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COMISSIONISTAS - Ao longo de quatro décadas criou-se em Portugal uma raça a que vou chamar de comissionistas políticos. Cresceram a cobrar, sempre discretamente, comissões pela sua actividade onde quer que tivessem uma réstea de poder. Desenvolveram-se em todos os partidos e quadrantes ideológicos e foram fazendo a sua actividade em benefício das suas organizações partidárias, locais ou nacionais, de grupos de pressão, de organizações amigas a que depois ficavam ligados e, nalguns casos, em proveito próprio. As comissões tinham mil caras - desde as que estavam impressas nas notas de papel moeda até às trocas de favores ou obtenções de sinecuras futuras. A sucessão de casos foi crescendo ao longo dos anos e foi-se estendendo também na administração pública e nalgumas empresas. Mais cedo ou mais tarde as coisas começam a dar nas vistas em demasia e foi isso que agora aconteceu. Durante muito tempo proliferou o discurso que acusava a justiça de só perseguir os pobres e indefesos; mas mal o aparelho judicial começou a perseguir banqueiros, altos funcionários, políticos no activo ou na reforma, ex-governantes e dirigentes partidários, começou um imenso clamor de protesto de que havia intenções políticas detrás das acções da justiça. E assim chegamos ao ponto em que pensadores de diversos matizes se deixam envolver mais pelo sentimento do que pela razão e se tornam cegos. Fernando Sobral escreveu, aqui neste jornal, que se criaram as condições para uma pergunta assassina, em termos sociais e políticos: “és a favor ou contra Sócrates?” E acrescentava: “se a política se reduzir a isto estamos perdidos”. Mas é isso mesmo que está a acontecer, como desde quinta-feira se tornou bem patente, graças ao contributo de Mário Soares para a questão. Subjacente a tudo isto está um princípio, de que a esquerda não abdica: ela é intocável e intrinsecamente honesta, e a direita é a mãe de todos os vícios e fundamentalmente desonesta. Ou seja, a esquerda é o Bem e a direita é o mal. Este raciocínio maniqueísta tem ainda mais décadas que a existência de comissionistas políticos em Portugal - mas é o raciocínio da moda, que comanda o sentimento sobre a razão. É o raciocínio solidário:  Sócrates é de esquerda e, portanto, não pode ser desonesto; se o acusam é porque se trata de uma manobra política, obviamente desonesta e de direita. Estarmos reduzidos a isto é uma tristeza. E há ainda outra coisa: os mesmíssimos políticos que gostam de jogar com a velocidade e agilidade mediática quando estão a fazer guerrilha e chicana, são os que agora se lamentam pela excessiva atenção dada pelos media a este caso, não se recodadndo que foi a mesma atenção dada a outros recentes onde não viram nada de excessivo. No fundo não compreendem uma coisa básica: a velocidade da justiça e a velocidade do sistema mediático são coisas diferentes. E ainda bem. Talvez preferissem que não houvesse velocidade. Ou seja, que nada se movesse. Presumo que escuso de citar Galileu.

 

SEMANADA - PS e PSD juntaram-se pela primeira vez nesta legislatura para apresentarem uma proposta de reposição das subvenções aos políticos, mas passados dias os seus proponentes tiveram que a retirar; duas dezenas de deputados declararam manter colaborações regulares com orgãos de comunicação; na semana seguinte à prisão de vários altos quadros do Estado no processo dos vistos gold o ex-Primeiro Ministro José Sócrates foi detido sob a suspeita de corrupção e branquamento de capitais; o advogado que apareceu a defendê-lo já tinha pedido há um mês atrás cópias dos despachos que ordenaram a destruição das escutas dos telefonemas entre Sócrates e Armando Vara; a detenção ocorreu na noite de sexta feira e o advogado João Araújo apareceu como seu representante no dia a seguir; Mário Soares foi visitá-lo à prisão na quarta-feira e disse que ele era um homem exemplar; Pedro Silva Pereira, um dos mais próximos colaboradores de Sócrates, esteve mais de 72 horas sem se pronunciar publicamente sobre a detenção do ex-Primeiro Ministro; um grupo de jovens eborenses, alunos de arquitectura, tirou selfies à porta da prisão onde está José Sócrates logo no dia em que ele chegou; depois da visita de Mário Soares José Sócrates distribuíu um comunicado a considerar a sua detenção “um abuso”; segundo a Marktest no último fim-de-semana o nome de José Sócrates foi o mais mencionado nas redes sociais, sobrepondo-se a todos os outros assuntos, personalidades ou marcas; ainda segundo a Marktest em apenas dois dias foram divulgadas cerca de três mil notícias relacionadas com o ex-Primeiro-ministro; o investimento estrangeiro estava a subir 641% até à crise dos vistos gold; em dois anos fecharam mil lojas de compra e venda de ouro; o fisco penhorou 197 imóveis por dia desde o início do ano; há 73 queixas por dia de violência doméstica em Portugal; de 2009 até agora houve 4605 pessoas que mudaram de nome; o Estado arrecadou mais de 30 mil milhões de euros de impostos até Outubro, um aumento de mais 2 mil milhões em relação a igual período do ano passado.

 

ARCO DA VELHA - O ex-procurador Pinto Monteiro afirmou que, no almoço que teve com José Sócrates em Lisboa na semana em que o ex-Primeiro Ministro foi detido, apenas falaram de livros e de viagens.

 

FOLHEAR - Esta é a altura em que a “Monocle” chega à sua edição dupla, de Dezembro/Janeiro, que este ano tem cerca de 270 páginas. O tema da edição é o “soft power”, a capacidade de um país exercer  poder e ganhar reconhecimento  através da sua diplomacia e da sua presença no mundo. A lista de 30 países resulta do relatório de um think-tank britânico, The Institute For Government. Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Japão e França ocupam os cinco primeiros lugares de uma lista de 30 países, na qual Portugal está na 24ª posição. Nesta edição há ainda um destaque para o Top 50 dos viajantes e para Antuérpia, além da Art Basel de Miami. Finalmente, na capa, uma fotografia de um eléctrico bem lisboeta é o chamariz para um especial destacável, um guia de Portugal.  A edição deste guia resulta do esforço conjugado do Turismo de Portugal com o interesse há muito manifestado pela revista em relação ao nosso país - é rara a edição em que não se encontra alguma coisa seja sobre Lisboa ou Porto ou sobre criadores ou artesãos portugueses que estão a marcar a diferença.  O guia sobre Portugal tem 36 páginas e, como é hábito nestes guias da “Monocle”, tem recomendações sobre sítios onde ficar, onde comer e lugares a visitar, sobre lojas e pequenas indústrias, além de múltiplos dados sobre o país. Lisboa, as praias do surf, o Alentejo, o Algarve, o Porto, o Douro e o Minho são as zonas em destaque, com boas e acertadas sugestões. Já agora a revista anuncia que a 17 e 18 de Abril realizará em Lisboa a “The Monocle Quality Of Life Conference” que abordará temas desde urbanismo até ao comérico, passando pela indústria da restauração e hotelaria,  ou ainda o artesanato e ofícios criativos. E a 5 de Dezembro o grupo que edita a “Monocle” lança uma nova publicação, um almanaque anual intitulado “The Forecast”, que em 240 páginas promete ensaios fotográficos, reportagens e análises. Já falta pouco.

 

VER - Hoje recomendo-vos uma visita à Fundação Louis Vuitton, o edifício junto ao Bosque de Bolonha, no 16º Bairro de Paris, onde Frank Gehry concebeu e construíu um edifício extraordinário, encomendado por Bernard Arnault, o Presidente do grupo de produtos de luxo LMVH, para albergar um museu e centro cultural que teve um investimento de construção de perto de 150 milhões de dólares. A visita, para quem está em Lisboa e para aguçar o apetite, é fácil e barata. Basta ir a www.fondationlouisvuitton.fr e começar a percorrer o site. Aí poderão encontrar informação sobre as actividades, mas também registos de eventos recentes - desde o concerto inaugural de Lang Lang em Outubro até uma recente actuação, já em Novembro, dos Kraftwerk. Encontrarão também uma visita electrónica à obra do ponto de vista arquitectónico, que tembém pode ser vista através de uma aplicação disponível para smartphones. Ainda nesse campo existe também uma aplicação, concebida especialmente para crianças, que lhes permite fazerem uma visita virtual a esta obra de Gehry, “Archi Moi”, disponível para iPad.

OUVIR - Poucos discos me agarraram e surpreenderam tanto como “Down Where The Spirit Meets The Bone”, o álbum que a norte-americana Lucinda Williams editou em Outubro. Aos 61 anos é o seu primeiro duplo CD e inclui 18 temas originais, além de uma canção, “Compassion”, que abre o disco, feita a partir de um poema do seu pai, Miller Williams, e de uma versão de um tema de JJ Cale, “Magnolia”, que encerra o álbum. Além disso este é o disco de estreia da sua própria editora, Highway 20 Records. A produção é dela própria, de Tom Overby, seu marido, e de Greig Leisz. Entre os músicos está a secção rítmica de Elvis Costello, o trio Jackshit, ou o guitarrista Bill Frisell. A base da música de Lucinda Williams é a country, com incursões frequentes nos blues. Aliás o segundo CD do álbum é assumidamente bluesy. Eu não gosto muito de dizer coisas destas, mas ouvindo vez após vez este disco, e a diversidade e intensidade das suas canções, ocorre-me que este é uma daqueles momentos em que o título de obra de carreira se pode aplicar. Definitivamente um dos grandes discos de 2014. (Highway 20 Records, na Amazon)

 

PROVAR - No meio da proliferação das hamburguerias de todos os feitios e padrões vale a pena referir uma casa inaugurada há pouco tempo sob o nome “A Loja”. Fica perto do Liceu Maria Amália, entre a Artilharia Um e a Rua Castilho, cá para cima, do lado da Marquês da Fronteira - esta é aliás uma rua de boa memória em matéria de restauração. A Loja tem uma decoração leve e confortável, o pessoal é simpático e, como se exige numa casa destas, a carne é de boa qualidade, saborosa - e na cozinha sabem fazer o hamburguer mal passado (e é aí que se percebe que a carne que serve de base é boa). Há umas surpresas que vão variando mês a mês - em Outubro houve o hamburguer tártaro, em Novembro o de alheira com grelos salteados, vamos lá a ver que hamburguer traz o Pai Natal em Dezembro. Enquanto não se conhece o menu surpresa de Dezembro uma boa hipótese é o hamburguer da Loja, que leva cebola caramelizada e queijo gruyére. As batatas fritas são mesmo caseiras, grossas e vêm no ponto, sem óleo a escorrer. Há uma dúzia de variedades de hamburgueres, no prato ou no pão, tábuas de petiscos para uma conversa ao fim da tarde, saladas e sopas para as dietas e, nos doces, uma tentadora mousse de chocolate da casa e, se ainda não tiver esgotado a célebre e única A Tarte de amêndoa.  A Loja fica na Rua D. Francisco Manuel de Mello 26.

 

DIXIT - “Não é uma Justiça igual para todos que destrói a democracia - é a impunidade” -  Luis Rosa, no “i”.

 

GOSTO - Os turistas que visitam Lisboa descobriram as castanhas assadas e tornaram-se compradores frequentes do petisco.

 

NÃO GOSTO - Da maneira sistemática como se repetem inundações em Lisboa cada vez que a chuva é mais intensa.

 

BACK TO BASICS - “Os políticos deviam ler livros de ficção científica em vez de histórias de detectives e de crimes” - Arthur C. Clarke

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