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MEMÓRIAS  - É uma coincidência notável que na mesma semana estreie o filme sobre Paula Rego e seja editada uma nova pérola do arquivo de Amália Rodrigues, desta vez sobre a sua carreira em Itália. A partir de pontos de partida e de carreiras artísticas completamente diferentes estas duas mulheres são  exemplos da criatividade portuguesa para um mundo que nos achava desinteressantes, passada que foi a época das Descobertas, em que fomos pioneiros da globalização. A partir de Londres, onde estudou, Paula Rego desenvolveu uma carreira incontornável, ganhando o reconhecimento internacional, em termos de crítica e de mercado de arte. Forçando paralelismos, Amália conseguiu fora de fronteiras, desde cedo, um sucesso maior que aquele que aqui obtinha - sendo reconhecida e aplaudida em todo o mundo. Serve toda esta introdução para falar da importância da preservação da memória audiovisual dos nossos criadores. O filme, magnífico, sobre Paula Rego foi uma encomenda da BBC ao seu filho, que é um cineasta com méritos reconhecidos; Amália foi filmada por Augusto Cabrita, para um documentário nunca finalizado. Este é o retrato do nosso subdesenvolvimento audiovisual. Não preservamos a nossa memória. O operador de serviço público de televisão, a RTP, desperdiça recursos em séries grotescas, em concursos serôdios e em transmissões de futebol mas é incapaz de ter uma linha de produção de documentários, continuada e coerente,  que preserve a memória do talento português contemporâneo  para as próximas gerações.

 

SEMANADA - As viagens de finalistas que se realizam nas férias da Páscoa estão esgotadas há quatro meses e só uma agência, das várias que actuam nesta área,  vai levar 8000 jovens para o sul de Espanha; ainda há 154 milhões de escudos, em notas antigas, nas mãos dos portugueses e  no ano passado foram trocadas notas da antiga moeda no valor de 1,1 milhões de euros; há mais de cinco mil idosos que vivem isolados, dos quais 3500 que vivem sozinhos; Portugal fabricou e exportou 96 milhões de euros em notas de 50 euros para outros países comunitários; em 2016 os hospitais públicos sinalizaram 708 doentes, na maioria idosos, que ficaram nos hospitais para além do período normal de internamento porque os familiares não os queriam de lá tirar; as ajudas concedidas aos bancos e sector financeiro já custaram 13 mil milhões de euros aos portugueses; Portugal foi o sexto país da União Europeia que mais pagou em ajudas financeiras à Banca; tudo somado, e se a operação de resgate do Novo Banco não correr bem, o antigo BES poderá custar ao sistema financeiro, aos obrigacionistas e aos contribuintes 11,2 mil milhões de euros; mais de 118 milhões de pessoas vivem em risco de pobreza ou exclusão social na União Europeia; de acordo com os resultados do estudo TGI da Marktest, 33.4% dos portugueses têm consola de jogos em casa.

 

ARCO DA VELHA - O pároco da paróquia de Olhão mandou decapar a jactos de água a igreja matriz da cidade, construída no século XVI, para retirar a tradicional cal e, em sua substituição, mandou pintar o templo com tinta plástica.

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FOLHEAR - “Lodestars Anthology” é uma revista independente, editada no Reino Unido desde 2014. Destina-se a viajantes  - não é bem a quem gosta de viagens turísticas organizadas, mas sim a quem tem curiosidade em conhecer as gentes, costumes e características dos países que visita. Cada edição é exclusivamente dedicada a um país e a mais recente tem por tema o Japão. É um número magnífico, como sempre muito bem fotografado e ilustrado, com 160 páginas, ao longo das quais visitamos a cultura, a arte, a tradição, a religião, pequenos paraísos escondidos, ou a gastronomia. Conjuga crónica com reportagem e entrevista, mostra a natureza mas também o efeito que a arquitectura nela pode exercer. Na realidade  a Lodestar sai dos roteiros turísticos e descobre o pormenor, do florir das cerejeiras até aos locais onde perduram as tradições, maravilhas escondidas como um laboratório botânico ou, noutro campo, a vida das mulheres mergulhadoras que, numa zona do país,  desde há séculos capturam marisco entre as rochas. No fundo, a Lodestar Anthology é sobre criatividade, descoberta e viagem. Já fez edições sobre Inglaterra, Canadá, Escócia, Itália, Austrália, Suécia - o Japão é o sétimo país - e os próximos são Nova Zelândia e França, ainda este ano. Podem seguir as actividades no site, no Facebook, ou comprar a revista online ou na Undercover, em Lisboa, na Rua Marquês Sá da Bandeira.

 

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VER - Estreou esta semana o filme “ Paula Rego, Histórias & Segredos” e sexta-feira dia 7 inaugura a exposição com o mesmo título na Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais. O filme fica em cartaz em Lisboa, Porto e Cascais e neste fim de semana é assinalado o dia Paula Rego, com exibições especiais em 12 cidades, por todo o país. Mais tarde o filme será editado em DVD e exibido na RTP. Todos podem ter oportunidade de o ver. Trata-se de uma produção encomendada pela BBC e realizada por Nick Willing, um cineasta que é filho de Paula Rego e que, na estreia, fez questão de dizer que este é “o  filme que fiz com a minha mãe e não sobre a minha mãe” . O filme baseia-se em conversas com a artista e em imenso material de arquivo, de fotografias a filmes familiares em super 8 e que são particularmente importantes para mostrar a vida de Paula Rego e de Victor Willing, o seu marido, durante os anos em que viveram em Portugal, na Ericeira. Este documentário  mostra de forma exemplar  o processo criativo de Paula Rego - o que ela faz, porque o faz e como o faz e a esse nível é de uma riqueza impressionante no detalhe e naquilo que nos transmite. Nick Willling, apesar de ser filho, consegue um olhar simultaneamente próximo e distante, mas sempre íntimo, no entanto sem pudores nem complacências. Como Paula Rego diz a certa altura do filme ela pinta continuamente para não falar - é a pintura que a alimenta: “a vida é o trabalho”, desabafa, evocando as muitas dificuldades a que a sua opção artística esteve associada até surgir o sucesso. “Paula Rego, Histórias & Segredos” é ainda uma viagem ao país que Portugal era nos anos 60. Temas como a presença da religião, do sexo ou do medo não são evitados, com incursões entre as influências de Dante e de Disney na obra da pintora.  A edição e montagem são exemplares, a sonoplastia é certeira. E o filme termina com Amália, a cantar a “Gaivota”, de Alexandre O’Neill, recordando o amor num perfeito coração, a mesma Amália que é citada em diversos momentos destas Histórias & Segredos.

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OUVIR -  Regressemos a 1970, há quase meio século. Nesse ano Amália celebrava os seus 50 anos e fez “Com Que Voz”, o seu disco mais premiado. Já conquistara público no Japão e na URSS mas em 1970, logo em Janeiro, deslumbrou os italianos, em Roma. Esse foi o início de uma série de digressões por toda a Itália. Já antes, desde 1950, Amália tivera actuações pontuais em palcos italianos e na RAI. Mas digressões a sério, face a face com o público, aconteceram de 70 para a frente - quase 200 recitais em toda a Itália até 1994 - os anos mais intensos foram de 70 a 78. Logo no recital de Janeiro de 1970 na assistência estava Orson Welles, que se confessava à imprensa italiana grande fã da fadista : “O Fado é um dos géneros mais complicados e é excepcional assistir a um concerto da grande Amália”. É deste tempo que datam filmagens e fotografias de Augusto Cabrita, que acompanhou Amália com o objectivo de fazer um documentário nunca terminado, “O Mundo de Amália”. Graças ao persistente e exemplar trabalho que Frederico Santiago tem feito no arquivo da Valentim de Carvalho, foi agora editado um triplo CD, Amália em Itália, que agrupa gravações de alguns dos recitais e também temas de edições discográficas feitas para o mercado italiano. “Amália em Itália - a una terra che amo” é uma edição incontornável para os apreciadores do trabalho de Amália Rodrigues. É uma edição de coleccionador, cheia de raridades.

 

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PROVAR -  Gosto de cozinhar - ao fim do dia descontrai-me e ajuda-me a organizar as ideias. Gosto de imaginar refeições simples a partir de conservas - e não exclusivamente saladas primaveris ou veraneantes. Muitas conservas ligam bem com uma boa massa ou com arroz. Durante uns tempos experimentei o que a seguir vou relatar com arroz carolino enxuto. Ultimamente tenho usado massa, os cappelletti da marca Garofalo, que existe nomeadamente no Pingo Doce. Os cappelletti têm a vantagem de ganhar bem o sabor daquilo que com eles se cozinha, mais que outras massas. Neste caso resolvi misturá-los com mexilhões de escabeche, de conserva. Os portugueses, da Pitéu, são bons mas têm o escabeche um bocadinho puxado e demasiado presente. No El Corte Ingles encontrei uns mexilhões em escabeche das rias galegas, da marca Atlantic, que são menos intensos no tempero e mais leves - e que se misturam de forma ideal com os cappelletti. Normalmente, e foi o caso, incluo no final da cozedura da massa (e deixo-a sempre um pouco menos tempo que o recomendado), meia dúzia de tomates cherry cortados grosseiramente em oitavos e umas ervas aromáticas próprias para massas. Só depois de escorrer adiciono o conteúdo da conserva, mexo bem e tapo durante uns dois minutos, para misturar os sabores. A acompanhar provei o Marquês de Borba branco de 2016, feito por João Portugal Ramos a partir das castas Arinto, Antão Vaz e Viognier. É fresco, sabores citrinos, colheita cuidada, tem 12,5% e um preço no limiar dos cinco euros. Descontrai e proporciona boa conversa. Bom apetite.

 

DIXIT -  “Lisboa não pode ser uma estância turística sem lisboetas lá dentro” - Henrique Raposo.

 

GOSTO - O Indie Lisboa vai apresentar três centenas de filmes entre 3 e 14 de Maio, dos quais 45 são portugueses.

 

NÃO GOSTO - O Comandante da Escola Prática da GNR foi exonerado por se queixar da demora na abertura de um curso de formação de 450 militares.

 

BACK TO BASICS -”Deixar ao Governo a incumbência de proteger a nossa privacidade é como contratar um mirone para instalar persianas em casa” - John Perry Barlow.

 

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publicado às 13:37

AUTÁRQUICAS - É TUDO DEMASIADO MAU

por falcao, em 03.02.17

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ELEIÇÕES - Olho para o panorama daquilo que já se conhece e do que se adivinha das próximas eleições autárquicas e só me sai uma frase: é tudo demasiado mau. De norte a sul os partidos sofrem crises e deserções, mostram hesitações, vivem ilusões, entram em contradições. Em Lisboa, sobretudo, portam-se de forma inconsciente e abdicaram de combater um autarca substituto que transformou o centro de Lisboa num recreio pessoal.  Medina, estimulado por Salgado e embalado por Sá Fernandes, deixa marcas profundas na cidade, contra os lisboetas e a favor de uma noção de cidade-cenário bonitinha mas desconfortável - o poder vigente cuidou de embelezar o que está à vista, mantendo em ruínas o que está escondido. Tem uma noção antiga de cidade, saudosista e reaccionária, que mascara e usa na propaganda. Lisboa continua a perder habitantes, a sua população continua a envelhecer, está a deixar de ser um local agradável com tantas complicações que são postas no dia a dia a quem nela decidiu viver e trabalhar. Não admira o que sucedeu ao PSD na capital: quem nunca conseguiu ser oposição não vai ser alternativa. As eleições autárquicas deviam ser um exemplo de propostas de proximidade e de empenho político na melhoria efectiva da qualidade de vida. O pior de tudo é que nestas autárquicas, um pouco por todo o país, aquilo a que se assiste é ver os partidos a procurar a sua satisfação própria, distribuindo empreitadas e delapidando dinheiro em obras sem sentido, em vez de cuidarem do bem público. E como se preocupam mais com o umbigo do que com os objectivos, nem alianças conseguem fazer. E, nalguns casos, nem encontram quem queira ser candidato, com ideias e credibilidade.

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SEMANADA - Nem um único dos titulares de cargos políticos e públicos abrangidos pelo Código de Conduta aprovado pelo Governo em setembro passado  emitiu qualquer comunicação de conflito de interesses; um engenheiro da Associação Regional de Saúde do Norte confessou que desde há 20 anos exige luvas para aprovar as obras que superintende; os três principais corruptores livraram-se de ser acusados pelo Ministério Público por fazerem donativos de cerca de 2000 euros a instituições de solidariedade e prestarem depoimentos contra o principal acusado, que deles recebeu perto de meio milhão de euros para facilitar negócios; o mercado imobiliário em Portugal cresceu 50% nos últimos dois anos; o valor das pensões do Estado caíu 27% desde a troika; a dívida pública portuguesa atingiu no final de 2016 os 241,1 mil milhões de euros, o que representa um aumento de 9,5 mil milhões face a 2015: a PSP e a GNR arrecadaram 78,3 milhões de euros em multas de trânsito em 2016, menos 11,6 milhões que em 2015; o tabaco está 18% mais caro que em 2011 mas a venda de cigarros aumentou 14% no ano passado; o Observatório da Justiça elaborou um estudo sobre a actuação dos tribunais em casos de violência doméstica e concluíu que há decisões de sentido contrário em situações semelhantes; guardas prisionais denunciaram que as famílias de alguns detidos estão a ser chantageadas por outros detidos que exigem pagamentos para que os familiares presos não sejam espancados nas cadeias; em Tomar foi descoberto um lar ilegal que tinha dez idosos a dormir numa garagem.

 

ARCO DA VELHA - Oito pessoas perderam a vida em Janeiro e 45 ficaram  desalojadas devido a incêndios que ocorreram quando tentavam aquecer a casa.

 

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FOLHEAR - Hoje o livro de que vou falar pode ouvir-se em casa e ver-se em palco. “Mão Verde”, assim se chama o projecto, foi encomendado pelo Teatro Municipal de S.Luiz, onde estreou ainda em 2015, e coexiste sob a forma de um livro ilustrado, de um disco que vem com o livro e onde são cantados alguns dos poemas do livro e, finalmente, um espectáculo que domingo, dia 5, voltará a ser apresentado pelas 17h00 na Casa da Música, no Porto. A autoria do projecto é da rapper e socióloga Capicua (Ana Matos Fernandes) e do músico Pedro Geraldes (na composição, guitarra, programações e teclados). Aos dois autores juntam-se agora em palco,já que anteriormente era apenas o duo de autores que aparecia ao vivo, Francisca Cortesão no baixo e António Serginho nas percussões. A edição de “Mão Verde” reúne o livro e o disco num só objecto com magníficas ilustrações de Maria Herreros. As canções e os textos falam da natureza - das plantas e animais que constituem o mundo mágico que todos podem descobrir - sobretudo os mais novos. Arrisco dizer que é como um mapa musical de um jardim. Como escreve Capicua, “ as árvores quando morrem viram livros e os livros guardam as histórias e as memórias dos antigos. Das folhas das árvores para as folhas dos livros passa a poesia que nos ensina a ser livres”.

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VER -  A exposição “José de Almada Negreiros - Uma maneira de ser moderno”, que inaugurou esta semana na Fundação Gulbenkian, é uma retrospectiva da obra do autor que engloba mais de 400 trabalhos, alguns deles inéditos, e ocupa até 5 de Junho as duas grandes salas de Exposições Temporárias da Fundação, na Avenida de Berna, em Lisboa. Na Galeria Principal mostram-se a pintura e o desenho em ligação com os trabalhos que o artista fez em colaboração com arquitetos, escritores, editores, músicos, cenógrafos ou encenadores. Na sala do piso inferior é destacada a presença do cinema e da narrativa gráfica. Juntam-se ainda obras e estudos inéditos que permitem descobrir  várias facetas do processo criativo de Almada Negreiros.  Almada, visionário, dizia em 1927, na conferência “O Desenho”, em Madrid: “Isto de ser moderno é como ser elegante: não é uma maneira de vestir, mas sim uma maneira de ser. Ser moderno não é fazer a caligrafia moderna, é ser o legítimo descobridor da Novidade”. E sobre si próprio, em “A Invenção do Dia Claro”, de 1921: “Reparem bem nos meus olhos, não são meus, são os olhos do nosso século! Os olhos que furam para detrás de tudo.” São estes olhos, tão patentes nos seus auto-retratos, que são a sua imagem de marca. Almada defendia uma modernidade presente em todo o lado, nos edifícios públicos, nas ruas, no teatro, no cinema, na dança, no grafismo e nas ilustrações dos jornais e entendia o artista como o agente principal de todo esse movimento. A programação complementar desta retrospectiva, que assinala os 120 anos sobre a data de nascimento do artista, inclui uma peça de teatro, visitas às gares marítimas de Alcântara e Rocha do Conde de Óbidos onde estão murais de Almada, um concerto, um ciclo na Cinemateca Portuguesa e a exibição da obra multimedia “Almada, um Nome de Guerra” de Ernesto de Sousa. E há ainda a aplicação  “A Lisboa de Almada”, com um roteiro em 30 pontos da vida e das obras do artista na capital, desde as tapeçarias do Ritz aos vitrais da Igreja de Nossa Senhora de Fátima.

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OUVIR - Numa outra encarnação Curtis Stigers foi um cantor pop com vagas incursões na soul e no rock e que em 1992 ganhou fama com “I Wonder Why”. Depois fez carreira como cantor de jazz, compositor e saxofonista. Agora registou um disco de homenagem à histórica gravação “Live At The Sands”, de Frank Sinatra, feita em Las Vegas, em 1966, com a orquestra de Count Basie. Stigers alinhou a coisa com o repertório de Sinatra e seguiu o exemplo, gravando ao vivo em Copenhaga com a Big Band da rádio pública dinamarquesa. A qualidade desta orquestra, que captou o espírito e o swing de Count Basie, é o primeiro destaque do disco. E Stigers, que não é o xaroposo Michael Bubblé, afirma-se bem em temas como “Come Fly With Me”, “I’ve Got You Under My Skin”,”You Make Me Feel So Young”,  “Fly To The Moon”, “The Lady Is A Tramp” ou “One For My Baby”, mantendo aliás o fraseado original de Sinatra. É um disco de versões, claro, mas é um belo disco, que seguiu as orquestrações originais de Nelson Riddle, Billy May e Quincy Jones. E acaba por ser uma curiosa homenagem a Sinatra e a Count Basie. “One More For The Road”, de Curtis Stigers com a Danish Radio Big Band.

 

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PROVAR -  Rumemos então a Oriente no mapa lisboeta. Isto não quer dizer ir para a zona da Expo, quer dizer procurar um restaurante chinês que seja frequentado por chineses. É o caso do Palácio do Mar, na Rua D. Estefânia - na parte de cima da rua, ao lado de uma histórica cervejaria dos noctívagos lisboetas, “O Arpão”, agora substituída por uma hamburgueria sem história, uma das quatro, todas igualmente sem história, que existem num raio de 500 metros. O Palácio do Mar apresenta-se como uma casa dedicada à “alta cozinha asiática” e oferece menu de almoço acessíveis a 6 euros, horário em que a casa é mais frequentada por ocidentais - embora se vejam sempre alguns chineses na sala, normalmente com pedidos bem diferentes dos portugueses. Mas é à noite que a casa se torna mesmo um local sobretudo frequentado por orientais. Resumindo-me à minha qualidade de ocidental cabe-me elogiar os raviolis chineses cozidos a vapor, cozinhados na hora, e o pato à Pequim, bem crocante e saboroso. Para acompanhar sugiro uma deliciosa e aromática cerveja chinesa, de malte de cevada, lúpulo e arroz, a Tsingtao. Na lista podem ainda encontrar sopas, saladas e mariscos, que ajudam a fazer a boa reputação da casa.

Palácio do Mar, Rua Dona Estefânia 92 A -  Telefone 218 278 315.

 

DIXIT -  “Fogo com fogo se combate. É assim que a política se faz” - Miguel Esteves Cardoso

 

GOSTO - A Academia das Ciências aprovou uma proposta de aperfeiçoamento do acordo ortográfico que propõe o regresso das consoantes mudas, do acento gráfico e circunflexo e também do hífen.

 

NÃO GOSTO - Passado mais de um ano o Conselho Geral Independente da RTP ainda não apresentou o seu relatório sobre a actividade do operador de serviço público relativo ao ano de 2015. Nos corredores da empresa é conhecido por Conselho Geral Inútil.

 

BACK TO BASICS - “Nunca sabemos quem verdadeiramente somos até vermos aquilo que podemos ser capazes de fazer” - Martha Grimes

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publicado às 13:30

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Olhando as coisas bem de frente é bom que se diga e fique claro que a única razão para a posição tomada pelo Conselho de Opinião da RTP, rejeitando a indicação de João Paulo Guerra para provedor do ouvinte da rádio de serviço público,é de natureza ideológica. O indigitado foi recusado porque a maioria dos conselheiros olha mais para o currículo de pensamento dos candidatos, e para as posições que possa ter tomado ao longo da vida, do que para as competências profissionais e adequação às funções para as quais é proposto. E isto acontece assim porque o Conselho de Opinião é uma manta de retalhos, resultado de uma mixórdia politico-partidária com inspiração em negociatas e jogos parlamentares a que soma uma larga componente corporativa dos mais variados e contraditórios interesses - com o ponto comum de só uma minoria ter a ver com a actividade em si da concessionária do serviço público de comunicação audiovisual. Em ambos os casos o traço dominante é a falta de conhecimento da maioria dos membros do Conselho em relação à realidade da Comunicação, e, pior ainda, a impunidade com que dizem disparates sobre a matéria. Gostam de ser treinadores de bancada, e como frequentemente acontece a quem se dedica a essa actividade, nem sequer sabem o que é uma bola. Sei do que falo porque, durante alguns poucos meses, fui membro desse Conselho, no início deste século, e ouvi discussões de estarrecer e posições que apenas mostravam a ignorância de quem as tomava em relação às matérias em debate. Este modelo de Conselhos, que se pretendem democráticos, tem um efeito exactamente contrário ao pretendido como agora se verifica - a avaliação da competência foi sacrificada às guerrinhas partidárias e ideológicas. Enquanto o Serviço Público estiver dependente, a todos os níveis, destes conselhos pretensamente independentes, arrica-se a ser manobrado por incompetetes e inúteis que não percebem sequer o que fazem. Mais valia, já que se discute uma eventual revisão do funcionamento da ERC (Entidade Reguladora da Comunicação), que os Conselhos de Opinião e "Geral Independente" da RTP fossem extintos e as decisões passassem apenas pela ERC. Era tudo mais claro, profissional e transparente.

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publicado às 13:00

LISBOA - O custo do conjunto das obras que invadiram Lisboa ultrapassará os 25 milhões de euros. Trata-se de uma campanha eleitoral caríssima esta que Fernando Medina está a fazer à custa dos impostos dos lisboetas e dirigida contra eles. Cada vez que olho para algumas transformações que vou vendo, no traçado ou na circulação, penso que Fernando Medina deve ser uma daquelas pessoas que gosta de ter tudo arrumadinho, com naperons e gatos de porcelana por cima, num ambiente asséptico que não é para viver nem usar. A cidade que ele está a fazer poderá ser muito bonitinha, mas vai ser muito pouco prática, bastante incómoda e não tem em conta o que é o bem estar dos cidadãos que vivem e trabalham em Lisboa. As faixas de rodagem ficaram mais estreitas, há menos lugares de estacionamento, há mais ruas que passaram a não ter saída e mais sentidos proibidos. Para ajudar à festa os transportes públicos funcionam mal e tudo isto dificulta a mobilidade, ao contrário do que a propaganda afirma. Medina está a fazer uma cidade como quem faz um parque de diversões: pode ser engraçado para visitar e ver, mas é desengraçado para trabalhar e incómodo para habitar. “Viver Melhor Lisboa”, o lema que Medina mandou afixar junto às obras,  é um slogan mentiroso e neste regresso de ferias muitos lisboetas já o começaram a perceber. A insatisfação aumenta de tal forma que agora Medina se viu forçado a usar uma história que ele próprio já conhecia há meses - a das irregularidades nas obras da segunda circular - para as parar e tentar diminuir o caos. Não as parou por decência ou ética. Parou-as para minorar o desgaste que está a sofrer na opinião pública. Aproveitou apenas um pretexto. Um artista. Um artista da hipocrisia política.

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SEMANADA - Jerónimo de Sousa disse na Festa do Avante! que as medidas do Governo estão “aquém do necessário”; o Bloco de Esquerda e o PCP criticaram António Costa por se ter encontrado com Michel Temer, que substituiu Dilma Rousseff na presidência do Brasil; Passos Coelho disse que esta solução governativa “está esgotada”; Assunção Cristas disse que “o ritmo de crescimento da dívida voltou a disparar” e afirmou que o Governo tem prejudicado especialmente a classe média; começam a ser conhecidas as primeiras medidas de aumentos de impostos que farão parte do Orçamento de 2017; o financiamento bancário à actividade das empresas atingiu no primeiro semestre deste ano o valor mais baixo desde 2003; Portugal, Irlanda, Itália e Espanha concentram 57% do crédito mal parado na Europa; o Ministro da Cultura fez uma ameaça  velada ao Director do Museu Nacional de Arte Antiga por este ter revelado que o Museu tem apenas 64 pessoas para 82 salas abertas ao público, o que potencia a possibilidade de problemas nas instalações; o Ministro da Cultura, que tutela os orgãos de comunicação onde o Estado está presente, ainda não se pronunciou sobre as notícias que indicam que um administrador da RTP, Nuno Artur Silva, continuaria a ser proprietário de empresas audiovisuais e que contrata para a RTP guionistas e apresentadores dos seus canais e das suas produtoras; Marcelo Rebelo de Sousa recomendou a António Costa e Pedro Passos Coelho a leitura dos livros de Elena Ferrante porque este tipo de leitura melhora o “enriquecimento cultural”.

 

ARCO DA VELHA - O Presidente do Sporting chamou representantes das claques do clube para a comissão que vai fazer o inquérito à gestão de ex-presidentes leoninos.

 

 

 

 

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FOLHEAR - Hoje mesmo, dia 9, sexta-feira, Daniel Innerarity, professor de Filosofia Política e Social da Universidade do País Basco, participa num debate sobre o tema “A Política Em Tempos de Indignação”, que decorre às 19h00 na Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, com Paulo Portas e Marisa Matias, com moderação de Maria Flor Pedroso. Considerado como um dos grandes pensadores mundiais contemporâneos, este basco acaba de ver editado em Portugal o seu livro, de 2015, que dá o título ao debate: “A Política Em Tempos de Indignação”. Ali aborda a transformação da actividade política nos anos mais recentes, nomeadamente o surgimento de movimentos sociais difusos, de novos partidos e as dificuldades das instituições tradicionais do velho sistema. No fundo o autor questiona o que é hoje em dia a política, e interroga-se sobre a necessidade de mudanças que possam levar a que a indignação que se exprime, muitas vezes de forma caótica, possa vir a ter um papel construtivo na sociedade. Teremos chegado a uma época que assinala o fim dos partidos? A classe política é mesmo desprezada? Quais serão os novos actores políticos? A quem pertence o direito de tomar decisões? A democracia, tal como a temos conhecido, é uma desilusão completa? Qual será a acção política que pode nascer depois da indignação? Pode haver democracia sem política tal como a temos conhecido? - estas são algumas das questões sobre as quais o autor especula. Edição D.Quixote/Leya.

 

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OUVIR - Já não ouvia um bom disco pop há muito tempo e este “Foreverland”, dos Divine Comedy, encaixa-se na perfeição nessa categoria. O irlandês Neil Hannon, que é o único membro permamente do grupo, criou os Divine Commedy há 26 anos e desde Maio de 2010, quando foi publicado “Bang Goes the Knighthood”, não era editado nenhum disco de originais. “Foreverland” corria pois o risco de ser uma enorme frustração ou apenas um ressurgimento. Nem uma coisa nem outra: é um trabalho de excepção, um dos melhores de Hannon, com um sentido épico e de narrativa, por vezes quase conceptual, surpreendente nos dias de hoje, muito mais vocacionados para o relato de trivialidades. Há aqui um lado de passeio pela História, que se cruza com uma mordaz observação dos tempos actuais. Para alguns pode parecer previsível atendendo à obra de Hannon, mas para outros, entre os quais me incluo, é mais uma vez um sinal de como mesmo em tempos cinzentos se podem criar discos brilhantes. Completamente desfasado das modas actuais e com uma sonoridade e arranjos que às vezes quase parecem estranhos, de tanto que se afastam da norma vigente, “Foreverland” é um trabalho sobre o amor e a fantasia, do qual destaco “Funny Peculiar” (um dueto coDC Records, no Spotify.m Cathy Davey), “Napoleon Complex” e sobretudo “How Can You Leave Me On My Own”. DC Records, no Spotify

 

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VER -  Muito se tem falado nos últimos tempos do Quetzal Arts Centre, instalado num complexo que inclui uma vinha extensa, uma adega, um restaurante e um centro de artes - procurando uma ligação entre o enoturismo e o turismo cultural. Os proprietários, um casal holandês,  propõe-se ir expondo a sua colecção de arte contemporânea, considerada em 2010 pela Art News entre as 200 maiores colecções mundiais, e também promover no local residências de artistas convidados. Cees e Inge de Bruin, o casal em questão, tem uma antiga paixão por Portugal, que vem de há quatro décadas. Ele dedica-se a gerir investimentos (com a sua  holding Indofin) e ela tem desempenhado funções de direcção, curadoria e consultoria em algumas grandes instituições culturais internacionais. Foram três os artistas da colecção escolhidos para a abertura: Robert Heinecken (1931-2006), Pat O’Neill (n. 1939), e Trisha Baga (n. 1985), todos com trabalhos de manipulação de fotografias, cinema ou vídeo. A responsável pelo Centro de Arte, Joana Mexia de Almeida, fundamentou a escolha da seguinte forma: “Optámos por começar com obras audiovisuais, que talvez sejam mais adequadas para um grande público que não é conhecedor profundo de arte contemporânea”. Atendendo ao que está apresentado mal se compreende o alcance da sua afirmação. À eventual excepção dos trabalhos de Robert Heinecken (na imagem), infelizmente apresentados numa montagem duvidosa, o resto não será facilmente enquadrável no conceito de grande público. O próprio espaço expositivo apresenta problemas para esta opção  - o maior dos quais é a belíssima luz natural que convive com dificuldade com projecções video. A abertura de um espaço tão focado em formas de expressão artística contemporâneas é sempre uma boa ideia, tanto mais que na região , excepção feita à colecção Cachola, o pendor tem sido sempré conservador. Fico com curiosidade de ver como o trabalho dos detentores da colecção, em relação a este espaço, vai evoluir. Em Fevereiro do próximo ano será apresentada a segunda exposição.

 

PROVAR - Em abono da verdade se diga que o conjunto de edifícios da Quinta do Quetzal é um bom exemplo de arquitectura integrada na paisagem. Os 50 hectares de vinha começaram a ser criados em 2002, a adega foi a primeira coisa a ser construída, em 2006, e convive na perfeição com o edifício onde está o restaurante, a loja de produtos da propriedade e da região, e ainda o Centro de Arte. É pena que ao lado da varanda do restaurante esteja um charco lamacento que polui o panorama que se desfruta do terraço, com ampla vista sobre o vinhedo. A sala do restaurante é luminosa e o mobiliário é um bom exemplo de adequação ao espaço e à função. Os petiscos por enquanto são o prato forte do local - que mais tarde há-de servir refeições mais formais, sob orientação do chef é Pedro Mendes. O restaurante funciona de quarta a domingo, e na visita realizada os tais petiscos foram bem apreciados: croquetes de farinheira com maionese de cebolinho, empadinhas de coelho estufado, peixinhos da hora com mostarda de pimentos, umas inusitadas pataniscas de abóbora e uns ovos mexidos com farinheira que estavam excepcionais. A destoar o pão, que podia ser mais autêntico, e uma tábua de queijos algo anémica em relação à tradição local. Nos vinhos - o Guadalupe branco, corrente, foi um aperitivo fresco, o Guadalupe Winemaker’s Selection revelou-se um tinto robusto e competente para a intensidade da comida e, no fim, uma prova de Quetzal tinto reserva de 2012 surpreendeu pela positiva - um vinho feito de Syrah, Alicante Bouschet e Trincadeira -  apesar da concessão  a castas nada alentejanas. Preços dos petiscos e dos vinhos mais correntes perfeitamente honestos. Resta elogiar o serviço, atento e competente. A Quinta do Quetzal, onde tudo isto se passa, fica a poucos quilómetros da Vidigueira, em Vila de Frades e o telefone é 284441618.

 

DIXIT - “A cultura é uma espécie de gambozinos dos governos: acende em noites quentes” - Fernando Sobral.

 

GOSTO - Da iniciativa de Marcelo Rebelo de Sousa e da APEL de fazer uma Festa do Livro nos jardins do Palácio de Belém.

 

NÃO GOSTO - De um Ministério da Cultura que não gosta de ouvir criticas e que nada faz para descer o IVA das entradas dos museus e de alguns bens culturais que está em 23%.

 

BACK TO BASICS - Quando se colocam quinze membros de um mesmo partido numa sala ouvem-se 20 opiniões diferentes - Patrick Leahy, Senador norte-americano.



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DR. COSTA, E DEPOIS DO VAZIO?

por falcao, em 26.08.16

VAZIO - Este verão tem sido politicamente muito educativo. Ficámos a saber que a economia persiste em não crescer, que Catarina Martins está desgostosa com as tropelias que o PS faz na geringonça, que Costa continua optimista. Tudo indica que a rentrée política vai ser muito interessante: uma preparação do Orçamento de Estado que promete agudizar as divergências na coligação, um agudizar das tensões com Bruxelas e uma degradação geral do panorama do país. Há membros do Governo desgastados, em boa parte por culpa própria, e começa agora a ver-se que a equipa maravilha que Costa reuniu à sua volta está a meter água em vários lados. Se a geringonça fosse um barco, o melhor seria instalarem rapidamente uma bomba de água potente para evitar que se afundasse. O episódio da CGD, que, sabe-se agora, levará  a um orçamento rectificativo, ainda vai provocar mais fissuras na coligação - PCP e Bloco já disseram o que queriam, e o que querem não é o que o PS acordou em Bruxelas. O cenário está preto: olhamos à volta e não vemos criação de empregos duradouros, não se vislumbram políticas de desenvolvimento regional e nacional coerentes - em vez disso as cidades estão entregues a obras de jardinagem e embelezamento, fruto do esbanjamento em função das eleições autárquicas do próximo ano; a balança comercial está frágil, a reputação das finanças de Portugal nos mercados tem piorado e os juros que pagamos ressentem-se. como se viu na última semana. Costa encontrou um país em recuperação quando chegou a S. Bento. Vamos ver o que deixa, quando sair - no entretanto tudo indica que se prepara para provocar umas eleições antecipadas e tentar ficar a governar sozinho.

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SEMANADA - O Presidente da República veio de férias e forçou explicações do Governo sobre a Caixa; Bruxelas disse como queria a Administração da CGD, reduzindo os seus membros de 19 para 15; Bruxelas mandou que alguns dos nomes propostos pelo Governo para a CGD fossem estudar; Bruxelas aprovou uma recapitalização da CGD até 4,6 mil milhões de euros e fez incluir financiamento privado no pacote; Bruxelas quer redução do número de balcões e de funcionários da Caixa; a intenção governamental de mudar a lei bancária para encaixar as propostas do Governo, vetadas pelo BCE, foi travada por uma convergência de opiniões do Presidente da República, do PCP e do Bloco de Esquerda; Catarina Martins afirmou arrepender-se todos os dias do acordo que permitiu ao seu partido apoiar o Governo do PS, devido às limitações que cria; os filhos de um embaixador de um país árabe envolveram-se numa zaragata, um português de 15 anos foi espancado por eles, e os agressores disseram estar “humilhados e zangados” ; neste assunto o ocupante do Ministério dos Negócios Estrangeiros mostrou mais uma vez ser um mero verbo de encher; na PSP há entre 7 a 10 mil agentes desperdiçados em tarefas burocráticas; o Governo disse que não podia fazer mais no combate aos fogos; a Ministra da Administração Interna deu uma entrevista à revista Flash a explicar como as suas férias foram interrompidas pelos incêndios.

 

ARCO DA VELHA - Os encargos do Estado com as parcerias público-privadas no primeiro trimestre aumentaram 5% face a igual período de 2015 e as receitas das portagens para os cofres públicos caíram 2%.

 

 

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OUVIR - Este ano tenho feito umas férias um pouco diferentes do que é habitual e lancei-me à estrada, em Portugal e Espanha. De vez em quando ouvia as minhas listas no Spotify, mas na maior parte do tempo, em Portugal, sintonizei a Antena 1, 2 ou 3. Devo dizer que por razões profissionais sou um saltitão na escuta das rádios, mas pelo menos uma vez por semana sigo a emissão da manhã da Antena 1. Eu gosto muito de rádio, acho que é um dos media mais fascinantes e daqueles que melhor se tem conseguido adaptar às mudanças - de tal forma que tem ganho ouvintes em vez de os perder. Um estudo recente indicava que a rádio superava a imprensa em termos de confiança quanto à informação transmitida. Ao contrário do que acontece com a televisão, o horário nobre da rádio está no início da manhã, entre as sete e as dez, quando a maior parte das pessoas se deslocam para o trabalho, nomeadamente nos seus veículos particulares. Até há uns dois anos o carro era o sítio por excelência para ouvir rádio, mas, de repente, olhado-se para os números de consumo de internet, constata-se que começou a existir uma dispersão de horários - a audiência de rádios online, em streaming, já é significativa durante o período laboral. Regressando ao início do parágrafo, venho aqui dizer que gosto da Antena 1, gosto às vezes da Antena 2 e acho que a Antena 3 cumpre bem a sua função, embora não lhe ficasse mal um choque de vitaminas. O bom estado do serviço público de rádio deve-se a Rui Pêgo, que há anos o dirige. É impressionante o contraste entre a qualidade e utilidade do serviço público de rádio e a vacuidade da maioria do  serviço público de televisão - quer em termos de programas, quer em termos de informação. Bem sei que os meios necessários são diferentes, mas aqui, o que conta, é a atitude. Rui Pêgo faz serviço público. Outros, na RTP televisão, não. É isto. Deixo também um elogio ao facto de a rádio pública ter desenvolvido programas de autor sobre os mais variados temas. Estes programas de autor são, hoje em dia,  a matéria prima para a mais valiosa propriedade da rádio no mundo digital - os podcasts. E nesta matéria a rádio pública dá cartas.

 

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VER - A Condé Nast Traveller considerou este ano o Guggenheim de Bilbao, desenhado por Frank Gehry, como o mais bonito museu do Mundo. Bilbao saía de um período difícil quando se decidiu avançar para a construção do museu, que decorreu entre 1993 e 1997. O projecto ajudou claramente a mudar a imagem da cidade e voltou a colocar Bilbao no mapa. Lisboa podia ter um polo de atracção assim se o projecto de Gehry para o Parque Mayer tivesse ido em frente - infelizmente esse azar da democracia chamado Jorge Sampaio impediu-o, vetando, quando era Presidente da República, um diploma que permitiria fazer a obra. Ao fim destes anos todos o Parque Mayer continua sem solução, abandonado e sem plano coerente. Mas regressemos ao Guggenheim de Bilbao - além de ter um museu fantástico, tem um site na internet fabuloso e um conjunto de presenças nas redes sociais que permite visitar o projecto de arquitectura, a história da sua construção, o trabalho de Gehry e uma visita ao exterior e ao interior do edifício. É também possível percorrer a colecção própria do museu, fazendo uma visita virtual. Enquanto não se encontra tempo para lá ir, a visita virtual, cada vez mais acessível em numerosos museus de referência, é uma boa forma de nos informarmos, conhecermos e escolhermos aquilo que queremos ver. Era engraçado que o projecto de Gehry para o Parque Mayer estivesse também assim acessível. Pode ser que a história recente de Lisboa não se resumisse no futuro aos desvarios a que vamos assistindo.

 

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FOLHEAR - A edição de Setembro da “Monocle”, já distribuída em Portugal, é dedicada ao empreendedorismo, e sugere muitas ideias e casos para seguir. Berlim, Tel Aviv, Oslo e Auckland são cidades recomendáveis para novos negócios, segundo a revista. Kasrin Wanngard, a Mayor de Estocolmo, olha para os  resultados conseguidos pela sua cidade nos anos mais recentes e destaca a importância da educação, dos transportes públicos, de apoios familiares e de alojamento acessível como aquilo que permitiu atrair e reter talentos. Foi um esforço continuado de inovação, de promoção da diversidade, de educação em todos os níveis escolares e na criação de uma rede de infantários municipais disponíveis para todas as famílias, sejam estudantes ou já trabalhadores. Uma das prioridades da cidade é dar condições para combinar a família com a carreira e Karin sublinha que quando as cidades funcionam em termos de atracção de talentos, funcionam em termos de atracção de negócios, e está garantido que terão sólidas instituições culturais e desportivas. Outros artigos interessantes nesta edição têm a ver com as novas tendências de produção de televisão e diversos ensaios sobre as razões de sucesso de bons negócios. Portugal tem três referências - uma página de publicidade da trienal de arquitectura, um elogio às novas capacidades na industria aeronáutica que a Embraer aqui criou, e finalmente, no Guia do Empreendedorismo, o primeiro destaque vai logo para Nuno Carvalho, que explica como construíu a sua Padaria Portuguesa.

 

PROVAR - Já se sabe que o norte de Portugal é uma região onde se come bem. Mas mesmo assim, às vezes fica-se bem surpreendido. Foi o que me aconteceu na “Muralha de Caminha”. Trata-se de uma casa que é simultaneamente restaurante e alojamento local, situada em sítio privilegiado, frente à foz do rio Minho. Tem uma zona interior e uma belíssima esplanada que nestes dias merece ser vivida. À partida há três coisas a destacar - a frescura dos produtos (mariscos, peixe ou carne), a simpatia do pessoal e o saber da cozinha. No meio das voltas que dei não vi robalo de pesca local tão fresco como o que chegou à mesa da Muralha. Espreitei para  a mesa do lado, onde um cliente notoriamente habitual se deliciava com um lavagante “da nossa costa”, grelhado e flamejado em aguardente velha. Eu fiquei-me com meia dose de posta de novilho, feita com um tempero habilidoso de alho, louro e pimenta e que estava verdadeiramente delicioso. A acompanhar vinham batatinhas novas salteadas e feijão verde, mas o pedido de umas batatas fritas - feito por inveja do que via passar  - foi prontamente satisfeito. Antes de o repasto começar tinham vindo dois pastéis de bacalhau daqueles que já é raro encontrar, com mais bacalhau que batata, e dois rissóis de carne, impecáveis. A lista de vinhos é boa e tem em conta a produção local. A broa de milho era exemplar. Muralha de Caminha, Rua Barão de São Roque 69, telefone 258 728 199.


DIXIT - O facto de querer sempre concorrer com os privados, o facto de não ter uma elite com coragem para fazer diferente, tornam a RTP pouco relevante e muitas vezes irrelevante no que toca ao serviço público” - Eduardo Cintra Torres.

 

GOSTO - Da apresentação da integral das nove sinfonias de Beethoven, pela Orquestra Metropolitana de Lisboa, em várias cidades, como vai acontecer em quatro dias seguidos, no Terreiro do Paço, no fim do mês de Setembro.

 

NÃO GOSTO - Da decisão sobre a permanência dos Mirós em Portugal. Como Jorge Calado escrevia na Revista do Expresso: “Em vez de ficar com dois ou três razoáveis e vender o resto para comprar obras para as colecções existentes, vai-se criar o pior museu Miró do mundo para mostrar o rebotalho de uns restos de colecção. “

 

BACK TO BASICS - “Depois de saber tudo, estará sempre tudo por saber” - Alexandre O’Neill

 

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publicado às 14:09

VACAS VOADORAS DERROTADAS POR POKÉMONS

por falcao, em 22.07.16

MONSTRINHOS - Tudo indica que o primeiro-ministro passou das vacas voadoras para uma busca incessante atrás dos Pokémons. Onde quer que esteja só vê os pequenos monstros a saltarem por todo o lado à sua frente, e culpa-os de tudo o que lhe está a acontecer. Cada vez que Mário Centeno lhe aparece pela frente é como se estivesse a olhar para um Pokémon gigante. Sonha com monstrinhos na Caixa Geral de Depósitos e no Novo Banco. Cada vez que aterra em Bruxelas lá anda de telemóvel na mão a ver se descobre mais Pokémons nos corredores e, na recente visita de Hollande a Portugal, foi visto a olhar para o Presidente francês como se este tivesse algum Pikachu a sair-lhe do colarinho. Até em Belém, cada vez que lá entra, olha desconfiado para o ecrã do telemóvel a ver se por detrás de Marcelo não aparece nenhum Pokémon. Quando passa perto do Bloco de Esquerda ou do PCP fica desconfiado, a ver de onde lhe vai saltar um dos pequenos monstros. Na Assembleia da República nem se fala - mandou os seus assessores andarem de telemóvel no meio do hemiciclo a ver se descobrem qual a influência que os Pokémon tiveram na rejeição de Correia de Campos para o Conselho Económico e Social. E segundo os relatos surgidos a público através de vários Pokémons, numa recente reunião com parlamentares socialistas, mostrou-se desiludido, preocupado e houve até quem tivesse pensado que estava a preparar o caminho para eleições antecipadas. Quer-me parecer que a geringonça vai deixar de ser rebocada por vacas voadoras, e que em vez delas estarão Pokémons a fazer das suas...

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SEMANADA - A atividade económica em Portugal abrandou dois meses consecutivos, em Abril e Maio, e um índice para Junho (sobre clima económico) aponta para uma estagnação - as conclusões são de um relatório do Instituto Nacional de Estatística; um estudo do INE sobre o panorama do acesso à cultura nos concelhos portugueses mostra que em 41% dos municípios não há salas de espetáculo e Lisboa concentra um quarto da oferta e 60% das receitas; o Orçamento de Estado de 2017  terá cortes nas áreas da saúde e educação; esta semana um porta-voz dos comunistas garantiu que o PCP não tenciona “fazer a cama” ao governo;  PCP manifestou descontentamento por não ter sido ouvido na negociação dos nomes para Tribunal Constitucional, ao contrário do que aconteceu com o Bloco de Esquerda; o nome de Correia de Campos foi chumbado pelos deputados para presidir ao Conselho Económico e Social;  o Governo anunciou que vai congelar os salários dos funcionários públicos no próximo ano; as Universidades aumentaram o número de vagas e os cursos com mais desemprego não cortaram lugares; na Assembleia da República há nove deputados da que nunca falaram nas 88 reuniões já realizadas da actual legislatura; as vítimas de abuso sexual fora do contexto familiar têm que pagar custas judiciais se avançarem com processo contra os agressores; Arnaldo Matos, que voltou a dirigir o MRPP, classificou o atentado de Nice como “um acto legítimo de guerra”.

 

ARCO DA VELHA - Uma pesquisa no site da RTP permite concluir que o Conselho Geral Independente não tem ali actividade divulgada desde o final do 1º semestre de 2015 - nem comunicados, nem actualizações de linhas de orientação estratégica, nem TDT, nem sequer relatórios sobre a sua actividade ou actas das reuniões.

 

 

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 FOLHEAR - Uma das mais fascinantes revistas que tive oportunidade de folhear nos últimos tempos chama-se “amuseum” e é dedicada a mostrar objectos, enquadrando-os em artigos sobre cultura, arte, design, ciência e História. Editada em Londres, começou a sua vida em 2014 e vai no terceiro número. É obra de Dan Stafford, que a concebeu editorialmente e do ponto de vista gráfico - numa rara e bem sucedida combinação que abarca todo o processo editorial. A revista cruza textos com fotografias, ilustrações e banda desenhada. Tem um sentido de humor particular que se nota por exemplo na apresentação de Spielberg : “o mestre do suspense que colocou um tubarão na imaginação dos amantes de praia de todo o mundo” ou na secção objectos acabados, onde uma cassette VHS se cruza com o esqueleto de um dinossauro. Este é um daqueles casos em que depois de uma primeira visita se volta uma e outra vez às mesmas páginas, descobrindo novos pormenores, novos pontos de interesse. O seu ritmo de edição, anual, acaba por ser um incentivo a que ela seja guardada como o objecto de colecção, que de facto é. Mais informações em http://www.amuseummag.com .

 

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VER - Um céu, pintado no tecto de uma Igreja, foi o último projecto de Michael Biberstein, um pintor de naturalidade suíça radicado em Portugal durante cerca de três décadas e que faleceu subitamente em 2013 sem ter conseguido executar a sua ideia na Igreja de Santa Isabel. A viúva do artista, Ana Nobre Gusmão, o pároco da igreja,  José Manuel Pereira de Almeida, e várias entidades que asseguraram o financiamento da obra, deram vida à ideia e “o céu de Mike” foi inaugurado esta semana. A maquete ‘Um Céu para Santa Isabel’ foi apresentada pela primeira vez na galeria Appleton Square, no âmbito da Trienal de Arquitetura de 2010 e o “interesse” que o projeto despertou motivou angariação de fundos para a sua realização. Michael Biberstein faleceu a “escassos meses” de começar a pintura mas o pároco de Santa Isabel revelou que a sua viúva e todas as pessoas envolvidas resolveram continuar o projeto e estabeleceram que o tecto deveria ser pintado como surgia no original da maquete. “Como uma pedra preciosa guardada dentro de uma caixa escura com uma sombria tampa cinzenta” - foi assim que Michael Biberstein descreveu a igreja de Santa Isabel, sublinhando que a luz que entrava pelas janelas era absorvida pelo tecto preto-mate então existente, “o que visualmente torna o espaço muito pesado, impedindo-o de respirar e desenvolver visualmente o volume desejado”. No texto, disponível no blogue Um Céu para Santa Isabel, Biberstein propunha-se substituir “o sufocante manto cinzento por um céu aberto”, tornando-o mais acolhedor, forte e apelativo à meditação. O Céu de Santa Isabel está agora à disposição de todos.

 

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OUVIR - Se Frank Zappa fosse vivo aposto que gostaria de se candidatar contra Donald Trump só para marcar presença e dizer o que iria na alma. Zappa morreu no fim de 1993 e foi um dos mais fascinantes e influentes músicos norte-americanos nas décadas de 60 e 70, cruzando géneros e abrindo novos caminhos. Combinava uma invulgar capacidade musical - como compositor, executante e produtor - com um humor avassalador e um olhar atento e cáustico sobre a sociedade norte-americana. Ele, e os seus Mothers Of Invention, nunca foram muito populares mas marcaram uma época com discos como “200 Motels”, “Freak Out”, “We’re Only In It For The Money”, “Apostrophe”, “Hot Rats” ou “Chunga’s Revenge” entre tantos outros. Os seus herdeiros chegaram recentemente a acordo com a Universal Music e, muito adequadamente, neste ano de eleições norte-americanas, saíram agora em simultâneo (e já estão disponíveis em Portugal), dois álbuns feitos a partir dos arquivos de gravações não editadas de Frank Zappa. “Frank Zappa For President” retoma a ironia que o caracterizava e agrupa versões inéditas de temas conhecidos, gravações ao vivo e algumas remisturas. É Zappa no seu melhor, ele próprio a tocar o seu synclavier. Vale a pena ouvir “ If I Was President” e a  “Overture To Uncle Sam” permite perceber como maestros como Pierre Boulez se apaixonaram pela musica de Zappa e a gravaram. Em simultâneo a Universal lançou também “The Crux Of The Bisquit”, apresentado como um documentário audio, e que foi feito para celebrar o 40º aniversário da edição do álbum “Apostrophe”. Contém versões inéditas, gravações alternativas de alguns temas, até excertos de uma entrevista,  e recupera o primeiro alinhamento para o álbum que viria a ser um dos raros sucessos comerciais de Zappa - com participações de músicos como Jean Luc Ponty, Jack Bruce  ou George Duke, entre outros. Frank Zappa, “For President” e “ The Crux Of The Bisquit”, edições Universal disponíveis em CD.

 

PROVAR -  A casa abre só ao fim da tarde e depois fica a funcionar até à meia noite. Começa com petiscos e depois passa para jantar. Tem carta curta, ideal para quem não gosta de ter muita escolhe ou não gosta de ficar indeciso. Os pratos principais são um naco de atum ou um naco de carne angus. Volta e meia há um prato extra, tipo sugestão do dia, fora da lista, como um naco de espadarte ou um chuletón. O local que assim funciona chama-se Boca Café, e fica na Rua de S. Bento. Nas entradas e petiscos destaque para umas tortitas de miolo de sapateira com jalapeños e uma rica e variada salada vietnamita. Para coisas mais substanciais há o naco do mar - atum grelhado com maionese de lima e mostarda tradicional e o naco da terra, black angus grelhado com redução de balsâmico e mostarda. Em alternativa há pregos de atum e de angus, muito bem temperados, em pão de forno de lenha, acompanhados por umas deliciosas com batatas partidas com salsa brava. Nos acompanhamentos, além destas batatas, há espargos verdes e um curioso puré de boletos selvagens com tomilho. Nas sobremesas há um bem conseguido  gelado de chocolate belga, espuma de cacau e avelãs chamado Choco Duo. Para a próxima experimento o creme brulée com poejo. A lista de vinhos não é extensa mas tem boas propostas, embora precise de ser mais comedida nos preços propostos. Há vinho a copo e a imperial, bem tirada, é da cerveja espanhola Estrela Damm. O serviço é muito simpático e atencioso. A decoração é simples e confortável, um longo corredor que culmina numa sala e no bar Tudo fica ainda mais atraente nestas noites quentes com um pátio entre prédios, espaçoso, onde está uma esplanada sempre muito concorrida Nas paredes há obras de Sebastião Lobo, baseadas no nome do restaurante: Boca. Rua de S Bento 33, telefone 969 706 422, aberto das 19 à meia noite, fecha às segundas.

 

DIXIT - "Não faz sentido estar a gastar dinheiro na recuperação de símbolos do passado” - José Sá Fernandes, vereador em Lisboa.

 

GOSTO - O próximo livro da saga Harry Potter vai ter apresentação mundial na livraria Lello, do Porto.

 

NÃO GOSTO - Da afirmação de Simonetta Luz Afonso sobre a Praça do Império: “Os brasões não fazem falta nenhuma no jardim”.

 

BACK TO BASICS - A Europa não é mais do que uma expressão geográfica - Otto von Bismarck






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publicado às 14:00

TALVEZ - Em pouco mais de 48 horas, algures no Atlântico, o mais alto magistrado da nação passou da salvação ao talvez, com passagem clandestina pela casa de partida da negação. Por muitos anos que viva não conseguirei perceber o que se passou - como é que alguém pensou que podia fazer xeque mate ao PS deixando sem imaginar o Rei Soares a esgueirar-se para dentro do tabuleiro. Na política, como no xadrez, é preciso saber as regras do jogo e, mais ainda, antever as jogadas do adversário. Notoriamente o pecado capital de Cavaco Silva foi não prever o que se poderia passar. Tomou os desejos por realidades, fiou-se nas conversas das sereias que o bajulam e negou as evidências. Quando no último round deste combate de boxe entraram os pesos pesados em acção, o peso pluma de Belém ficou sem reacção. meteu os pés pelas mãos e mostrou como os 20 dias que empatou foram dias perdidos - porque regressou exactamente à casa de partida onde estava. Se há coisa que esta crise de 2013 mostra é a necessidade de rever o papel do Presidente da República - este semi-presidencialismo excitado, que fenece ao primeiro obstáculo, é uma atrapalhação para o Parlamento e para o regime. O regime, já o sabemos, não está são e os partidos estão comatosos. No meio deste desvario, o Presidente da República tem sido mais um carrasco que um salvador. E esse é  um dos recorrentes  problemas a resolver. Adivinha da semana: quem é que gosta de falar do futuro daqui a um ano e vai falhando o futuro próximo, que está ao virar da porta, comprometendo o presente ?


LISBOA - À medida que se aproxima o 29 de Setembro, aceleram as obras. Ruas há muito esburacadas levam um maquilhagem de asfalto. A Rua do Ouro, que parecia um concurso de lombas e declives, está a levar um “facelift”. Costa desempenha o papel daqueles  cirurgiões estéticos que não resolvem o problema, mas conseguem iludir as aparências. O que anda a fazer em Lisboa - da beira rio, ao centro da cidade, é uma espécie de botox alcatroado. Só lhe falta fazer rotundas - mas em compensação fez ciclovias que permanecem desertas na maior parte do dia. Pelo caminho que as coisas levam, António Costa será  um voto perdido para os que ne acreditam - vai conseguir maneira de deixar Lisboa entregue ao soldado desconhecido enquanto ele vai pelear pelo Governo - A Lisboa de Costa, a vida política de Costa,  é isto: ilusão, make up e propaganda. O pior é quando se anda na Avenida da Liberdade...



SEMANADA - Sinal do regime: o BPN continua bem presente na vida política nacional e no poder; na imprensa, entre 2004 e 2011 desapareceram 782 publicações regulares; a dívida portuguesa é, na zona euro, a que mais sobe desde 2010 -  42 milhões de euros por dia ao ritmo actual;  Vitor Gaspar dimitiu-se a 1 de Julho;  a crise abriu-se a 2 de Julho com a demissão de Paulo Portas;  a nova orgânica proposta para o Governo, já após negociações da coligação, foi comunicada dia 5 por Passos Coelho a Cavaco; depois o Presidente da República fez um intervalo para parto de uma ideia e, finalmente, a remodelação só foi concretizada a 23, o mesmo dia em que António José Seguro completou 2 anos à frente do PS - imagino que a remodelação tenha sido uma prenda segura depois da ruptura das negociações de “salvação nacional”; indiferente às redundantes reorganizaç\oes e discussões sobre serviço público, a televisão está a mudar - meia centena de candidatos às autárquicas já criaram canais de televisão próprios no Meo Kanal, algo impensável há quatro anos; nos últimos cinco anos foram investidos seis mil milhões de euros em projectos agrícolas; o negócio da agricultura biológica vale 20 milhões de euros por ano; as exportações de frutas, legumes e flores triplicaram na última década; dos 75 mil candidatos a professores, só 1344 foram colocados; dos 40 mil professores contratados apenas três conseguiram entrar nos quadros de uma escola pública; a greve de guardas prisionais teve forte adesão na cadeia dos VIP - qualquer dia há um reality show por detrás das grades.


ARCO DA VELHA - Suspeitas de fraudes no Serviço Nacional de Saúde já levaram à detenção de 35 pessoas, à constituição de 250 arguidos e à detenção de irregularidades superiores a  135 milhões de euros.


VER - Pode um curador deixar uma marca? Eu digo que sim, e há duas exposições em Lisboa que abonam esta tese, ambas com curadoria de Luis Serpa. No BESart, no Marquês do Pombal, está  'Territórios de Transição #11 - A Experiência do Silêncio', que  reúne um conjunto de obras de fotografia da coleção BESart e d'O Museu Temporário, até 19 de setembro. É uma exposição que mostra a importância do ritmo com que o visitante vê,  quando se faz uma montagem de uma sucessão de obras, na essência muito diferentes, mas que acabam por confluir graças ao trabalho do curador. Mas é em “Aparências Privadas”, uma mostra de auto-retratos de artistas contemporâneos, da colecção Safira& Luis Serpa e da Colecção Arpad Szenes-Vieira da Silva que melhor se compreende a importância do curador e, muito, do pormenor da escolha, da montagem. A exposição estará patente até 10 de Novembro na Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva, no Jardim das Amoreiras,e é um dos pontos imperdíveis do roteiro estival em Lisboa.



OUVIR- Se tiverem um descapotável a audição deste disco fica facilitada: é pô-lo a tocar e senir os quilómetros a passar, com a brisa a ajudar. Se não for o caso, como acontece à maioria doa mortais, o disco serve para imaginar como podia ser agradável ouvi-lo nas circunstâncias atrás descritas. Seja como fôr este disco de que falo substitui um DJ - porque é feito por DJ’s, que fizeram as suas malfeitorias habituais em cima de temas clássicos do jazz vocal. “Verve Remixed - The First Ladies”, agarra em temas históricos do catálogo da Verve, de nomes como Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan, Nina Simone, Dinah Washington ou Astrud Gilberto e dá-lhes um tratamento remix por cima. Os puristas não vão gostar, o tratamento é mais radical que em anteriores remixes do catálogo Verve. Aqui há pouca ligação com o passado e, mais, um exercício do prazer imediato. Sinal dos tempos que correm. (Verve Remixed, the First Ladies, CD Universal, FNAC)



FOLHEAR - A “Wired” britânica de Agosto dá a capa ao tema “Como ser criativo nos negócios: 13 lições para pensar mais ráºido e melhor”. Atendendo à conjuntura nacional eu acho que uma boa atitude de serviço público era distribuir exemplares desta edição por vários ministérios. Começava em S. Bento, onde a criatividade se revela cada vez mais necessária, e depois fazia um périplo pelas Finanças, a Economia e a Educação. Já nem faslo nos novos Negócios Estrangeiros, porque o bafio é medonho. A ver vamos como tudo se desembrulha. A “Wired” britânica continua provocatória como se deseja, “mainstream” para ser viável e útil para ser atraente. Em resumo - três pilares de serviço público - se a RTP fosse provocatória, mainstream e útil, em simultâneo, não haveria tanta conversa à volta do assunto. A coisa resolvia-se por si. A vantagem do comando de televisão é que assim toda a gente pode mudar de canal. E, eventualmente, ouvir ou ler em vez de ver. A experiência não é pior.


PROVAR - Sento-me com amigos à volta de um queijo, umas lascas de presunto também. Combinamos petiscar. Abre-se uma garrafa de “Aurius”, o tinto de touriga nacional, syrah e petit verdot feito por José Bento dos Santos na sua Quinta do Monte D’Oiro, em Alenquer. O ano da colheita é 2009, mas chegou agora ao mercado. Tem 14º e o seu aroma quente vai bem com os petiscos que debicamos. Beberricamo-lo devagar, a apreciar os sabores das castas que o compõem. Perdemo-nos nos abores e na conversa. Foi uma noite magnífica.


DIXIT - “A união faz a forca. A salvação nacional dá a corda” - Rui Zink

GOSTO - Da nova composição do Governo


NÃO GOSTO - Do tempo que se perdeu a fazer a remodelação

BACK TO BASICS - “A dúvida não é uma condição agradável, mas a certeza é absurda” - Voltaire

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publicado às 15:03

O papel do Serviço Público de televisão tem que ser visto hoje em dia no contexto da dinamização do tecido industrial audiovisual português e da divulgação da língua e cultura portuguesa no espaço digital. Por outro lado a rápida evolução tecnológica exige que verdades passadas sejam reanalisadas periodicamente e que os períodos de atribuição dos contratos de concessão do serviço público, e respectivo conteúdo, sejam aferidos, avaliados e eventualmente modificados com maior frequência do que até aqui tem sucedido.

 

Há alguns anos que me interesso pelo tema: em 2002 integrei uma Comissão criada pelo Ministro Morais Sarmento, que elaborou um Relatório sobre o Serviço Público de Televisão, cujos princípios gerais continuam justos. Algum tempo depois fui convidado para pôr de pé o projecto de um canal aberto à Sociedade Civil, que ficou conhecido como a 2:,  que dirigi durante quase três anos.  Antes, quando trabalhei na produção independente, nomeadamente na área dos documentários, na Valentim de Carvalho Televisão, testemunhei que era mais fácil vender documentários sobre a história contemporânea portuguesa à SIC, como aconteceu, do que à RTP. De há cerca de três anos a esta parte a estação pública tem perdido progressivamente relevância e, nos tempos mais recentes, as mudanças de tecnologia, de distribuição e de hábitos de consumo de programas foram enormes, afectaram-na de forma sensível,  e é absolutamente indispensável que as definições gerais de serviço público audiovisual sejam adaptadas à realidade da introdução da Televisão Digital Terrestre, que é utilizada como meio único de recepção por apenas cerca de um quarto dos lares portugueses, e que o papel da RTP seja repensado no novo universo tecnológico, nomeadamente enquanto motor de inovação e não enquanto bastião da tradição.

 

Costumo dizer que Gutenberg chegou à televisão com a entrada no mercado de câmaras digitais de alta definição de preço acessível e com sistemas de edição baseados em computadores que qualquer um de nós pode ter em casa. Mas a realidade é que este Gutenberg audiovisual ainda é pouco aproveitado pelo serviço público e que a RTP, para utilizar uma analogia com a imprensa, ainda trabalha com composição a chumbo numa época em que o offset já tem várias gerações e em que, por exemplo no MEO, é possível a cada um de nós criar um canal – bem sei que não é bem disso que estamos a falar, mas este exemplo serve para mostrar como a televisão deixou de ser uma tecnologia inacessível e isso tem inevitavelmente consequências no comportamento de todo o sistema.


A ALTERAÇÃO DO CONSUMO E A REESTRUTURAÇÃO DA RTP


Hoje em dia cerca de 77% dos lares portugueses consomem televisão que lhes chega por um dos sistemas de distribuição de cabo ou satélite. Quer isto dizer que estes lares têm uma oferta de pelo menos meia centena de canais, em vez dos quatro tradicionais (RTP 1 e 2, SIC e TVI) e do Canal Parlamento, que também está, vá-se lá perceber porquê, na Televisão Digital Terrestre.


Portanto, sem desprezo pelos 23% de lares restantes, a oferta e os hábitos de consumo de televisão em Portugal mudaram de forma substancial nos últimos cinco anos. Basta dizer que desde há mais de um ano o conjunto dos canais de cabo ultrapassa em share médio de audiência qualquer um dos canais de sinal aberto.


Ora estas alterações significativas na distribuição e no consumo dos canais de televisão tem inevitavelmente consequências no serviço público – sobretudo no que deve ser a sua definição hoje em dia. A questão do acesso universal e gratuito por exemplo, já não é a pedra de toque da definição. Por outro lado, os canais generalistas e comerciais privados fornecem informação pelo menos tão pluralista como a da RTP, entretenimento e produção nacional em maior quantidade que a RTP, e qualquer pessoa – com cabo ou sem cabo - pode aceder a eles em qualquer ponto do território para ver futebol ou transmissões diretas de acontecimentos importantes – já que todos o fazem.

 

Fruto de um posicionamento concorrencial face aos privados, a RTP é ainda hoje uma entidade despesista, com uma estrutura sobredimensionada e custos desproporcionados. Num modelo ideal a RTP devia possuir apenas os meios necessários à informação e à emissão e tornar-se, usando a terminologia anglo-saxónica, num “broadcaster” e não numa empresa de produção, que é hoje em dia.


Ou seja, toda a área de conteúdos não informativos devia ser descontinuada e o investimento em programas de documentário, ficção, infantis e entretenimento devia ser aplicado na produção externa e na aquisição de programas - o que quer dizer ter uma ideia do que se quer encomendar, do que se deve aceitar, do quye se deve exigir aos produtores externos: ou seja não ter um papel passivo na recepção da encomenda, mas um papel activo de discussão de conteúdos e de resultado final, em função dos objectivos da estação. Ao contrário do que muitos pensam a BBC não produz internam,ente as belas séries e os belos documentários que conhecemos: contrata produtores externos para a sua concretização mas tem uma equipa de produtores executivos que define, acompanha, controla e decide se o produto final está de acordo com a encomenda e  com as guidelines da estação.


Este canalizar para a aquisição de conteúdos de parte importante das verbas actualmente gastas em funcionamento permitiria dinamizar a produção independente, desenvolvendo e consolidando uma industria audiovisual, necessária à manutenção do português enquanto língua viva. Recordo que a RTP é a empresa que menos tempo de emissão consagra à produção nacional não informativa, nomeadamente na ficção.


No meu entender existe um papel importante a desempenhar pelo serviço público e que tem a ver com uma carteira de encomendas continuada, junto à produção independente, nas áreas menos apetecidas pelos operadores privados, como os documentários, o registo de espectáculos na área do entretenimento ou uma programação infantil acessível, cuidada e baseada no português falado e não em legendagens. Estas áreas são fulcrais para o desenvolvimento e para a nossa sobrevivência no universo dos conteúdos audiovisuais. Actualmente, nem 10% do investimento em grelha chega à produção independente.


De uma forma mais concreta, faria sentido que o serviço público de televisão investisse a maior fatia do seu orçamento de produção na encomenda e aquisição de programação de stock – aquela que se pode repetir ao longo do tempo e que não se esgota na primeira emissão, e a que se chama de fluxo. Para dar um exemplo uma série de ficção é stock e um concurso como o “Preço Certo” é fluxo. Faz mais sentido investir no que perdura do que naquilo que se evapora, certo? Já nem vou dizer que o aproveitamento da produção de stock nas emissões internacionais, em intercâmbios com outras televisões ou até na venda de direitos é uma realidade e que o fluxo é inaproveitável em tudo isto. A este propósito não deixa de ser interessante que a BBC tenha escolhido a sua área emporesarial que se dedica à comercialização dos conteúdos próprios (produzidos externamente), para servir de garantia e alavanca a uma operação de financiamento.

 

CRIATIVIDADE OU BOÇALIDADE?

 

Analisemos o tema de outra perspectiva, mesmo correndo o risco de alguma repetição: nos dias de hoje, num país com a dimensāo de Portugal, qual o sentido de existir um serviço público de televisāo, suportado pelos cidadāos, neste caso por uma taxa obrigatoriamente paga por todos os consumidores de electricidade? Numa sociedade onde felizmente existem vários operadores privados de televisāo e de rádio, e numa época em que o digital veio proporcionar novas formas de emissāo, difusāo e recepçāo - para nāo falar já profunda alteraçāo dos hábitos e formas de  consumo de televisāo, sobretudo entre os mais novos - para que serve um serviço público?


Correndo mais uma vez o risco de me repetir, insisto em algumas perguntas: o serviço público deve fazer concorrência aos privados,  ou deve proporcionar programaçāo alternativa e formativa? O serviço público deve ser comprador concorrencial de direitos de exibiçâo de futebol, um conteúdo comercial especialmente apetecível, contribuindo para inflacionar o seu preço? Ou deve privilegiar o fomento da produçāo de ficção e dos documentários sobre a realidade portuguesa? Deve fomentar a criatividade ou a boçalidade? Deve fazer programaçāo infantil em português, que possa ser difundida noutros países lusófonos, ou deve gastar recursos a fazer formatos internacionais de concursos e de entretenimento? Deve privilegiar a co-produção com outros países do universo cultural lusófono, ou adquirir séries que já passam nos canais de cabo emitidos em Portugal?


Bem sei que um canal que se focasse na nossa cultura e na nossa história, que fizesse uma informação de referência, abdicando da espectacularidade do sensacionalismo e da chicana política, teria menos audiência e menor influência na luta partidária. Mas, ao nível a que já caíram as audiências da RTP, a diferença não seria grande e até poderiam surgir surpresas.


A este propósito, as recentes decisões da RTP, de suspender a produção de documentários por produtores independentes é muito preocupante: penso que esta devia ser uma área prioritária de recursos financeiros das grelhas e não uma área descartável. No fundo, a RTP quer investir em fluxo ou em stock? É esta a questão que deve ser clara em decisões futuras sobre as obrigações do serviço público.


Finalmente penso que uma área onde se devem aproveitar as disponibilidades técnicas e humanas da RTP - e que deve fazer parte da sua missão - é a informação regional e até mesmo local. O seu serviço informativo deveria ser orientado para a proximidade com os seus públicos e não apenas de índole nacional, repetindo os canais concorrentes. Da mesma forma faria sentido desenvolver as boas capacidades existentes de reportagem, a partir dos meios disponíveis na Direcção de Informação - alguns desses espaços já existentes são aliás exemplo de boas audiências conquistadas pelo canal.


Mais vale um serviço público sério, rigoroso e dinamizador do tecido industrial audiovisual que um serviço incaracterístico, concorrencial com os privados e que tenha por missão disputar audiências. Um serviço público pensado sobre uma matriz cultural na acepção mais ampla da palavra, seria uma alternativa verdadeira, teria um carácter complementar, e um papel maior e mais importante a longo prazo na defesa da presença da nossa língua no mundo. Um serviço público assim, que dinamizasse a indústria audiovisual, que apostasse na produção externa, seria um investimento com retorno em vez de um problema a fundo perdido - como a RTP tem maioritariamente sido nos últimos 20 anos.

 

OLHAR PARA O FUTURO E TOMAR DECISÕES

 

Um país que não tiver produção audiovisual de referência, que não apostar em conteúdos duradouros, não terá existência futura no mundo digital, o seu idioma não existirá para geração futuras, não terá presença nem influência internacional. Infelizmente a estratégia é esta, a da dissolução da nossa presença no mundo contemporâneo - bem diferente de outros países com idiomas menos falados, como a Noruega, a Finlândia ou a Islândia, onde no entanto se pensa numa estratégia nacional de conteúdos - que tem sabido cativar audiências onde menos se espera.


Para terminar e para esclarecer as coisas, sou da opinião de que deve existir serviço público, tendencialmente com um único canal nacional de sinal aberto, com um forte enfoque em noticiário nacional, regional e internacional, de acesso livre e universal em todo o território português, por difusão hertziana. Este canal, na minha opinião,  não deve ter publicidade nem patrocínios comerciais e deve privilegiar a informação, o pluralismo, o debate, a programação infantil de qualidade, a produção de documentários de diversa índole e a produção de ficção nacional nas tipologias não concorrenciais com os canais privados. Pode e deve ter um tratamento adequado do entretenimento, modalidades de desporto incluídas – sobretudo não pode ser um canal maçador, sorumbático e cinzento.


Gostaria de aprofundar a questão da publicidade. Actualmente a RTP pode ter até seis minutos por hora de inserções publicitárias, e os privados podem ir até aos 12. Nesta altura do ano de 2013, o investimento publicitário nos canais de sinal aberto (RTP1, SIC e TVI) está a cair cerca de 20%, por cima das quedas verificadas nos últimos anos. O desconto médio em relação aos valores de tabela tem vindo a aumentar. A oferta de espaço publicitário nas televisões de sinal aberto encontra a concorrência cada vez maior dos dos canais de cabo. Na realidade a oferta de espaço publicitário em televisão de sinal aberto excede largamente a procura e, salvo raras ocasiões, nem os seis minutos hora são ocupados. O resultado é uma acentuada quebra de valor do espaço publicitário em televisão, o que tem efeitos nefastos noutros media, sobretudo a imprensa - já que o preço em televisão baixou a valores que se tornam, na prática, muito concorrenciais. Também aqui, na minha opinião, se devia repensar o tema, caminhando para uma progressiva diminuição da publicidade na RTP até à sua anulação - este é o papel regulador que, creio, o Estado pode e deve ter para procurar assegurar uma diversidade de formas de comunicação e não a sua redução.


Existem pelo mundo diversos canais públicos com estas boas características, que inclusivamente exportam formatos. Esse canal deve ter o mínimo de meios necessários e basear a sua produção nos produtores independentes, seguindo as recomendações internacionais sobre esta matéria. A presença do operador de serviço público no cabo deve ser repensada à mesma luz da não concorrência aos privados e protegendo a necessidade de maior participação das diversas regiões do país, aproveitando os recursos técnicos existentes para a informação. E, finalmente, a nível internacional, o operador de serviço público deve acabar com o RTP África – compreendendo aliás que nos países lusófonos já existem operadores locais de televisão com os quais interessa mais fazer cooperação do que concorrência -  e manter apenas um canal que seja a imagem internacional do país – um embaixador audiovisual de Portugal.


Isto é o que me interessa – ou seja, os conteúdos de um serviço público de televisão e as suas obrigações é que o tornam, ou não, útil e necessário. O resto é uma questão de distribuição e de organização. Mas o primeiro passo é decidir o que deve ou não ser assegurado, da forma mais concreta que fôr possível.


(Este texto é uma versão actualizada do que foi publicado na revista Notícias TV de 5 de Julho)

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publicado às 10:39

(Texto de opinião escrito a pedido da Notícias TV numa série de artigos sobre "A RTP e o Futuro")

 

Depois dos acontecimentos desta semana, fica novamente em aberto o que vai acontecer à RTP – a mudança de Governo e de ciclo político trará provavelmente alterações aos planos traçados. Há alguns anos que me interesso pelo tema: em 2002 integrei uma Comissão criada pelo Ministro Morais Sarmento, que elaborou um Relatório sobre o Serviço Público de Televisão, cujos princípios gerais continuam justos. Algum tempo depois fui convidado para pôr de pé o projecto de um canal aberto à Sociedade Civil, que ficou conhecido como a 2:,  que dirigi durante quase três anos.  Antes, quando trabalhei na produção independente, nomeadamente na área dos documentários, na Valentim de Carvalho Televisão, testemunhei que era mais fácil vender documentários sobre a história contemporânea portuguesa à SIC, como aconteceu, do que à RTP. De há cerca de três anos a esta parte a estação pública tem perdido progressivamente relevância e, nos tempos mais recentes, as mudanças de tecnologia, de distribuição e de hábitos de consumo de programas foram enormes, afectaram-na de forma sensível,  e é absolutamente indispensável que as definições gerais de serviço público audiovisual sejam adaptadas à realidade da introdução da Televisão Digital Terrestre e que o papel da RTP seja repensado no novo universo tecnológico, nomeadamente enquanto motor de inovação e não enquanto bastião da tradição.

Costumo dizer que Gutenberg chegou à televisão com a entrada no mercado de câmaras digitais de alta definição de preço acessível e com sistemas de edição baseados em computadores que qualquer um de nós pode ter em casa. Mas a realidade é que este Gutenberg audiovisual ainda é pouco aproveitado pelo serviço público e que a RTP, para utilizar uma analogia com a imprensa, ainda trabalha com composição a chumbo numa época em que o offset já tem várias gerações e em que, por exemplo no MEO, é possível a cada um de nós criar um canal – bem sei que não é bem disso que estamos a falar, mas este exemplo serve para mostrar como a televisão deixou de ser uma tecnologia inacessível e isso tem inevitavelmente consequências no comportamento de todo o sistema.


A ALTERAÇÃO DO CONSUMO E A REESTRUTURAÇÃO DA RTP


Hoje em dia cerca de 77% dos lares portugueses consomem televisão que lhes chega por um dos sistemas de distribuição de cabo ou satélite. Quer isto dizer que estes lares têm uma oferta de pelo menos meia centena de canais, em vez dos quatro tradicionais (RTP 1 e 2, SIC e TVI) e do Canal Parlamento, que também está, vá-se lá perceber porquê, na Televisão Digital Terrestre.

Portanto, sem desprezo pelos 23% de lares restantes, a oferta e os hábitos de consumo de televisão em Portugal mudaram de forma substancial nos últimos cinco anos. Basta dizer que desde há mais de um ano o conjunto dos canais de cabo ultrapassa em share médio de audiência qualquer um dos canais de sinal aberto.

Ora estas alterações significativas na distribuição e no consumo dos canais de televisão tem inevitavelmente consequências no serviço público – sobretudo no que deve ser a sua definição hoje em dia. A questão do acesso universal e gratuito por exemplo, já não é a pedra de toque da definição. Por outro lado, os canais generalistas e comerciais privados fornecem informação pelo menos tão pluralista como a da RTP, entretenimento e produção nacional em maior quantidade que a RTP, e qualquer pessoa – com cabo ou sem cabo - pode aceder a eles em qualquer ponto do território para ver futebol ou transmissões diretas de acontecimentos importantes – já que todos o fazem.

 

Fruto de um posicionamento concorrencial face aos privados, a RTP é ainda hoje uma entidade despesista, com uma estrutura sobredimensionada e custos desproporcionados. Num modelo ideal a RTP devia possuir apenas os meios necessários à informação e à emissão e tornar-se, usando a terminologia anglo-saxónica, num “broadcaster” e não numa empresa de produção, que é hoje em dia. Ou seja, toda a área de conteúdos não informativos devia ser descontinuada e o investimento em programas de documentário, ficção, infantis e entretenimento devia ser aplicado na produção externa e na aquisição de programas. Este canalizar para a aquisição de conteúdos de parte importante das verbas actualmente gastas em funcionamento permitiria dinamizar a produção independente, desenvolvendo e consolidando uma industria audiovisual, necessária à manutenção do português enquanto língua viva. Recordo que a RTP é a empresa que menos tempo de emissão consagra à produção nacional não informativa, nomeadamente na ficção. No meu entender existe um papel importante a desempenhar pelo serviço público e que tem a ver com uma carteira de encomendas continuada, junto à produção independente, nas áreas menos apetecidas pelos operadores privados, como os documentários, o registo de espectáculos na área do entretenimento ou uma programação infantil acessível, cuidada e baseada no português falado e não em legendagens. Estas áreas são fulcrais para o desenvolvimento e para a nossa sobrevivência no universo dos conteúdos audiovisuais.

De uma forma mais concreta, faria sentido que o serviço público de televisão investisse a maior fatia do seu orçamento de produção na encomenda e aquisição de programação de stock – aquela que se pode repetir ao longo do tempo e que não se esgota na primeira emissão, e a que se chama de fluxo. Para dar um exemplo uma série de ficção é stock e um concurso como o “Preço Certo” é fluxo. Faz mais sentido investir no que perdura do que naquilo que se evapora, certo? Já nem vou dizer que o aproveitamento da produção de stock nas emissões internacionais, em intercâmbios com outras televisões ou até na venda de direitos é uma realidade e que o fluxo é inaproveitável em tudo isto.

 

CRIATIVIDADE OU BOÇALIDADE?

 

Analisemos o tema de outra perspectiva, mesmo correndo o risco de alguma repetição: nos dias de hoje, num país com a dimensāo de Portugal, qual o sentido de existir um serviço público de televisāo, suportado pelos cidadāos, neste caso por uma taxa obrigatoriamente paga por todos os consumidores de electricidade? Numa sociedade onde felizmente existem vários operadores privados de televisāo e de rádio, e numa época em que o digital veio proporcionar novas formas de emissāo, difusāo e recepçāo - para nāo falar já profunda alteraçāo dos hábitos e formas de  consumo de televisāo, sobretudo entre os mais novos - para que serve um serviço público?

Correndo mais uma vez o risco de me repetir, insisto em algumas perguntas: o serviço público deve fazer concorrência aos privados,  ou deve proporcionar programaçāo alternativa e formativa? O serviço público deve ser comprador concorrencial de direitos de exibiçâo de futebol, um conteúdo comercial especialmente apetecível, contribuindo para inflacionar o seu preço? Ou deve privilegiar o fomento da produçāo de ficção e dos documentários sobre a realidade portuguesa? Deve fomentar a criatividade ou a boçalidade? Deve fazer programaçāo infantil em português, que possa ser difundida noutros países lusófonos, ou deve gastar recursos a fazer formatos internacionais de concursos e de entretenimento? Deve privilegiar a co-produção com outros países do universo cultural lusófono, ou adquirir séries que já passam nos canais de cabo emitidos em Portugal?


Bem sei que um canal que se focasse na nossa cultura e na nossa história, que fizesse uma informação de referência, abdicando da espectacularidade do sensacionalismo e da chicana política, teria menos audiência e menor influência na luta partidária. Mas, ao nível a que já caíram as audiências da RTP, a diferença não seria grande e até poderiam surgir surpresas.

Mais vale um serviço público sério, rigoroso e dinamizador do tecido industrial audiovisual que um serviço incaracterístico, concorrencial com os privados e que tenha por missão disputar audiências. Um serviço público pensado sobre uma matriz cultural na acepção mais ampla da palavra, seria uma alternativa verdadeira, teria um carácter complementar, e um papel maior e mais importante a longo prazo na defesa da presença da nossa língua no mundo. Um serviço público assim, que dinamizasse a indústria audiovisual, que apostasse na produção externa, seria um investimento com retorno em vez de um problema a fundo perdido - como a RTP tem maioritariamente sido nos últimos 20 anos.

 

OLHAR PARA O FUTURO E TOMAR DECISÕES

 

Um país que não tiver produção audiovisual de referência, que não apostar em conteúdos duradouros, não terá existência futura no mundo digital, o seu idioma não existirá para geração futuras, não terá presença nem influência internacional. Infelizmente a estratégia é esta, a da dissolução da nossa presença no mundo contemporâneo - bem diferente de outros países com idiomas menos falados, como a Noruega, a Finlândia ou a Islândia, onde no entanto se pensa numa estratégia nacional de conteúdos - que tem sabido cativar audiências onde menos se espera.

Para terminar e para esclarecer as coisas, sou da opinião de que deve existir serviço público, com um único canal nacional, com um forte enfoque em noticiário nacional, regional e internacional, de acesso livre e universal em todo o território português, por difusão hertziana. Este canal único nacional, na minha opinião,  não deve ter publicidade nem patrocínios comerciais e deve privilegiar a informação, o pluralismo, o debate, a programação infantil de qualidade, a produção de documentários de diversa índole e a produção de ficção nacional nas tipologias não concorrenciais com os canais privados. Pode e deve ter um tratamento adequado do entretenimento, modalidades de desporto incluídas – sobretudo não pode ser um canal maçador, sorumbático e cinzento. Existem pelo mundo diversos canais públicos com estas boas características, que inclusivamente exportam formatos. Esse canal deve ter o mínimo de meios necessários e basear a sua produção nos produtores independentes, seguindo as recomendações internacionais sobre esta matéria. A presença do operador de serviço público no cabo deve ser repensada à mesma luz da não concorrência aos privados e protegendo a necessidade de maior participação das diversas regiões do país, aproveitando os recursos técnicos existentes para a informação. E, finalmente, a nível internacional, o operador de serviço público deve acabar com o RTP África – compreendendo aliás que nos países lusófonos já existem operadores locais de televisão com os quais interessa mais fazer cooperação do que concorrência -  e manter apenas um canal que seja a imagem internacional do país – um embaixador audiovisual de Portugal.

Isto é o que me interessa – ou seja, os conteúdos de um serviço público de televisão e as suas obrigações é que o tornam, ou não, útil e necessário. O resto é uma questão de distribuição e de organização. Mas o primeiro passo é decidir o que deve ou não ser assegurado, da forma mais concreta que fôr possível.


Manuel Falcão


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publicado às 17:42

O SÓCRATES

por falcao, em 16.04.13

Apresentado pela RTP como um trunfo para combater a queda de audiências, verifica-se no entanto que Sócrates está a perder espectadores desde que voltou à televisão. Na entrevista transmitida dia 27 de Março, e que assinalou o seu regresso à RTP, o ex-Primeiro Ministro teve cerca de 1,61 milhões de espectadores. No Domingo 7 de Abril a estreia de “A Opinião de José Sócrates” alcançou 978 mil espectadores mas neste último Domingo, dia 15, a segunda emissão caíu para 757 mil espectadores, uma queda de cerca de 22,5%.

 

À mesma hora, na TVI, Marcelo mantinha-se firme, sem grandes variações, nos seus habituais 1,6 milhões de espectadores. Tudo isto acontece numa semana em que teoricamente podia haver interesse político em ouvir a opinião de Sócrates: o PS tinha feito eleições directas que reconduziram António José Seguro, tinha havido uma mini-remodelação e o CDS/PP lançou uma ponte ao PS a propósito da reforma do Estado. Mas nem nesta conjuntura política José Sócrates conseguiu aumentar a sua plateia.

 

Confesso que ainda não tinha visto o programa que a RTP emite com José Sócrates na noite de Domingo. Ontem espreitei e uma das coisas que me causa alguma perplexidade no programa é o cenário – baseado numa imagem híper-aumentada que reproduz a silhueta da cara de Sócrates, por trás da sua presença ao vivo. Parece-me de mau gosto e um pouco a puxar ao culto de personalidade. A falta de capacidade de fixar audiências tem também a ver com isto – e com um discurso mais revanchista que virado para o futuro. O estilo de propaganda, que Sócrates escolheu, é derrotado pela conversa bem disposta e mais solta de Marcelo Rebelo de Sousa.

 

(publicado no diário Metro de dia 16 de Abril)

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publicado às 18:16


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