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A CULTURA NO MINISTÉRIO DAS FINANÇAS - Daqui a menos de um mês, a 10 de Outubro, o Governo apresentará a sua proposta de Orçamento de Estado que, além das grandes linhas gerais, terá o enquadramento para alterações que possam existir na política fiscal. Uma das alterações pretendidas é uma reivindicação das galerias de arte e traduz-se na possibilidade de aplicação de IVA à taxa reduzida de 6%, possibilidade prevista aliás numa directiva comunitária. No início deste ano a taxa de IVA aplicável nestas vendas variava entre 11.5% e 14,5%. Inexplicavelmente, pouco tempo depois de a anterior Ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, ter declarado, na inauguração da feira ARCO Madrid, que considerava fundamental que o IVA reduzido se aplicasse aos galeristas, o Ministério das Finanças aplicou à venda de obras nas galerias de arte a taxa de IVA de 23%, muito além dos 6% de taxa reduzida pretendidos. A situação é bem diversa em França, Alemanha, Itália, Luxemburgo e brevemente também na Bélgica, onde, na aplicação da referida directiva comunitária, a taxa foi reduzida para os valores mínimos de IVA existentes nesses países, alguns abaixo dos 6%. A divergência pública entre Dalila Rodrigues e o Ministério das Finanças pôs mais uma vez a nu a dificuldade de entendimento entre estas duas áreas do Governo. Na realidade o que se passa é que ou a pasta da Cultura é dirigida por alguém com peso político capaz de se fazer ouvir, ou as Finanças abafam qualquer veleidade de proporcionar incentivos fiscais ao desenvolvimento do mercado de bens culturais e das indústrias criativas. Cabe ao Governo em primeira instância, e eventualmente também às oposições, aquando da discussão do OE na especialidade, incluir a venda de obras de arte em galerias no valor da taxa mínima de IVA. A actual Ministra, que acumula a Cultura com a Juventude e o Desporto, é hábil em fazer de conta que ouve, enquanto deixa as coisas correrem sem as resolver - prova aliás do fraco peso político que tem. Entretanto o mercado afunila, as vendas este ano estão abaixo dos valores do ano passado e começa a desenhar-se uma crise no sector. É mais barato comprar uma obra de um artista português na representação de uma galeria portuguesa em Paris do que fazê-lo em Lisboa. As galerias, que são de entrada livre, não têm subsídios e são tanto a montra de divulgação de novos talentos como a de consagrados. Todos os artistas necessitam da actividade das galerias, não só no país, como nas feiras internacionais onde os galeristas levam as suas obras, contribuindo assim para a afirmação da cultura portuguesa no estrangeiro. As galerias, sublinhe-se, não pedem um subsídio, pedem um incentivo fiscal que permita dinamizar o mercado. Os mais cínicos, raça abundante entre governantes e políticos de várias origens, dirão que essas questões da Cultura são um problema menor e agem em conformidade. É o país que temos, a Ministra que temos, o Primeiro-Ministro que temos.
SEMANADA - Vítor Escária, o chefe de Gabinete de António Costa que tinha 75.800 euros em numerário numa estante da sua sala de trabalho em S. Bento, de origem mal explicada, foi premiado com o cargo de director do Instituto Superior de Gestão, passados 674 dias sobre a busca policial que encontrou o dinheiro e desencadeou a queda do Governo de António Costa; um inquérito recente indica que 49% dos portugueses não se identificam com um partido; o número de passageiros nos aeroportos portugueses cresceu 4,9% de janeiro a julho, face a igual período no ano passado, para um total de 42 milhões de passageiros que se movimentaram nos primeiros sete meses do ano pelos aeroportos nacionais; desses, o Aeroporto de Lisboa movimentou 49,1% do total de passageiro; de janeiro a agosto houve 81 813 óbitos em Portugal, mais que no mesmo período do ano passado; no hospital de D. Estefânia em 2020 apenas uma criança estava em lista de espera para cirurgia de ortopedia, agora são 280 e o prazo de espera pode chegar aos 4 anos; entre janeiro e julho celebraram-se em Portugal 19 630 casamentos, mais 372 do que no mesmo período de 2024; dos jovens cujos pais têm apenas o ensino básico apenas 23% concluíram o ensino superior; nos primeiros seis meses do ano as queixas de violência doméstica subiram 26% e foram identificadas 21 mil vítimas; no primeiro semestre deste ano as queixas em relação às urgências hospitalares aumentaram 90% face ao mesmo período do ano passado.
O ARCO DA VELHA - Um professor de Educação Moral e Religiosa condenado a oito anos de prisão, por 62 crimes de abuso sexual de menores, Fernando Silvestre, foi colocado no Agrupamento de Escolas de Gondifelos, em Famalicão.

CONVERSA DE ARTISTAS - Existe um quadro de Manuel Dacosta intitulado “Cão a Uivar à Lua”, que remete para uma expressão popular que relembra que o uivo é uma forma de comunicação à distância entre animais. A imagem da comunicação é boa, e aplica-se a uma nova recolha de textos de Delfim Sardo precisamente intitulada “Uivar à Lua”. Delfim Sardo, historiador de arte, professor e curador, agrupou em cerca de 350 páginas textos que foi produzindo sobre a obra de 23 artistas, dois dos quais arquitectos, e que inclui nomes como José Pedro Croft, Julião Sarmento. Lourdes Castro, Luísa Cunha, Michael Biberstein, João Onofre, Rui Sanches, Sara Bichão, Alberto Carneiro, Gordon Matta-Clark, Gustavo Sumpta, Helena Almeida, Carrilho da Graça, Aires Mateus, entre outros. Estes textos, foram feitos entre 2013 e 2025, e quase todos foram escritos para catálogos de exposições ou a convite de artistas e curadores. Os ensaios de “Uivar à Lua, sublinha Delfim Sardo, tentam compreender os processos criativos dos artistas e “partem de relações de cumplicidade, “frequentemente inseparáveis das opções curatoriais que os enformaram, e são, por isso, muito físicos, influenciados pela convivência com os autores e com as obras, mesmo quando foram escritos já na sua ausência”. Edição Tinta da China.

PINTURAS ESCRITAS - Ver numa galeria uma espécie de banda desenhada criada por um artista plástico é uma ideia desafiadora. A Ocupart associou-se à Galeria Sá da Costa para a exposição “ O Circo do Senhor Clyde Beatty” uma narrativa visual de pinturas de Pedro Zamith com textos de Hugo Barreiros. Zamith estudou pintura, cenografia e figurinos e Barreiros estudou teatro, e escreve argumentos para cinema, televisão e peças de teatro. Este é o primeiro projecto dos dois, num cruzamento entre as artes plásticas e a palavra. Inspirado na figura histórica do domador americano Clyde Beatty (1903–1965), Pedro Zamith “explora com ironia o universo decadente e fascinante do circo clássico e propõe uma reflexão visual sobre o lado sombrio, grotesco e profundamente humano do espetáculo” - assinala a galeria. As obras apresentadas, pintura, desenho e texto sobre tela, dão vida a diversas personagens e os textos acrescentam ironia às figuras representadas. Hugo Barreiros conta que “o processo de criação foi partilhado. Uma palavra pode ser pintada de muitas formas diferentes tanto quanto uma pintura pode ser descrita por milhares de palavras. Eu escrevia um mundo e o Pedro contrapunha com uma pintura, ou Pedro pintava um mundo para eu escrever. Nunca foi muito claro quem escrevia para quem pintar ou quem pintava para quem escrever.” Até 11 de Outubro na Sá da Costa, Rua Serpa Pinto, 19, ao Chiado.

ROTEIRO - Em 1975 Fernando Negreira tinha 18 anos e como tantas outras pessoas integrou-se nas brigadas de alfabetização que foram pelo país fora integradas nas Campanhas de Dinamização Cultural do MFA. Negreira, apaixonado desde cedo pela fotografia, documentou o que viu e que mais tarde mostrou na Associação Académica de Coimbra e numa exposição colectiva no Palácio Foz, em Lisboa. Foi o princípio de uma carreira de fotojornalista que assinala agora 50 anos de trabalho com a exposição “Monochrome 50”, na Casa da Imprensa até 14 de Novembro, com curadoria de Paulo Alexandrino e Paulo Petronilho, organizada pelo colectivo CC11 (Rua da Horta Seca 20). Ao longo dos anos Fernando Negreira trabalhou em numerosos jornais e revistas, e foi também editor fotográfico em algumas dessas publicações. Negreira sublinha que “esta não é uma retrospectiva de vida mas um apontamento pessoal de imagens captadas entre 1975- 1980, uma espécie de recolha paralela à vida profissional de um fotógrafo de imprensa”. Na imagem uma das fotos dessa época. Mais fotografia nos Jardins do Bombarda, numa série de exposições promovidas também pelo colectivo CC11 que na sua Mostra de Fotografia de Autores apresenta “Blessed Ground” de Ricardo Lopes, “Almas em Cura” a partir da colecção de fotografia do antigo Hospital Miguel Bombarda, “Brava” de Ricardo Rocha sobre o universo das touradas e “Cante”, de Ana Baião, todas até 5 de Outubro. E na galeria Narrativa (Rua Dr. Gama Barros, 60) está em exposição até 25 de Outubro “Temporada Turva”, de João Salgueiro Batista, trabalho vencedor do prémio FNAC Novos Talentos de fotografia.

BOWIE COMPILADO - A coisa é gigantesca. uma caixa com 13 CD’s ou 18 LP’s que agrupa um conjunto extenso de gravações de David Bowie, em novas versões remasterizadas e algumas gravações até agora não editadas de concertos. O título da caixa é “I Cant Give Everything Away (2002-2016)”. Aqui estão os discos “Heathen” (2002), “Reality” (2003), “A Reality Tour” (com 33 faixas dos concertos da derradeira digressão de Bowie feita em 2003 com quase centena e meia de concertos), “The Next Day” (2013); “The Next Day Extra “(2013), “Blackstar “ (o seu derradeiro álbum de originais editado dias antes de morrer, em 2016), o EP “No Plan “ (2017) e um conjunto de 44 faixas, em três CD’s, com remisturas para singles e colaborações com nomes como Lou Reed, Earl Slick, David Gilmour, Kristeen Young, ou Arcade Fire. Também estão neste lote os lados B de singles, remisturas feitas para rádio, excertos de bandas sonoras, faixas extras de várias edições especiais e versões alternativas às que foram editadas nos álbuns. Ao todo são 12 horas de música com 163 faixas. Além das edições físicas em CD e LP esta compilação está disponível nas plataformas de streaming.
DIXIT - “O Estado português prefere investir em coisas novas e muitas vezes inúteis em vez de reparar e modernizar o que tem” - Luís Marques, no Expresso
BACK TO BASICS - “Não há mérito especial para um humorista quando o governo faz o trabalho por ele” - Will Rogers
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
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