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O COMBOIO DA POLÍTICA - Em circunstâncias normais saltar de um comboio em andamento é uma actividade perigosa. Mas no reino da política saltar de um veículo em movimento é uma habilidade rentável. Passo a explicar: é muito frequente assistir a que algum partido ou político, depois de estar no poder bastante tempo, deixando desenvolver ou mesmo incentivando políticas com efeitos negativos, tenha uma amnésia total sobre as suas responsabilidades quando perde eleições e abandona o poder. Presumo ser frequente que ao saltar do comboio em andamento tenham batido com a cabeça nalgum sítio e perdido a memória. É por exemplo o que acontece com o PS na Câmara Municipal de Lisboa que, durante os anos em que através de Costa e Medina governou a cidade deixou crescer desordenadamente o alojamento local, impulsionou as circunstâncias que ditaram a especulação imobiliária e assim fez muita gente, dos mais velhos aos novos, abandonar Lisboa. Mais: permitiu que crescessem sem limite TVDE’s e TukTuks e atribuíu às juntas de freguesia responsabilidades na limpeza da cidade sem lhes dar os meios correspondentes para a execução da tarefa, acabando assim por causar problemas na recolha do lixo, criando uma imagem de cidade suja. Claro que agora o PS e os seus aliados de então, com destaque para o Bloco e o Livre, aparecem a criticar os efeitos daquilo em que estiveram envolvidos - o Bloco até teve um vereador que participou numa operação imobiliária especulativa. Outra curiosa ligação dos comboios com a política sucede quando algum partido ou político quer saltar para dentro de um comboio em movimento. É o que se verifica quando, no meio de uma onda de protestos ou reivindicações, resolvem assumir a defesa de causas que ignoraram durante os anos em que mandaram, apanhando agora a boleia de quem protesta. Este amor aos comboios, à amnésia e aos protestos vai ser engraçado de seguir ao longo de 2025 até à realização das autárquicas, lá mais para o fim do ano. Para já Carla Tavares, a nova presidente da Federação da Área Urbana de Lisboa do PS, definiu como prioridade do partido nas próximas autárquicas a habitação acessível, a mobilidade, segurança, transição climática e justiça social, áreas onde os problemas que existem nasceram, na maioria, durante a governação do PS na cidade (e no país nalguns casos). Alexandra Leitão, uma combativa especialista em amnésia selectiva e em contorcionismo político, como se tem visto no Parlamento, vai ser um osso duro de roer na campanha para Lisboa. Enganam-se os que pensam que a vida ficou mais fácil para Moedas.
SEMANADA - Mais de um quinto das mortes na estrada estão ligadas a excesso de álcool e são os condutores entre os 40 e os 49 anos que bebem mais; só na área de intervenção da PSP, os centros urbanos, verificaram-se no ano passado 58.434 acidentes rodoviários, dos quais resultaram 79 mortes, mais oito que em 2023; Alcácer do Sal é o concelho com maior número de acidentes com vítimas por mil habitantes; 216 peões morreram atropelados em 2022 e 2013 e nos primeiros seis meses de 2024 morreram mais 35; mais de 11 mil condutores sem carta foram detidos no ano passado; os acidentes com tratores agrícolas provocaram pelo menos 52 vítimas mortais em 2024, mais 21 mortes do que as registadas no ano anterior e o distrito de Bragança foi o que registou mais acidentes fatais, com nove óbitos; o número de docentes do ensino superior com mais de 60 anos quase duplicou na última década; a disciplina de Português como Língua Não Materna apenas chegou a 12% dos 14 mil alunos estrangeiros; o carregamento de carros eléctricos aumentou 66% num ano; actualmente com 119 anos de existência, a livraria Lello, no Porto, recebe 3500 visitantes por dia e vende um milhão de livros por ano; graças ao turismo, comércio e restauração o PIB dos Açores cresce acima da média do país; só 4% das cauções de água, luz e gás foram devolvidas aos consumidores, e isto ao fim de 25 anos da mudança da lei que acabou com essa prática; o valor médio de renda pago pelos inquilinos subiu 7% em 2024, o maior aumento dos últimos 30 anos; num inquérito recente 46% dos portugueses indicaram viagens como a sua principal intenção de consumo para 2025.
O ARCO DA VELHA - O novo Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa revelou que a instituição paga milhares de euros de rendas por imóveis que nem sequer utiliza.
UM OLHAR ÚNICO - Esta história é maravilhosa e conta como um dos mestres da fotografia, o japonês Eikoh Hosoe, e o grande escritor, também japonês, Yukio Mishima, se conheceram: em 1961 Hosoe foi convidado por Mishima para o fotografar para um livro de ensaios que Mishima ia publicar, “The Attack Of Beauty”. Pretendia uma fotografia de capa menos convencional. Quando se encontraram, Hosoe perguntou: “Sr. Mishima, quer dizer que posso fotografá-lo à minha maneira?” - “Eu sou o seu objecto de estudo, fotografe-me como quiser, Sr. Hosoe”, respondeu Mishima. Esse foi o começo de “Barakei”, a famosa obra de Hosoe publicada em 1963, no Japão, e que levou o título “Ordeal By Roses” em inglês. “Barakei” é um livro e uma série fotográfica sobre a vida e o sofrimento, centrada na figura de Yukio Mishima, cujo centenário do nascimento se celebrou a 14 de Janeiro de 2025, simbolicamente o dia da inauguração desta primeira exposição de Eikoh Hosoe em Portugal, na Ochre Space, um espaço dedicado à fotografia fundado por João Miguel Barros, ele próprio também fotógrafo e estudioso de fotografia contemporânea. Na Ochre, numa montagem muito bem conseguida, estão dezena e meia de fotografias de “Barakei” e ainda vários dos livros de Hosoe, que ali podem ser comprados. Dia 8 de Fevereiro, a partir das 16.00, a Ochre Space realiza uma conversa de encerramento da exposição dedicada a Eikoh Hosoe sob o tema “Hosoe e Mishima juntos na Imortalidade”, com a presença de José Bértolo, professor na Universidade Nova, Tânia Ganho, autora e tradutora da obra de Yukio Mishima em Portugal, e João Miguel Barros. Recentemente falecido, Hosoe foi um dos grandes visionários da fotografia contemporânea, e esta exposição, preparada há mais de um ano ainda com o seu conhecimento, será a primeira no mundo após a sua morte. A Ochre Space fica na Ajuda, Rua da Bica do Marquês 31 A e a exposição pode ser visitada de quarta a sábado, das 15h30 às 18h30.
ROTEIRO - Na Galeria Quadrum (Palácio dos Coruchéus, Rua Alberto Oliveira 52, Lisboa), Manuel Santos Maia apresenta uma exposição evocativa das suas próprias memórias de infância, no Norte de Moçambique, em Nampula. A exposição conta histórias da família do artista e da cultura macua e também aborda as mudanças ocorridas em Moçambique desde que há 50 anos se tornou independente. Na exposição “Nampula, Macua Socialismo” podem ser vistas fotos antigas, objectos de viagens, uma maquete de bronze da sua primeira casa, uma carta que evoca memórias passadas, tecidos e música macua. No fundo, como salienta Manuel Santos Maia, cada peça conta um fragmento da sua história e “ajuda a perceber o passado, mostrando como as pessoas de diferentes lugares estão todas ligadas.” Com curadoria de João Sousa Cardoso a exposição (na imagem) fica patente até 20 de Abril na Quadrum. Destaque ainda para as novas obras de Miguel Navas expostas na Casa da Cultura de Setúbal, sob o título “Entre o silêncio e a paisagem” e, no mesmo local, Catarina Real apresenta uma série de serigrafias sob o título “composição, roubo e autoria”. E finalmente no Centro de Arte Manuel de Brito (Campo Grande 113), pode-se ver uma exposição que assinala os 25 anos da morte de António Palolo.
UM OBRA EXCEPCIONAL - “Confissões de Uma Máscara” é um romance autobiográfico de Yukio Mishima, editado originalmente em 1949, agora reeditado no centenário do seu nascimento. Esta edição retoma a tradução feita por António Mega Ferreira que, no texto de apresentação, sublinha que “esta é uma das obras de mais desafiante leitura no conjunto da vastíssima obra que nos foi legada por Yukio Mishima”. O autor tinha 24 anos quando escreveu este livro, que o consagrou como um dos mais importantes escritores japoneses do pós-guerra. “Confissões de Uma Máscara” narra a sua vida desde o nascimento à juventude, numa análise sobre identidade, pulsão sexual e procura da conformidade e o assumir da sua homessexualidade. «O que eu tentei com a escrita deste livro foi uma espécie de arte de renascer. Sou uma sofisticada e inútil contradição. Este romance é a prova fisiológica disso», terá escrito Mishima ao seu editor Kazukame Sakamoto. Esta é a voz de um jovem no Japão do pós-Segunda Guerra Mundial, um jovem que, no rígido Japão imperial onde não há lugar para impulsos transgressivos, tem de usar uma máscara, sempre, a todo o custo. Yukio Mishima é o pseudónimo de Kimitake Hiraoka, que nasceu em Tóquio em 1925 e suicidou-se, praticando o ritual japonês seppuku, a 25 de novembro de 1970, manifestando assim a sua discordância perante o abandono das tradições japonesas e a aceitação acrítica de modelos consumistas ocidentais. Edição Livros do Brasil, colecção Dois Mundos.
A GUITARRA DO JAZZ - Gravado originalmente em 2014, este disco do guitarrista dinamarquês JaKob Bro esteve uma década guardado nos arquivos da editora ECM, que finalmente o decidiu lançar em finais de 2024. Sob o título “Taking Turns” o álbum mostra Bro ao lado de nomes como o saxofonista Lee Konitz, o guitarrista Bill Frisell, o pianista Jason Moran, o baixista Thomas Morgan e o baterista Andrew Cyrille. Konitz que morreu em 2020 vítima de Covid, é uma presença marcante neste disco, que evidencia a sua cumplicidade musical com os outros músicos e em especial com JaKob Bro e Thomas Morgan. É difícil destacar temas neste álbum mas “Black is All Colors at Once” e “Haiti” são exemplos do virtuosismo de Konitz, “Pearl River” um bom exemplo do trabalho conjunto de todos os músicos e “Mar Del Plata” é o momento para ouvir a forma como Bill Frisell toca guitarra e como se articula com Jakob Bro. “Taking Turns” está disponível nas plataformas de streaming.
AQUI AO LADO - O governo espanhol anunciou a intenção de criar uma taxa de até 100% sobre a compra de imobiliário por cidadãos de países fora da União Europeia, como forma de combater o aumento dos preços da habitação.
DIXIT - “Como lembrava o filósofo, a maior inimiga da esquerda continua a ser a realidade” - João Pereira Coutinho
BACK TO BASICS - “É muito perigoso um candidato a eleições dizer coisas de que as pessoas se podem vir a recordar” - Eugene McCarthy
A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE NEGÓCIOS
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