identidade dos povos”, sublinhando que “o nosso idioma global também vive e renasce no singular, no que é específico de determinadas localidades, regiões, aldeias”. Edição Guerra & Paz.
VER - Na Culturgest estão duas exposições notáveis, ambas com curadoria de Delfim Sardo, ambas exemplos da diversidade criativa norte-americana do final da década de 60 e década de 70 do século passado. Começo por “Splitting, cutting, writing, drawing, eating...Gordon Matta Clark”, que mostra o percurso de um dos mais marcantes artistas norte-americanos da sua geração - morreu em 1978 com 35 anos. Arquitecto de formação, Matta-Clark fez desenho, escultura, interviu em edifícios devolutos desconstruindo a sua estrutura e fez performance em espaços públicos - de que é bom exemplo o restaurante Food, um ponto de encontro de artistas, aqui recordado num filme de Matta-Clark e de Robert Frank (o fotógrafo da obra The Americans). A outra exposição, “Time Capsule”, é dedicada à revista “Aspen”, um projecto fascinante criado em 1965 e que durou até 1971, publicando dez números, na época disponíveis apenas por assinatura. A publicação foi concebida como uma caixa dentro da qual vinham diversos materiais, uns impressos, outros gravados, como discos, e até filme em bobine. Cada número tinha um editor e designer diferente e a Aspen tornou-se num espelho de novas tendências. A exposição mostra todos os números da revista a partir da colecção de António Neto Alves, que demorou cerca de uma dezena de anos a conseguir obter todas as edições. Para além dos exemplares da Aspen, a exposição contextualiza cada número com o auxílio de diverso material complementar. É sobretudo empolgante pensar como a “Aspen” foi criada a partir de um suporte tradicional em papel, que em diversas ocasiões juntou registos de som e de imagem, quase de forma premonitória em relação ao que hoje é possível fazer em publicações de suporte digital e distribuição na internet. Imperdível, até 7 de janeiro.
OUVIR - Miles Davis começou a gravar para a etiqueta Prestige em 1951 e em 1955, depois do êxito obtido no Festival de Newport, foi para estúdio com o seu quinteto e gravou, em três extensas sessões, realizadas no final de 1955 e em 1956, uma série de discos hoje considerados o ponto de viragem decisivo da sua música. “The Legendary Prestige Quintet Sessions” é uma caixa de quatro CD’s, originalmente editada em 2006, agora reeditada e disponível no mercado nacional. O disco 1 recolhe gravações editadas no LP “The New Miles Davis Quintet”, que incluía John Coltrane no saxofone, Red Garland no piano, Paul Chambers no baixo e Philly Joe Jones na bateria, além de Miles no trompete. O disco 2 recolhe temas gravados nos LP’s “Relaxin’ With The Miles Davis Quintet” e “Steamin’ With The Miles Davis Quartet”. O disco 3 recolhe gravações dos LP’s “Miles Davis and the Modern Jazz Giants”, “Workin’ with the Miles Davis Quintet” e “Cookin’ With The Miles Davis Quintet”. O disco 4 recolhe gravações feitas em programas de rádio e televisão, que aqui tiveram a sua primeira edição em disco e também alguns solos de Davis registados durante as sessões de estúdio. As gravações foram remasterizadas a partir das fitas originais e a caixa inclui um livro de 52 páginas com um texto de Bob Blumenthal que permite enquadrar a forma como tudo se passou. Disponível na FNAC e El Corte Ingles.
PROVAR - A chef Luísa Fernandes ganhou fama em Nova Iorque, para onde foi aos 49 anos, depois de ter sido paraquedista e enfermeira: começou como pasteleira num restaurante português, o Alfama, e , depois de ter estado no Galitos, Park Blue e Nomad, terminou como Chef num dos mais prestigiados restaurantes nova-iorquinos, o Robert. Há menos de um ano regressou a Portugal e há poucos meses abriu junto à Avenida da Liberdade o seu próprio restaurante, “Peixe na Avenida”. Focado no tema do mar tem uma decoração sóbria e confortável. Ao almoço há uma proposta de menu executivo por 14 euros (entrada, um prato à escolha entre três propostas, sobremesa, bebida e café). À noite há uma carta com uma boa diversidade de propostas, que contempla incursões em, ceviche, sushi e sashimi, todos com um toque português. Numa recente visita a mesa provou atum braseado com escabeche de uvas e cebola roxa, ceviche de atum rabilho dos açores, sushi de atum com tempura de batata doce, pargo selvagem com batata vitelote e peixinhos da horta, bacalhau asiático com couve bok choi e arroz de bambu selvagem e ainda um bacalhau mais português, escalfado em azeite com esmagada de batata e nabiças. O destaque vai para o ceviche, o atum braseado e para o bacalhau asiático. A sobremesa foi uma tarte tartin de maçã servida com um surpreendente gelado de violeta. O vinho da casa é Quinta da Pacheca e revelou-se uma boa companhia. O Peixe na Avenida fica ao fundo da rua Conceição da Glória, no número 2, na esquina com a Avenida da Liberdade. Encerra à segunda, sábado e domingo aberto ao jantar. Telefone 309765939
DIXIT - “Como se estão a criar muitos compromissos futuros assentes numa economia de redistribuição, e não numa economia de investimento, temo que no futuro fiquemos na maré vazia e sem calções, como já sucedeu” - João Duque, professor do ISEG, sobre o Orçamento de Estado
GOSTO - Da frontalidade da comunicação ao país de Marcelo Rebelo de Sousa na noite de terça-feira
NÃO GOSTO - Do cinismo da comunicação ao país de António Costa na noite de segunda-feira
BACK TO BASICS - «O Estado é o mais frio de todos os monstros. Ele mente friamente. Da sua boca sai esta mentira: “Eu, o Estado, sou o povo.”» - Nietzsche.
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