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TEATRO - Achei muito curioso que, à medida que os dias foram passando, o foco das redes sociais tenha deixado de ser o fim do Teatro da Cornucópia e passado a ser o protesto contra a visita que Marcelo Rebelo de Sousa fez no dia, anunciado publicamente, do encerramento das portas ao público. O mais curioso de tudo é que muitas pessoas que se insurgem geralmente contra a apatia dos poderes e dos políticos perante a cultura, desta vez insurgiram-se contra o facto de o Presidente da República ter mostrado preocupação com uma companhia de teatro referencial no nosso panorama artístico. Não houve idêntica preocupação por parte do apagado ser que foi proclamado Ministro da Cultura, e que se viu obrigado a alterar os seus planos de fim de semana para ir ter com o Presidente e encarar a situação de frente, o que antes nem lhe passava pela cabeça fazer; nem se ouviu tão pouco palavra dessa espantosa criatura, que gere esta área de actuação, o secretário de Estado, que, de Honrado, na acção política, tem apenas o nome. O que me quer parecer é que a visita de Marcelo Rebelo de Sousa incomodou todos os que se ficaram pelas palavras e posts no Facebook, na função habitual de carpideiras. Num assomo de interesse pela Constituição multiplicaram-se os que disseram que o Presidente estava a sair da sua esfera de competências. Esses e mais uns tantos clamaram pelo fim da ingerência de Belém nas acções de S. Bento, coisa curiosa vinda de quem, há tempos, tanto dizia, defendia e pugnava pelo contrário. Por muito que me espante não vejo onde está o problema - Marcelo sempre se interessou por temas culturais e ainda por cima, é público, gosta de Teatro, e não estou a ser irónico. E, em abono da verdade se diga, seja qual fôr o desfecho de tudo isto, que também não me causa engulhos que haja na atribuição de subsídios critérios de mérito - desde que se assumam de forma clara. A realidade é que, usando subterfúgios, em diversas áreas, o mérito e o peso histórico de alguns criadores sempre foi reconhecido, em todos os governos, em todos os regimes, em todas as épocas. O estranho é avaliar da mesma forma quem começa e quem é referência. O cinismo aplicado em regulamentos é a arte dos indigentes. E dos oportunistas.
SEMANADA - Os custos da habitação pesam cerca de 32% no orçamento das famílias portuguesas; mais de 1700 famílias foram despejadas em 2016; a lista de espera de habitação social é composta por quase quatro mil famílias; o índice dos preços de habitação aumentou 7,6% no terceiro trimestre deste ano; 37% dos novos contratos de trabalho foram feitos com salário mínimo; este ano os CTT contam receber cerca de 200 mil cartas dirigidas ao Pai Natal; neste Natal cada consumidor português deverá gastar 373.35 euros, mais 25% que em 2015; as compras no comércio de rua tradicional estão a aumentar, em detrimento dos centros comerciais; em Lisboa os Sapadores Bombeiros realizam cerca de 20 mil intervenções por ano; os incêndios deste ano provocaram a destruição de mais de 8% do Parque Nacional da Peneda-Gerês; este ano arderam 160 mil hectares no continente, dos quais 14 mil em áreas protegidas; em 2016 a criminalidade geral desceu 6,5% mas a chantagem sexual por actividades nas redes sociais e na net aumentou; apenas 1,5% dos inquéritos sobre pornografia infantil resultam em acusação; o Bareme Imprensa da Marktest quantifica em sete milhões o número de portugueses que contactam regularmente com jornais ou revistas.
ARCO DA VELHA - Cristina Pinto, uma desempregada de Felgueiras, criou um bolo que pretende representar Portugal, e a que chamou Dom Marcelo, em homenagem ao Presidente da República.
FOLHEAR - A mais recente edição da colecção “Livros Amarelos” inclui “A Noite Que Foi Natal” de Jorge de Sena, a “Carta do Pai Natal” de Mark Twain e “Os Mortos”, de James Joyce. Esta colecção é feita com o objectivo de mostrar, e dar a ler, o diálogo entre ensaios, contos, poemas ou novelas, procurando as relações que existem entre textos célebres. “A Noite Que Fora de Natal” foi escrita por Jorge de Sena em 1962 e a “Carta do Pai Natal” reproduz um texto de Mark Twain escrito em 1895, em resposta a uma carta enviada pela sua filha Susy ao Pai Natal, em seu nome e em nome da irmã mais nova, fazendo uma série de pedidos. É um texto marcante, onde é impossível não vislumbrar a ternura de Twain pela sua filha, as brincadeiras que imaginou para que ela pudesse falar directamente com Santa Claus. Finalmente, “Os Mortos” é o derradeiro conto, short story melhor dizendo, de “Dubliners”, de 1914 - e por acaso é, em dimensão, o maior de todos. É também considerado como o expoente das short stories em língua inglesa e já serviu de inspiração a um filme realizado por John Huston e a um musical da Broadway. E é um texto fascinante.
VER - Pode ver-se o “Memorial do Convento”? Até aqui podia apenas ler-se, agora já se pode visualizar. O editor José Cruz dos Santos imaginou uma edição especial da obra, ilustrada por João Abel Manta e prefaciada por Carlos Reis, uma ideia que de imediato seduziu José Saramago, poucos anos antes da sua morte. João Abel Manta fez uma série de 20 ilustrações, até agora inéditas, já que a projectada edição nunca se chegou a concretizar. A “Guerra & Paz” conseguiu ressuscitar o projecto e fez agora essa edição, numa tiragem única e limitada de 500 exemplares, que mostra exactamente a edição que havia sido pensada e criada entre 2005 e 2010, mas que nunca havia sido concretizada. A edição é graficamente magnífica, capa dura, as ilustrações, a côr, coladas ao longo das páginas. São desenhos inspirados pela obra, a maioria a viver num imaginário onde o fantástico é omnipresente e que vive da sugestão dos corpos e dos seus actos. O prefácio de Carlos Reis é magnífico, permite contextualizar “Memorial do Convento” no percurso literário do autor, no momento editorial da sua primeira edição (1982), e, claro, no cruzamento da ficção com a História.
OUVIR - Quando escreveu “The Last Ship”, sobre a decadência de Wallsend, a cidade onde cresceu, entre docas e estaleiros que foram encerrando, Sting disse numa entrevista, em 2013, que tinha deixado de lhe interessar fazer canções para uma banda rock. “The Last Ship” foi escrito para orquestra, pensado para representação teatral, estreado na Broadway em finais de 2014 e foi um falhanço de bilheteira. Surpreendentemente Sting lançou agora um disco novo, só com temas inéditos, todos com um fraseado claramente rock, com guitarras, baixo e bateria, num som inequivocamente Police. Para além da clara inspiração rock, “57th & 9th”, é um trabalho onde se notam as influências do jazz que Sting foi cultivando nos últimos anos, assim como das sonoridades celtas que sempre foram uma obsessão sua. Além do amor e suas desventuras estas canções falam também de questões contemporâneas, como as mudanças climáticas ou a questão dos refugiados. Há momentos em que é inevitável recordar “Born In The 50’s” do primeiro álbum dos Police, um hino rock onde a voz de Sting disputava o protagonismo da gravação com a guitarra - o que aqui volta a acontecer em várias ocasiões, nomeadamente em “I can’t stop thinking about you” ou “Petrol Head”. Uma das faixas iniciais, “50.000”, é claramente uma evocação da emoção de estar em palco e ao mesmo tempo uma homenagem a nomes como Prince e Bowie, desaparecidos este ano. O disco vai buscar o seu nome a uma das zonas de Nova Iorque onde ainda há estúdios de gravação e foi num deles que grande parte do trabalho de “57th & 9th” decorreu. Há uma edição especial, uma caixa, disponível na FNAC e El Corte Ingles, com três faixas extra, notas sobre as canções, escritas pelo próprio Sting, um dvd com uma entrevista ao autor, uma gravação ao vivo e ainda uma colecção de fotografias feitas para este disco.
PROVAR - Às vezes leio por aí algumas crónicas e notícias sobre novos restaurantes que me levam a querer conhecê-los. De repente percebo que o local em causa se dedica apenas a servir menus de degustação, onde os comensais são obrigados a encarar o que o cozinheiro (que nestes sítios se chama Chef) lhes dá, sem possibilidade de escolha. O racional por trás desta coisa é simples: se o cozinheiro é tão artista que se intitula Chef, a sua obra carece de liberdade de expressão que não pode ser toldada por um qualquer apetite momentâneo de um freguês insensível. Assim sendo quem vai ao local é para apreciar arte, porque a escolha já foi feita - seleccionando o artista que se vai provar. Pois devo dizer que não é coisa que me agrade. Gosto de olhar para uma lista e escolher o que me apetece, se quero entrada ou não, se quero peixe ou carne, e se quero doce, o que raramente acontece. Felizmente alguns locais mantêm o bom senso e, tendo menus de degustação, têm também alternativas; e outros possibilitam que se escolha apenas parte do menu. Chama-se a isto oferecer ao cliente liberdade de escolha em vez de imposição de gosto. Não tenho paciência nenhuma para cozinheiros que dedicam mais atenção a elaborar nomes complicados para os pratos que apresentam do que a querer servir e satisfazer quem os visita.
DIXIT - “Éramos nós todos que estávamos a cair com aquele homem (o embaixador Russo em Ancara) e, quase ao mesmo tempo, a ser trespassados por um camião em Berlim. Este é o século XXI que teve início, não em Janeiro de 2000, mas em Setembro de 2001” - João Gonçalves, no Facebook.
GOSTO - O Diário da República passou a estar disponível online, com todo o seu arquivo, e um motor de busca de funcionamento exemplar.
NÃO GOSTO - Os cursos de comandos estão sem regras orientadoras há oito anos.
BACK TO BASICS - “As ideias são o que faz erguer as civilizações e o que desencadeia revoluções, Há mais dinamite numa ideia do que em muitas bombas” - Vincent Long Van Nguyen, bispo católico vietnamita
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PRONTO - Temos Presidente, temos Governo, falta é claro conseguirmos ter Portugal. Não vou apelar ao bom senso do Governo porque as recentes declarações sobre o Orçamento e o défice provocam-me arrepios, assim como os aumentos de despesa prometidos em declarações de muitos ministros, sem saber como as vão cobrir num Orçamento que é feito a partir da base zero. De maneira que dedico estas linhas a duas questões que penso poderem ser reformas marcantes e que só podem nascer de uma colaboração entre os vários orgãos de soberania e as diversas forças políticas. Em primeiro lugar o Banco de Portugal: desde há anos que está quase tudo mal naquelas bandas, como comprova o rol de acontecimentos no sistema financeiro. Ao longo das últimas décadas o Banco de Portugal transformou-se num Estado dentro do Estado e numa parideira de Ministros das Finanças, a maior parte dos quais com resultados catastróficos para o país. Ou a escola é má, ou a inconsciência é total. Seja como fôr há que mudar o Banco de Portugal, o seu papel, controlar a sua actuação e sobretudo evitar que ele tome o freio nos dentes para depois se pôr a assobiar quando atira a carruagem para o abismo. Em segundo lugar vem a reforma do sistema político, a reforma das leis eleitorais, a actualização séria dos cadernos eleitorais, decisões sensatas sobre a coexistência entre as obrigações da comunicação nos actos eleitorais e a liberdade editorial, e, finalmente, alguma modernização no funcionamento e comportamento da Comissão Nacional de Eleições, que tem demonstrado uma desagradável tendência para se imiscuir no que não deve, não compreendendo o tempo em que vive. Se estas mudanças não forem feitas a abstenção só vai aumentar. Nestas eleições, em dois terços do país, a abstenção ficou acima dos 50% e o candidato eleito, por larga margem, teve 52% dos votos expressos mas apenas 24,8% do número de recenseados. Se estas duas questões forem resolvidas já se terá avançado mais neste mandato que nas últimas décadas.
SEMANADA - O Governo apresentou a proposta de orçamento a Bruxelas e reduziu duas décimas no défice que estava no documento original; Bruxelas respondeu que uma redução de duas décimas é insuficiente e que pode exigir uma revisão do Orçamento; a agência de notação Fitch disse que se António Costa não conseguir uma redução de défice que permita a sua aprovação por Bruxelas terá que descer o rating de Portugal; a mesma Fitch classificou de “irrealistas” as previsões do OE; a Moody’s afirmou que o OE é demasidado optimista e repete erros do passado; Bruxelas alertou para o elevado risco da dívida portuguesa a médio prazo; Jerónimo de Sousa admitiu que o PCP possa viabilizar um orçamento de Estado “mais duro”; António Costa diz que a actual visita da Troika a Portugal não tem relevância política; o Ministro da Saúde diz que a reposição das 35 horas pode aumentar os custos do Estado no sector; o Ministério Público suspeita que Sócrates terá influenciado o resultado da OPA da Sonae sobre a PT a troco de “luvas”; já em 2009 Belmiro de Azevedo tinha culpado Sócrates pelo falhanço da OPA à PT; o Partido da Terra pronunciou-se contra a intenção de plantar mais árvores na segunda circular; um estudo recente indica que 90% das leis aprovadas em Portugal ficam fora do escrutínio público; o PAN reivindica a existência de um menu vegetariano em todas as cantinas públicas; Portugal é o país europeu com uma maior associação entre chumbos e pobreza; a China ultrapassou Portugal nas vendas para Angola; Jerónimo de Sousa, líder do PCP, resumiu a atitude do seu partido nas presidenciais da seguinte forma:”podíamos arranjar uma candidata engraçadinha, mas não somos capazes de mudar”; no dia a seguir disse que retirava a afirmação caso alguém no Bloco de Esquerda tenha “enfiado a carapuça”; na quarta-feira o Comité Central do PCP culpou o PS e o Bloco de Esquerda pelo resultado das eleições.
ARCO DA VELHA - Na noite eleitoral Sampaio da Nóvoa, que obteve menos de metade dos votos do vencedor, disse que tinha ficado perto de passar à segunda volta;
FOLHEAR - Sou fascinado por edições de livros com um toque especial - que tenham um tratamento gráfico inesperado. Quem diria que num clássico, pouco conhecido, de Camilo Castelo Branco, isso poderia acontecer, ainda por cima por vontade do autor? “O Que Fazem Mulheres” é uma paródia aos folhetins românticos que já foi descrito como um romance filosófico sobre o comportamento feminino - obviamente analisado à luz dos costumes de 1858, ano em que foi publicado.O livro começa por um diálogo em que uma mãe tanta convencer a filha a casar por dinheiro. A filha, Ludovina, é bela mas sem dote e dela diz um enamorado: “lisongeia um amante, mas não pode satisfazer as complicadas necessidades de um marido”. Está dado o mote e, como Camilo anunciou à época, aqui há “bacamartes e pistolas, lágrimas e sangue, gemidos e berros, anjos e demónios”. O lado gráfico da edição segue à risca as recomendações de Camilo: inclui um capítulo solto que o leitor pode colocar onde quiser, no decurso da narrativa, e um outro capítulo, fechado, que tem este aviso expresso do autor: “Cinco páginas que é melhor não se lerem”. Edição Guerra & Paz.
VER - O que é “Spotlight”? É um filme sobre investigação jornalística mas era também o nome de uma unidade especial existente dentro do diário “Boston Globe”, um dos principais jornais norte-americanos, e que publicava as suas reportagens de investigação na edição de Domingo, a mais lida.. Foi fundado em 1872 por cinco homens de negócios da cidade, ganhou uma dúzia de prémios Pulitzer, tornou-se um exemplo de como o noticiário local é importante para reforçar os laços com a comunidade de leitores e criou não poucas inovações editoriais, a começar na forma como acompanhava o baseball e a equipa local, os Boston Red Sox, e a acabar na unidade de investigação que tinha um funcionamento praticamente autónomo, uma pequena redacção própria e funcionava com uma grande liberdade editorial e sem pressões de prazos para publicação. Uma das reportagens que tornou o Boston Globe famoso, e que deu à equipa da Spotlight mais um Pulitzer, foi a investigação sobre o escândalo dos comportamentos pedófilos de padres católicos, publicada em dezenas de artigos entre 2001 e 2003. Do caso foi feito um filme, estreado esta semana nas salas portuguesas e que tem o nome “Spotlight”. Nele retrata-se o funcionamento do jornal, e sobretudo da equipa do Spotlight e dão-se conta da situação criada numa cidade predominantemente católica quando o principal jornal acusa o clero de uma série de abusos sexuais sobre menores, praticados ao longo dos anos. O filme, uma crónica assumida sobre o jornalismo, estreou nos EUA em Novembro de 2015, está nomeado para seis Oscars e foi realizado por Tom McCarthy. Se depois de verem o filme quiserem espreitar o jornal basta irem ao seu site, que é também um dos mais premiados da imprensa norte-americana - www.bostonglobe.com
OUVIR - Yaron Herman é um pianista israelita que vive em Paris e que até agora tinha uma carreira feita sobretudo a partir de versões de composições originais de nomes tão diversos como Björk, Britney Spears, Leonard Cohen e alguns compositores clássicos, além música popular de inspiração judaica. “Everyday” é o seu álbum de estreia na Blue Note e é também um salto numa direcção mais pessoal. Uma ajuda importante neste disco é do baterista Ziv Ravitz, que assume a direcção musical do projecto ao lado de Yaron Herman. Aqui a maioria dos temas são da autoria de Herman, alguns em co-autoria com Ravitz, e duas versões - uma do “Prelúdio nº4, opus 74” de Alexander Scriaboin e a outra de uma canção de James Blake, “Retrograde”, que já havia revisitado anteriormente. Um dos temas feito em co-autoria, é “Volcano”, que de alguma forma assume um papel central no disco, uma espécie de cruzamento de influências. A produção do tema é de Valgeir Sigursson, que costuma trabalhar com Bjork, a a interpretação vocal é de uma cantora islandesa, Helgi Jónsson - já agora vários temas do álbum são cantados. “Volcano” é um tema envolvente, com sonoridades inesperadas. “Vista”, “Everyday”, “Five Trees”, “Volcano”, “Retrograde” e “18:26” são talvez as faixas deste CD que melhor conseguem mostrar o caminho entre a improvisção do jazz e revisitações de diversos estilos contemporâneos que Yaron Herman está a trilhar.
PROVAR - Desde há uns anos Duarte Calvão e Miguel Pires são os animadores de um blogue de crítica gastronómica, o Mesa Marcada, que foi criando influência e audiência. Paulina Mata foi durante algum tempo convidada do Mesa Marcada e agora iniciou o seu blogue pessoal, Assins & Assados. O Mesa Marcada foi-se extremando na cozinha de autor e em propostas gastronómicas sofisticadas, que alinham na designação de fine dinning. As listas dos melhores restaurantes que o Mesa Marcada anualmente organiza mostra como o enfoque está no acompanhamento da moda em termos de restauração (e também de alguma sensibilidade às relações públicas e à comunicação que têm fabricado alguns chefs). Esta opinião tem origem na minha aversão profunda a menus degustação e aos restaurantes que fazem do estilo um catecismo, área que o Mesa Marcada aprecia. Para mim os menus degustação, salvo raras excepções, são uma mesmice, para usar uma expressão que li no blogue, num comentário de um leitor, e a que achei graça. Mas volta e meia o Mesa Marcada lá fala de coisas úteis, como locais onde comer bem no dia a dia ou simplesmente petiscar. Uma outra coisa parece estar a nascer no blogue de Paulina Mata, que para já parece mais focado na essência das coisas e na revisitação daquilo que é básico: boa matéria prima bem confeccionada. A ver vamos como evolui. Aqui ficam os endereços: http://assinseassados.blogs.sapo.pt/ e http://mesamarcada.blogs.sapo.pt/
DIXIT - O PS vive num estado de ilusão e não está em condições de combater o Bloco de Esquerda, que se tornou o partido mais populista em Portugal - Francisco Assis, em artigo no Jornal de Notícias no dia seguinte às presidenciais.
GOSTO - O Estado gastou menos dinheiro a subvencionar as eleições presidenciais
NÃO GOSTO - Do barulho e do cheiro das pipocas nas salas de cinema - não há banda sonora que resista ao ranger dos dentes no milho esponjoso
BACK TO BASICS - A inveja dos outros é o imposto que nos cai em cima quando temos sucesso - David Nichols
PRESIDENTE - Se há alguém que no sistema político português precisa de ter uma apurada sensibilidade política e uma capacidade negocial e de influência considerável, esse alguém é o Presidente da República. Um Presidente não pode ser um anti-político nem um tecnocrata - a sua função é conciliar os cidadãos com o país, os dirigentes partidários com os seus eleitores, os governantes com o equilíbrio e o bom senso. Quem conseguir desempenhar assim o seu mandato, ficará na História, já que nestas últimas quatro décadas, e sobretudo nas duas últimas, com Sampaio e Cavaco, andou-se bem distante de tudo isto que um Presidente deveria ser. Quando o Governo não tem a sensibilidade social no seu DNA cabe ao Presidente fazer-lhe esse diagnóstico e recordar que a sociedade só pode evoluir a bem e nunca à força. Vem tudo isto a propósito das reflexões que o caso da morte ocorrida no Hospital de S. José despoletaram. Um Presidente que exerça o seu mandato deve ponderar a forma como são feitos cortes orçamentais em sectores essenciais, sobretudo quando se constata que os cortes verificados no sector da saúde não são nada quando comparados com o custo suportado pelos contribuintes em sucessivos escândalos com bancos ao longo dos últimos anos. Independentemente das guerras corporativas que também explicam o mau funcionamento de alguns hospitais, e em particular este caso, esta frase, dita por Marcelo Rebelo de Sousa numa visita recente ao Hospital de S. José, é o melhor manifesto eleitoral de qualquer dos candidatos presidenciais: “Pode-se poupar em muita coisa, mas poupar na saúde dos portugueses não é um bom princípio para quem quer afirmar a justiça social e construir um Estado democrático mais justo".
SEMANADA - Em 2015 os piropos tornaram-se crime puníveis até três anos de prisão, no seguimento de uma proposta legislativa do PSD; em contraste, os piropos recíprocos entre PS, PCP e Bloco deram na formação de um Governo; nos últimos quatro anos 400 mil portugueses emigraram, tantos quanto a totalidade dos emigrantes nos últimos 40 anos; ao fim do primeiro mês de Governo PS, o PSD viabilizou o orçamento rectificativo apresentado por António Costa e disse que não quer crises políticas; Paulo Portas anunciou que abandona a liderança do PP; nos últimos quatro anos os serviços básicos subiram 25% e os salários nem 2%; um em cada onze empregos em todo o mundo está no sector do turismo; em 2014 a Cultura representou 1,7% da riqueza produzida em Portugal, próxima de sectores como as telecomunicações, que representaram 1,9%, enquanto a construção valia 4%; as duas principais operadoras de telecomunicações anunciaram, nos últimos dois meses do ano, investimentos de quase novecentos milhões de euros em direitos de transmissão de jogos de futebol, valor que deverá ainda subir nas próximas semanas; para começar bem o novo ano o Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário convocou uma greve para sexta-feira dia 1 de Janeiro.
ARCO DA VELHA - A Refer foi condenada a pagar uma indemnização de 80 mil euros a um seu ex-funcionário que foi despedido da empresa, por falsificar pesagens de carris a favor do sucateiro Manuel Godinho. O mesmo ex-funcionário foi condenado a cinco anos e três meses de prisão pelo Tribunal de Aveiro, no âmbito do processo Face Oculta. Mesmo assim a empresa terá de o indemnizar por um outro tribunal o ter considerado despedido sem justa causa.
FOLHEAR - Este ano que passou trouxe-nos alguns factos curiosos em matéria de leituras. Se é certo que a queda de circulação das edições impressas dos jornais diários continua a verificar-se, também é certo que o tempo médio gasto na leitura das suas edições digitais tem aumentado, sobretudo nas suas versões para dispositivos móveis. Por outro lado, e curiosamente, além das notícias de actualidade, os artigos mais longos, mais explicativos - aquilo que se enquadra na classificação de “long reading”, estão a captar mais leitores. Hoje em dia, numa edição digital, é possível ver quais os artigos e os assuntos que os leitores vão ler com maior frequência, mas também aqueles a que consagram maior tempo de leitura. Finalmente as publicações digitais mais actualizadas desenvolveram sistemas de interacção com os seus leitores, baseadas no que são o comportamento e as preferências típicas de cada um. Um dos mais flagrantes exemplos disso vem de um facto recente: apesar da sofisticação técnica e da qualidade do jornalismo do New York Times, e que o levou a ser um exemplo e um líder mundial na imprensa digital, nos últimos meses o Washington Post tem alcançado números de circulação digital já superiores ao do NYT. Para compreender o porquê desta surpreendente recuperação do WT é preciso andar um pouco para trás, quando o criador da Amazon, Jeff Bezos (na imagem), o adquiriu. Sem grandes alardes nem ruído, com uma reestruturação interna relativamente pequena e sem interferências conhecidas na sua orientação editorial, a verdade é que Bezos mudou uma coisa: o departamento digital do WT foi alvo do trabalho dos engenheiros e programadores da Amazon, que criaram sistemas de rastreamento e acompanhamento de cada leitor digital do jornal, fornecendo-lhes sistematicamente sugestões e envolvendo-os cada vez mais - tal como a Amazon faz aos seus clientes. Os resultados estão à vista, ao fim de poucos meses. Na maior parte dos indicadores digitais o Washington Post supera agora o New York Times. Começa a perceber-se o que Jeff Bezos queria fazer. Aguardam-se os próximos episódios.
VER - Fundado em 1774, o British Museum tornou-se numa referência mundial. Recentemente fez uma parceria com o Google Cultural Institute e dessa parceria saíu um novo site do museu, que é absolutamente revolucionário e permite que, em qualquer ponto do mundo, a partir de um computador, tablet ou smartphone, se possa literalmente percorrer o interior do museu, voltando atrás ou parando frente a uma obra. O novo site fez do British Museum o maior espaço coberto visível pelo Google Street View , a tecnologia que permite visitar os nove andares e 85 galerias permanentes do museu, exibindo cerca de 80.000 peças, tal como ela estão apresentadas ao público no local. Adicionalmente foi construída uma timeline que incorpora cerca de 4500 objectos ao longo da cronolgia, que permite ampliações de cada uma das peças e a sua localização nas épocas da História em que foram produzidas. Se quiser visitar este British Museum virtual basta ir a www.google.com/culturalinstitute/collection/the-british-museum .
OUVIR - Neste Natal os responsáveis pelo catálogo dos Beatles disponibilizaram finalmente todas as suas gravações nas plataformas de streaming - Spotify, Apple Music, Google Play, Amazon Prime, Slacker, Tidal, Groove, Rhapsody e Deezer. Independentemente da plataforma utilizada o streaming é a nova forma de ouvir música que cada vez cativa maior número de utilizadores - e este ano o lançamento da Apple Music veio alargar ainda mais esta tendência. Eu continuo a comprar discos e a ouvir CD’s, mas muitas vezes vou primeiro ouvir um disco acabado de lançar em streaming a ver se vale a pena. Por exemplo, já fui ouvir uma das novas canções de David Bowie, “Lazarus” do álbum “Blackstar” que sairá em Janeiro. Depois fui à descoberta do quarteto do saxofonista Donny McCaslin, cujos músicos participam em “Blackstar” e em pouco tempo fiquei a perceber a nova direcção de Bowie, que aos 69 anos permanece sempre atento. No carro continuei a ouvir o Spotify com a gravação de um concerto de Rufus Wainright e quando à noite resolvi ler coloquei uma das playlists de jazz que o Spotify me propõe. O iPad ou o iPhone que utilizo estão ligados ao sistema de som do carro e ao de casa por Bluetooth. E as minhas descobertas de novas músicas, de repente, ficaram mais fáceis.
PROVAR - Portugal vai tendo novos bons restaurantes, há mais chefs portugueses que são apreciados e distinguidos com as ambicionadas estrelas Michelin, mas a verdade é que nas coisas mais simples, de dia-a-dia, há muito pouca inovação. Por exemplo, as sanduíches: comer uma boa sanduíche em Lisboa é difícil. Na esmagadora maioria dos casos apresentam-nos uma carcassa aborrachada - ou um pão de forma cheio de ar - com tímidas e transparentes fatias de fiambre ou de queijo indistinto. As mais das vezes nem o fiambre é do melhor nem o queijo passa do flamengo mais barato - mas são sempre em quantidade mínima. Numa terra de bons enchidos e fumados são raras as casas que apresentam uma sanduíche que misture um bom paio ou uma boa paiola, em quantidade honesta, com um pão fresco e estaladiço de qualidade, que possa também receber um queijo da ilha ou um queijo de serpa curado, enriquecido por algum legume adequado e com algum tempero que passe da simples manteiga - e isto quando escapamos ao calvário da margarina. Recordo om inveja as fotografias das sanduíches de abundante pastrami, em pão estaladiço. Os cafés e as cafetarias portuguesas não sabem usar os nossos melhores produtos para fazer uma sanduíche condigna e os nossos padeiros não sabem fazer um pão adequado a essa função - que não tenha demasiado miolo, que seja possível trincar sem deslocar o maxilar. Boas sanduíches, precisam-se.
DIXIT - “ O resultado, na minha opinião, foi desastroso” - Jorge Tomé sobre a medida de resolução aplicada ao Banif, que liderou.
GOSTO - Em 2014 os turistas deixaram em Portugal 32,6 milhões de euros por dia.
NÃO GOSTO - Da ineficácia, dos erros, dos disparates, da falta de bom senso, dos lapsos e dos atrasos de todo o sistema judicial, porventura o pior de todos os males do Estado português.
BACK TO BASICS - “Um optimista fica acordado para viver a entrada do novo ano; um pessimista quer ter a certeza que o ano velho se vai de vez” - Bill Vaughan
(Publicado no Jornal de Negócios de30 de Dezembro de 2015)
(publicado no diário «Meia Hora» de Quarta-Feira)
Nota: depois deste texto estar escrito e publicado, novos desenvolvimentos no sector PSD, basicamente em torno das preocupações expressas por Ângelo Correia, reforçam o clima de desconfiança em relação a Luis Filipe Menezes.
Nos últimos dias uma série de figuras, com prestígio e peso político, começaram a sugerir que talvez conviesse considerar a hipótese de Marcelo Rebelo de Sousa se decidir a ir tomar conta do PSD. Para além do mito sebastianista que varre ciclicamente a sociedade portuguesa, esta questão merece alguma atenção.
Na realidade a desilusão com a incapacidade de liderança de Menezes, o desapontamento com a sua actuação política tacticista, volátil, ziguezagueante e inconsequente, atingem sectores cada vez mais vastos daquilo a que designarei por área de influência natural do PSD. Estes sectores olham para o futuro, percebem o afastamento do PSD da realidade e vêem o espectro de um partido único em regime democrático, com o PS a continuar a ganhar eleições, a reboque do poder que Sócrates impõe, e toda a oposição destroçada, excepção feita ao PCP.
Para a oposição interna do PSD a questão é a de saber quando precipitar a mudança de Menezes, sendo que a maioria, entre comodismo, conveniência e algum receio, se inclinam para deixar o actual líder ser derrotado nas sucessivas etapas do próximo ciclo eleitoral, para depois ser afastado sem apelo nem agravo, daqui a uns dois anos. Isto parece muito certinho, mas arrisca-se, à velocidade a que a situação se degrada, a deixar o PSD num estado de anemia profunda e reduzida expressão e peso políticos. Daqui a dois anos, por este caminho, o PSD está moribundo. Provavelmente nessa altura fará mais sentido criar um novo partido que reanimar um tão degradado.
Por isso, para o PSD, talvez valesse a pena que, se Marcelo se decidir a avançar, o faça antes do calendário eleitoral, sabendo de antemão que irá ter uma vida difícil. Eu acho que, quanto mais cedo começar a mudança e começarem a ser mandados sinais claros para a sociedade de que as coisas vão mudar, melhor.
Há uns meses atrás dificilmente diria isto: que venha Marcelo, que regresse à política activa, que se rodei de uma boa equipa e que mostre que também ele pode ter aprendido com os erros que cometeu no passado: menos intriga palaciana, menos atitudes de analista, mais atitudes de líder político. Se isso acontecer, a vida democrática em Portugal poderá melhorar, poderá haver mais debate e alternativa credível.
Na realidade uma reforma do PSD no sentido de recuperar as elites terá efeitos para além das suas margens partidárias – provavelmente terá repercussão entre o PP e sectores liberais não organizados. Será que Marcelo e os seus apoiantes conseguem avançar?
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