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UMA OPERETA DE BAIXA CATEGORIA

por falcao, em 21.03.25

 

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A CRISE - Uma pessoa está uma semana fora do país e quando regressa descobre que o Governo caíu, que o Primeiro Ministro tropeçou nas próprias pernas e verifica que até parece que voltámos aos tempos em que os governos explodiam de seis em seis meses. Ponho-me a ver o que aconteceu e, graças a Ricardo Araújo Pereira e ao seu inestimável almanaque da vida portuguesa que é a primeira parte do “Isto É Gozar Com Quem Trabalha”, nome cada vez mais adequado ao estado da nação, arrepio-me a assistir ao  teatro de horrores em que o Parlamento se travestiu. De repente parece que as principais bancadas da Assembleia da República foram acometidas por uma virose e que não há terapia que melhore o seu estado. Tudo isto se assemelha a uma opereta de baixa categoria, com actores de quinta ordem, acompanhados por bandos de servis lacaios que se limitam a dizer que sim. Olhando ainda mais de perto para o que a bancada do governo fez no dia do debate da moção de confiança fico com a sensação que estiveram a jogar poker sem saber fazer bluff, jogadores inábeis numa mesa de casino clandestino. Continuo a achar que grande parte deste clima de instabilidade, de sucessivas quedas de governo, vem da Lei Eleitoral que temos. Não garante a representatividade real dos eleitores, afasta os eleitos dos cidadãos, estimula dirigentes habilidosos e mal formados nos partidos. Francisco Mendes da Silva escreveu um belo artigo no Público onde explica: “a sorte de praticamente todos os políticos com mais poder do PSD e do PS está dependente de serem escolhidos para os lugares de protagonismo pelo respectivo líder, mas completamente imune ao sucesso ou fracasso que esse líder venha a ter. O impulso para o enfrentarem, antes de eleições, é nulo.” Cito outro escrito que li por estes dias: “Os aparelhos partidários têm um poder paralelo ao do Estado. É um processo mais recente e resulta do aprisionamento dos partidos pelas jotas, por alguma gente sem outra forma de singrar na vida e por uma tentacular rede de interesses. É o Tutti-Frutti, por exemplo. Nestes aparelhos não há ideologias, há lugares. Nem sequer há política, há empregos. O interesse público é substituído por interesses individuais, que nunca se cansam”Mas, em vez de irem para o reformatório, que é onde muitos mereciam estar, vão para o Parlamento - e às vezes até para o governo.

 

SEMANADA - Nos últimos cinco anos o número  de denúncias de cibercrimes à Procuradoria-Geral da República aumentou mais de sete vezes; em 2023 das 2916 denúncias recedidas 30% diziam respeito a burlas no esquema “olá mãe, olá pai” e a tentativas de  cobrança de falsas dívidas de energia eléctrica; em 2024 os centros de emprego anularam a inscrição a 6232 desempregados subsidiados por não cumprirem obrigações previstas na lei, um número 13,5% superior ao verificado no ano anterior; em 17 freguesias de Lisboa foram detectadas redes de imigração ilegal; os cerca de 370 mil imigrantes brasileiros em Portugal enviaram para o seu país mais de 400 milhões de euros no ano passado; os emigrantes portugueses espalhados pelo mundo enviaram para Portugal no ano passado cerca de 3500 milhões de euros com Suiça, França e Reino Unido, por esta ordem, a serem os países de onde foi enviado mais dinheiro; segundo o Banco de Portugal a incidência do salário mínimo tem vindo a aumentar de 198,5% em 2015 para 31,4% actualmente; mais de 40% dos trabalhadores do alojamento e restauração recebem o salário mínimo, o mesmo acontecendo a 30,2% dos trabalhadores da construção e a 27,3% dos trabalhadores da educação e saúde; as quatro eleições que vão ocorrer em Portugal nos próximos dez meses têm um custo estimado de 137 milhões de euros; há 13 mil pessoas em fuga à Justiça e tribunais são incapazes de localizar milhares de arguidos e condenados.

 

O ARCO DA VELHA - Durante sete meses um grupo de cinco elementos aproveitava a hora das missas na região norte do país para roubar o que estava no interior dos carros estacionados perto das igrejas, incluindo os dos padres que celebravam a missa.

 

View of José Pedro Croft's site-specific work ©

UM NOVO MUSEU PRIVADO  -   Armando Martins é um dos grandes coleccionadores portugueses de arte e presença assídua em várias galerias e feiras de Arte. Começou a colecionar em 1974 e desde então adquiriu mais de 600 obras, que vão do final do século XIX até à actualidade. Agora tem o seu próprio Museu, o MACAM, dirigido por Adelaide Ginga (ver nestas páginas a reportagem de Filipa Lino), onde expõe a sua colecção e apresenta outros artistas. Este novo museu privado combina um hotel, construído no recuperado Palácio Condes da Ribeira Grande, onde durante muitos anos funcionou o Liceu Rainha Dona Amélia, na Junqueira, e que acolhe a exposição permanente da colecção de Armando Martins, e uma nova ala para exposições temporárias. Além disso, no exterior, estão obras encomendadas expressamente para o local como a de José Pedro Croft (na imagem, fotografada por Fernando Guerra), uma escultura de grande dimensão composta por três elementos ovais em aço e vidro colorido, localizada no terraço nascente da fachada do palácio e que pode ser vista da rua. Cristina Ataíde desenvolveu uma memorável escultura em mármore, que evoca uma montanha, colocada na fonte do jardim do antigo palácio, intitulada “Montanha- Água” e que remete para a relação entre os dois pólos que se complementam na natureza. Outras peças criadas para o local são da canadiana Angela Bulloch, que concebeu uma composição vertical de cinco poliedros irregulares que está num dos outros terraços e o artista espanhol Carlos Aires que criou uma instalação na antiga capela evocando um  diálogo entre a espiritualidade e a brutalidade da guerra. A colecção permanente é apresentada com o título ”uma colecção a dois tempos” e inclui nomes como Amadeo de Sousa Cardozo, Paula Rego, Júlio Pomar, Pedro Cabrita Reis, Maria Helena Vieira da Silva, Helena Almeida, Julião Sarmento, Marina Abramović, Olafur Eliasson, ou Thomas Struth, entre outros. No nova ala do edifício estão duas exposições temporárias, “O Antropoceno” sobre o impacto da actividade humana no planeta e a outra é “Guerra: Realidade, Mito e Ficção”, sobre a fragilidade da vida e a situação do mundo nos dias de hoje. Adelaide Ginga e Carolina Quintela dividem entre si a curadoria das exposições apresentadas. De salientar ainda que a nova ala tem a fachada coberta com azulejos tridimensionais da autoria da artista e ceramista portuguesa Maria Ana Vasco Costa, numa homenagem à tradição portuguesa de fabrico de azulejos.

 

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VER A NATUREZA - Uma boa maneira de saudar a primavera que agora dá os primeiros passos é olharmos para a natureza à nossa volta, que nesta altura do ano explode. É fantástico descobrir os ciclos da natureza observando a evolução da vida das árvores, como são as folhas, as flores que nascem nos ramos, o crescer dos frutos, é um espectáculo. Para tornar tudo ainda mais agradável é importante sabermos distinguir as árvores, como se chamam, qual a sua história e que episódios lhes estão associados. É isso que António Bagão Félix, economista e professor universitário, ex- membro de vários governos em diversas pastas faz no livro “Quarenta Árvore em discurso directo”, uma revisão de uma obra do autor que há muito se encontra esgotada e que se chamava “Trinta árvores em discurso directo”. Botânico amador, desenvolveu a sua observação desde plantas herbáceas, a suculentas e cactáceas, mais tarde de arbustos e, por fim, árvores. A cada uma das quarenta árvores o autor dá voz e carisma, imaginando que elas conversam com o leitor sobre as suas origens e geografias, relações com a cultura e o mundo. Na parte final do livro, há um sumário das árvores que, em Portugal, estão classificadas legalmente de interesse público ou mesmo como monumentais, assim como um curto glossário botânico. Para terem uma ideia, as páginas sobre o jacarandá começam assim: ”Cheguei a Portugal há para aí uns cento e cinquenta anos, vim do Brasil, onde passei a minha infância….Quando fiz a longa travessia achei, talvez precipitadamente, que não me iria dar bem com os ares de Lisboa”. A história começa assim e já sabemos que o Jacarandá  se afeiçoou a Lisboa e a cidade a ele. No livro, cada uma das árvores conta a sua história na primeira pessoa. Uma edição da Porto Editora.

 

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UNPLUGGED - Kristin Hersh, a vocalista e guitarrista dos Throwing Muses, é um caso à parte no mundo da música anglo-americana e o novo álbum da banda, o 11º em 40 anos de actividade, é prova disso mesmo. Neste disco, “Moonlight Concessions”, a sonoridade do grupo é muito diferente do habitual, assumidamente acústica. Este é um disco claramente comandado por Kristin Hersh, que além da voz e composição assina a produção. David Narcizo na percussão faz um trabalho mais minimal e discreto, Bernard George assegura um baixo eficaz e elegante e a surpresa é o violoncelo, que assume quase o primeiro plano, tocado por Pete Harvey. O álbum inclui nove canções curtas, tem um total de 29 minutos e as canções são como pequenas histórias que se sucedem umas às outras. A crítica tem assinalado a semelhança entre estas canções e as short stories de Raymond Carver. Mas de facto a voz de Kristin Hersh continua a ser o maior ponto de diferenciação. Disponível nas plataformas de streaming.

 

image-18.pngALMANAQUE - Em Nova Iorque, no Centro da Cidade, na Quinta Avenida, paredes meias com o Central Park, está a Neue Galerie, um discreto museu dedicado à arte e design da Áustria e Alemanha do início do século XX. Fica num edifício magnífico construído em 1914,  no primeiro piso podem ser vistas peças de design e mobiliário austríacas, assim como obras de nomes como Gustav Klimt (na imagem), Egon Schiele e Oskar Kokoschka; um piso acima encontramos um acervo de obras de arte e design alemãs, de nomes como Max Beckmann, Ernst Ludwig Kirchner, Paul Klee ou Marcel Breuer. A colecção permanente, que espelha um período particularmente rico da criação artística da Áustria e Alemanha, num tempo de incertezas políticas e convulsões sociais, é verdadeiramente impressionante, quer nas obras de pintura, no mobiliário ou nos objectos de design. 

 

DIXIT  - “O primeiro-ministro não ajudou ao esclarecimento, antes terá tornado tudo ainda mais opaco, mas questionável e mais problemático” - António Barreto

 

BACK TO BASICS -  “É melhor ser merecedor de honras e não as ter do que tê-las, não sendo merecedor delas” - Mark Twain

 

A ESQUINA DO RIO É PUBLICADA SEMANALMENTE, ÀS SEXTAS, NO SUPLEMENTO WEEKEND DO JORNAL DE  NEGÓCIOS



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